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ADMINISTRATIVO
CLÁSSICOS FORENSE
REVISTA FORENSE
Anistia – Conceito – Pagamento de Vantagens a Militares
Revista Forense
20/12/2022
REVISTA FORENSE – VOLUME 156
NOVEMBRO-DEZEMBRO DE 1954
Bimestral
ISSN 0102-8413
FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO
FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto,
Abreviaturas e siglas usadas
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SUMÁRIO REVISTA FORENSE – VOLUME 156
CRÔNICA
DOUTRINA
- O princípio da igualdade perante a lei, Nestor Duarte
- Da Dogmática jurídica, Paulo Carneiro Maia
- A administração e o controle de legalidade, Caio Tácito
- As sociedades de economia mista, Válter T. Alvares
- A condição civil da mulher casada, Lino de Morais Leme
- O processo administrativo tributário, Rui Barbosa Nogueira
- Culto, João De Oliveira Filho
PARECERES
- Imposto de Vendas e Consignações – Imposto de Exportação, Francisco Campos
- Rendas Locais – Arrecadação Estadual – Impôsto de Renda – Participação dos Municípios, Gilberto de Ulhoa Canto
- Mercado Municipal – Domínio Público – Autorização Administrativa – Executoriedade Dos Atos Administrativos, Antão de Morais
- Anistia – Conceito – Pagamento de Vantagens a Militares, A. Gonçalves de Oliveira
- Juiz – Promoção Automática – Elevação de Entrância, Gabriel de Resende Passos
- Ministério Público – Unidade e Indivisibilidade da Instituição, J. A. César Salgado
- Advogado – Ingresso nos Cancelos dos Juízos e Tribunais, Cândido de Oliveira Neto
NOTAS E COMENTÁRIOS
- Hugo Grocio, Hidelbrando Acióli
- Lúcio de Mendonça, F. C. San Tiago Dantas
- Do Corpo de Delito, José Frederico Marques
- A Homologação das Sentenças Estrangeiras de Divórcio, João de Oliveira Filho
- A Emissão de Ações com Ágio, Sílvio Marcondes
- Poder Discricionário do Juiz
- Exceção de Inexecução de Contrato Bilateral, Arno Schilling
- Reintegração de Posse “Initio Litis”, Enéias de Moura
- Justiça do Distrito Federal, José Pereira Simões Filho
- José Antônio Pimenta Bueno, Dr. Laudo de Almeida Camargo
JURISPRUDÊNCIA
LEIA:
Sobre o autor
Antão de Morais, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo.
PARECERES
Anistia – Conceito – Pagamento de Vantagens a Militares
– A anistia é da competência exclusiva do Poder Legislativo, que pode estabelecer limites à sua aplicação.
– A anistia concedida pelo decreto-lei nº 7.474, de 1945 da ensejo ao pagamento de vantagens aos militares por ela beneficiados.
PARECER
I. A questão jurídica ora submetida à apreciação desta Consultoria diz respeito à interpretação do dec.-lei nº 7.474, de 19 de abril de 1945, que concedeu anistia a todos quantos tenham cometido crimes políticos desde 16 de julho de 1934 até a publicação dêsse ato legislativo, a saber, se o pagamento do soldo e vantagens atribuídos aos militares que reverteram a seus postos deve ser feito a partir da data da reversão ou se da data do mencionado decreto-lei.
Os dispositivos invocados para solucionar a questão estão assim redigidos:
“Art. 2º A reversão dos militares beneficiados por esta lei, aos seus postos, ficará dependente de parecer de uma ou mais comissões militares, de nomeação do presidente da República”.
“Art. 4º Em nenhuma hipótese terão os beneficiados por êste decreto-lei direito aos vencimentos atrasados ou suas diferenças, e bem assim a qualquer indenização”.
No entendimento dêsses preceitos, o Tribunal Federal de Recursos, como consta do processo, tem entendido, em, pelo menos, duas decisões, que a percepção de vencimentos e vantagens dos anistiados reincluídos em suas carreiras é assegurada a partir do citado decreto-lei e não do ato de reversão, como entendeu o Dr. consultor jurídico do Ministério da Marinha. Por êsse motivo, em face da jurisprudência daquele egrégio Tribunal, o ministro da Marinha, ao ensejo de apreciar pedidos de dois subordinados, submete o assunto à eminente apreciação e decisão do Exmo. Sr. presidente da República.
Como expressão de renúncia ao jus puniendi, conhece o nosso direito positivo a anistia, a graça individual e a graça coletiva, ou indulto. Enquanto os últimos são atos da atribuição constitucional do presidente da República, a anistia, por sua natureza política, é reservada à competência exclusiva do Congresso Nacional.
Assim dispõe expresso dispositivo da Constituição federal vigente (art. 66, nº V), como nas demais Cartas republicanas, que lhe antecederam, prevalecera sempre tal competência, que remonta à primeira lei sobre a, matéria, lei nº 40, de 11 de outubro de 1836, que anistiou os participantes da guerra dos Farrapos, tal como sucedeu no direito americano, cuja constituição, a propósito, contudo, era omissa.
A sua finalidade, o seu escopo, é o de desarmar os espíritos, é apagar na lembrança, anestesiar na memória fatos sediciosos, movimentos revolucionários, em última expressão, crimes políticos.
Pôsto que matéria, da competência do Parlamento, a anistia, a lex oblivionis é aplicada pelo Poder Executivo, cujos atos, ainda neste particular, são controlados, do ponto de vista de sua legalidade, pelo Poder Judiciário, ao qual compete, mediante provocação dos interessados, dar sôbre a lei respectiva a palavra derradeira, restabelecendo direitos assegurados.
