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Contornos jurídicos sobre a letalidade policial
Renee do Ó Souza
27/01/2022
Neste artigo, Reneé do Ó Souza[1], Luiz Fernando Rossi Pipino[2] e Andrea Walmsley Soares Carneiro[3] tecem algumas considerações sobre a letalidade policial, com vistas a identificar as suas principais repercussões jurídicas. Leia!
Contornos jurídicos sobre a letalidade policial
A letalidade policial é entendida como a morte intencional provocada por membros das polícias no desempenho de suas funções. Segundo levantamentos oficiais feitos pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), 21.910 pessoas morreram em decorrência de intervenções policiais no Brasil entre os anos de 2009 e 2016. Aponta Luís Felipe Zilli:
“Apenas para que se tenha uma ideia da magnitude deste problema no Brasil, basta comparar os números nacionais com os de outros países que também enfrentam graves problemas de segurança pública: em 2016, enquanto o Brasil apresentou uma taxa de aproximadamente duas mortes decorrentes de intervenções policiais para cada grupo de 100 mil habitantes, na África do Sul essa taxa foi de pouco mais de uma morte; no México, não chegou a 0,3; e nos Estados Unidos, país com aproximadamente 900 mil agentes policiais em atividade (no Brasil são pouco mais de 500 mil), este indicador chegou a 0,13 morte para cada grupo de 100 mil habitantes (Zimring, 2017; Nunes, 2018)[4]”.
Inegavelmente, contudo, há uma percepção popular que, se não justifica, atenua o reproche a estes números, calcada principalmente na constatação de que os agentes policiais brasileiros se encontram submetidos a elevadas taxas de vitimização. Os números reais são mesmo suficientes para embasar essa percepção geral, afinal, durante o mesmo período acima citado (entre 2009 e 2016), 2.996 agentes policiais foram assassinados, tanto em serviço quanto fora dele.
Essa suposta contraposição de problemas envolve a discussão sobre a letalidade policial em um debate polarizado que dificulta a identificação das suas causas e da construção de soluções de ordem político-criminal. Não se pretende sustentar com isso que haja alguma prevalência da questão da letalidade sobre a vitimização policial. Esta outra chaga brasileira é tão danosa quanto aquela e reclama uma outra gama de providências estruturais próprias, merecedoras de outro estudo. Mas nosso objetivo aqui é tecer algumas considerações sobre a letalidade policial, com vistas a identificar as suas principais repercussões jurídicas.
Diga-se, além disso, que a proposta do presente texto não parte de uma premissa de desvalor intrínseco da atividade policial. Ora, semelhante conclusão seria descabida e inaceitável. Ao revés, o exercício da função própria pelos órgãos de segurança pública é imperativo indeclinável do regular funcionamento do Estado de Direito o qual, como o próprio nome indica, demanda a inafastável obediência aos ditames legais.
A letalidade policial à luz da legislação vigente
Em uma análise direta da legislação penal, extrai-se que o uso da força letal dos agentes de segurança só pode ser feito nos restritos contornos da legítima defesa (CP, art. 25). Embora as situações de risco sejam mais comuns aos agentes de segurança pública, tal qual ocorre com qualquer cidadão, no Brasil, só é possível a prática autorizada de um homicídio em situação de legítima defesa[5]. A morte provocada fora da excludente da ilicitude resulta na necessária responsabilização penal do autor do homicídio, impreterivelmente.
É certo que a análise dos requisitos da legítima defesa, em se tratando de ato praticado por um agente policial, experimenta modificações circunstanciais. A repulsa à injusta agressão, o uso moderado e os meios necessários são aferíveis a partir de peculiaridades do exercício da função desses agentes, que atuam de forma muito mais ampla quando comparados ao cidadão comum, movidos pelo chamado dever normativo de proteger[6], mas mediante treinamento e armamento específico. Aliás, como explica Rogério Sanches Cunha, em que pese a doutrina referir-se à objetividade destes requisitos, não se pode ignorar que devem ser aferidos a partir das valorações do agente e do agressor, tais como estado de ânimo, porte físico, nível de instrução, os hábitos e modo de vida dos envolvidos[7].
Não se pode descurar que a adoção de um modelo finalista pelo nosso Código Penal, calcado em categorias lógico-objetivas, não impede que sejam feitas análises casuísticas acerca das situações postas a debate e extraídos resultados também com a ponderação de critérios de ordem subjetiva.
