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DIREITO COMPARADO

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As sociedades de economia mista e as emprêsas públicas no direito comparado

DIREITO COMPARADO

EMPRESAS PÚBLICAS

SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA

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15/08/2022

REVISTA FORENSE – VOLUME 152
MARÇO-ABRIL DE 1954
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto,

Abreviaturas e siglas usadas
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CRÔNICARevista Forense 152

DOUTRINA

PARECERES

NOTAS E COMENTÁRIOS

BIBLIOGRAFIA

JURISPRUDÊNCIA

LEGISLAÇÃO

SUMÁRIO: Introdução. Nova função da emprêsa mista. Emprêsas públicas em França. Experiência norte-americana. Conclusão.

Sobre o autor

Egberto Lacerda Teixeira, advogado em São Paulo.

NOTAS E COMENTÁRIOS

As sociedades de economia mista e as emprêsas públicas no direito comparado

I Introdução

Se é reduzida a nossa literatura jurídica em matéria de direito administrativo, o que se explica pelo impulso que só recentemente receberam êstes estudos,1 podemos dizer que realmente muito pouco se tem escrito no Brasil sôbre sociedades de economia mista e emprêsas públicas.

A partir de 1940, dois ensaios sintetizam o pensamento dos nossos juristas neste campo. O primeiro é de autoria de TRAJANO DE MIRANDA VALVERDE, tendo sido publicado na “REVISTA FORENSE”2 e na “Rev. de Direito Administrativo”. O segundo é constituído pelos três capítulos que TEMÍSTOCLES CAVALCÂNTI dedica ao assunto no IV vol. do seu “Tratado de Direito Administrativo”.3 Ambos os estudos se preocupam mais com o ponto de vista do direito constituído do que com o prisma de jure constituendo. Contornam a questão da necessidade e da oportunidade da criação das companhias mistas para descreverem mais longa e minuciosamente as sociedades dêste gênero existentes em nosso direito positivo. São introduções à matéria feitas por dois eminentes mestres, o primeiro comercialista emérito e o segundo um dos criadores do nosso direito administrativo moderno que, todavia, não quiseram esgotar o assunto por estarem a êle se referindo incidenter tantum em tratados gerais que não se cingiam ao estudo das sociedades de economia mista.4 Deixaram um campo vasto, aberto para que as monografias se encarregassem de enveredar por estudos mais, meticulosos e completos, partindo dos quadros gerais fixados nos tratados, desenvolvendo-os e cobrindo a realidade em tôda sua extensão e minudência.5

Parecia que a sociedade de economia mista já se integrara por completo em nosso sistema de vida, quando ouvimos, em 1952, a brilhante conferência pronunciada pelo deputado BILAC PINTO no Curso de Direito Público da Fundação Getúlio Vargas, em que focalizava, numa síntese densa e com grande fôrça de argumentação, “O declínio das sociedades de economia mista e o advento das modernas emprêsas públicas”.

A palestra do catedrático de direito administrativo da Faculdade Nacional de Direito, que teve larga repercussão mesmo fora dos meios estritamente jurídicos,6 foi um grito de alarme lançando o anátema da ciência e da lógica sôbre a sociedade de economia mista. Evocando as opiniões dos grandes mestres estrangeiros e o testemunho das obras mais recentes, assinalava o estéril contra-senso que representava êste tipo de companhia, mostrando que o futuro acenava para as emprêsas públicas ainda completamente desconhecidas em nosso direito positivo.

O estudo do problema deslocou-se.

MIRANDA VALVERDE e TEMÍSTOCLES CAVALCÂNTI tinham aceito a fórmula já existente e apenas procuraram definir-lhe os contornos. Já BILAC PINTO discute e condena a forma técnica, afastando-se do positivismo jurídico para tecer considerações sôbre a oportunidade e a conveniência da existência da sociedade de economia mista como processo de intervenção estatal.

Até 1950, o meio jurídico brasileiro aceitava a companhia mista apontando-lhe as vantagens, e o nosso legislador, abandonando as discussões teóricas, utilizava-a como meio eficaz, seja para a execução de certos serviços públicos, seja para incentivar a produção quando faltassem os necessários recursos às emprêsas privadas.

O artigo do Prof. BILAC PINTO, divulgando uma literatura estrangeira mais recente e evocando a experiência feita em diversos países nos últimos anos, veio abrir novamente um debate que parecia definitivamente encerrado. Recrudesceu o movimento doutrinário e o interêsse legislativo em matéria de sociedades de economia mista e de emprêsas públicas.7

É, aliás, interessante mencionar que MIRANDA VALVERDE e TEMÍSTOCLES CAVALCÂNTI citam uma bibliografia que data dos anos de 1920-1930 e corresponde à época em que surgiu e se desenvolveu a sociedade de economia mista, então considerada como magnífica solução do conflito entre individualistas e intervencionistas. Assim, as obras de LAPIE (“Les entreprises d’économie mixte”, Paris, 1925), ALEXANDRE BRET (“Une nouvelle formule d’organisation économique: la société d’économie mixte”, Paris, 1925) e CHÉRON (“De l’actionnariat des collectivités publiques”, Paris, 1928) pertencem à primeira fase da reação doutrinária em que foi saudada entusiàsticamente a economia mista como meio de apaziguar e dirimir as divergências de interêsses entre o Estado e os particulares. Já BILAC PINTO, escrevendo mais recentemente, alude a obras posteriores peculiares à época em que são publicadas. Efetivamente, após a tese, veio a antítese. A sociedade de economia mista não era a solução ideal. Criava novos problemas que não podiam ser desprezados. Como conciliar o interêsse do Estado que almeja o bem comum e a satisfação das necessidades coletivas com o animus lucrandi dos particulares egoìsticamente apegados ao próprio sucesso e desejosos de obterem vantagens pessoais? É o problema que vem definir, em 1935, HENRI ZWAHLEN, professor da Faculdade de Direito de Lausana, na sua obra, já hoje clássica, “Des Sociétés commerciales avec participation de l’Etat”. O livro de ZWAHLEN é um dos últimos trabalhos que TEMÍSTOCLES CAVALCÂNTI cita, sem, aliás, dar muita atenção às objeções do mestre suíço. Ao contrário, BILAC PINTO parte da crítica contida no estudo do professor de Lausana para confirmá-la pelas obras de JOSÉ GIRON TENA (“Las sociedades de economia mista”, Madri, 1942) e de MAURICE BYÉ (“Les nationalisations en France et à l’Etranger”, Paris, 1948).

Era natural que o catedrático da Faculdade Nacional de Direito e ilustre deputado mineiro, interpretando nova corrente de idéias que se constituiu na Europa nos anos de 1935-1948, divergisse dos seus predecessores, que trataram da matéria, e viesse a falar no declínio das sociedades de economia mista, que, de fato, correspondeu a uma realidade transitória.

II Nova função da emprêsa mista

De fato, para quem observa a vida econômica nacional, pode parecer ousada a afirmação do Prof. BILAC PINTO quando fala no declínio das sociedades de economia mista. Estas parecem, ao contrário, ter chegado ao apogeu do seu desenvolvimento, estando em constante expansão.

