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Do procedimento extrajudicial e o acesso ao agente de execução no PL 6.204/19: anverso e reverso
Joel Dias Figueira Júnior
10/06/2021
Arruda Alvim[1] e Joel Dias Figueira Júnior[2]
O inovador Projeto de Lei 6.204/19 de autoria da Senadora Soraya Thronicke que dispõe sobre a desjudicialização da execução civil de título executivo judicial e extrajudicial traz em seu bojo regramento atinente ao processamento destes feitos perante os tabelionatos de protestos, cujo acesso se dá de forma absoluta aos agentes de execução, responsáveis pela administração dos procedimentos extrajudiciais desta espécie, a exemplo dos exitosos modelos normativos adotados em Portugal e França.
Esses “sistemas” apresentam-se de forma híbrida ou mista, na exata medida em que o Estado-juiz permanece do início ao fim à disposição das partes para manter a observância do devido processo legal, enquanto a prática dos atos executivos propriamente ditos realizam-se por meio da atuação de um terceiro imparcial – “agente de execução” ou “huissier de justice”. Em outras palavras, tem-se um processo executivo desjudicializado sem perder a sua natureza jurisdicional.
De início, destaca-se inexistir qualquer inconstitucionalidade ou ilegalidade[3] acerca da opção feita pelo legislador no tocante ao direcionamento do processo extrajudicial exclusivamente ao tabelião de protestos,[4] tratando-se de escolha baseada em razões suficientemente hábeis a respaldar tal definição.[5]
O tema da “obrigatoriedade” ou “facultatividade” como vetor de acesso à justiça[6] não é novo em doutrina ou em sede legislativa – em que pese pouquíssimo explorado, sobretudo quando se trata de desjudicialização – merecendo destaque a curiosa situação normativa brasileira em que se inserem os procedimentos dos Juizados Especiais, ora facultativo (Juizados Estaduais Cíveis – Lei 9.099/95, art. 3º, § 3º), ora obrigatório (Juizados Fazendários – Lei 12.153/09, art. 2º, § 4º e Juizados Federais – Lei 10.259/01, art. 3º, § 3º).
Percebe-se, facilmente, que o tema encontra como ponto de partida a vontade do legislador motivada em elementos que resultam do cotejo analítico das possíveis vantagens e desvantagens de uma ou outra escolha a ser feita nesta seara.
Diferentemente de outros ramos da ciência, o Direito não dispõe de laboratórios para testar as teses firmadas, valendo-se do mundo empírico para chegar a determinadas conclusões, donde exsurge a importância da doutrina, da jurisprudência e da comparação com sistemas normativos alienígenas para bem orientar o legislador em suas opções, ao que se agrega outros fatores de ordem política, social, econômica, religiosa etc.
No caso do PL 6.204/19 convém assentar que várias foram as razões que levaram o legislador em optar pela definição do modelo que absorve os contornos do procedimento extrajudicial não facultativo para a execução civil. Neste breve estudo procuraremos demonstrar os principais fundamentos desta escolha, sem perdermos de vista a dimensão do “outro lado da moeda” que também porta consigo alguns atrativos, que não podem e não devem ser desconsiderados para uma reflexão séria a respeito do tema posto.
