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CLÁSSICOS FORENSE
DIREITO COMPARADO
PROCESSO PENAL
REVISTA FORENSE
Tribunais de polícia para o Brasil?
Revista Forense
21/08/2024
A justiça penal brasileira vem passando, há vários anos, por série crise. Uma das causas dessa crise reside na forma antiquada de julgamento dos crimes. Adotamos um processo formalista e vagaroso, que prolonga as demoras desesperantes para os réus, e agrava o congestionamento temível do foro criminal. O vigente Cód. de Proc. Penal, embora elaborado em 1940, época em que o movimento da justiça penal já apresentava dificuldades de escoamento, preferiu conservar, com modificações secundárias, o regime anterior. Não quis perfilhar sistema inglês e norte-americano do, Tribunais de Polícia, que é muito rápido em dar vazão à caudal dos processos criminais.
Hoje, com as crescentes dificuldades do fôro criminal brasileiro, voltam a baila os Tribunais de Polícia (policecourts), também denominados magistrate’scourts e ainda pettysessionalcourts, que são, como dizem os juristas inglêses, côrtes de jurisdição sumária.
Iremos examinar ràpidamente, no presente artigo, como funcionam tais tribunais. A seguir, veremos quais os resultados obtidos, e o que de útil podem êles sugerir-nos para a solução de nossa crise penal.
Comecemos pela Inglaterra. A justiça penal, neste país, se realiza pelo clássico júri para os mais graves dentre os crimes, e pelos Tribunais de Polícia e CountryCourts para os crimes menos sérios e para as contravenções.
Alguns dados estatísticos ajudar-nos-ão a fazer idéia do mecanismo atual da justiça penal inglêsa. Em 1934, passaram pelos vários tribunais inglêses, incluindo-se o júri, 788.000 acusados. Dêsse total, apenas 5% foram absolvidos. Os outros, ou sejam 657.000 pessoas, foram declarados culpados. Dêsse conjunto de infratores, cêrca de 65.000 cometeram indictableoffenses, isto é, crimes mais graves, incluindo-se os homicídios, e que exigem um processo mais formalista. São tais crimes assim chamados porque poderá o respectivo processo iniciar-se perante um júri de acusação (grandjury), cuja função é apenas, decidir se o acusado deve ou não ser julgado pelo júri comum, também chamado pettyjury, composto de 12 membros. Ao decidir se o acusado deve ser julgado, o grandjury pronuncia uma acusação ou indictment, e entrega o réu ao júri comum.
Voltemos às estatísticas. De 657.000 réus, 65.000 cometeram indictableoffenses, e estariam, pelo que acaba de ser explicado, sujeitos ao julgamento pelo júri.
Os restantes culpados – 592.000 praticaram non–indictableoffenses, ou seja, crimes menos graves.
Todavia, dos 65.000 autores de indictableoffenses, a maioria não foi a júri. Isto poderia constituir uma surpresa apenas para alguém não familiarizado com a evolução moderna da justiça inglêsa. Com efeito, nada menos de 58.000 réus de indictableoffenses foram condenados por simples Tribunais de Polícia. Isto significa que apenas 7.000, dos 65.000 réus desta categoria, foram julgados e condenados pelo júri, ao contrário do que se dava antigamente.
Por aí se verifica o declínio da jurisdição do, júri no próprio país de origem, aliás no interêsse do melhor funcionamento da justiça penal.
Quanto aos 592.000 réus de crimes menos graves (nos–indictableoffenses), referidos há pouco, foram todos êles julgados, sumàriamente, por Tribunais de Polícia. Neste conjunto, as infrações de trânsito forneceram 334.000 casos; os processos por embriaguez subiram a 15.000; as agressões se computaram em 20.000 e as infrações a regulamentos, em 40.000.
Deve acrescentar-se que no caso de qualquer delito, cujo processo se inicia num Tribunal de Polícia, ser punível com mais de três meses de prisão, o acusado poderá optar pelo júri. Mas, na prática, isso quase nunca se dá, pois os súditos de Sua Majestade Britânica geralmente confiam nos seus excelentes Tribunais de Policia.
Como expressivo resultado, temos que, em 1952, devido à evolução da justiça penal inglêsa, nada menos de 99% de todos os casos criminais da Inglaterra e do País de Gales foram decididos em Tribunais de Polícia. Tal é a informação oficial contida no livro “Britain, an Official Handbook”, de 1954, à pág. 65.
O que são tribunais de polícia?
Mas, afinal de contas, o que são êstes Tribunais de Polícia, que surgiram em 1791? O seu nome não deve iludir-nos. Desde o seu primeiro vagido, êles eram, de fato; Tribunais de Justiça. Os acusados aí gozam de garantias legais, e são julgados por juízes ou magistrados, com recurso para instância superior. Os seus julgadores pertencem ao Poder Judiciário, e são independentes do executivo.
Se assim é, por que surgiu tal denominação, com a circunstância agravante de existireis expressões mais adequadas para êles – magistrate’scourts, pettysessionalcourts?
Explica-se tal denominação pelo fato de a Polícia funcionar, em tais tribunais, em contato mais direto com a justiça do que no sistema processual do Tribunal do Júri. Essas funções da Polícia, que impressionaram o povo freqüentador, se manifestam de várias formas. De um lado, o agente policial serve como testemunha de acusação; de outro, êle instrui o processo em tais Côrtes. Isso explica, mas não justifica tal nome, filho de uma liberdade de linguagem análoga à que deu nascimento à denominação guaraná–champanhe; bebida essa que da champanhe só tem a côr (e ainda assim… ) e a gaseificação.