Anistia e União
Por disposição de natureza constitucional, cabe à União conceder anistia (artigo 5º, nº XIV), por intermédio do Congresso Nacional (art. 66, nº V), deslindado de quaisquer regras constitucionais, daí resultando que ao legislador se reconhece o poder, que sempre se lhe reconheceu, de imitar a anistia, o que tem feito em resguardo sobretudo a direitos e interêsses de terceiros integrantes de carreiras militares (ver acórdão do Supremo Tribunal Federal, relator ministro CARVALHO MOURÃO, na “REVISTA FORENSE”, vol. 69, pág. 503; idem, relator ministro OROZIMBO NONATO, revista citada, volume 144, pág. 157).
É certo que o seu aplicador, o aplicador da abolitio publica, de que falava CÍCERO, pleiteando e obtendo-a do Senado para os assassinos de Júlio César, deve ter “ânimo liberal”, como aconselha o ministro OROZIMBO NONATO, do alto de sua cátedra do Supremo Tribunal Federal (“REVISTA FORENSE”, vol. 144, pág. 182), como doutrina PONTES DE MIRANDA (“Comentários à Constituição Federal de 1946”, 2ª ed., vol. 1º, pág. 346), esteado em conceito de prosápia romana remontando a JAVOLENO, segundo máxima tirada das Epístolas: “Beneficium imperatoris, qual a divina sodice cius indulgentia proficiscitur, quam plenissime interpretari debemus”.
Não se pode negar, todavia, o poder de limitação, que nem o gênio do maior, dos advogados brasileiros conseguiu ofuscar, na “anistia inversa”, quando desfechava contra o dec. nº 310, de 21 de outubro de 1895, todo o arsenal da sua sabedoria inexcedível, pelo fato de ter êsse ato restringido o benefício da lex indulgenciae: os militares sòmente voltaram ao serviço ativo dois anos a data da lei e durante o biênio sòmente recebiam o sôldo de seus postos, contando, apenas, o tempo para reforma.
Foi então que o Supremo Tribunal Federal, em magna sessão, firmou sua jurisprudência no sentido de que, “podendo a anistia ser geral, restrita, absoluta ou condicional, sòmente ao Poder Legislativo, que nela Constituição federal tem a atribuição privativa de a decretar, assiste o incontestável direito de estabelecer as garantias e condições que julgar necessárias ao interêsse do Estado, à conservação da ordem pública e à causa da Justiça. Cabe ao Poder Legislativo, consultando os altos interesses da disciplina, especificar em lei as condições para tornar efetiva a anistia a militares, envolvidos em crime de rebelião”. E concluiu: “Assim sendo, as condições prescritas no dec. n° 310, de 21 de outubro de 1895, não podem comportar o caráter de pena, por serem os consectários jurídicos de um ato de natureza condicional ou restrita” (acórdão nº 216, de 20 de janeiro de 1897, in CARLOS MAXIMILIANO, “Comentários à Constituição Brasileira de 1891”, 2ª ed., pág. 421).
Anistia e esquecimento ao delito
III. Em face dos princípios expostos, verifica-se que a anistia, impondo esquecimento ao delito, salvo expressa disposição legal em contrário, “restaura a situação a êle anterior”, na expressão do ministro LUÍS GALLOTTI, em notável estudo (“REVISTA FORENSE”, vol. 104, página 448).
Por isso mesmo, como concluiu FRANCISCO CAMPOS, quando consultor geral da República, sendo ampla, “reintegra os anistiados, para todos os efeitos, na sua situação anterior, como se nada tivesse havido”, dando direito, inclusive, a vencimentos atrasados, que o mérito consultor geral reconheceu, no caso então submetido à sua consulta (“Pareceres do Consultor Geral da República”, vol. I, página 403).
Do mesmo modo, o antigo consultor geral da República, ARARIPE JÚNIOR sentenciava: “Tendo a anistia por efeito excluir tôdas as conseqüências más da infração, extinguindo o próprio delito e repondo as coisas no mesmo estado em que se achariam se a infração nunca tivesse sido cometida, devem-se entender garantidas as vantagens de que se trata” (“Pareceres”, 1903-1905, vol. I, página 408).
Em regra, fôsse no caso ampla a anistia, até ao pagamento de vencimentos atrasados daria ensejo. O dec.-lei nº 7.474, de 1945, no entanto, os excluiu expressamente (art. 4º), como poderia faz-lo. Mas, os vencimentos após a anistia, o pagamento do sôldo dos militares, este, desde a data do citado decreto-lei, parece-me irrecusável. Em verdade, nem no caso de chamada “anistia inversa” aos beneficiados tal pagamento fôra negado.
Na hipótese da consulta, assim se interpreta a lei: a reversão fica na dependência do parecer da Comissão então nomeada, mas, desde que concedida, ao beneficiado só se nega, nos têrmos do artigo 4º, o pagamento dos vencimentos atrasados.
Assim tem decidido o egrégio Tribunal Federal de Recursos, como esclarece o ministro da Marinha, em arestos com os quais ora se põe de pleno acôrdo a Consultoria Geral da República.
Salvo melhor Juízo.
Rio de Janeiro, 8 de outubro de 1954. – A. Gonçalves de Oliveira, consultor geral da República.
LEIA TAMBÉM O PRIMEIRO VOLUME DA REVISTA FORENSE
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 1
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 2
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 3
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 4
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 5
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 6
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