Vejamos, então, os principais fundamentos que sustentam a opção legislativa:
1º) imbricar o conteúdo normativo com a política do Poder Judiciário que absorveu integralmente a Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas e inseriu-se em 2018 de forma pioneira no programa voltado aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável/ODS e, para tanto, estabeleceu a Meta 9 cujo mote é a prevenção de conflitos e a desjudicialização.[7]
Aliás, registra-se en passant que o tema em voga tem recebido atenção especial por parte do emérito professor e processualista, Ministro Luiz Fux, notadamente após assumir a Presidência da Corte Constitucional e do Conselho Nacional de Justiça, a começar pelo seu discurso de posse (10/9/20) ao frisar os “cinco eixos” de base para a sua gestão, todos alinhados aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas;[8]
2º) seguir a mesma linha dos modelos legislativos estrangeiros exitosos com os procedimentos executivos extrajudiciais não facultativos e que encontram a mesma origem e identidade normativa (civil law ou romano-canônico), notadamente Portugal e França;
3º) reduzir o excessivo volume de demandas que tramitam no Poder Judiciário (77mi), desjudicializando de forma rápida e gradativa[9] as execuções fundadas em títulos judiciais e extrajudiciais (aproximadamente 13 milhões de demandas = 17% de todo o acervo);
4º) como consequência imediata, oferecer aos jurisdicionados o acesso pleno e irrestrito aos cartórios extrajudiciais, que representam garantia para os consumidores desses serviços, prestados com extrema segurança jurídica, transparência, celeridade, publicidade, responsabilidade e qualidade acima dos padrões, fato este reconhecido por todos os usuários,[10] pelas Corregedorias-Gerais de Justiça e pelo Conselho Nacional de Justiça;
5º) direcionar com segurança o jurisdicionado para o caminho a ser seguido em busca da pretensão recuperatória de crédito fundado em título executivo;
6º) recuperar mais rapidamente os créditos represados pela inadimplência e recalcitrância do devedor, notadamente com a prática do protesto antecipado,[11] o que refletirá a curto e médio prazos no fomento gradativo da economia nacional;
7º) de plano, disponibilizar aos jurisdicionados o acesso a um elevado número de serventias extrajudiciais (muito superior ao número de varas e juízes com competência cível)[12], pois é assente que dos 99 tabelionatos de protestos espalhados por todo o Brasil nas capitais com atribuição específica[13], somam-se a eles as demais serventias que cumulam atribuições alusivas às notas, protestos e registros, perfazendo um total de 3.779 cartórios extrajudiciais capilarizadas por todos os rincões do País; a este número, acrescenta-se 3.779 serventuários substitutos (subtotal de 7.558 servidores) e, a este resultado expressivo, mister ainda considerar que, em média, cada cartório é dotado de 5 funcionários, totalizando em 18.895 prepostos que, somados aos titulares e substitutos, representam um efetivo de nada mais nada menos do que aproximadamente 26.453 servidores extrajudiciais, aptos a colocar em prática o procedimento de execução extrajudicial de títulos executivos conforme definido no PL 6.204/19;
8º) reflexo imediato na redução de demandas executivas em tramitação no Poder Judiciário, de maneira a conferir aos Magistrados e serventuários a possibilidade real de direcionamento de seus esforços e tempo de trabalho para os processos que exigem do Estado-juiz a efetiva prestação de tutela jurisdicional (conhecimento e de urgência);
9º) impactar rapidamente na redução de despesas para os cofres públicos. Segundo dados oficiais, um processo custa em média R$ 5.000,00 e, ao multiplicarmos esta quantia por 13 milhões de demandas chega-se ao resultado de aproximadamente 65 bilhões de reais, importância a ser em economizada em pouco tempo pelo Poder Judiciário;
10º) reduzir custos em investimentos futuros e de manutenção do funcionamento do Judiciário, na medida em que, com a diminuição de demandas executivas, tornar-se-á desnecessária a criação de novas varas cíveis, cargos de juízes e de serventuários, além de instalações físicas e equipamentos para o desempenho desse mister. Com a desjudicialização da execução civil, todos os custos financeiros dos investimentos voltados à prestação desses serviços serão repassados para os delegatários da função pública, que a exercem em caráter privado;
11º) permitir que os tabeliães de protesto possam melhor realizar os ajustes necessários de infraestrutura (física e de pessoal) em suas serventias para, desde o início, bem atender os consumidores desses novos serviços, que serão por eles prestados;
12º) conferir segurança para o planejamento financeiro e estratégico de atuação dos serventuários extrajudiciais que exercerão de forma específica ou cumulativa as atribuições de “agentes de execução”, tendo em vista que poderão aferir com maior precisão o número de demandas executivas que aportarão em seus cartórios e, assim, melhor dimensionar e programar o fluxo de trabalho na administração desses procedimentos (organização técnica e administrativa).
Por outro lado, não se pode desconsiderar que o critério não adotado pelo legislador (facultatividade procedimental extrajudicial) pode trazer consigo algumas outras vantagens, como veremos a seguir, porém, de menor envergadura quando confrontado com a opção feita pelo PL 6.204/19 (art. 6º e 7º).
Um dos argumentos utilizados pelos que defendem a facultatividade procedimental da execução extrajudicial repousa na bem sucedida tradição jurídico-normativa que há muito trilhamos com a prática da desjudicialização, iniciada há 17 anos[14] com a Lei 10.931/2004, que instituiu a retificação do registro imobiliário sem a atuação do Estado-juiz, seguindo-se a edição de tantas outras, tais como o inventário, separação e divórcio (Lei nº 11.441/2007), da retificação de registro civil (Lei nº 13.484/2017) e da usucapião instituída pelo Código de 2015 (art. 1.071 – LRP, art. 216-A).