Ao lado das sociedades criadas pelo Estado Novo, às quais já tivemos ocasião de nos referir,8 assistimos ao despontar contínuo de novas companhias, em que figuram, como acionistas, o Estado, outras pessoas jurídicas de direito público e particulares. Bastaria mencionar a Petrobrás e o Banco do Nordeste como recentes realizações neste domínio. Mas ainda é interessante lembrar que existe um projeto na Câmara Federal visando entregar as nossas estradas de ferro a uma sociedade de economia mista.9 Outrossim, os jornais nos comunicam a existência de uma sociedade mista em Minas para a exploração de frigoríficos – a Frigoríficos Minas Gerais S.A. (FRIMISA), enquanto, por outro lado, é sugerida a transformação em companhia mista da produtora cinematográfica Vera Cruz.10

Não pretendemos fazer um relatório completo do que existe como sociedades de economia mista no Brasil. Limitamo-nos a apontar alguns fatos sintomáticos que, à primeira vista, parecem tornar irrisória a afirmação do deputado mineiro.

Na verdade, após a tese e a antítese, chegamos à síntese, para a qual se inclina a doutrina numa terceira fase.11

Efetivamente, a sociedade de economia mista deixa de ser unes, técnica empregada para a satisfação das necessidades públicas essenciais, para a realização dos serviços públicos, sendo substituída, neste campo, pela emprêsa pública.12 Mas a companhia mista torna-se uma forma pela qual o Estado incentiva a produção em caso de insuficiência dos capitais particulares.

Enquanto a nossa doutrina ainda não atinou com essa verdade, o legislador pátrio já aplicou tal conclusão, com o adiantamento que os homens práticos têm sôbre a especulação da doutrina. O nosso direito positivo já concebe a companhia mista não mais como meio de realizar serviços públicos, mas como processo de incentivo à produção.

A inércia, do espírito humano difìcilmente aceita inovações e, quando estas surgem, exige, para aceitá-las, que mantenham ao menos as antigas formas. GASTON MORIN, decano da Faculdade de Direito de Montpellier, dedicou algumas páginas à análise profunda dêste fenômeno, revelando, num estilo cheio de vida e com acuidade e finura, como se processavam as mutações jurídicas. Os novos institutos surgem camuflados e dissimulados sob as formas antigas. Já TARDE, aliás, assinalava que a continuação da vigência do direito formal antigo esconde as transformações em que vai nascendo o direito material e vivo. Os primeiros vagões conservaram a forma das diligências e os automóveis não quiseram romper com o aspecto tradicional das carruagens antigas.13 Assim, o contrato, perdendo o seu valor econômico na Rússia soviética, passou a ter função psicológica.14 Manteve-se a forma, a palavra que qualifica o instituto jurídico, o “rótulo da garrafa”, como diria, PAUL VALÉRY, mas o conteúdo foi modificado, o fundo transformado. Dêste modo, a sociedade de economia mista de outrora, que realizava serviços, foi substituída pela emprêsa pública, mas foi dada nova missão à companhia mista, já agora considerada como técnica de intervenção estatal para incentivara produção.

Já tivemos o ensejo de mostrar como o Prof. BILAC PINTO, firmando a sua opinião na lição de HENRI ZWAHLEN, ROGER, KRAEPPELIN, RAYMOND RACINE, GIRON TENA, BATSON, JOHN THURSTON e MAURICE BYÉ, condenou a sociedade de economia mista, por serem incompatíveis os interêsses que nela se associam.

Efetivamente, escreve o eminente publicista brasileiro:

“Através dessas objeções emanadas de especialistas que, em diferentes países, acompanharam a evolução das emprêsas mistas, notamos a coincidência de uma argüição fundamental contra êsse sistema: o conflito insolúvel entre o interêsse particular e o interêsse público”.15

O argumento, todavia, nem sempre procede.

Acreditamos que possam existir sociedades de economia mista em que se, conciliem interêsses sociais e particulares.

Nas sociedades em que o Estado é majoritário, os acionistas particulares não têm voz ativa na administração social. O seu papel fica de fato reduzido ao de simples mutuantes, cujo dividendo corresponde ao preço de locação do capital investido, sendo, pois, uma espécie de juros variáveis de acôrdo com os benefícios realizados pela sociedade. Pode assim o Estado obter capitais associando os mutuantes aos riscos da emprêsa, sem se obrigar ao pagamento de juros que poderiam onerar demasiadamehte a emprêsa se esta não rendesse lucros imediatos.

Nas sociedades em que o Estado é minoritário, a participação pública veio substituir vantajosamente o antigo sistema, de subvenções.16 Os poderes públicos, operando para incentivar a produção nacional, especialmente nos países subdesenvolvidos, que se caracterizam pela falta de capitais particulares vultosos, preferiram a técnica da sociedade de economia mista com participação estatal minoritária à subvenção, já que, na emprêsa mista, o Estado tem maior contrôle e conhecimento direto das atividades sociais, evitando assim que os fundos públicos sejam utilizados de modo diverso ou contrário à finalidade a que se destinavam.

Neste caso, em vez de subvencionar sociedades particulares em que a fiscalização do emprego da subvenção será sempre difícil e aleatória, prefere o Estado moderno criar sociedades de economia mista em que êle figura como mero acionista, devendo ser de preferência a sua participação minoritária para não entravar o dinamismo da iniciativa privada.

Já se alegou que uma sociedade que necessita de capitais públicos é destinada por definição a ser deficitária. Não se justifica esta afirmação, pois há sociedades que para o seu desenvolvimento inicial precisam de capitais importantes e cujos lucros, no comêço, são relativamente moderados, de modo que não conseguem atrair grandes capitais particulares que têm fins mais imediatistas. Se uma sociedade dêste tipo exerce uma atividade útil para o sistema da produção, parece acertada a utilização no caso da técnica da companhia mista com participação estatal minoritária.

Assim, falou-se recentemente na transformação em sociedade de economia mista da Companhia Vera Cruz, que está afrontando dificuldades financeiras. É compreensível que há interêsse do Estado no funcionamento de emprêsas cinematográficas nacionais, inclusive por motivos de política econômica internacional e especialmente atendendo-se à falta de divisas estrangeiras de que sofremos. Os poderes públicos, na sua missão de incentivar a produção nacional, não podem deixar perecer uma indústria nova e ainda inexistente no país. O meio de salvar a emprêsa seria a concessão de subvenções governamentais. Mas, no caso de empréstimo feito pelo Estado à sociedade comercial, difícil seria saber se o dinheiro foi realmente empregado para consolidar a produção cinematográfica nacional, ou seja, se foi observada a verdadeira finalidade da subvenção. Parece, pois, preferível que o Estado se transforme em acionista minoritário, tornando-se a sociedade uma emprêsa mista.

Pode não haver choque entre o interêsse público e a avidaz de lucro. Nas Companhias das Índias, o objetivo principal era o lucro, o benefício a ser realizado pelos comerciantes, o que não impediu que tais companhias fôssem da máxima utilidade para a política internacional dos Estados que as criaram. Os particulares visavam o fim econômico, os governos o objetivo político. Algumas vezes, conciliavam-se.17

Nem sempre há oposição entre aspirações estatais e intenções particulares.

BERNARD CHENOT, professor no Instituto de Estudos Políticos de Paris, no seu afamado livro “Organisation économique de l’Etat” mostra como é artificial a objeção levantada pelo Prof. BILAC PINTO, dizendo ser a economia mista uma ficção.

