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Algumas reflexões sobre os impactos da COVID-19 nas relações familiares
Ana Carolina Brochado Teixeira
29/04/2020
Os desafios que estamos vivendo na atualidade são inúmeros e, assim como a COVID – 19, espalham-se para todos os lados, têm inúmeros aspectos e são de natureza multidisciplinar. A pandemia da COVID-19 invadiu as nossas casas e nos colocou todos juntos, em convivência full time. Mas para os casais separados com filhos menores, o desafio, em alguns aspectos, é ainda maior. Além das dificuldades e dos riscos inerentes à pandemia – contágio veloz do coronavírus, que faz do isolamento social a medida de prevenção aparentemente mais eficaz em razão da ausência de vacinas, por ora – o momento gerou duas reações:
- Diante das medidas de segurança que reverberaram no Poder Judiciário, muitos ex-casais se viram diante da necessidade de se restabelecer o diálogo (mesmo que forçadamente) para negociarem novas possibilidades para esse período, pois precisavam encontrar soluções que protegessem os filhos e, em alguma medida, atendessem às expectativas de convivência entre pais e filhos;
- Para aqueles que não conseguiram resolver consensualmente, o Poder Judiciário foi procurado para dar solução aos conflitos. As demandas que proliferaram nesse momento se referem, principalmente, ao exercício da convivência familiar e aos alimentos, temas que serão abordados nessa oportunidade.
Em relação à convivência, verifica-se prioritariamente pedidos de suspensão das visitas, sob o argumento de que os deslocamentos representam riscos à criança, a serem verificados no caso concreto. Se algum dos pais for médico, se tiver idosos ou outros membros de grupos de risco no núcleo familiar da criança, deve-se ter atenção especial.
Por ser a convivência familiar um direito fundamental, a teor do art. 227 da Constituição Federal, as razões para excepcioná-lo devem ser da maior relevância e gerar riscos diretamente para a criança ou seu entorno. A prioridade é manter o exercício da convivência e, se for possível, resguardar a todos. Nesse caso, cada genitor deve se responsabilizar pelas crianças integralmente durante o período em que estiverem jutos, inclusive absorvendo as atividades escolares remotas propostas para as crianças.
Se for o caso, uma boa alternativa é tratar esse período de isolamento como férias, de modo a aumentar os dias em que a criança fica com cada um dos pais e reduzir os deslocamentos. Também nesse período, ambos os genitores deverão cuidar do cumprimento das tarefas escolares atribuídas aos filhos, de modo que não seja apenas a mãe ou o pai o responsável por administrá-las junto aos filhos.
E, só excepcionalmente, se não for possível manter a convivência, se houver algum risco à criança, as visitas devem ser suspensas. Nesse caso, é importante (i) haver prazo determinado de suspensão da convivência, mesmo com a possibilidade de modificação posterior e (ii) manter o convívio virtual – preferencialmente com sistema de áudio e vídeo –, por meio das tecnologias ou telefone. A imprensa noticiou alguns casos de suspensão das visitas. Merece destaque a decisão do TJSP que suspendeu a convivência paterno-filial, por 14 dias, de pai que viajou para a Colômbia, frequentou diversos aeroportos internacionais e queria visitar a filha de 2 anos que tinha frequentes problemas respiratórios; dadas as circunstâncias do caso, entendeu-se mais prudente o cumprimento do isolamento por parte do pai durante 14 dias, quando estaria liberado para conviver com a filha se não apresentasse nenhum sintoma da COVID-19.[1]
A sugestão, portanto, é uma gradação que parta da regra (convivência familiar já estabelecida) para a exceção (suspensão do convívio):
1º. Manter a convivência nos moldes estabelecidos;
2º. Se não for possível, tratar o período do isolamento social como férias;
3º. Se houver risco à criança (pais na linha de frente do sistema de saúde, familiares moradores da mesma casa pertencentes a grupos de risco, criança acometida por comorbidade cuja necessidade de preservação é maior), aí sim deve-se pensar em suspender as visitas. Nesse caso extremo, é importantíssimo haver um tempo determinado de suspensão, mesmo havendo prorrogação posterior.
Essa sugestão justifica-se para se evitar a criação de um ambiente facilitador de práticas de alienação parental.
Os alimentos também têm sofrido grande impacto da pandemia, em face da redução da renda de profissionais liberais, autorização de redução de contratos de trabalho, da escassa circulação de dinheiro, etc. O resultado econômico tem reverberado para ambos os lados: tanto para o pai – que geralmente paga os alimentos – quanto para a mãe, que habitualmente gerencia o valor recebido pelo filho, mas também contribui para o sustento do menor. Sem dúvida, é necessário se refletir sobre as autorizações de redução dos alimentos, sendo essencial uma verificação concreta dos efeitos da pandemia tanto para o pai quanto para a mãe, levantando-se eventuais despesas que podem ser temporariamente cortadas, mas sem ignorar as que são essenciais para a sobrevivência digna do menor.
Embora a repercussão econômica esteja disseminada, a análise do caso concreto é essencial, devendo-se avaliar: (i) se é devida a redução dos alimentos, (ii) qual o percentual deve ser diminuído e (iii) por quanto tempo essa restrição permanecerá.
Outra situação a ser observada refere-se às execuções de alimentos, em virtude do inadimplemento de muitos alimentantes em razão do decréscimo financeiro. Merece destaque também a necessidade de uma análise concreta hábil a verificar se o inadimplemento é mesmo involuntário e quais os efeitos da pandemia na realidade econômica do alimentante. Além disso, deve-se destacar a decisão do STJ que estendeu habeas corpus para todos os presos por dívida alimentar do país, fixando prisão domiciliar por dívidas de alimentos, a fim de evitar a propagação do vírus e minorar os riscos à saúde dos alimentantes (HC 568.021), em atenção ao art. 6º da Recomendação 62 de 17.03.2020 do CNJ.[2]
Nota-se, portanto, a necessidade de se pensar sobre os efeitos da pandemia a partir da proteção aos vulneráveis, principalmente a criança, preservando seus direitos fundamentais à convivência familiar e à sobrevivência digna.
[1] Disponível em https://www.conjur.com.br/2020-mar-13/desembargador-proibe-pai-ver-filha-risco-coronavirus. Acesso em 22 abril 2020.
[2] Art. 6º. Recomendar aos magistrados com competência cível que considerem a colocação em prisão domiciliar das pessoas presas por dívida alimentícia, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus.
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