É exatamente neste ponto que a análise jurídica da legítima defesa policial difere da convencional, especialmente porque a atuação desses agentes é regida por padrões de condutas específicos.
Uma primeira particularidade é a de que, não raro, o agente de segurança pública repele a injusta agressão identificada pelas suas atividades de policiamento (ostensivo ou investigativo), o que o impele a agir mediante técnicas e táticas voltadas à preparação prévia para embates, inclusive que buscam controlar distúrbios e desestimular o confronto armado. Daí o desenvolvimento de toda a doutrina e normas infralegais próprias sobre técnicas de policiamento, patrulhamento acompanhado, negociação, exibição de poderio bélico voltado à inibição de resistência, postura tática, disparos de alertas, técnicas de imobilização e de abordagem, uso de linguagem própria, uso progressivo da força etc, tudo orientado à resolução dos conflitos e desempenho da atividade policial menos danosa possível, que lança o uso da força letal depois que se esgotam os outros recursos.
Para se ter uma ideia da importância do assunto, buscando regulamentar o uso da força pela polícia e estabelecer parâmetros para a ação policial, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, por meio da Resolução nº 34/169, de 17/12/1979, aprovou o “Código de Conduta para os Policiais” (Code of Conduct for Law Enforcement Officials), que abrange normas gerais e específicas sobre o comportamento individual do policial, e o uso de força. Depois, em 18/12/1990, a fim de assegurar a efetiva implementação do Código de Conduta para os Policiais, a ONU realizou o 8º Congresso para Prevenção do Crime quando emitiu a Resolução 45/166, que estabelece os Princípios Básicos para o Uso da Força e das Armas de Fogo pelos Policiais (Basic Principles on the Use of Force and Firearms by Law Enforcement Officials)[8].
No Brasil, podemos encontrar alguns poucos marcos legais sobre o assunto. Um primeiro diploma a ser lembrado é a Lei nº 13.060/2014, que trata do uso dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública, em todo o território nacional. Esta lei possui disposições que regulam a atuação policial e que criam um padrão legal que pode servir para análise acerca da legítima defesa letal, especialmente no tocante à desproporcionalidade da reação policial frente uma atuação de policiamento. Com efeito, dispõe o seu art. 2º, parágrafo único, que “Não é legítimo o uso de arma de fogo:
I – contra pessoa em fuga que esteja desarmada ou que não represente risco imediato de morte ou de lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros; e
II – contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, exceto quando o ato represente risco de morte ou lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros[9]”.
Aliás, não é de hoje que a tentativa de uma normatização da atuação policial visa impedir o desbordo funcional, bastando lembrar os inúmeros procedimentos de operações-padrão disseminados pelas polícias do país afora, sobretudo na década dos anos 2000.
Protocolos de atuação funcional são fundamentais principalmente para impelir os agentes estatais a uma padronização profissional, voltada à busca por objetivos planejados e organizados pela instituição a que pertençam. Regulamentações procedimentais desta espécie repelem ações isoladas, individuais e improdutivas junto aos serviços públicos estatais. Neste ponto, cabe fazer menção à Portaria Interministerial 4.226/2010, que versa sobre o uso da força pelos agentes de segurança.
Como lembra Rogério Greco:
Os policiais somente estão autorizados a efetuar disparos com arma de fogo quando estiverem agindo numa situação de legítima defesa, seja ela própria ou mesmo de terceiros. No entanto, nem toda situação de legítima defesa permitirá o uso de arma de fogo. Nesse sentido, a Portaria Interministerial nº 4.226, de 31 de dezembro de 2010, determina, no tópico 3, verbis: 3. Os agentes de segurança pública não devem disparar armas de fogo contra pessoas, exceto em casos de legítima defesa própria ou de terceiro contra perigo iminente de morte ou lesão grave. Assim, por exemplo, se alguém estiver praticando um crime de furto e for surpreendido por um policial, não poderá este último, com a finalidade de evitar a consumação da mencionada infração penal, efetuar disparo em direção ao agente, mesmo que com a finalidade de, tão somente, intimidá-lo. O uso da arma de fogo, de acordo com a determinação interministerial, somente será permitido nas hipóteses relativas à legítima defesa e, ressalte-se, desde que essa ação de defesa seja necessária para preservar a vida ou a integridade física do policial ou de terceira pessoa. Nas demais hipóteses, em que também seria legítimo o raciocínio correspondente à legítima defesa, como no caso acima referido, está proibido o uso de arma de fogo. Ao contrário, quando a vida ou a integridade física do policial, ou de terceira pessoa, estiver em perigo, legitimada estará a utilização da arma de fogo, como no exemplo daquele que surpreende os agentes durante uma ação criminosa de roubo a banco e efetua disparos em direção à guarnição policial. Nesse caso, o uso da arma de fogo pela polícia está legitimado, devendo, no entanto, atender a todos os requisitos objetivos e subjetivos já analisados[10]”.