“Se a participação do Estado é muito fraca”, escreve CHENOT, “ela é acidental e não há interêsse público em jôgo. O Estado equipara-se aos outros acionistas e a sociedade funciona como qualquer emprêsa privada. O fato de ser o Estado acionista lhe dá algumas informações do que se passa na emprêsa e pode eventualmente preparar uma intervenção estatal mais direta na sociedade. Se a participação do Estado se torna importante, não há mais igualdade entre as partes. As coletividades administrativas gozam de privilégios que lhes permitem manter a sociedade dentro dos quadros do serviço público, mesmo se os resultados comerciais da emprêsa com isso venham a sofrer. Neste caso, a economia mista não passa de um processo que permite a associação do Estado com os particulares para a realização de uma missão de interêsse geral sem que aquêle abandone as prerrogativas do poder”.18

Apreciando o histórico da sociedade de economia mista, CHENOT aponta a decadência em que caiu logo após a última guerra mundial, mas revela que hoje está sendo recebida com maior entusiasmo, havendo mesmo algumas emprêsas públicas que voltam à forma de sociedade de economia mista, como tem acontecido com a Companhia Air France, por exemplo.

Concluindo, reconhece que não é a emprêsa mista um processo de realização dos serviços públicos. “Seu domínio eletivo”, escreve, “deve abranger os setores que o Estado pretende deixar à iniciativa privada, favorecendo, todavia, a atividade desta”. E cita o exemplo das companhias criadas para a exploração e o desenvolvimento da França de Além-mar.19

Chegamos, pois, à seguinte tese: Se, na realização dos serviços públicos, as sociedades de economia mista devem ser substituídas pelas emprêsas públicas (sociétés d’Etat, Government corporations), em que as pessoas de direito público são os únicos acionistas, ao contrário, a técnica da emprêsa mista de preferência com participação estatal minoritária é das mais fecundas para o incentivo da produção.

No tocante aos serviços públicos, tem razão BILAC PINTO quando, com BIELSA, diz que deve ser superada a sociedade de economia mista para que haja “prestação direta dos serviços públicos pelo Estado, pois esta é a razão da sua existência, a justificação da sua criação”.

Por outro lado, o novo destino das sociedades mistas, já pressentido por MIRANDA VALVERDE e assinalado por CHENOT, é a sua transformação em técnica de auxílio à produção, substitutiva das subvenções, enquanto a emprêsa pública sucede à economia mista e, mais remotamente, às concessões, no campo da realização dos serviços públicos.

O que só agora os publicistas vêm descobrindo, já o compreendeu intuitivamente o nosso legislador, e já encontramos no direito positivo brasileiro a nova função que há de caber no mundo hodierno às emprêsas mistas.

Transformações da técnica. Privatização e publicização. Conceito de direito comercial.

Os juristas franceses, ao tratarem da, economia mista, gostam de apontar a comercialização do direito administrativo. GEORGES VEDEL, autor do afamado “Manuel élémentaire de droit constitutionnel”,20 lembra que “o Estado expropriou os capitalistas, não só das suas emprêsas, como também das suas receitas e das suas experiências”. HOUIN, professor da Faculdade de Direito de Rennes, começa o seu fecundo artigo publicado nos “Archives de Philosophie du Droit” sob o título “La gestion des entreprises publiques et les méthodes du droit commercial”,21 notando que há povos vencidos cuja civilização e cujas leis se impõem ao vencedor em virtude do valor inerente que representam. Do mesmo modo que os bárbaros militarmente preponderantes se inclinaram diante da cultura romana, o direito público em sua fase de expansão teve que adotar a técnica privatista. JEAN RIVERO, que se tornou conhecido pelos seus estudos sôbre as transformações sofridas pelo direito público após a última guerra mundial, afirmou que “o prestígio das instituições capitalistas sobrevive à condenação dos princípios que as inspiravam”.

De fato, as emprêsas públicas passam a ser consideradas como comerciantes, submetidas às normas de direito comercial que se refletem na sua contabilidade, nos seus contratos, nas suas relações com o respectivo pessoal e com terceiros.22

Cria-se, assim, uma região neutra, uma zona cinzenta entre o direito público e o direito privado em que se desenvolvem estas figuras híbridas. Já ROUBIER, aliás, na sua “Théorie générale du droit”,23 assinalava que “por mais importante que possa ser a distinção entre o direito privado e o direito público, devemos, todavia, admitir que existem certos ramos do direito que permanecem fora dessa classificação”.

Mas o latim dos bárbaros já não era mais aquêle falado em Roma. O próprio fato da adaptação da técnica privatista ao direito público transformou o direito comercial, dando-se-lhe nova função, que os comercialistas modernos tentam conceituar.

Assim é que JEAN ESCARRA afirma dever ser definido o direito comercial tendo-se menos em vista o móbil do comerciante do que a organização da emprêsa. Tanto RIPERT como ESCARRA repudiam a teoria do ato de comércio inventada pela doutrina do século XIX para considerar o direito comercial como direito profissional,24 ou direito das emprêsas,25 ou ainda, na palavra de JOSEPH HAMEL, direito dos negócios.26

Em sentido análogo, manifesta-se o nosso VALDEMAR FERREIRA, ao tratar das sociedades anônimas. “Qualquer que seja o seu objeto”, escreve o eminente jurisconsulto paulista, “a sociedade anônima é mercantil e rege-se pelas leis e usos do comércio. Não é questão de objeto. É de forma”.27

Assim, notamos três fenômenos distintos, mas paralelos:

1) A publicização do direito privado apontada por todos os escritores modernos, desde JOSSERAND até SAVATIER e RIPERT.

2) A aplicação da técnica privatista ao direito público, demonstrada por HOUIN, VEDEL e RIVERO.

3) A transformação do direito comercial por influência da adaptação que sofreu quando da sua aplicação no campo do direito público, ou seja, o aproveitamento pelo direito privado das experiências realizadas no domínio do direito público.

2. Tipos de intervenção. As emprêsas públicas na França. Problemas criados.28

Na França, encontramos três tipos de intervenção estatal, nos quais o Estado procura se submeter às normas do direito comercial. São:

1) A sociedade de economia mista, quadro adotado para a organização da Societé Nationale des Chemins de Fer, da companhia Air France e de 30 sociedades criadas para o desenvolvimento da França de Além-mar.

2) As sociedades comerciais em que o Estado é o único acionista, que funcionam como sociedades anônimas sui generis e constituem verdadeiras emprêsas públicas. Tal é o caso, entre outros, de quatro bancos e de 35 companhias de seguros que foram nacionalizados e de nove emprêsas criadas na França de Além-mar de conformidade com a lei francesa de 30 de abril de 1946.

3) Os estabelecimentos públicos de caráter comercial e industrial constituídos sob a forma de sociedades e submetidos às leis e usos do comércio, como o Charbonnage de France, a Société Nationale des Entreprises de Presse e o Gaz et Electricité de France, assim como a Régie Renault.

Deixando de lado as sociedades de economia mista, cujo mecanismo já é largamente conhecido, poderíamos sondar os problemas surgidos com o aparecimento da emprêsa pública.

São as seguintes as características da emprêsa pública:

1) Possuem a qualidade de comerciantes.

2) São sujeitas à fiscalização do Tribunal de Contas.

3) Têm patrimônio autônomo.

4) Os litígios em que são partes pertencem à competência da jurisdição ordinária.

5) Os contratos firmados por estas emprêsas são submetidos ao direito privado.

6) Adotam a forma das sociedades comerciais comuns.

7) A propriedade, direção e administração das emprêsas públicas são exclusivamente governamentais.

8) Têm personalidade jurídica de direito privado.

9) As suas relações com o pessoal se regem, não pelas normas de direito administrativo, mas pelo direito trabalhista.