Vejamos alguns casos concretos dessa união policial. Não há muito, dois policiais do interior da Inglaterra prenderam um grupo de cinco gatunos. O processo foi levado a um Tribunal de Surrey. Os dois policiais que, haviam efetuado as prisões cuidaram da acusação; enquanto uma equipe de criminalistas experimentados funcionaram na defesa. Os policiais, que tinham esquadrinhado códigos em horas de folga e dedicado suas noites ao preparo da causa, sustentaram com habilidade a acusação. Nem uma só vez ultrapassaram êles os limites da conveniência judiciária. E afinal ganharam a questão.
Outro caso interessante. Anos atrás, um figurão político foi prêso (prêso, notem beim) por um jovem guarda-civil inglês (guarda-civil, embora inglês), sob a acusação de prática contra a moral. Imediatamente se fêz sentir a pressão contra o policial, para que esquecesse aquilo. Indignado êle compareceu ao Tribunal de Polícia e acusou o político, que foi declarado culpado e multado em cinco libras. Um ano depois, o policial foi promovido a sargento. Se aquela prisão se efetuasse em certo país conhecido dos leitores, o guarda pegaria cadeia ou iria para a rua…
Como funcionam os Tribunais de Polícia? As suas audiências são destituídas de formalidades, e depois de ouvidas as partes e suas testemunhas, os juízes proferem as suas decisões. As penas aplicadas são ou multas ou prisão até um máximo que raramente excede de seis meses.
Vários anos atrás, um jornalista italiano, em Londres, tendo visto processar e julgar em menos de duas horas um operário que grosseiramente injuriara o seu companheiro, escreveu, atônito, para o seu jornal, pondo em contraste o que acabava de presenciar e o que estava habituado a ver em sua pátria, onde o ofendido, de acôrdo com os precedentes de todos os dias, teria por certo preferido responder ao insulto com uma facada; porquanto a Justiça nunca lhe daria a reparação a que êle tinha direito. Se fôsse só na Itália que isso acontece…
Demos um relance de olhos à justiça penal norte-americana, que difere da inglêsa em muitos pontos. Em primeiro lugar, os vários Estados da União Americana são autônomos, e cada um tem o seu direito penal. Por exemplo, a sedução de menores só é crime em 35 dos seus 48 Estados. Além disso, as penas para êsse crime variam conforme os Estados. Em alguns; prisão de três meses a 10 anos, com ou sem multa; em outros, só multa; que varia de 200 a 1.000 dólares.
A pronúncia por um grandjury ou júri de acusação é ainda uma formalidade obrigatória em muitas jurisdições americanas, quando se trata de crimes capitais e de muitos outros crimes graves. O julgamento pelo júri comum ou pettyjury é usualmente uma garantia constitucional, exceto quando se trata de crimes menos graves, ou minoroffense. Não devemos, porém, iludir-nos com palavras. Com efeito, os Tribunais de Polícia norte-americanos julgam muitos crimes verdadeiramente graves. Assim é que a lei do Estado de Michigan (ao Norte, na fronteira canadense) condenava as prostitutas a um máximo de três anos de prisão, e apesar da gravidade da pena, tal crime estava sob a jurisdição dos Tribunais de Polícia, não só neste, como em muitos outros Estados. Na verdade, em nada menos de 46 entre as 48 unidades federativas de Tio Sam, a prostituição é considerada como grave crime ou delito (felony), e apesar disso é julgada em Tribunais de Polícia, como acontece no Estado de New York.
O homossexualismo ou sodomia e um grave, um gravíssimo crime, em quase todos os Estados da União, punível com um a 20 anos de prisão. Não obstante, são Tribunais de Polícia que o julgam. A respeito, é digna de transcrição esta deliciosa passagem de dois modernos autores americanos, M. ERNST e DAVID LOTH, que se lê no livro “American Sexual Behavior and the Kinsey Report”, de 1948:
“Tornou-se cada vez mais patente que os juízes dos Tribunais de Polícia” (policecourts), ficando geralmente escandalizados com os delitos de homossexualismo, inclinam-se a dizer: “Gostaria (se pudesse) de trancafiar esta maldita criatura para o resto da vida”. Na verdade, o juiz de primeira instância tende a condenar o réu no máximo da pena prevista pela lei. Mas, ao recorrer o réu para o tribunal superior” verificamos que os ministros ou desembargadores provàvelmente dirão: “Não poderíamos encaminhar êste pobre diabo a um psiquiatra?” (pág. 119).
E segundo informa o professor universitário americano WARREN STEARNS, os graves casos de violência carnal e estupro contra menores de 16 anos são da jurisdição dos Tribunais de Polícia “Sexology”, julho de 1947, pág. 743;
II – Direito comparado
Verifica-se que 99% dos casos criminais na Inglaterra, e a maioria dêles nos Estados Unidos, são confiados ao processo sumário dos impròpriamente chamados Tribunais de Polícia ou policecourts. E também se observa que muitos dêsses crimes são realmente graves sedução de menores; estupro, prostituição, etc.