Verifica-se, contudo, um forte traço distintivo entre a proposta contida no PL 6.204/19 com as leis mencionadas, qual seja, o caráter meramente administrativo (“jurisdição voluntária”) daqueles procedimentos, que se realizam unilateralmente ou de forma consensual, enquanto a execução extrajudicial perfectibiliza-se a partir de pretensão insatisfeita[15], pois fundada em título líquido, certo e exigível, com desdobramentos previsíveis de atos diversos executivos, tais como citação, penhora, expropriação e alienação de bens do executado, sem contar com a possibilidade de incidentes processuais, embargos do devedor, de terceiro etc., salvo se ocorrer o pagamento da dívida antes ou após o protesto, em cumprimento espontâneo de sentença condenatória de quantia certa ou em face de autocomposição.
Afigura-se também equivocada a conclusão de que a facultatividade levaria a concorrência de acessos mediante critério de escolha do credor, hábil a dar ensejo à permanente e crescente melhora dos serviços a serem prestados pelos cartórios extrajudiciais.
Talvez, em casos excepcionais, esse resultado possa vir a ocorrer; contudo, não se pode olvidar que “os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público” (CF, art. 236). Significa dizer que, neste ponto, a busca por prestação de serviços cada vez mais qualificados em prol do consumidor é uma constante nas serventias extrajudiciais, pois decorre do cumprimento de um dever legal (sob pena de …)[16] assim como dá ensejo à percepção de seus emolumentos e, com isso, a própria sobrevivência de todos os integrantes das serventias.
Outro aspecto a ser destacado respeita ao propalado assentimento prévio do devedor a fim de que o credor possa percorrer o procedimento extrajudicial; com todas as vênias, trata-se de compreensão equivocada sobre o direito de agir, em especial em se tratando de execução cuja demanda traz consigo pretensão qualificada (mais do que resistida, insatisfeita) diante da recalcitrância do devedor em quitar a sua dívida. É no mínimo ingênuo pensar que o devedor daria o seu consentimento para ser executado em procedimento extrajudicial, pois todos os indicadores apontam para a obtenção de um resultado mais célere e satisfatório em prol do credor, quando comparado com os dados obtidos na jurisdição estatal. Ademais, o devedor poderá a qualquer momento do procedimento extrajudicial, sempre que se fizer necessário, acessar o Estado-juiz, segundo se infere do disposto nos arts. 18 e 21 do PL 6.204/19.
Também não há qualquer paralelo entre a via extrajudicial da execução civil com a via jurisdicional arbitral; isto porque a arbitragem encontra-se revestida de natureza jurisdicional negocial, fundada na autonomia da vontade das partes contratantes, ou seja, jurisdição de caráter privado prestada por árbitros (juízes de fato e de direito – LA art. 18), enquanto o tabelião de protestos na qualidade de agente de execução exercerá apenas atribuições administrativas executivas procedimentais. [17]
Digamos que um dos pontos positivos do regime da facultatividade resida na possibilidade de escolha pelo credor entre os dois sistemas, norteando-se de acordo com a via que melhor atenda às suas expectativas voltadas à qualidade dos serviços prestados pelo Estado-juiz ou agente de execução. De fato, não se pode desconsiderar que, em determinado tempo e local, os serviços podem estar sendo oferecidos aos consumidores com melhor qualidade e rapidez em sede judicial ou extrajudicial, por exemplo, nos casos de serventias vagas ou com serviços deficitários, ausência frequente de juiz titular por razões diversas, falta de oficiais de justiça ou de outros serventuários etc.
Vale refletir e tentar mensurar se a excepcionalidade dos casos deve definir a regra de regência dos procedimentos executivos extrajudiciais, no cotejo entre as “vantagens” e “desvantagens”.
Já ouvimos dizer também, que a facultatividade viria ao encontro dos interesses do credor, pois solucionaria o problema da insuficiência do número de tabeliães de protesto, porquanto em desproporção com o elevado número de demandas executivas em curso e aos 4 milhões de novas ações que aportam, em média, a cada ano, conforme os últimos dados obtidos no Justiça em Números.
