GENJURÍDICO
shutterstock_98518868

32

Ínicio

>

Artigos

>

Processo Penal

ARTIGOS

PROCESSO PENAL

Acreditar é a Receita do Bolo da Vovó

1969

AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA

CONVENÇÃO AMERICANA DOS DIREITOS HUMANOS

MAGISTRATURA

PRESIDENTE DO TRIBUNAL

PRESÍDIO

PRESOS

PRISÃO CAUTELAR

RÉU

Guilherme de Souza Nucci

Guilherme de Souza Nucci

16/10/2015

shutterstock_98518868

Se você nunca fez um bolo antes, mormente aquele maravilhoso que a vovó fazia, pode acreditar na receita encontrada, mas não deverá acertar da primeira vez. Vai perder muitos bolos antes de – talvez – conseguir chegar no primor do bolo da vovó.

Essa é a audiência de custódia, que muitos estão tratando como um bolo delicioso, a ser preparado por qualquer “juiz-cozinheiro”, em todas as Comarcas, com o primor da vovó. Trata-se de uma fraqueza intelectual e/ou realística das mais graves. Seria o mesmo que eu, com quase  trinta anos de magistratura, dissesse que tenho uma nova fórmula mágica, no atual estado dos presídios, para nunca mais haver rebelião. Quem iria acreditar?

Estão lidando mal com a audiência de custódia, simplesmente porque não é ela, nem nunca foi a causa das prisões cautelares em excesso no Brasil. Todos temos certeza disso. Ao menos, aqueles que prezam pelo mínimo de rigor científico e vivem, ainda, no mundo real. Então, por que “acreditar” na audiência de custódia?  Porque em muito lugares, inexistem juízes naturais para receber a cópia do flagrante e avaliá-lo. São magistrados livremente designados pela Presidência do Tribunal. Possivelmente, dentro de uma argumentação coerente, se eu fosse Presidente do Tribunal, designaria somente juízes com espírito extremamente liberal, para que, havendo a audiência de custódia, mais soltem do que prendam.

Aliás, nem mesmo isso pode dar certo, porque os magistrados podem ser liberais, mas seguem a lei. São racionais. Logo, há casos que, vendo o indiciado – ou não – haverá mantença da prisão cautelar.

Desprezar o Delegado de Polícia, como se fosse um mero serventuário burocrata, que “batesse carimbos”, pois a prisão somente valeria se fosse ratificada em juízo é um erro lastimável.

Acreditar que a Convenção Americana dos Direitos Humanos (1969), que não foi aceita pelo Brasil até que o governo se tornou civil (1992) trouxe um preceito “inédito”, que absolutamente nenhuma processualista viu antes, nem Tribunal, é um escárnio. Lá estava a redação. Fez-se a interpretação do momento, porque interessa politicamente agitar a prisão cautelar.

Com a devida vênia, somos macacos velhos, aqueles que conhecem as artimanhas do momento e até mesmo o porquê.

Vou frisar bem claramente: o juiz responsável (a maioria), que lê o auto de prisão em flagrante e verifica exatamente se é possível conceder algum benefício ao indiciado preso, assim o faz independentemente da superfetação da audiência de custódia. Esta audiência, a propósito, pode ser valida, dentre os países americanos, que não possuem o delegado como agente concursado, apto a verificar os elementos do crime, antes de encaminhar o indiciado ao cárcere de graça.

Fico estarrecido quando leio ou ouço argumentos do gênero: “quando o juiz visualizar o indiciado preso, com suas sandálias surradas e sua roupa rota, ele certamente vai lhe conceder liberdade provisória”. E esse juiz somente o fará quando o vir na audiência de custódia. Soltemos, então, o serial killer perigosíssimo, pois ele estará nos mesmos andrajos. Absurdo comparar roupa de cadeia com o que foi feito pelo sujeito preso.

Não confiem em certas estatísticas, é o meu conselho. São manipuladas muitas delas. “Depois que foram instaladas as audiências de custódias, o número de presos libertados aumentou em ‘x’ %”. Em que condições foram realizadas? Com quais juízes? Quais foram os presos encaminhados seletivamente?

Há que se fazer alguma coisa – qualquer coisa – para soltar presos cautelares, que superlotam presídios. Por isso, “criaram” as audiências de custódia. Vamos incentivar os juízes a soltar e soltar. Vamos criar um fato novo para cair do mundo da mídia. Em lugar de criar vagas (muito caro), vamos soltar e soltar.

Sou contra a audiência de custódia? Absolutamente não. Apenas adianto que é uma burocracia a mais no cansado processo penal que temos e não vai resolver absolutamente nada. A audiência de custódia não é a receita de bolo da vovó. Não basta quebrar ovos e juntar farinha. O elevado custo dessa nova empreitada vai gerar ainda muitos aborrecimentos.


Veja também:

Conheça as obras do autor (Clique aqui!)

Assine nossa Newsletter

Li e aceito a Política de privacidade

GENJURÍDICO

De maneira independente, os autores e colaboradores do GEN Jurídico, renomados juristas e doutrinadores nacionais, se posicionam diante de questões relevantes do cotidiano e universo jurídico.

Áreas de Interesse

ÁREAS DE INTERESSE

Administrativo

Agronegócio

Ambiental

Biodireito

Civil

Constitucional

Consumidor

Direito Comparado

Direito Digital

Direitos Humanos e Fundamentais

ECA

Eleitoral

Empreendedorismo Jurídico

Empresarial

Ética

Filosofia do Direito

Financeiro e Econômico

História do Direito

Imobiliário

Internacional

Mediação e Arbitragem

Notarial e Registral

Penal

Português Jurídico

Previdenciário

Processo Civil

Segurança e Saúde no Trabalho

Trabalho

Tributário

SAIBA MAIS

    SAIBA MAIS
  • Autores
  • Contato
  • Quem Somos
  • Regulamento Geral
    • SIGA