Entre as penas aplicadas por seus juízes, a multa ultrapassa, sem comparação, tôdas as outras formas de punição. A prisão é muito menos usada do que ela. Todos êstes característicos dos Tribunais de Polícia também repontam no Canadá, hoje pràticamente independente da Inglaterra.
É interessante mostrar como a lei é aplicada pelas policecourts em todos os recantos do território daqueles países, quer se trate de crimes ou de simples; contravenções. Tomemos, por exemplo, a Canadá. Nas frígidas planícies do Norte, com escassíssima população permanente, muitos caçadores e pescadores porfiam em desrespeitar as leis protetoras da fauna. Certa feita, na Província de Saskatchevan, vários pescadores estavam usando um tipo de redes condenado pela lei.
O policial da zona, alertado pelo fiscal de caça e pesca, se pôs em ação, para promover os processos. Como se sabe, a Polícia tem por função investigar as infrações, deter os contraventores e acusá-los perante os Tribunais de Polícia. Ao dirigir-se para o local das infrações, o nosso policial se fêz acompanhar de um juiz de paz, encarregado da instrução inicial do processo. E isso porque a Polícia investiga, testemunha e acusa, mas não determina os atos da formação de culpa. Alojaram-se ambos numa cabana do governo, improvisada. em pretório. As rêdes proibidas foram vistoriadas, e as “queixas” do policial apresentadas ao juiz de paz. Elucide-se que falamos em “queixas”, pois, no regime anglo-norte-americano, o policial apresenta queixa à Justiça, como se fôsse um cidadão qualquer. Os vários acusados, que estavam residindo temporàriamente a apreciáveis distâncias da cabana (o mais retirado estava a 48 quilômetros), foram ritualmente citados em três dias, por meio de trenós de cães. Foram fixadas datas para as audiências, e tomadas medidas para que o mais próximo juiz de polícia (policemagistrate), sediado a 350 quilômetros, se locomovesse para o local. O advogado da defesa veio de avião, de Edmonton, a uns 400 quilômetros. Tanto o juiz como o defensor se acomodaram num pequeno povoado, a 45 milhas da acanhadíssima cabana improvisada em auditórios. Ambos se dirigiam diàriamente de avião para as audiências.
O advogado da defesa fez quanto pôde. Mas depois que os sete primeiros réus foram considerados culpados, e condenados a pagar uma multa relativamente fraca, o causídico entregou os pontos.1
Passemos, agora, a um rápido balanço das qualidades dos Tribunais de Polícia na Inglaterra e nos Estados Unidos. A rapidez dos seus julgamentos é coisa indiscutível, e passaremos, assim, a outros pontos.
O grande constitucionalista inglês HAROLD LASKI, ainda ao tempo em que era ativo adversário do govêrno, não deixou de reconhecer que os juízes inglêses estão completamente livres dos vícios de corrução e de desrespeito à lei.2
Em outra obra, insiste LASKI em que os tribunais de instância superior, no seu país, “possuem grandes virtudes, especialmente na administração da justiça penal. Seus juízes são verdadeiramente” independentes e completamente livres de quaisquer suspeitas de corrução ou de influência política”.3
Todavia, os tribunais inglêses de PrimeiraInstância – e os TribunaisdePolícia pertencem a essa categoria – são menos satisfatórios. Os seus juízes são homens honestos, mas estão longe de serem brilhantes. Há uma importante exceção para a justiça penal de Londres, pois os magistrados que aí ocupam cargos remunerados (stipendiarymagistrates), realizam em geral um trabalho admirável, uma vez que são recrutados entre os melhores advogados. Os magistrados leigos dos Tribunais de Polícia, contudo, representam um problema difícil. Sua nomeação é geralmente uma recompensa a serviços políticos. Por não terem cursado uma Escola de Direito, suas decisões não podem ser boas. Pecam por, desproporção nas punições infligidas; por condenável tendência à faciosidade em casos quase políticos e trabalhistas; e por certa tendência às discriminações sociais em delitos menos graves.4
Em que consistem estas discriminações sociais? Alguns exemplos esclarecer-nos-ão. O que em Whitechappel (bairro pobre de Londres) se considera pequeno furto nas lojas, punível com prisão ou multa, em Kensington (zona elegante), se fôr praticado por uma senhora, passará a ser cleptomanianeurastênica. E a tal senhora, é claro, não irá para a cadeia nem pagará multa. É doente, coitadinha, e precisa de um psiquiatra..
Outro exemplo. Em Oxford, as desordens promovidas pelos estudantes por ocasião da regata Oxford-Cambridge, são simples “estudantadas”, mas se distúrbios semelhantes produzirem a leste de Temple Bar, e zona proletária, a Polícia considerá-los-á como “séria desordem” e cuidará de encaminhar seus autores a uma policecourt, que não deixará de condená-los.5
Outro caso, para rematar. É relativamente comum, lá, a “embriaguez quando na direção de um veículo motorizado”, que pode ser auto, caminhão, ônibus, etc. Porém, se o motorista apanhado é grã-fino, politicão ou filhinho-de-papai, estará apenas “alegrinho”; se é homem-do-povo, estará bêbedo, e sofrerá os rigores da lei.
Em outro famoso livro, “A Grammar of Politics”, LASKI faz esta censura às policecourts: “Existem juízes cujas sentenças em crimes sexuais são notòriamente leves; outros há que, em casos semelhantes, infligem punições com o máximo rigor”.