As emprêsas públicas adotaram a técnica das sociedades anônimas, mantendo os mesmos órgãos: presidente, diretor geral, conselho de administração e assembléia geral. Foram dotadas de personalidade moral para que lhe seja assegurada a autonomia financeira, limitando-se, assim, a responsabilidade estatal.

Mas, atrás das formas tradicionais que eram conservadas, criou-se uma realidade nova, com traços peculiares.

Rompendo com a tradição clássica, admitiu o direito francês a one man’s company, e, aliás, já AMIAUD notava que “a pessoa do acionista se tornou tão pouco importante que a existência de sociedades anônimas sem acionistas não é impensável”.29

Na sua conceituação moderna, a sociedade anônima apenas exige a presença de dois elementos: a emprêsa organizada e o patrimônio autônomo. Assim é que se tornou possível o enquadramento da emprêsa pública no campo das sociedades anônimas. Foram abandonados os requisitos subjetivos: affectio societatis e anianus lucrandi. Passou-se a atender exclusivamente aos elementos objetivos. Com esta transformação, tornaram-se necessárias numerosas derrogações ao direito comum. Assim, por exemplo, não tinham mais razão de ser, nas emprêsas públicas, as numerosas normas destinadas à proteção dos acionistas, já que no caso o acionista único – o Estado – se confunde com o administrador da sociedade.

Não obstante tenha estabelecido o artigo 33 da lei francesa de nacionalização, de 25 de abril de 1946, que as emprêsas públicas conservassem a condição de sociedades comerciais, elas têm, em numerosos pontos, um status especial. Vejamos, pois, alguns casos concretos em que se ressaltam estas peculiaridades das emprêsas públicas:

a) Por diversas ocasiões dá-se a intervenção ministerial. No caso de aumento de capital da emprêsa, deve ser ouvido o ministro da Fazenda. Em certos estabelecimentos públicos de caráter comercial ou industrial cabe ao ministro da Produção Nacional solucionar os conflitos que surgirem entre o presidente e o conselho administrativo da sociedade, assim acontecendo, verbi gratia, na Régie Renault.30

b) A sociedade é responsável em relação aos terceiros, e o seu ativo responde pelas dívidas por ela contraídas. Mas acontece freqüentemente nas emprêsas públicas que o ativo comporte bens inalienáveis pertencentes à Nação – como o gás, a eletricidade, o carvão, – e discute-se, neste caso, em que têrmos há de ser definida a responsabilidade da emprêsa pública, tendo sido levada a questão ao Conselho de Estado.

c) Enquanto as emprêsas públicas são submetidas à contabilidade comercial, uma, decisão da Côrte Francesa de Cassação obrigou os estabelecimentos públicos com caráter comercial ou industrial, que têm a forma de sociedade, a adotarem a contabilidade pública. A dificuldade consiste em delimitar os campos de aplicação, respectivamente, do direito comercial e do direito administrativo. Se, no domínio dos contratos e da contabilidade, a tendência atual é no sentido de abandonar os princípios de direito público, êstes continuam, todavia, a ser aplicados em matéria de concorrência pública e de seleção e admissão do pessoal.

A adoção da contabilidade pública faz perder aos estabelecimentos pertencentes ao Estado a necessária maleabilidade, a rapidez e a segurança nas suas transações, sendo estas as qualidades básicas e essenciais para as sociedades comerciais.

Discutiu-se muito a questão quando foi pedida a penhora dos bens da SNEP (Société Nationale des Entreprises de Presse), opondo-se a Côrte de Paris à execução dos bens do estabelecimento público, por constituírem bens públicos os seus pertences. Em sentido contrário decidiram, todavia, os tribunais de Lyon e da Aix.31

Mas o dilema não encontra solução fácil. Ou há fiscalização, e esta dificulta as operações comerciais que necessitam de iniciativa, decisões de momento e sigilo, ou não há fiscalização, e nada obsta a realização dessas transações, mas, por outro lado, a emprêsa não presta contas, e, no Brasil, sabemos o sentido exato desta expressão.

O que parece mais aconselhável é a supressão dos contrôles a priori e o estabelecimento de um sistema da fiscalização a posteriori.

d) No tocante à administração, sabemos que os presidentes e diretores são nomeados e demitidos por decreto. A assembléia geral perdeu a sua razão de ser. O diretor geral, ou administrador especial, viu aumentarem os seus poderes. Como na vida política, também na sociedade anônima assistimos ao fortalecimento do Executivo.32 Nos conselhos de administração, encontramos uma representação heterogênea, compreendendo técnicos e delegados do Estado, do pessoal e dos consumidores, havendo divergências de aspirações dos diversos grupos. Enquanto os representantes dos consumidores pugnam pela baixa das tarifas, os mandatários do pessoal reivindicam aumento dos salários e os funcionários hesitam entre a defesa dos lucros que a sociedade poderia realizar e a realização dos serviços pelo preço de custo. A tendência atual parece ser no sentido de constituir conselhos de administração apolíticos, formados preponderantemente por técnicos.

e) Um contrôle multiforme, abrangendo aspectos os mais diversos, pesa sôbre as emprêsas públicas entravando as suas atividades. São, em primeiro lugar, os delegados ministeriais que funcionam junto às emprêsas e que são denominados censores ou fiscais do Estado, gozando da prerrogativa do veto. Em seguida, a emprêsa está subordinada ao ministro da Fazenda, ao Parlamento e a certas comissões especiais para os fins de aumento de capital, empréstimos, tarifas, estatuto do pessoal, programas de trabalho, etc. Outrossim, a assembléia geral foi mantida no seu papel de fiscal, atribuindo-se a sua função nas emprêsas públicas a outros órgãos, como, verbi gratia, o Conselho Nacional dos Seguros, para as companhias especializadas neste ramo de atividade, e a Comissão de Contrôle Bancário, para os bancos. Ainda temos, enfim, os comissaires aux comptes, nomeados, ora pelo Executivo, ora pelo Judiciário.

Multiplicaram-se os contrôles externos que dificultam a realização de operações comerciais rápidas. As contas devem ser prestadas a diversos órgãos, como Comissão de Verificação de Contas das Emprêsas Públicas e as Comissões Parlamentares de Contrôle da Assembléia Nacional e do Conselho da República.33 O excesso de contrôle tem sido condenado unânimemente pela doutrina. LAGARDE diz que quiseram remediar a má qualidade do motor fortalecendo os freios.34 No mesmo sentido se manifesta HOUIN, assinalando que a fiscalização demasiada paralisa a ação das emprêsas públicas.35

f) No domínio da responsabilidade civil, sérias dúvidas não deixaram de surgir. No caso de ato culposo praticado pelo administrador nomeado por decreto, poderá a emprêsa acionar o Estado, obrigando-o a ressarcir o dano? Estamos aqui numa zona limítrofe entre o direito privado e o direito público, em que já parece ser inaplicável a teoria geral da responsabilidade civil, que é substituída por um sistema de medidas disciplinares análogas, embora menos rígidas, àquelas que encontramos no sistema soviético em caso de inadimplemento contratual de uma emprêsa estatal em relação a outra.

g) No tocante à competência dos tribunais comerciais, a jurisprudência se inclina a reconhecê-la nas causas em que são partes as emprêsas públicas.

h) Quanto à existência de fundo de comércio das emprêsas públicas, os julgados são divergentes e, por enquanto, é difícil chegar a uma conclusão nesta matéria.

i) A falência das emprêsas públicas é jurìdicamente possível, embora, de fato, seja sempre substituída por uma liquidação administrativa. O Estado é responsável, senão jurídica, ao menos moral e politicamente, pelos atos praticados pela emprêsa.36

Em resumo, as emprêsas públicas são comerciantes submetidos em princípio às normas de contabilidade comercial, ficando os contratos que firmam sob a égide do direito privado. A diversidade das leis que regem as emprêsas públicas cria muitas vêzes exigências peculiares para cada sociedade. A França aguarda ansiosamente uma lei orgânica das emprêsas públicas. É possível, todavia, que esta lei de padronização das emprêsas públicas nunca seja promulgada, porque a uniformização, no caso, representaria uma rigidez em oposição à própria razão de existência das sociedades nacionais, que se pretendem condicionar à função que exercem e querem libertar-se do jugo do direito público.37

3. A experiência colonial francesa. Um novo sentido da emprêsa pública.

Foi nas experiências tentadas na França de Além-mar que melhor se configuraram as funções, respectivamente, da sociedade de economia mista e da emprêsa pública no mundo moderno.

