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Estruturação ASG (Ambiental, Social e Governança) de Empresas

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Estruturação ASG (Ambiental, Social e Governança) de Empresas

Gladston Mamede
Gladston Mamede

25/01/2024

Diante da publicação de Estruturação Jurídica de Empresas, diversas perguntas surgiram. Uma delas: 

– É possível estruturar uma empresa com viés ASG (ambiental, social e de boa governança)? 

– Só é! – como se diz por aí.

A dúvida é relevante. Afinal de contas, esse é um dos assuntos do momento, podendo ser compreendido como um modismo ou, quiçá, como uma fase incontornável da evolução econômica da humanidade, principalmente no que diz respeito à gestão empresarial e os impactos das atividades produtivas e negociais. Trata-se de uma discussão mundializada, passando por temas como insegurança climática, poluição, proteção à biodiversidade, uso de energias renováveis de matriz limpa, atenção à diversidade na gestão de recursos, incluindo liderança empresarial etc. Uma discussão que não está restrita aos atores de mercado, mas que envolve o Aparelho de Estado e, de resto, já se faz ecoar forte na sociedade, orientando o consumo. Isso para não falar em capital e financiamento.

Como estruturar uma empresa ASG

– Mas há como estruturar uma empresa ASG? – insiste o interlocutor.

A tônica de Estruturação Jurídica de Empresas é exatamente essa: a distinção corporativa como alternativa e, mais do que isso, como mister, como excelência da prestação de serviços de advocacia. A compreensão dinâmica do Direito Societário ali proposta, demonstrada e ensinada aponta justo na vantagem de se oferecer a um mercado (o brasileiro) a possibilidade de se autorregulamentar (de enunciar as normas que se lhe aplicam, recusando o generalismo da lei e a interpretação do julgador em face das lacunas). Isso pode ser feito no ato constitutivo (plataforma normativa primária) ou nos regramentos acessórios (secundários) e laterais (terciários), como ali explicamos. Consequentemente, a resposta positiva se impõe: há um amplo espaço de manobra para se dar contornos específicos e diversos para corporações. O societarismo é um movimento consolidado em países avançados e ainda engatinhando entre nós.

Por que estruturar uma corporação ASG?

– Mas por que estruturar uma corporação ASG? Para quê?

Antes de mais nada, por convicção. Há sim muitos atores de mercado que possuem convicções sobre a necessidade de evolução para um capitalismo responsável (usam-se outras expressões similares: capitalismo sustentável, capitalismo consciente, ou, para quem prefere idiomas alienígenas, stakeholder capitalism, capitalisme des parties prenantes). Há um número crescente de empreendedores que pautam sua atuação por princípios que se alinham com os desafios da chamada agenda internacional, ou seja, que se esforçam por estabelecer atividades negociais responsáveis, sustentáveis, cuidadosas com seus impactos de ordem diversa. E a multiplicação de problemas concretos, como eventos climáticos adversos (para não dizer catástrofes), ampliação dos efeitos nefastos de lixões, erosões, desertificações, sedimentações etc. 

Outros, contudo, podem estudar a adesão à tendência por interesses diversos, nomeadamente em face da sinalização de que há vantagens associadas ao movimento de revisão do capitalismo, designadamente oportunidades ligadas a financiamento e capitalização de atividades produtivas. A ninguém passa desapercebido as potencialidades do mercado brasileiro para engajar-se numa pauta ambiental, social; bom governo societário não é demanda exclusiva nossa, nem preferência: é padrão de qualidade que diz respeito a todos mundo afora. Mas nossas condições naturais e sociais trazem para o foco empresas que se mostram efetivamente atentas para os desafios e as exigências do meio-ambiente e do meio-social em que estão inseridas ou mesmo d’alhures. É notório, por exemplo, que a emissão dos chamados títulos verdes, títulos ASG (ou ESG, preferindo a sigla remetendo a vocábulos do inglês), títulos sociais, já alcança dezenas de bilhões de reais, ao passo que, mui provavelmente, o interesse global nesse tipo de aporte financeiro (investimento, financiamento, garantia etc) gire pela casa de US$ 1 trilhão. E o agravamento de eventos climáticos adversos pode ampliar ambos os volumes (nacional e mundial).