Apesar dêstes senões, a justiça penal inglêsa é, em geral, boa. O mesmo não sucede com a norte-americana. Juízes americanos houve, como o famigerado BARNARD, que não teve pejo em declarar, alto e bom som: “Quem, ocupa um cargo na magistratura, possui um valioso patrimônio, de que dispõe a seu bel-prazer em favor dos seus prediletos. Tenho-me dado perfeitissimamente auxiliando os meus amigos, e negando tudo aos meus adversários”.
Muitíssimo haveria que dizer sôbre os defeitos graves dessa justiça. Lorde BRYCE, um dos mais objetivos analistas da civilização americana, escrevia: “A administração da justiça é tão falha nos Estados Unidos, que a próprio presidente Taft, num discurso pronunciado em Chicago, não hesitou em classificá-la como uma vergonha para a civilização americana”.6
A Justiça norte-americana degradou-se, em boa parte, ante o poder do dinheiro, e o espírito de partido se dissimula sob a toga dos juízes. O chefe de polícia de Búfalo, A. J. Roche, admitiu “haver juízes que trabalham de acôrdo com criminosos profissionais (racketeers), aos quais favorecem no decorrer dos processos” (“The New York Times”, de 1° de outubro de 1933). Existem alianças entre certos juízes corrompidos e os políticos e policiais indignos (“San Francisco Examiner”, de 27 de agôsto de 1933).
Não é sem razão que a parte mais sã daquela nação tem lutado pela moralização da sua magistratura, especialmente no setor mais atingido, o das policecourts ou Tribunais de Polícia.
Além disso, muitos dos membros dêsses tribunais, ainda que honestos, são acusados de falta de critério.7
Os Tribunais de Polícia nos Estados Unidos são medíocres, em virtude dos seguintes principais motivos: os seus juízes são eleitos pelo povo, como se fôssem deputados, e isso os torna muitíssimo sensíveis à política e aos pedidos; a política norte-americana, em geral corrompida, se intromete muito na justiça. Afinal, as polícias estaduais americanas, politicamente controladas e abastardadas, prejudicam a ação da justiça.
Tudo isso é mais do que sabido, e um sociólogo americano, WILLIAM SEAGLE, atribui a notória inferioridade da justiça penal estadunidense à corrução do sistema político norte-americano (“Encyclopedia of Social Sciences”, vol. 8, pág. 522).
O sistema dos Tribunais de Polícia atenta contra as garantias da liberdade individual? Se considerarmos a Inglaterra, a resposta é negativa. Antigamente era o júri que julgava a maioria dos casos criminais na Inglaterra. BLACKSTONE afirmou, nos tempos. áureos do júri, ser esta instituição, na lei e nos costumes inglêses, o baluarte das liberdades britânicas. Ora, apesar disso, assistimos modernamente ao declínio da jurisdição do júri, na Inglaterra. Mas tal decadência e a avassaladora jurisdição dos Tribunais de Polícia são devidas a razões de ordem técnica, pois os inglêses, hoje como sempre, prezam muitíssimo suas liberdades.
Na Inglaterra, tôda pessoa prêsa tem de ser apresentada a um juiz dentro de 24 horas, podendo ser conduzida à prisão por oito dias, caso o juiz o julgue necessário. Mas o detido poderá obter advogado e defender-se, reperguntando às testemunhas de acusação. O inquérito é público, em geral.
Naquele país, a lei é rigorosamente aplicada, e nas raras vêzes em que a sua Polícia se excede, a reação da opinião pública é fortíssima; os culpados são punidos. Eis o que nos conta um dos mais eminentes juristas da Inglaterra de hoje, o professor ARTUR GOODHART: “Não há muito, uma jovem humilde chamada Irene Savage foi conduzida a um pôsto policial de Londres, e interrogada de forma ilegal. No correr da semana, todos os jornais da Inglaterra protestaram, uma interpretação foi feita, e o govêrno viu-se obrigado a nomear uma comissão de inquérito”.8
III Necessidade de adaptação à realidade brasileira
Em anteriores seções dêste artigo, tivemos em mira delinear o funcionamento dos Tribunais de Polícia da Inglaterra e dos Estados Unidos e registrar os resultados obtidos. Especialmente na Grã-Bretanha, a instituição tem provado bem, como vimos. Isto, todavia, não quer dizer que nos convenha um decalque servil. O que se recomenda é uma inteligente adaptação ao nosso meio e às nossas necessidades.