GASTON LEDUC, professor na Faculdade de Direito de Paris, em interessante artigo publicado nos “Archives de Philosophie du Droit”, de 1952, mostrou que a origem legislativa da emprêsa pública na França remonta à lei de 30 de abril de 1946 que constitui a carta fundamental do desenvolvimento planificado dos países de Além-mar da União Francesa.

A referida lei estabelecia no seu artigo 1º que o ministro da França de Além-mar ficava encarregado de apresentar um plano de desenvolvimento econômico e social a ser realizado no prazo de 10 anos e destinado a transformar os territórios de civilização atrasada em países modernos, em tudo que se refira ao equipamento público e privado, devendo o plano abranger a produção, a transformação, a circulação e a utilização das riquezas, visando atender às necessidades das comunidades indígenas, criar condições favoráveis ao progresso social e, na conformidade com o decidido no plano MONNET, concorrer para a execução dos programas de reconstituição e desenvolvimento da economia da União Francesa.

Para alcançar êste fim, o art. 2° da mesma lei permitiu a criação de emprêsas públicas (funcionando com os métodos adotados pelas sociedades comerciais e submetidas à fiscalização a posteriori da Inspetoria das Colônias e do Ministério da Fazenda) e de sociedades de economia mista com participação majoritária do Estado, sendo criado um fundo especial – o FIDES (Fundo de Investimentos para o Desenvolvimento Econômico e Social dos Territórios de Além-mar) – constituído por contribuições da metrópole e dos territórios interessados.

Original é, todavia, a nova concepção da emprêsa pública que surge na experiência colonial francesa. Se, na metrópole, a emprêsa pública vinha substituir a concessão ou a sociedade de economia mista na realização dos serviços públicos, já nos territórios associados de Além-mar surge tão-sòmente no caso de impossibilidade de ser criada uma sociedade de economia mista por carência completa de capitais particulares interessados. Nas colônias, a emprêsa pública é elemento subsidiário de incentivo à produção, caso não possa ser constituída uma sociedade de economia mista.

Foram criadas, até janeiro de 1952, nos quadros da lei de 1946, cêrca de 30 sociedades de economia mista e nove emprêsas públicas. As emprêsas públicas só se organizaram no caso de apatia completa dos capitais particulares.

“A sociedade de Estado (emprêsa pública)”, escreve LEDUC, “foi concebida como um meio de paliar a carência completa de investimentos privados. Quando esta sòmente é parcial, nada se opõe à adoção da fórmula da economia mista”.

“Se fôr total a abstenção de capitais particulares e as necessidades de valorização exigirem, todavia, certas realizações, delas devem encarregar-se as coletividades públicas (adotando o processo das emprêsas estatais)”.38

A diferença estabelecida no âmbito colonial entre a sociedade de economia mista e a emprêsa pública não é mais ontológica, não depende do fim que a sociedade vai realizar. Fica, apenas, subordinada à existência ou inexistência de capitais privados a serem investidos na região. Assim, uma sociedade imobiliária terá em Guadelupe forma de emprêsa pública, enquanto na ilha da Reunião será organizada como sociedade de economia mista. Pergunta, então, o Prof. LEDUC: Dever-se-á deduzir dessa divergência que os capitais particulares preferem o oceano Índico às Antilhas? Do mesmo modo, são emprêsas públicas a instituição criada para facilitar a imigração para a Guiana e o bureau de estudos para o desenvolvimento da produção agrícola dos territórios de além-mar, enquanto é sociedade de economia mista o Bureau central d’études pour les équipements d’outre-mer.

Em conclusão, vemos que:

1) A emprêsa pública deve executar os serviços públicos que exigem certa flexibilidade.

2) A sociedade de economia mista tem função de incentivo à produção.

3) Nos casos em que o Estado quiser contribuir para o desenvolvimento da produção e não puder contar com o auxílio de capitais particulares, por não ser rendoso o emprêgo do capital, recorrer-se-á às emprêsas públicas.

4. O ressurgimento da economia mista.

O recente desenvolvimento da economia mista na França não se limitou ao domínio colonial. Afastando o processo da economia mista nos anos de 1944-1946 em proveito das nacionalizações, reaparece hoje, seja na reorganização da marinha mercante, seja na exploração da televisão, seja, enfim, como forma de reintroduzir capitais particulares nas sociedades nacionalizadas.

O exemplo da companhia Air France é sintomático. Emprêsa mista com participação minoritária do Estado até 1944, tornou-se sociedade nacional em 1945, para voltar ao regime de economia mista, já agora com participação estatal majoritária, em 1948.

Vemos, pois, que o exemplo francês dêstes últimos anos não proscreve a economia mista, mas conserva-a, paralelamente com a emprêsa pública, dando, a cada uma, função diversa na vida econômica nacional.40

V

Ao lado das repartições públicas hieràrquicamente organizadas e integradas no sistema administrativo e das autarquias que representam uma forma de administração descentralizada, uma especialização de serviço por função ou ainda uma pessoa de direito público com capacidade de auto-administração, surgiram, desde 1930, nos Estados Unidos,41 as emprêsas públicas denominadas government corporations.42

A primeira sociedade em que o govêrno americano teve participação foi o Banco dos Estados Unidos. Posteriormente adquiriu, em 1904, a Panama Railroad Company.

Mas foi durante a primeira guerra mundial que surgiram diversas emprêsas criadas pelo Congresso, como a War Finance Corporation, a Emergency Fleet Corporation, a United States Grain Corporation, a United States Housing Corporation, o United States Sugar Equalization Board e a United States Spruce Production Corporation.

Para facilitar o crédito, foram criados 12 bancos pertencentes à União ou por ela controlados de acôrdo com o Federal Farm Loan Aet.

Em 1924, foi organizada a Inland Waterways Corporation, que tinha como administrador o secretário de Estado em exercício na pasta da Guerra.

Depois da crise de 1930, o New Deal veio dar papel de extrema importância às emprêsas públicas. Data dessa época a Reconstruction Finance Corporation.

Em 1936, existiam nos Estados Unidos cêrca de 90 emprêsas públicas.

Com a guerra de 1939-1945, mais de 20 novas emprêsas públicas foram criadas: a Metals Reserve Company, a Rubber Reserve Company, a Defense Plant Corporation, a War Damage Corporation, etc.

Existem também sociedades anônimas pertencentes aos Estados. É o caso do Port of New York Authority, pertencente aos Estados de New York e New Jersey. Também são states corporations as Universidades de Michigan, Minnesota e Idaho e a North Dakota Mill and Elevator Association.