Ecologia de fachada X empreendedorismo sustentável

Entretanto, não basta gritar “sou ecológico!” para merecer a atenção de tais fundos, instituições públicas e privadas, governos etc. Não é uma simples questão de marketing, de slogan, de decoração e/ou paisagismo de sedes ou filiais (embora tais iniciativas possam produzir efeitos sobre consumidores e seus impulsos). Não basta sequer empenho e engajamento, se não é possível demonstrá-lo, atestá-lo, prová-lo. Em suma – e assumido novamente o ônus da reiteração –, é indispensável estruturar a empresa para patentear seu ingresso nesse universo específico do mercado. Noutras palavras, é preciso tratar-se de opção e realização demonstráveis, o que recupera a importância da assessoria advocatícia, bem como de outros assessores profissionais, como administradores de empresas, engenheiros (de produção, ambientais), profissionais de logística, contadores etc. Não se tire daí a conclusão de que é complexo e caro; mas, sim, é preciso ser bem feito (o que, sejamos sinceros, é afirmação do óbvio, apesar da tendência generalizada ao improviso, o jeitinho, o fazer de qualquer modo).

Melhor será quando o empreendedorismo sustentável e o empreendedorismo cidadão compuserem o DNA da sociedade, preferencialmente com raízes na plataforma normativa primária (atos constitutivos), podendo passar por plataformas acessórios (a exemplo de compromissos e princípios que orientem o exercício do poder de voto pelo bloco de controle), devendo chegar a uma ou mais plataformas normativas laterais. Nesse sentido, registram-se casos de seções específicas no Código de Ética e Conduta, Comitês ASG e seus regimentos internos, Código de Sustentabilidade, entre outros rótulos. Obviamente, situações mais complexas, como comitês, para organizações maiores; mas nada impede haver sistemas simplificados, mas reais e eficazes, em microempresas e empresas de pequeno porte; mesmo um MEI – microempreendedor individual pode ter plataformas normativas, rotinas e sistemas de trabalho, que lhe atestem o compromisso e a atuação ASG. Precisamos aprender a importância da forma, do livro, do registro, do relatório, como exemplo fácil. E o advogado é – e deve ser – um vetor pedagógico dessa transformação.

Como afirmamos em Estruturação Jurídica de Empresas, é preciso atentar para a importância da construção normativa da corporação; o desenho escritural, feito em ato constitutivo, pactos parassociais e regramentos diversos, permitindo uma arquitetura mais completa, uma autorregulamentação mais detalhada, uma conformação (dar forma) mais específica, mesmo para que se definam alternativas ao comum societário. Aliás, tais plataformas servem justo para isso: para dar identidade, para sair do comum, do ordinário: a vala geral das disposições legais que são empregadas quando os atores privados renunciam ao direito de construir os cânones próprios de cada ente e/ou situação. A ideia da estruturação completa, vale dizer, mais detalhadas, é oferecer o máximo de definições peculiares, criando uma organização com características ímpares. Assumindo o risco de ser repetitivo: a linha central deste livro e sua teoria é chamar atenção para o fato de que, sob uma perspectiva dinâmica do Direito Societário, é possível elevar o nível de qualidade empresarial atendendo às necessidades que são singulares em cada sociedade. Não é reiterar estruturas, mas atribuir distinções que permitam romper desafios pontuais ou gerais. É o profissional do Direito, é o advogado, quem cumpre tal função, a merecer visão de longo prazo, capacidade de raciocínio estratégico, atenção a problemas e soluções para, assim, apontar caminhos, oportunidades.