Trata-se, com a devida vênia, de um falso problema, que se origina em equívoco de avaliação de dados concretos, vejamos: mister se faz repetir que os indicadores atuais apontam para um número expressivo de serventias extrajudiciais (3.779) capazes de absorver de maneira qualitativa e quantitativa a nova atribuição que será imposta aos tabeliães de protesto como agentes de execução.
Por outro lado, os tribunais locais, através de suas corregedorias e o Conselho Nacional de Justiça, em conjunto com as serventias extrajudiciais, estarão durante a vacatio legis envidando todos os esforços para obter o melhor resultado prático possível, em prol dos jurisdicionados, desde a entrada em vigor da norma regente da execução civil extrajudicial; aliás, o legislador teve o cuidado de tratar sobre esse tema nos arts. 22 a 29 do PL 6.204/19.
Além disso, ao primeiro sinal de insuficiência do número de cartórios para atender essas demandas, os Tribunais de Justiça darão início aos procedimentos administrativos voltados à abertura de concursos públicos para esse fim; frise-se que esse diagnóstico preliminar já está sendo feito por alguns Tribunais com os olhos voltados para o breve futuro que se avizinha.
Há de se observar ainda, que a facultatividade estará presente em se tratando de título executivo extrajudicial de valor não excedente a 40 salários mínimos ou sentenças condenatórias para pagamento de soma oriundas dos Juizados Especiais Cíveis, tendo-se como certo que o modelo previsto no PL 6.204/19 não exclui ou se sobrepõe à Lei 9.099/95 (art. 3º, § 3º c/c art. 53), ao que se acrescenta o benefício irrestrito da gratuidade em primeiro grau de jurisdição (art. 54), ou, ainda, a possibilidade conferida ao jurisdicionado de postular em causa própria sem a representação de advogado, em demandas de até 20 salários mínimos (art. 9º).
Por seu turno, é inegável que algumas das vantagens acima elencadas e as razões que levaram o legislador a fazer a escolha pela vinculação do acesso único aos tabelionatos de protesto, não deixariam de existir se a opção procedimental fosse pela “facultatividade”. Contudo, o que se deve considerar – por ser de fundamental importância – é que a forma, a extensão e o tempo de obtenção dos resultados almejados terminarão reduzidos, ofuscados e perderão sensivelmente o seu impacto positivo quando confrontados entre si os dois modelos, a começar pela letárgica redução de demandas executivas, que tanto assoberbam o Poder Judiciário e assombram os jurisdicionados.
Nada obstante estarmos seguros de que a melhor opção encontra-se bem traçada no texto do PL 6.204/19, talvez seja de bom alvitre escaparmos do dualismo em busca de uma “via de meio” que possa, num primeiro momento de entrada em vigor da nova lei, adequar-se às diferentes realidades sempre encontradas em nosso País de dimensões continentais, além de harmonizar os entendimentos dos estudiosos preocupados com esse tema, todos desejosos por encontrar o melhor caminho legislativo para os jurisdicionados… digamos: nem tanto ao mar, nem tanto à terra.
A ideia que trazemos a lume não é nova, mas precisa ser amadurecida. Trata-se da possibilidade de se criar uma regra de transição entre a facultatividade e a obrigatoriedade de acesso ao agente de execução, como forma intermediária de implementação do novo sistema, quiçá com menor risco e percalços que possam, eventualmente, surgir de início e, assim, obter-se resultados práticos mais profícuos com a desjudicialização da execução civil, ou seja, institui-la de forma gradativa.
Esta talvez possa vir a ser uma boa alternativa entre os dois modelos apresentados, além de servir como elemento pacificador e de convergência de ideias, em que a facultatividade venha a ser admitida por determinado tempo (dois anos, por exemplo); essa fase de transição estaria sendo administrada e controlada pelos Tribunais de Justiça, conforme programas preestabelecidos pelas Corregedorias-Gerais, voltados ao atendimento das particularidades de cada comarca, em estreita sintonia com as serventias extrajudiciais, de maneira a permitir o acesso obrigatório ao agente de execução (ressalvadas as hipóteses previstas no art. 1º, p. único do PL e de opção pelos Juizados Especiais Cíveis) somente quando verificada a adequação satisfatória dos novos serviços a serem ofertados aos consumidores do direito, o que poderá ocorrer desde a entrada em vigor da nova lei ou dentro do prazo limite por ela estipulado.