Na verdade, este tipo de regulamentação normativa se insere nas chamadas regras de engajamento[11], dirigidas ao controle de situações de ameaça à ordem pública, que delimitam as situações, proporcionalidade, modo, intensidade e quantidade de força que deve ser empregada nas operações de policiamento.
Neste sentido, pode ser citado também o chamado Método Girardi de Tiro Defensivo na Preservação da Vida, publicado no Manual de Tiro Defensivo – M-19-PM (1999), relacionado ao uso das armas de fogo, criado pela polícia militar de São Paulo e que busca preparar o agente estatal para oferecer uma resposta racional, mesmo em situações de perigo e alta tensão, de modo a agir para proteger a sua vida e de terceiros, preservar a integridade da instituição policial e manter a coerência com as normas e a ordem social.
Embora mais comumente feita pelas próprias agências policiais, há uma tendência pela edição de novas normas regulamentadoras da atuação policial por outras instituições, o que abre o espaço para a atuação do Poder Judiciário e para a próxima seção deste trabalho.
Regulamentação da atuação policial pelo Poder Judiciário
É verdade que inexiste proibição para que uma regulamentação como esta seja feita pelo Poder Judiciário.
Aliás, não se pode olvidar do disposto no art. 3º-F do Código de Processo Penal[12] que, embora suspenso pelo Supremo Tribunal Federal liminarmente nas ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305, prevê um papel regulamentador ao juiz das garantias referente à exploração da imagem dos presos e detidos, o que está a indicar que essa é uma prática em ascensão.
Especificamente quanto ao tema da letalidade policial, relembre-se que ele se encontra inserido na ADPF 635, a ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal, e que tem como pedido o estabelecimento de restrições à realização de operações policiais nas comunidades do Estado do Rio de Janeiro e mediante a necessária comunicação e justificativa da medida ao Ministério Público. A ADPF busca, assim, definir critérios para a atuação policial e, de algum modo, induzir protocolos que possam reduzir a letalidade dos agentes estatais.
No Brasil, é um tanto quanto incomum o Poder Judiciário fixar diretrizes como esta, mesmo porque uma decisão estrutural, entendida como aquela que busca implantar uma reforma ampla relacionada a uma política pública, pressupõe adoção de medidas e provimentos específicos incomuns. Embora mais debatido no âmbito do processo civil, a teoria do processo estrutural pode ser aplicada no processo penal, como inclusive já foi feito pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento da ADPF nº 347 que tratou do sistema prisional do Brasil e restou adotada a teoria do Estado de Coisas Inconstitucional. De forma resumida, naquele caso, restou-se reconhecida uma violação generalizada e sistêmica de direitos fundamentais de determinados cidadãos ante a inércia ou incapacidade reiterada das autoridades públicas em modificá-la e, a partir disso, a Corte procura estruturar uma atuação orgânica, mediante a integração de várias autoridades, com vistas a corrigir essas ilegalidades.
Esse parece ser o contorno a ser dado pela ADPF nº 635 que claudica sobre a adoção de medidas que busquem uma reorganização e uma estruturação material das instituições policiais envolvidas no controle da segurança pública, visando à melhoria do tema relativo à letalidade policial.
Mas, como dito, a atuação do Poder Judiciário em casos assim reclama a tomada de medidas que reestruturem toda uma política pública, voltada à adoção de medidas protetivas dos direitos fundamentais envolvidos na questão. É certo, contudo, que a inovação de uma política criminal, notadamente quando capitaneada pelo Poder Judiciário, deve estar embasada em indicadores concretos acerca do ilícito e levar em conta a participação das agências de segurança, a fim de colher elementos acerca da viabilidade operacional, possibilidade orçamentária e diminuição da resistência das medidas fixadas. E mais, deve considerar ainda os parâmetros da legalidade – exigência nascida da própria ideia de legitimidade – se forma a ser descabida a intromissão direta e frontal do Poder Judiciário em matéria reservada ao império da lei em sentido estrito.