Para o ponto agora focado, deve-se atentar, antes de mais nada, para o fato de que se está longe do obrigatório. Falamos de uma possibilidade, de uma opção. Como se não bastasse, chamamos atenção para o fato de tratar-se de ambiente já calejado com falsas adesões, a demandar um enraizamento corporativo demonstrável, seja por encontrar reflexo nas previsões (dever-ser) anotadas nas plataformas normativas, seja por relatórios e documentação que demonstrem o esforço em alcançar tais padrões e, mais do que isso, as conquistas já efetivadas. E, tudo isso, sob uma perspectiva jurídica: isso também é estruturação jurídica, como demonstramos. É esse o novo horizonte, a nova demanda; são essas as habilidades que agora são requeridas e que justificam a contratação de advogados. Parece muito? Já se registram no mercado financiamentos com juros fixados em certo patamar e a previsão de bônus (reduções de juros) se forem alcançadas metas como redução de emissão de carbono (e/ou emissão de outros poluentes), redução do consumo de energia, contratação de lideranças femininas ou afrodescendentes, entre outros critérios ASG. É preciso assimilar tais referências para oferecer a tecnologia jurídica correspondente para as empresas: uma tecnologia que transforma a administração societária, que a torna compatível com os avanços do mercado.

Melhor será quando, à gestão ambiental e social, entre outras, se atribuir uma diretoria em apartado, ou uma chefia, mas isso é próprio de corporações maiores, a comportar organogramas mais complexos – e inchados – de gerência. Mas ainda que se tenha um só administrador societário, é possível apartar a gestão ambiental e/ou social, entre outras, o que se faz não por meio de pessoas diversas, mas diferenciando-se os atos da mesma pessoa: o administrador e/ou gerente. Nisso está uma aplicação direta da linha geral deste livro: o que é uma empresa, sob o foco do mercado, é uma série de atos jurídicos, sob o enfoque do Direito. E a definição de normas (dever-ser) por meios das quais se faça a arquitetura da corporação, da plataforma normativa primária às terciárias, é um meio de destacar a gestão ambiental, social e de boa governança. Vamos a um exemplo: o contrato social de uma sociedade limitada, uma microempresa, uma olaria que produza tijolos artesanais:

“O administrador societário  está obrigado a pautar seus atos para que a empresa atue de forma ambientalmente sustentável, socialmente responsável e respeitando os melhores princípios de governança corporativa.

Parágrafo único – Semestralmente , o administrador societário apresentará à reunião de sócios, relatório sobre a gestão ASG da empresa, acompanhado dos respectivos documentos comprovantes, se existentes. A ata da reunião, o relatório e os respectivos documentos ficarão arquivados na sede da sociedade.”

Veja que tal norma, colocada no ato constitutivo, comporá o que chamamos metaforicamente de o DNA da corporação. E, como o ato constitutivo é público, haverá ciência ficta de tal característica da arquitetura societária. Ademais, o mecanismo disposto no parágrafo atua como fator de comprovação, permitindo a comprovação em face de fundos, instituições públicas e privadas, associações; por exemplo, para ter acesso a determinadas linhas de crédito especiais. Mas é possível replicar e ampliar a autorregulamentação em plataformas normativas acessórias e laterais e, sim, isso é um trabalho promissor para a advocacia, hoje restrito a grandes corporações. Há todo um mercado por atender, o que explica mesmo o avanço dos chamados escritórios verdes, tema sobre o qual escreveremos, publicando neste blog. Por ora, importa observar que a capacidade de trabalhar com a estruturação jurídica de empresas, inclusive para lhes dar um perfil ASG, é agregar valor à advocacia.

Não há Direito e advocacia apenas nos fóruns e nos tribunais. Não há Direito e advocacia apenas nos processos, nas petições e recursos, em audiências. O advogado brasileiro tem plenas condições de avançar para  um exercício profissional diverso, convertendo o conhecimento, que até aqui usou para argumentar (acionar ou contestar), em tecnologia que permite indicar caminhos seguros, alternativas mais eficazes, substituindo litígio por planejamento e estruturação. E isso já é realidade, há muito, nos mercados mais desenvolvidos. O contencioso ainda terá uma participação importante no trabalho das bancas, mas em proporções cada vez menores. Procura-se por advogados que possam auxiliar corporações a atingir sua melhor conformação jurídica, que as adequem aos ambientes regulatórios atuais e às demandas contemporâneas do mercado. Não há boa empresa sem estruturação jurídica de qualidade. O mercado está aprendendo isso.

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