São dignas de meditação, a êsse respeito, as palavras do grande processualista espanhol, hoje residente no México, professor NICETO ALCALÁ ZAMORA Y CASTILLO: “A Inglaterra soube, com sua característica lentidão e perseverança, criar o clima político adequado para que lançasse raízes e florescesse a justiça em seu território. Portanto, o ensinamento a tirar-se da experiência inglêsa não consiste em copiar servilmente instituições made in England e que não servem para exportação; mas, sim, tendo em conta o temperamento, a história e as possibilidades de cada país, preparar o ambiente que permita obter “uma justiça tão boa como a que, corri um instrumento primitivo, os ingleses souberam criar”.9
Acentuamos, logo de inicio, que a denominação – Tribunais de Polícia – é imprópria; poder-se-á escolher outra mais adequada às projetadas jurisdições criminais sumárias para crimes menos graves e contravenções. Poderia ser, como se dá no projeto argentino de Reforma Processual, TribunaisCorrecionais, os quais visam solucionar problemas judiciários semelhantes souberam criar”.9
É terrível o congestionamento do foro criminal de nossos grandes centros, muito especialmente o de São Paulo e o do Rio de Janeiro. O aumento de varas nada resolve. Ao contrário, cria novos problemas. É muito acertado o que declarou a respeito o magistrado e professor JOSÉ FREDERICO MARQUES: “Essa solução empírica transtorna a normalidade da carreira judiciária, permitindo promoções a granel sem elemento humano para isso. Sobem juízes ràpidamente na carreira, sem conhecimentos sedimentados pela pratica quotidiana da vida forense, chegando a São Paulo ainda bisonhos e sem experiência, pelo que atendem deficientemente às necessidades de um fôro movimentado como o da Capital”.10
Chegamos, no Estado de São Paulo, ao ponto de serem excluídos da apreciação da justiça inúmeros delitos e contravenções, através de uma eliminação prévia, à margem da lei, feita pela polícia. Assim é que, em 1951, das ocorrências conhecidas pela polícia, a maioria delas não constituiu objeto de inquérito. Muitas delas nem sequer foram registradas. Foram simplesmente registradas, sem conseqüência processual alguma, 66.910. Eis a natureza de várias delas: agressões (574 na Capital e 952 no interior); desobediência à autoridade (670 e 1.124, respectivamente); escândalos (1.134 e 1.337); insultos (761 e 706); mendicância (1.708 e 748); vadiagem (365 e 1.517); pequenos furtos (67 e 259); jôgo proibido (na Capital não houve sequer registro; no interior, 684); embriaguez pública (5.329 e 15.161).11
Segundo editorial da “Fôlha da Manhã” (na seção “Direito e Justiça”, de 9.2.56), a não-abertura de inquérito, no caso dessas infrações menores, se deve à intenção implícita de não agravar o congestionamento do fôro penal. Pensamos nós que êsse é apenas um dos motivos. Outros há mais efetivos: a negligência de um lado, e, do outro, as deficiências em recursos materiais e humanos necessários à investigação de muitos dêsses casos. A Polícia reserva seus limitados recursos para os crimes mais graves.
Em 1955, o movimento registrado no fôro criminal, na Capital paulista, atingiu nível elevadíssimo, que se traduziu em cêrca de 26 mil feitos distribuídos. Dêsse total, alguns milhares dizem respeito a habeascorpus, precatórios e outros casos que não dão motivo a processos criminais. Feitas as devidas reduções, é de calcular-se que uns 18.000 daqueles feitos se transformem em ações criminais que virão somar-se às que, oriundas dos anos anteriores, atravancam as Varas da Capital. No ano de 1955 se decidiram uns 8.000 processos. A vazão é pois, absolutamente insuficiente. Para que se decida mais ràpidamente a maioria dos processos distribuídos, é necessário adotar um rito mais expedito, ao menos para os crimes mais leves e contravenções. E isso exige modificações no Cód. de Proc. Penal brasileiro.
Dois anteprojetos, relativos à criação de tribunais criminais do rito sumário, foram recentemente elaborados no Brasil. Um dêles surgiu no Rio de Janeiro e destina-se exclusivamente ao Distrito Federal. É da autoria do procurador ROMÃO CÔRTES DE LACERDA.12 O outro se estende a todo o Brasil, é juridicamente mais amplo, sendo uma reforma do Cód. de Processo Penal. Foi elaborado em São Paulo por uma Comissão de que é membro o desembargador JOSÉ FREDERICO MARQUES, e acaba de ser entregue aos componentes da bancada paulista na Câmara Federal.
O projeto paulista põe a cargo dos novos tribunais correcionais o julgamento sumário de tôdas as contravenções, assim como dos crimes punidos com penas até um ano de detenção. A criação dêsses juízes especiais será feita nos centros populosos, ou seja nas cidades de mais de 150.000 habitantes. Em nosso Estado, a Capital e Santos serão abrangidos pela futura lei. Quanto a Campinas, o caso é duvidoso. Com efeito, as estatísticas de 1950 lhe atribuem apenas 99.256 almas, contra 198.405 em Santos. Será que a, terra de Carlos Gomes já terá mais de 150.000 pessoas?
Na Capital, deverão surgir vários juízos dessa espécie, entrosados com as zonas, circunscrições ou distritos policiais. No projeto carioca, o Distrito Federal ficará Dividido em três zonas, ficando cada uma vielas sob a jurisdição de um juízo. A competência do projeto carioca se limita também, em matéria de crime, às pequenas infrações. Mas, em contraste com o projeto paulista, também julgará casos civis e pequena monta, que na vida quotidiana de uma grande cidade são muitos e geram, freqüentemente, atritos mais ou menos sérios, que, às vêzes, acabam em crimes.
Em contraste com os Tribunais de Polícia inglêses e americanos, os dois projetos brasileiros são cautelosos ou tímidos em matéria de competência. Como vimos, 99% dos casos criminais da Inglaterra são julgados pelas policecourts e o mesmo se dá com a maioria dêles, nos Estados Unidos. E graves crimes (sodomia, estupro, prostituição, etc.) entram em tal jurisdição.