Segundo aponta a doutrina especializada, quando chamado a decidir litígios estruturais, o Poder Judiciário quase nunca utiliza argumentos comprometidos com a reconstrução técnica e racional da política pública confrontada. Geralmente, limita-se a argumentos de índole estritamente técnico-jurídica, dissociada dos campos do saber relacionados à Ciência Política, Ciência da Administração e Gestão Pública, necessários para aferir as razões para efetividade ou não de determinada política pública[13].
Além de evitar este tipo de erro, em casos assim, é absolutamente necessário que uma decisão destinada ao controle de uma política pública como essa leve em conta seu caráter volátil, apta a conferir-lhe correspectividade e ordens diretamente associadas à evolução do problema no tempo[14].
Além disso, é imprescindível que uma decisão judicial neste tipo de processo seja conjugada com atividades de outros agentes públicos, de maneira a traçar uma trama de competências capaz de superar o isolacionismo institucional que dificulta a obtenção dos resultados pretendidos.
Um importante ponto de cuidado que uma decisão como esta deve ter é a não criação de rotinas que ampliem as formalidades cartoriais que burocratizem, desnecessariamente, os procedimentos investigatórios brasileiros. O enfrentamento da letalidade policial não pode mecanizar ou engessar o trabalho policial, mediante construção de formalidades como preenchimento de relatórios, aposição de carimbos, encartes de documentos etc, mesmo porque é impossível ignorar que a realidade dos fatos e da rotina de combate à criminalidade é pautada por juízos de valor incompatíveis com procedimentalizações aritméticas[15].
Levando em conta essa preocupação, visando ao enfrentamento da letalidade policial, são indicadas adoção de protocolos de atuação direcionados ao uso progressivo da força e de controle de distúrbios capazes de moldar e preparar corretamente os agentes estatais. Essas diretrizes devem estabelecer critérios técnicos para a atuação voltada à autodefesa ou defesa alheia, mediante o cotejo dos riscos que sua ação pode gerar a terceiros.
Também são recomendáveis adoção de medidas semelhantes àquelas já mencionadas no Protocolo de Minnesota que trata da investigação de casos envolvendo uso letal da força policial. De acordo com o referido documento, resumidamente, esses casos devem contar com investigações independentes, com participação das vítimas, de seus familiares e da sociedade civil, além de medidas relacionadas ao fortalecimento da perícia técnica.
Deve-se atentar ainda ao seguinte:
“A Corte Interamericana de Direitos Humanos, ao condenar o Estado brasileiro por diversas violações aos direitos humanos no julgamento do caso Favela Nova Brasília, enfatizou que, havendo suspeita da prática de crimes graves por membros da polícia, a investigação deve ser conduzida por órgão suficientemente independente das pessoas ou estruturas cuja responsabilidade esteja sendo apurada, como o Ministério Público. A sentença, embasada em diversos julgados da Corte Europeia de Direitos Humanos, ressalta que, em conjunturas tais, há alta probabilidade de contaminação da investigação, em virtude da parcialidade de seus gestores, pois se observa que: a) os investigadores são suspeitos em potencial ou são colegas dos acusados ou com eles mantêm relação hierárquica; b) há falhas na adoção de determinadas medidas fundamentais para elucidar o caso e, oportunamente, punir os responsáveis; c) é conferido peso excessivo à versão dos suspeitos, deixando-se de explorar outras linhas de investigação claramente lógicas e necessárias; d) verifica-se inércia excessiva na determinação e cumprimento das diligências[16]”.
Por fim, mas não menos importante, uma decisão de reestruturação de uma política criminal voltada ao enfrentamento da letalidade policial não pode ignorar as dificuldades estruturais relacionadas ao desempenho das funções policiais e a sua etnometodologia atual. Ganha relevância a análise da rotina das instituições policiais, bem como suas carências de recursos financeiros, logísticos e materiais, circunstâncias que repercutem diretamente na qualidade da tomada das decisões desses agentes estatais quando da atuação concreta.
Isso significa que, para além do estabelecimento de normas de regulamentação do uso progressivo da força e do incremento de medidas de supervisão e punição dos casos de desvios funcionais, a questão sobre a letalidade policial passa pelo incremento relacionado:
- à melhoria das condições de trabalho dos agentes de segurança, com suporte adequado referente ao efetivo humano suficiente para criação de escalas de serviço e descanso condizente com a atividade desempenhada, apoio emocional mediante padrão remuneratório adequado;
- oferecimento de treinamentos que visem dar ao agente subsídios para a tomada da decisão do grau de força a ser usada,
- emprego de ferramentas e equipamentos tecnológicos avançados voltados à melhoria no desempenho do policiamento, inibição do abuso de autoridade e melhoria na apuração dos ilícitos. Disponibilização de armas não letais, promoção de gravações e filmagens durante a operação policial e durante depoimentos colhidos nas investigações tendem a conferir mais celeridade.