Três razões militaram para a criação das emprêsas públicas nos Estados Unidos:

1) Facilitar o crédito nas épocas de crise, verbi gratia, Reconstruction Finance Corporation.

2) Liquidar problemas de emergência ligados à segurança nacional, verbi gratia, pesquisas sôbre a bomba atômica, uso pacífico da energia atômica.

3) Dever o Estado exercer certas atividades comerciais, que, pela sua extensão e pelo lucro remoto que hão de dar, não poderiam ser feitas por particulares, como seria o caso da Panama Railroad Company, da Inland Waterways Corporation e da Tennessee Valley Authority.

Distinguem-se as government corporation das mixed enterprises (companhias mistas) por não haver nas primeiras o concurso de capitais particulares. “A análise das emprêsas públicas não nos revela um tipo simples e uniforme de estrutura. Elas variam no método de constituição, nas suas relações com a estrutura administrativa central, no grau de autonomia, na fonte dos seus capitais e na sua organização interna. Não existe uma definição de emprêsa pública geralmente aceita”.43

A superioridade das emprêsas públicas sôbre os departamentos administrativos (repartições públicas) consiste na flexibilidade e na eficiência comercial das corporations. Os autores norte-americanos catalogam da seguinte maneira as: vantagens que a emprêsa pública apresenta:

1) Autonomia financeira.

2) Direito de obter e fazer empréstimos.

3) Liberdade de reger-se pelos seus, estatutos e de estabelecer normas próprias para regulamentar a situação dos seus, funcionários, as compras da sociedade, etc.

4) Possibilidade de ter um sistema próprio de contabilidade, de processar e ser processado, de transigir, etc.

5) Descentralização regional e autonomia local.

As emprêsas públicas tiveram nos Estados Unidos, até 1935, as chamadas três liberdades, que consistiam, respectivamente, em não prestar contas ao Bureau of the Budget e ao Congresso, na isenção das normas e processos do serviço civil (sistema de concurso e de promoção) e na isenção da regulamentação legal pública para compras e contratos (sistema da concorrência pública).

A doutrina, todavia, condenou as government corporations, quando não entrosadas num ministério, considerando que não havia coordenação entre as atividades da companhia estatal e a política geral do govêrno. A importância de um trabalho harmônico das diversas entidades estatais é assinalada pelos publicistas, norte-americanos. Não basta, dizem êles, que a nomeação dos diretores da emprêsa dependa do presidente da República. É preciso integrar a sociedade num ministério, ressalvando, todavia, a sua autonomia, nomeando, por exemplo, o secretário de Estado para o cargo de presidente da companhia. É um pouco o que fizemos no Brasil com a subordinação da Petrobrás ao Conselho Nacional do Petróleo.44

A tendência isolacionista das emprêsas públicas na América do Norte provocou uma profunda reação. Diversas leis, sendo a primeira de 1935 e a última de 1945, submeteram as contas das emprêsas estatais ao Bureau of the Budget. A seguir, as modificações do capital social ficaram sujeitas à aprovação do Congresso, e as normas do serviço civil passaram a ser aplicadas às emprêsas públicas, de acôrdo com o Ramspeck Act. Um plano de reorganização de 1939 subordinou tôdas as emprêsas públicas, salvo a Tennessee Valley Authority e a Federal Deposit Insurance Corporation, a secretarias de Estado. Enfim, com o Government Corporation Control Act de 1945, as emprêsas públicas perderam sua autonomia fiscal.

C. H. PRITCHETT, em artigo intitulado “O paradoxo das emprêsas públicas”, escreve que a lei de 1945 é o último passo na luta de 10 anos travada contra a autonomia das emprêsas públicas. Assim se completou o trabalho de eliminação dos traços característicos que fizeram das emprêsas públicas instrumentos úteis para os grandes empreendimentos econômicos. A fiscalização imposta significa que, para o bem ou para o mal, a experiência americana das emprêsas públicas autônomas está substancialmente finda.45

Devemos anotar, todavia, que, se verdadeira a afirmação de PRITCHETT, não representa matéria pacífica nos próprios Estados Unidos. O próprio LEONARD WHITE dela diverge ao dizer que, no mundo de amanhã, tanto a emprêsa pública como a sociedade de economia mista podem ser destinadas a ter um papel grandioso.46

Vemos, pois, que a companhia mista não exclui a emprêsa pública, como esta não impede a existência daquela.

As experiências francesas e americanas nos revelam, todavia, o aniquilamento progressivo da comercialização das emprêsas públicas e das sociedades de economia mista, que desaparecem sob o pêso da excessiva fiscalização estatal.

Já mostramos, aliás, a dificuldade inerente ao problema quando assinalamos que a livre iniciativa, a flexibilidade da emprêsa comercial, a rapidez das transações e a necessidade de sigilo não se coadunam com a fiscalização permanente dos poderes públicos e com a aplicação dos princípios da contabilidade pública e do serviço civil.

VI

1) A experiência do direito comparado nos revela que a economia mista e a emprêsa pública são processos fecundos de intervenção estatal. Necessário é, todavia, distinguir entre as funções de ambas, e a diferenciação há de ser feita distribuindo-se a cada uma sua verdadeira missão. O advento da emprêsa pública não implica o declínio da economia mista. Ambas podem existir simultâneamente, e, nos países subdesenvolvidos, em que faltam os capitais necessários para os grandes empreendimentos,47 representam técnicas cujo emprêgo é indispensável para o desenvolvimento nacional. Já se disse que a economia mista era um matrimônio sem amor que não chegava a ser um casamento de razão. O mesmo se poderia dizer da emprêsa pública em que se coordenaram normas tão diversas como as pertencentes ao direito público e ao direito privado. Mas, mesmo no casamento, o hábito cria vínculos novos, e a experiência demonstra, contra os argumentos abstratos dos lógicos, que os cônjuges acabam vivendo harmoniosamente, encarregando-se o tempo de criar a affectio conjugalis.

2) A tendência atual do direito administrativo é dominada pelos princípios de padronização excessiva. Já se falou na desautarquização das autarquias. Transformam-se as autarquias, as emprêsas públicas e as próprias sociedades de economia mista em simples repartições públicas, perdendo a sua iniciativa e o seu senso de responsabilidade própria sob o pêso esgotante dos múltiplos contrôles. Já vimos que, tanto na França como nos Estados Unidos, as emprêsas públicas desaparecem devido à excessiva fiscalização, integrando-se nos ministérios e de sociedade comercial só conservando o nome.

Só há direito público, dizia DUGUIT, quando há limitação dos poderes do Estado. SPIEGEL adaptou a frase ao direito administrativo, dizendo que o seu valor jurídico depende sempre das garantias que encontra para a sua realização. Da mesma maneira, quando estudamos os aspectos jurídicos da emprêsa pública ou da sociedade de economia mista, o problema essencial é o da limitação dos seus respectivos poderes, ou seja, do contrôle exercido pelo poder central sôbre a sociedade pertencente total ou parcialmente ao Estado.

É indispensável estabelecer um justo equilíbrio entre a flexibilidade comercial de que essas sociedades necessitam e a fiscalização, a prestação de contas exigida pela Nação, para que se saiba como estão sendo aplicados os fundos públicos. É preciso conservar a justa medida entre a autonomia da sociedade e os contrôles imperativos.