Traços comuns e inovadores nos dois anteprojetos são a oralidade, a imediação, a concentração e a continuidade do juízo. No que toca à livre-convicção, ou, mais precisamente, à persuasãoracional ou regras da sã crítica, não há novidade, pois ela já fôra consagrada pelo vigente Código de Proc. Penal.
A oralidade do processo penal é aconselhada pela teoria e pela prática. As deduções da teoria, a favor dêste rito natural e humano, são confirmadas pelos resultados da experiência na Inglaterra, na França e na Itália. Mais recentemente, na Província de Córdoba (Argentina), cuja lei processual penal em 1939 adotara o procedimento oral, surgiram ótimos resultados, afirma o alto magistrado e professor ALFREDO VÉLEZ MARICONDE.13
De fato, o procedimento oral constitui o sistema mais favorável à descoberta da verdade, não só quanto aos fatos, mas também quanto à personalidade do acusado e aos motivos determinantes de sua conduta. O juiz sente diretamente os fatôres psicológicos, éticos, econômicos de educação ou de ambiente, que rodeiam o drama, cujos personagens não conseguem ocultar-lhe a realidade. Até o próprio esforço de ocultação facilita às vêzes tal descoberta. É o resultado palpável da imediação (contato direto entre o juiz e os fatos). Além disso, se o rito é sumário, torna-se impraticável o uso do procedimento escrito.
A oralidade permite obter-se economia, rapidez e publicidade. Mas exige, ao mesmo tempo grande capacidade nos magistrados. A chave do sistema oral, muito mais necessária e efetiva do que no procedimento escrito entre nós vigente, é o juiz, isto é, o tribunal. Dêle depende a marcha dos debates, a utilidade e a direção dos interrogatórios para o objetivo visado – que é a averiguação da verdade mediante a discriminação entre provas úteis e inúteis, impedindo o verbalismo exagerado e declamatório e não se deixando impressionar por encenações calculadas. Com a oralidade, os fatos forçam mais a atenção do juiz, pois a discussão é viva e direta e permite mais fàcilmente esclarecer os pontos obscuros.
E, sobretudo, uma das maiores vantagens do princípio da oralidade consiste em que, na jurisdição sumária projetada, o mesmo vai unido a outros princípios que são também essenciais, como sejam a publicidade, a imediação (atrás referida), a concentração da causa e a continuidade dos atos do processo. Tudo isso redunda em grande rapidez processual.
Outras vantagens da imediação se põem de manifesto nas declarações indagatórias e testemunhais, nas acareações, e nas explicações verbais dos peritos, que tão-sòmente o juiz, e ninguém melhor do que êle, deve tomar, apreciando as condições físicas e morais dos declarantes e suas reações, motivadas pela culpa, pelo arrependimento, pela indignação, e que, podem denotar a periculosidade dó réu. A concentração permite efetuar, em uma só audiência ou no máximo em poucas audiências a curto prazo, os atos processuais fundamentais, evitando-se que se desvaneçam ou se tornem confusas as impressões do juiz, e que o traia a memória; e também impedindo que mude o juiz que tomou conhecimento do caso, e que mais apto está para julgá-lo.
Em conclusão, o bom magistrado é essencial ao novo sistema de justiça corretiva. Não se diga que, nos dois projetos brasileiros que só abrangem delitos menos graves e contravenções, essa exigência é secundária. Com efeito, por um lado, à direção do processo pouco importa que o delito seja mais ou menos grave. De outro, a gravidade do crime é uma coisa relativa. Um crime objetivamente muito grave, um homicídio, por exemplo, pode ser praticado por um agente que não apresente periculosidade. Tal é o caso do uxoricídio por infidelidade. Ao invés, um crime insignificante sob o aspecto material (um pequeno furto) poderá revelar grande periculosidade, exigindo aplicação de prolongada medida de segurança detentiva.
Evidentemente, magistrados de quarta entrância, em nosso Estado, ficarão à testa dos projetados juízos correcionais. Êles deverão habituar-se à nova técnica de julgar. Por outro lado, será assoberbante o trabalho de tais Varas, e deverá prever-se uma forma de tornar menos árdua a tarefa dos magistrados em aprêço.
IV Organização dos tribunais correcionais
Quanto a organização dos tribunais correcionais projetados para os nossos grandes centros, vejamos o anteprojeto paulista. Declara um dos seus autores, o desembargador JOSÉ FREDERICO MARQUES: haverá sempre, de noite e de dia, juízes, dois promotores, dois defensores de ofício de plantão, além, é claro, de escrivães, escreventes e oficiais de justiça.14
Modestamente sugerimos, para desafogar o árduo trabalho dos juízes, dispositivos segundo os quais o juiz poderá determinar que um juiz-adjunto ou mesmo secretário (êste é o caso de leis argentinas) receba declarações testemunhais, e possa também ordenar e assinar por si só as diligências de mero trâmite.
Como deverão funcionar tais juízos? Esclarece a respeito o professor JOSÉ FREDERICO MARQUES: “A autoridade ou funcionário policial apresentará o réu ao promotor, com as testemunhas do caso. Este formulará a acusação em audiência. Se houver prisão em flagrante, o auto será lavrado na audiência. Poderão ser ouvidas testemunhas de defesa, se o réu no momento as apresentar. Não apresentando, poderá fazê-lo dentro de dois dias, a critério do juiz”.15
Vemos que, diferentemente do sistema anglo-norte-americano, não é a Polícia, mas o promotor público, quem oferece a acusação. Estamos de acôrdo com o anteprojeto.