Conclusão
É certo que urge a estruturação de uma política criminal capaz de melhorar os índices alarmantes relacionados à letalidade policial no Brasil, o que deve envolver as várias instituições relacionadas à segurança pública em torno da questão.
A maior dificuldade deste arranjo resolutivo está na complexidade do tema, fruto da identificação de suas várias causas que possuem, individualmente, diferentes tipos de soluções.
Sem essa percepção, corre-se o risco de imaginar que uma única decisão com uma providência episódica, magicamente, seja capaz de sanar o problema, o que nos remete à sentença feita pelo jornalista norte-americano H.L. Mencken, “para todo problema complexo, existe uma solução simples, fácil e completamente errada”[17].
Espera-se que a complexidade do tema referente à letalidade policial envolva uma gama de atividades estruturais, metodologicamente voltadas à construção de uma política criminal eficaz à sua solução.
REFERÊNCIAS
ÁVILA, Luciano Coelho. Políticas Públicas de prestação social: entre o método, a abertura participativa e a revisão judicial. Belo Horizonte: D’Plácido.
BRASIL. Conselho Nacional do Ministério Público. Manual de atuação para membros do Ministério Público em crimes violentos leitais intencionais. 2021.
BUSATO, Paulo Cesar. Direito Penal: Parte geral. vol. 1. 5. ed. são Paulo: Atlas, 2020.
CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1° ao 120). 8.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2020.
DAHER. Lenna Luciana Nunes. Ministério Público Resolutivo e o Tratamento Adequado dos Litígios Estruturais – Coleção Ministério Público Resolutivo – Belo Horinzonte: D’Plácido, 2019.
FERREIRA, Suely Pereira. A legítima defesa: como caracterizá-la em operação de Garantia da lei e da ordem (GLO). IN: Direito Militar Brasileiro: controvérsias, atualidades e análises. Salvador: Editora Direito Levado a Sério. 2020.
GRECO, Rogério. Atividade policial: aspectos penais, processuais penais, administrativos e constitucionais. 10ª edição. Niteroi-RJ: Impetus, 2020.
HUNGRIA. Nelson. Comentários ao Código Penal. V. 1 Rio de Janeiro: Forense, 1994.
MENCKEN, de Henry Louis. Prejudices: Second Series. 1920.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: volume I: parte geral. 9ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2011. p. 508
ZILLI, Luís Felipe. Letalidade e Vitimização Policial: características gerais do fenômeno em três estados brasileiros. In: repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/8873/1/bapi_17_cap_10.pdf.
[1]Mestre em Direito. Promotor de Justiça em Mato Grosso. Membro Auxiliar do Conselho Nacional do Ministério Público. Professor e autor de obras jurídicas.
[2] Pós-graduado em Direito e Processo Penal pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Promotor de Justiça em Mato Grosso. Professor e autor de obras jurídicas.
[3] Doutora em Direito. Procuradora da República. Professora e autora de obra jurídica.
[4]ZILLI, Luís Felipe. Letalidade e Vitimização Policial: características gerais do fenômeno em três estados brasileiros. In: repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/8873/1/bapi_17_cap_10.pdf.
[5]Não se ignora a discussão em torno do disposto na Lei nº 9.614/98, também conhecida como Lei do Abate, que autoriza a derrubada de aeronaves civis que adentrem o espaço aéreo brasileiro sem autorização, ou que se recusem a obedecer às ordens emanadas pela autoridade competente, mas cuja excepcionalidade não justifica, neste momento, maiores aprofundamentos dogmáticos.
[6]BUSATO, Paulo Cesar. Direito Penal: Parte geral. vol. 1. 5. ed. são Paulo: Atlas, 2020. p. 704.
[7]CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1° ao 120). 8.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2020. p. 336.