BIELSA, ao prefaciar a obra de HORACIO HEREDIA, “Contralor administrativo sobre los entes autárquicos”, mostrou a necessidade do contrôle, aplicando-se a sua frase não só às autarquias como também às emprêsas públicas e às sociedades de economia mista. “Desaparecem tôdas as vantagens da descentralização”, escreve o mestre platino, “com o uso excessivo e inconveniente dêsse discricionarismo a que são tão propensos os corpos dirigentes dessas entidades, ao se converterem estas em umas pequeñas republiquetas, com propensão a distribuir favores, a conceder altos vencimentos, a realizar atos de disposição financeira injustificados; em suma, a criar para si a sua própria lei. Pois bem, tudo isso não encontra senão um freio e um remédio: o dúplice contrôle da legalidade e da conveniência”.

A fiscalização é necessária e indispensável, mas pode ela coadunar-se com uma certa liberdade de iniciativa permitindo que seja mantida a flexibilidade da emprêsa.

A autonomia da sociedade de economia mista e da emprêsa pública pode ser resguardada desde que haja uma compreensão profunda e geral dos deveres cívicos. E talvez o problema venha a ser sobremaneira uma questão moral. Freqüentemente a verdadeira solução das discussões políticas e administrativas só pode ser encontrada no campo da moral. Necessário se torna uma renovação de nossa mentalidade, desenvolvendo-se o espírito público do nosso povo. Sòmente com essa reestruturação de base, poderemos manter o justo equilíbrio obrigatório para o desenvolvimento das emprêsas públicas e das sociedades de economia mista, que se tornarão, assim, grandes meios para a expansão da economia nacional.48

Aqui, mais uma vez, parece que a razão está com o poeta francês CHARLES PÉGUY, quando escrevia: “La révolution sera morale ou ne sera pas!”.

A transformação da técnica há de se apoiar numa reforma moral.

____________

Notas:

1 Escreve o Prof. SAN TIAGO DANTAS, ao esboçar, em artigo publicado no “Correio da Manhã”, os “Aspectos gerais da evolução do direito privado brasileiro nos últimos 50 anos”:

“É de ser assinalada ainda, como característica da cultura jurídica contemporânea, a expansão dos estudos de direito administrativo, que encontra antecedentes longínquos na grande obra do VISCONDE DE URUGUAI, mas que sucede a uma fase de desinteresse e mediocridade interrompida por um outro estudo de valor de repercussão limitada. Distinguem-se aí as obras de TEMÍSTOCLES CAVALCÂNTI, os estudos de SEABRA FAGUNDES, BILAC PINTO, CARLOS MEDEIROS DA SILVA e a “Rev. de Direito Administrativo”.

No mesmo sentido se manifesta o professor da Faculdade Católica de São Paulo, J. H. MEIRELES TEIXEIRA, no prefácio no trabalho de A. NOGUEIRA DE SÁ, “Do contrôle administrativo sôbre as autarquias”, São Paulo, 1952, Edições Leia, pág. 12,

2 In “REVISTA FORENSE”, vol. 102, página 417.

3 TEMÍSTOCLES BRANDÃO CAVALCÂNTI, “Tratado de Direito Administrativo”, 2ª ed., IV vol., Freitas Bastos, 1949 págs. 334-363.

4 O artigo de TRAJADO DE MIRANDA VALVERDE constitui como que um apêndice ao seu substancial livro “Sociedades por ações”.

5 Outra obra da época que se refere às companhias mistas, é o livro de ERIMÁ CARNEIRO. “As autarquias e as sociedades de economia mista no Estado Novo”, edição do D. I. P., Rio de Janeiro, 1941.

6 A conferência do Prof. BILAC PINTO também foi realizada no Instituto da Ordem dos Advogados de Minas Gerais, tendo sido publicada em diversos periódicos especializados como a “Rev. de Direito Administrativo” e a “REVISTA FORENSE”, vol. 196, e outros de divulgação, como o “Digesto Econômico”, nº 98, de janeiro de 1953.

7 Como indício sintomático do interêsse surgido em tôrno do problema como repercussão da conferência do deputado BILAC PINTO, podemos citar as teses apresentadas na III Semana de Estudos Jurídicos na Bahia pelo bacharelando AGNALDO MENDES BEZERRA por ARNOLD WALD, publicada na “Rev. do Serviço Público” de agôsto de 1953, e por GILDO ESPÍNOLA BARBOSA in “Angulos”, revista da Faculdade de Direito da Bahia, setembro de 1953.

8 Vide ARNOLD WALD, “As Sociedades de Economia Mista”, in “Rev. do Serviço Público” já citada.

9 “Diário do Congresso” de 6-5-1962. Haveria no caso transformação de uma autarquia em sociedade de economia mista. A respeito pronunciou Interessante conferência infelizmente inédita, o Prof. SAN TIAGO DANTAS. Outrossim, uma lei de janeiro de 1954 criou nova sociedade mista – a Companhia Nacional de Seguro Agrícola.

10 O Prof. THIERS MOREIRA, que ocupa a cátedra de direito administrativo da Faculdade Católica de Direito, nos referiu a constituição de uma sociedade de economia missa na Amazônia, em que eram acionistas a União, o Estado, os Municípios e particulares.

11 Vide o número dos “Archives de Philosophie du Droit” de 1952, dedicado a “La distinction du droit privé et du droit public et l’entreprise publique”, especialmente págs. 79-122.

12 BILAC PINTO, ob. cit.; PAUL REUTER, “La société anonyme au service des collectivités publiques”; no mesmo sentido, GASTON LAGARDE, “De la société anonyme à l’entreprise publique”, in “Etudes offertes à GEORGES RIPERT”, Paris, 1950, tomo II, págs. 296-318.

13 GASTON MORIN, “La Révolte du Droit contre le Code” – “La révision nécessaire des concepts juridiques (Contrat, responsabilite, propriété)”, Paris, Recueil Sirey, 1945, págs. 2-6. No mesmo sentido, IHERING, “Esprit du droit romain”, tomo IV, pág. 235; TARDE, “Les transformations du droit”, 2ª ed., pág. 123, e HENRI BERGSON, “L’évolution créatrice”, 77ª ed., Paris, Presses Universitaires de France, 1948, página 139.

14 RENÉ DAVID, “Traité Elémentaire de Droit Civil Comparé, Paris, Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, 1950, págs, 325-337.

15 Artigo citado, in “Digesto Econômico”, janeiro de 1953, pág. 38.

16 Assim se manifesta EMILE JAMES, em seu livro “Les formes d’entreprises”, dizendo que a economia mista não é uma forma estatista, “aplicando-se de preferência às emprêsas anteriormente vivendo sob o regime de subvenção”. Vide a respeito TEMÍSTOCLES BRANDÃO CAVALCÂNTI, ob. cit., IV vol. da 2ª ed., 1949, pág. 329, nota 8.

17 Sôbre a East India Company e as suas funções comerciais e políticas, pode ser consultado o livro de WOLFANG HOFFMANN HARNISCH, “Lord Clive, o conquistador da Índia”, edição da Livraria do Globo, Pôrto Alegre, 1942.

18 BERNARD CHENOT, “Organisation économique de l’Etat”, Paris, Dalloz, 1951, págs. 295-297.

19 No mesmo sentido, GASTON LEDUC, no artigo “Les sociétés d’Etat, instruments de la mise en valeur de l’outre-mer”, in “Archives de Philosophie du Droit”, de 1952, já citado, pág. 109.

20 GEORGES VEDEL, “Manuel élémentaire de droit constitutionnel”, Paris, Recueil Sirey, 1949.

21 Número de 1952 dos “Archives”, já citado, pág. 79.

22 O projeto governamental que visava à criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico pretendeu que os empregados desta entidade tivessem suas situações regidas pela legislação trabalhista.