Passemos a outro ponto. É evidente que a ação do advogado ou defensor, referida na primeira declaração do desembargador F. MARQUES, é sempre necessária desde o início do inquérito. Surgem aí inovações fundamentais em relação ao sistema atual. É suprimido o inquérito policial, substituído pelo inquérito judicial. É sabido que, no inquérito policial, o advogado não pode intervir. Ao invés, nos futuros tribunais correcionais, de acôrdo com os princípios formulados na Constituição federal (art. 146, § 25), o advogado de defesa (e também o de acusação) deverá ter livre acesso ao inquérito judicial e incidentes derivados do mesmo. Isto significa duas coisas: que terá direito de rever as autuações já realizadas, e que também poderá assistir aos atos, isto é, intervir em tôdas as autuações do juízo correcional. Será notificado ou dar-se-lhe-á vista de todo o processado.
Outra modificação implícita que sofrerá o sistema atual é a seguinte: no processo das contravenções, segundo interpretação da regra da art. 532 do Cód. de Proc. Penal, a nomeação de defensor será feita quandopossível. No futuro sistema ela será, ao invés, indispensável, e, para obviar possíveis dificuldades, haverá o plantão de defensores.
Outro ponto em que haverá modificação importante, é o do sigilo. No atual sistema de inquérito policial (art. 20 do Cód. de Proc. Penal), a duração do sigilo poderá ser ilimitada, isto é, estender-se durante todo o inquérito, a critério da autoridade policial. No sistema projetado, todavia, é nossa opinião que o juiz só poderá ordenar o sigilo (que, aliás, não poderá exceder o prazo de uns 10 dias) sòmente quando êle fôr absolutamente indispensável para assegurar o êxito da investigação. E esta justificação haverá de constar do processo. Na maioria dos casos, a reserva não será necessária; ordená-la, então, significará um abuso, que poderá ser corrigido por via disciplinar. O juiz deverá lembrar-se sempre de que quanto mais acesso tiver a defesa durante a instrução, mais fácil resultará o debate.
Há um caso, todavia, em que o sigilo é absolutamente afastado: o dos atos irreproduzíveis, destinados a ter valor em juízo. Êles nunca deverão ser secretos.
Na própria Inglaterra, cujo sistema judiciário é profundamente liberal, pode haver segrêdo, a critério do juiz das suas policecourts, como se deduz dessas frases de J. RADCLIFF e GEOFFREY CROSS:
“O inquérito (judicial) é, na prática, realizado pùblicamente, embora isso não se dê obrigatoriamente“.16
Passemos ao modo de decidir dos futuros tribunais correcionais. A sentença poderá ser dada imediatamente após a infração ou delito, nos casos de flagrante. Esclarece o professor J. F. MARQUES:
“A sentença será dada na hora, ditada pelo juiz durante a audiência. Dela caberá recurso em sentido estrito, porque assim o juiz poderá reformá-la. Como o julgamento sumário é sempre perigoso, é de se prever o agravo no auto do processo para vários casos. O juiz poderá dar provimento a êsse agravo; quando houver recurso em sentido estrito. Para remediar outro perigo do julgamento rápido, deve prever-se uma espécie de revisão (revocatória penal), que o condenado poderá propor dentro de dois anos, rescindindo a condenação. O condenado, então, passará a autor, e o Estado a réu. Também é de se prever uma forma de reabilitação especial e total, requerida depois de seis anos”.
Louvamos as diretrizes liberais aí contidas, relativamente ao resguardo dos direitos da defesa. De fato, o que se deseja é um julgamento rápido, e não um julgamento apressado.
Os recursos se dirigem naturalmente à segunda instância. Sob êste aspecto, o anteprojeto carioca é inovador. Êle estabelece que os recursos serão interpostos para um órgão colegial, composto pelos juízes das três zonas (em que será dividido o Distrito Federal), que se reunirão uma vez por semana para essa tarefa.17
Outro importante setor da futura Justiça Correcional é o das multas. O professor F. MARQUES sugere o aumento de tôdas as multas estabelecidas no Cód. Penal, para tornar mais eficiente a pena pecuniária.
Esta modificação tornou-se muito necessária. Vejamos alguns exemplos. Atualmente, o máximo da multa para o crime de injúria (quando o juiz não quiser aplicar ao réu a detenção) é de Cr$ 2.000,00. Assim, se o injuriador é um milhardário, possuidor de um milhão de contos, e se o juiz, por qualquer motivo, não quiser levá-lo para o cárcere, aplicar-lhe-á uma multa absolutamente irrisória, que não satisfaz qualquer dos fins da pena.
Há poucos anos, surgiu no Paraná um caso resolvido de modo talvez pior. Uma mulher de família insulta uma môça solteira, sua vizinha. atirando-lhe na cara que ela se entregava a qualquer homem. Apesar da extrema gravidade da injúria, a ré foi pelo juiz condenada apenas à multa de Cr$ 500,00, em sentença confirmada pelo Tribunal.18 Em outras palavras, nem ao menos o máximo de multa foi aplicado ao caso.