[8]Destaque-se o disposto no item 9 da Resolução: “9. Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei não devem fazer uso de armas de fogo contra pessoas, salvo em caso de legítima defesa, defesa de terceiros contra perigo iminente de morte ou lesão grave, para prevenir um crime particularmente grave que ameace vidas humanas, para proceder à detenção de pessoa que represente essa ameaça e que resista à autoridade, ou impedir a sua fuga, e somente quando medidas menos extremas se mostrem insuficientes para alcançarem aqueles objectivos. Em qualquer caso, só devem recorrer intencionalmente à utilização letal de armas de fogo quando isso seja estritamente indispensável para proteger vidas humanas”.
[9]Essa previsão legal, parece responder e trazer para o plano normativo a lição dada por Zafarroni e Pierangeli “Tanto em relação à legítima defesa, como ao de cumprimento do dever legal, uma pergunta se impõe: é admissível a morte de uma pessoa para evitar a sua evasão, porque não acata a sua detenção, e, particularmente, pode-se usar armas para matá-la em tais casos? Considerando-se ser a moderação um dos requisitos da legítima defesa não nos parece, de modo algum, admissível o homicídio como meio legítimo para que um Estado de Direito defenda a administração de sua justiça. Os regulamentos que, em sentido contrário, contrariam este princípio e autoriza utilização de armas para a causação da morte, ou à custa da morte do fugitivo, são manifestamente inconstitucionais em qualquer Estado de Direito, as ações dos agentes do poder público, ou de particulares em tais situações constituem homicídios. (ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: volume I: parte geral. 9ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2011. p. 508).
[10]GRECO, Rogério. Atividade policial: aspectos penais, processuais penais, administrativos e constitucionais. 10ª edição. Niteroi-RJ: Impetus, 2020. p. 169.
[11]“Internacionalmente conhecidas pelo acrônimo ROE (do inglês Rules of Engagement). No Brasil, o ‘Glossário das Forças Armadas” (MD35-G-01) assim define o que sejam as ROE: “REGRAS DE ENGAJAMENTO – Caracteriza-se por uma série de instruções pré-definidas que orientam o emprego das unidades que se encontram na área de operações, consentindo ou limitando determinados tipos de comportamento, em particular o uso da força, a fim de permitir atingir os objetivos políticos e militares estabelecidos pelas autoridades responsáveis. Dizem respeito à preparação e à forma de condução tática dos combates e engajamentos, descrevendo ações individuais e coletivas, incluindo as ações defensivas e de pronta resposta’” (FERREIRA, Suely Pereira. A legítima defesa: como caracterizá-la em operação de Garantia da lei e da ordem (GLO). IN: Direito Militar Brasileiro: controvérsias, atualidades e análises. Salvador: Editora Direito Levado a Sério. 2020. p. 150).
[12]Art. 3º-F. O juiz das garantias deverá assegurar o cumprimento das regras para o tratamento dos presos, impedindo o acordo ou ajuste de qualquer autoridade com órgãos da imprensa para explorar a imagem da pessoa submetida à prisão, sob pena de responsabilidade civil, administrativa e penal.
Parágrafo único. Por meio de regulamento, as autoridades deverão disciplinar, em 180 (cento e oitenta) dias, o modo pelo qual as informações sobre a realização da prisão e a identidade do preso serão, de modo padronizado e respeitada a programação normativa aludida no caput deste artigo, transmitidas à imprensa, assegurados a efetividade da persecução penal, o direito à informação e a dignidade da pessoa submetida à prisão.
[13]ÁVILA, Luciano Coelho. Políticas Públicas de prestação social: entre o método, a abertura participativa e a revisão judicial. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016.
[14]DAHER. Lenna Luciana Nunes. Ministério Público Resolutivo e o Tratamento Adequado dos Litígios Estruturais – Coleção Ministério Público Resolutivo – Belo Horinzonte: D’Plácido, 2019. p. 60-61
[15]Esse tipo de cuidado valorativo está contido, por exemplo, na lapidar e histórica lição de Nelson Hungria sobre a moderação da legítima defesa: “A apreciação deve ser feita objetivamente, mas sempre de caso em caso, segundo um critério de relatividade, ou um cálculo aproximativo; não se trata de pesagem em balança de farmácia, mas de uma aferição ajustada às condições de fato do caso vertente; não se pode exigir uma perfeita equação entre o quantum da reação e a intensidade da agressão” (HUNGRIA. Nelson. Comentários ao Código Penal. V. 1 Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 461).
[16]Brasil. Conselho Nacional do Ministério Público. Manual de atuação para membros do Ministério Público em crimes violentos leitais intencionais. 2021. p. 17-18.
[17]MENCKEN, de Henry Louis. Prejudices: Second Series. 1920. p. 158.