23 PAUL ROUBIER, “Théorie générale du droit”, Paris, 1946.

24 GEORGES RIPERT, “Traité élémentaire de droit commercial”, 2ª ed., Paris, Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, 1951, página 3, in fine.

25 JEAN ESCARRA, “Cours de droit commercial”, 1952, ns. 41 e 91.

26 JOSEPH HAMEL, “Droit civil et droit commercial en 1950”, in “Le droit privé français au milieu du XXème. siècle, études offertes à GEORGE RIPERT”, Paris, Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, 1950, 2º vol., págs. 261-271. Escreve o professor da Faculdade de Direito de Paris: “Et c’est ainsi que je vois l’avenir: un Droit commercial devenu Droit des affaires, qui accentuera sou caractère objectif en devenant le Droit de tous ceux qui se trouvent mélés à la vie des affaires, – un Droit civil qui restera impregné de personnalité humaine et qui regnera sur tous les domaines – et ils sont immenses – qui se situent em dehors de la production économique” (HAMEL, loc. cit., pág. 271, in fine).

27 VALDEMAR MARTINS FERREIRA, “Instituições de direito comercial”, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, 3ª ed., 5º vol., pág. 83, in fine.

28 Podem ser consultados a respeito os artigos do número de 1952 dos “Archives de Philosophie du Droit”, e o de LAGARDE contido nos “Estudos oferecidos a GEORGE RIPERT”, já citados, pág. 296, assim como CHENOT, ob. cit., vol. XIII.

29 A. AMIAUD, “L’évolution du droit des sociétés par action”, in “Le droit privé français au milieu du XXème. siècle, études offerts à GEORGES RIPERT”, Paris, 1950, pág. 295.

30 Decreto francês de 7-3-1945.

31 Côrte de Cassação, 9-7-1951, JCP, 1951-II-6.437, Gaz. Pal. 23 oct. 1951. No mesmo sentido: Paris. 22-12-1948, S.1949.2.89, nota DRAGO, JCP 1949.II.4.729, nota LAVAU e D.1949. 235, nota BLAEVOET. Em sentido contrário: Aix, 30-11-1949, D.1950.69, JCP 1950.11.5.245 bis, nota LAVAU e LYON, 13-7-1948, JCP, 1950.11.5.290.

32 No tocante ao direito público BIGNE DE VILLENEUVE, “La fin du principe de séparation des pouvoirs” Paris. Sirey, 1934, passim; MIRKINE GUETZEVITCH, “Modernas tendencias del derecho constitucional”, Madri, Reus, 1934, páginas 187-213; DUVERGER, “Les Constitutions de la France”, Paris, Presses Universitaires, 1950, pág. 95, e “Les regimes politiques”, Paris, Presses Universitaires, 1948, pág. 71. Quanto às sociedades anônimas, vide RIPERT, “Les aspects juridiques du capitalisme”, 1946, págs. 48 a 123; AMIAUD, artigo citado, pág. 294, e HOUIN, ob. cit., pág. 82.

33 Art. 56 da lei francesa de 6-1-1948 e artigo 70 da lei de 21-3-1947, modificado pela lei de 5-7-1947.

34 LAGARDE, ob. cit., pág. 313.

35 HOUIN, ob. cit., pág. 96.

36 LAGARDE, pág. 307 do artigo citado, e HOUIN, ob. cit., págs. 105-106.

37 No mesmo sentido, vide HERBERT EMMERICH, Government corporations and independent supervisory agencies”, in “President’s Committée on administrative management”, Washington, 1937, págs. 299 e segs., e o comentário de TEMÍSTOCLES BRANDÃO CAVALCÂNTI, ob. cit., tomo IV, 2ª ed., 1949, pág. 181.

38 LEDUC, “Les sociétés d’Etat, instruments de la mise eu valeur de l’outre-mer”, in “Archives de Philosophie du Droit”, já citado, pág. 109.

39 CHENOT, ob. cit., págs. 290-291 e 412-416, e LAGARDE, artigo citado, pág. 300.

40 A conclusão da doutrina francesa se resume na seguinte idéia: a sociedade anônima, longe de ser uma estrutura, não passa de uma máscara que esconde a realidade representada pela emprêsa pública ou pela sociedade de economia mista. Esquecendo a forma da sociedade comercial, fundamentada no animus lucrandi, o jurista contemporâneo deverá encontrar um novo estatuto para a emprêsa pública, inspirando-se na idéia da descentralização.

É o que escreve GASTON LAGARDE, professor na Faculdade de Direito de Paris: “Si on no se laisse pas hypnotiser par les mots “gestion commerciale”, un statut satisfaisant des entreprises publiques doit être trouvé assez vite, en partant de l’idée de déconcentration. La société anonyme peut leur servir de masque, non d’armature” (artigo cit., pág. 318).

O mesmo pensamento é lembrado por R. HOUIN: “(L’entreprise publique) rappelle, ce qu’on avait un peut trop tendance à oublier, que la société anonyme n’est pas un cadre polyvalent, mais demeure liée à la recherche en commun dos bénéfices. Elle montre qu’il peut étre dangereux d’utiliser ce cadre pour créer des sociétés sans actionnaires et des patrimoines d’affectation ou pour faire participer à la gestion des intéréts concurrents” (art. cit., pág. 107).

A tendência atual é, pois, no sentido de um divórcio sempre maior entre a emprêsa pública e a sociedade anônima, passando a emprêsa estatal a se integrar no sistema administrativo, aproximando-se, na sua própria estrutura, das autarquias.

41 Vide a respeito: LEONARD D. WHITE, “Introduction to the study of public administration”, 3ª edition, 1951, págs. 119-127; OGG & RAY, “Introduction to American Government”, 9th edition, New York. 1948, págs. 471-472, 608-610, 665-668 e 707-709; DAVID LILIENTHAL & ROBERT MARQUIS, “The conduct of business enterprises by the federal government”, in “Harvard Law Review”, fevereiro de 1941, pág. 550.

42 Pouco se conhece no mundo anglo-saxão a sociedade de economia mista. Na Inglaterra, o Overseas Ressources Development Act, de 1947, criou duas emprêsas públicas: a Overseas Food Corporation e a Colonial Development Corporation.

43 LEONARD WHITE, ob. cit., pág. 119.

44 Escreve LEONARD WHITE: “The view that government corporations have so distinct and separate a function that coordination of policy is: irrelevant will hardly bear examination. To depend upon personal relations with the president is inadequate especially as the number of corporations increases… To place each of these corporations within one of the major departments of government, clearing on major policy with the secretary of the department while retaining a substancial degree of operating freedom, does create an organic relationship which ensures harmony of general program and responsiveness to the policy of the party in the power. Essential coordination of policy is thus guaranteed by the type of relationship exemplified in the Inland Waterways Corporation” (ob. e loc. cits.).

45 PRITCHETT, in “American Political Science Review”, 1946, pág. 509.

46 “Government corporations and mixed enterprises may be destined to play a significant role in the changing world of the future” (L. WHITE, ob. cit., pág. 127).

47 Pode ser consultado a respeito o interessante artigo de ROBERTO PINTO DE SOUSA in “Digesto Económico”, nº 98, de janeiro de 1953, págs. 56-57.

48 No mesmo sentido o Prof. J. H. MEIRELES TEIXEIRA, in Prefácio da obra de A. NOGUEIRA DE SÁ, “Do contrôle administrativo sôbre as autarquias”, São Paulo, 1952, pág. 20.

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