Trata-se de manifestações de velha tendência da nossa Justiça. O grande PEDRO LESSA já lamentava a inexcedível compassividade dos juízes para essa espécie de delitos, acarretando o indefectível resultado das vinditas particulares, da incessante perpetração de novas infrações do Direito Penal.19
Torna-se imperioso que os projetados tribunais correcionais sejam mais objetivos na aplicação destas penalidades, e isto só se conseguirá dispondo de um excelente corpo de magistrados de carreira.
O poder das multas, quando aplicadas como devem ser, revela-se com um exemplo recente. Um leiteiro português para aqui emigrado; depois de enriquecido no seu negócio, resolveu passar o resto dos dias na santa-terrinha. Lá se estabeleceu com leiteria. Mas a água no leite custou-lhe um ano de cadeia e multas tão elevadas que teve de vender seus bens. Resultado: voltou para o Brasil, a fim de refazer a vida.
*
Observam acertadamente RADCLIFF e CROSS que a polícia é o fundamento de qualquer sistema eficiente de justiça penal. 21 A polícia inglêsa é universalmente reconhecida como a melhor do mundo, e sua alta qualidade influi poderosamente para a excelência das policecourts britânicas.
A importância de uma boa Polícia, para o funcionamento dos juízos correcionais, que se pretende criar entre nós, é grande, é imensa. Basta notar-se que apenas uns 20% dos delitos e contravenções são apanhados no flagrante. A maioria (80%) deverá ser investigada pela Polícia, a qual, em face dos futuros tribunais correcionais, agirá sob a direção dos juízes. Por outro lado, o nosso atual problema carcerário é novo obstáculo ao rápido funcionamento dos futuros tribunais correcionais.
Entre nós, a Polícia está atravessando uma fase crítica. As estatísticas citadas anteriormente são expressivas. As falhas graves em material e pessoal, as tremendas mazelas que a corroem e de que poderíamos citar trágicos exemplos recentes, era quantidade, estão a mostrar-nos que ela não está à altura mínima exigível para o sofrível funcionamento dos projetados tribunais correcionais. Sem uma reforma de fundo, e não apenas de. fachada, procedida na Polícia, os futuros tribunais, logo ao nascerem, serão atacados de paralisia infantil.
Por outro lado, no tocante às relações funcionais entre a Justiça e a Polícia, a experiência entre nós tem sido amarga para a primeira. O íntegro magistrado LAURINDO MINHOTO, quando nas funções de juiz-corregedor, assim se manifestou: “Tal sistema de irresponsabilidade não se revelava apenas pela inércia de determinadas autoridades, diante dos crimes dos seus subordinados. A questão oferecia aspectos de gravidade ainda maior. A recusa em agir contra os seus agentes ia até a desobediência a requisições judiciárias. Presos eram ocultos, )ara que não fôssem submetidos a exames periciais determinados pelo juiz. Autoridades policiais de mais alto pôsto no Estado, segundo consta de documentos oficiais, expressamente determinavam a sonegação de pacientes em processos de habeascorpus” (trecho do relatório estampado no “Diário da Noite” de São Paulo, a 22 de outubro de 1952, pág. 10).
AlípioSilveira, professor da Faculdade de Direito do Estado do Rio de Janeiro.
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Notas:
1 “Law and Order in Canadian Democracy”, publicação oficial, 1952, pág. 259.
2 H. LASKI, “Derecho y Politica”, tradução castelhana, Madri, págs. 275-276.
3 LASKI, “Encyclopedia of Social Sciences”, vol. VII. 1932, págs. 25-26.
4 “Encyclopedia”, cit., lugar referido.
5 H. LASKI, ob. Cit., pág. 282.
6 BRYCE, “Modern Democracies”, tradução francesa, cap. II, pág. 501.
7 Professor K. LLEWELLYN na coletânea “About the Kinsey report”, 1948, pág. 127.
8 GOODHART, “Les Théories Anglaises du Droit”, no “II Annuaire de l’Institut Internacional de Philosophie du Droit et de Sociologie juridique”, 1935-1936, págs. 99-101.
9 ALCALÁ ZAMORA, “Revista de Derecho Procesal”, 1944, I, 2ª parte, pág. 97.
10 MARQUES, na “Fôlha da Manhã”, “Direito e Justiça”, de 21 de janeiro de 1956.
11 “Fôlha da Manhã”, “Direito e Justiça de 9 de fevereiro de 1956.
12 Projeto carioca, na “Fôlha da Manhã”, “Direito e Justiça”, de 15 de outubro de 1955.
13 MARICONDE, “Revista de Derecho Procesal”, 1948, n. 4, 1ª parte, pág. 333.
14 MARQUES. na “Fôlha da Manhã”, “Direito e Justiça”, de 21 de janeiro de 1956.
15 JOSÉ FREDERICO MARQUES, “Folha da Manhã”, de 21 de janeiro de 1956.
16 RADCLIFF e CROSS, “The English Legal System”, 1937, pág. 328.
17 Declarações do sr. Ministro NÉLSON HUNGRIA, na “Folha da Manhã”, de 15 de outubro de 1955.
18 “Paraná Judiciário”, dezembro de 1946, págs. 288-289.
19 LESSA, na “Rev. do Supremo Tribunal”, outubro de 1917, pág. 107.
20 Crônica de RUBEM BRAGA. na “Folha da Tarde” de 23 de abril de 1956).
21 Ob. Cit., pág. 321.
LEIA TAMBÉM O PRIMEIRO VOLUME DA REVISTA FORENSE
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 1
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 2
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