Destarte, não se pode olvidar que, se por um lado a implementação imediata do modelo previsto no PL 6.204/19 trará consigo grandes vantagens, por outro, poderá acarretar dificuldades de ordem prática em algumas localidades, terminando por impedir, momentaneamente, o oferecimento dos novos serviços com os resultados satisfatórios.
Parece-nos que a transitoriedade entre os dois sistemas possa vir a ser uma alternativa razoável capaz de atender bem as expectativas dos jurisdicionados, do Poder Judiciário e dos advogados.
É bem verdade que toda moeda tem dois lados… mas só um deles é capaz de identificar o seu valor. Anverso ou reverso?
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[1] Livre-Docente e Doutor pela PUC/SP. Professor titular de Direito Civil do mestrado e doutorado da PUC/SP. Membro da Academia Paulista de Direito e da Academia Brasileira de Direito Civil. Membro honorário do IBDP e Membro emérito do IASP. Foi Procurador da Fazenda Nacional e Desembargador do TJSP. Foi revisor do novo CPC na Câmara dos Deputados. Diretor e fundador da Revista de Processo. Advogado, Parecerista e Consultor Jurídico.
[2] Pós-doutor pela Università degli Studi di Firenze e Doutor pela PUC/SP. Membro da Academia Brasileira de Direito Civil e do IBDP; Professor de Cursos de Pós-graduação do CESUSC; foi Presidente da Comissão de Juristas que elaborou o anteprojeto de lei que deu origem ao PL 6.204/19; integrou a Comissão Especial de Assessoria da Relatoria-Geral do Código Civil na Câmara dos Deputados. Membro do Comitê Brasileiro de Arbitragem-CBAr. Desembargador aposentado do TJSC, Advogado, Parecerista e Consultor Jurídico.
[3] Sobre esse tema, v. Joel Dias Figueira Jr., estudo intitulado “Da constitucionalidade da execução civil extrajudicial – análise dogmática do PL 6.204/2019” (in Reflexões sobre a desjudicialização da execução civil. Coletânea de estudos, coord. Elias Medeiros Neto e Flávia Ribeiro. Curitiba, Juruá, 2020, pp. 517/544).
[4] O art. 1º, parágrafo único do PL 6.204/19 excepciona algumas hipóteses em razão da qualidade das partes interessadas, in verbis:“Não poderão ser partes, na execução extrajudicial instituída por esta Lei, o incapaz, o condenado preso ou internado, as pessoas jurídicas de direito público, a massa falida e o insolvente civil”.
[5] Esse é também o modelo absorvido no PL 3.999/19, de autoria do Deputado Federal Ugo Leal, que dispõe sobre o despejo extrajudicial e a consignação extrajudicial de chaves, e para tanto altera a Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, segundo se infere da redação contida no art. 2º, ao inserir o art. 66-B na lei de locações, in verbis: “Art. 66-B. A fim de promover o despejo extrajudicial, o locador requererá ao Tabelião do Ofício de Notas situado na comarca do imóvel locado, que lavre ata notarial, na qual deverá constar cada fase do procedimento a seguir descrito.”
[6] “Acesso à justiça” assim considerado como todos os meios e mecanismos de resolução de controvérsias colocados à disposição dos jurisdicionados, ou seja, equivalentes jurisdicionais.
[7] O Programa Mundial de Desenvolvimento Sustentável liderado pela Organização das Nações Unidas define objetivos e metas a serem cumpridas até 2030, das quais três delas estão intimamente relacionadas com o tema das Alternative Dispute Resolution (ADR), na exata medida em que convergem para a promoção do Estado de Direito por intermédio da garantia igual e para todos do acesso à justiça (“Meta 16.3”), o que se perfaz por intermédio do desenvolvimento de instituições eficazes, responsáveis e transparentes (“Meta 16.6”), com a garantia da tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis (“Meta 16.7”).
[8] . Considerando-se os “cinco eixos” de atuação destacados pelo Ministro Fux para a sua gestão frente ao STF E CNJ dois deles estão intimamente relacionados com o tema em exame, quais sejam: “a garantia da segurança jurídica conducente à otimização do ambiente de negócios no Brasil” e o “incentivo ao acesso à justiça digital”.
Dando sequência ao seu projeto de gestão, o Ministro Fux instituiu em dezembro de 2020 um Grupo de Trabalho (Portaria 272 de 4/12/20, complementada pelas Portarias n. 285 de 11/12/20, n. 6 de 14/1/21, n. 42 de 3/2/21, n. 50 de 11/2/21) formado por renomados professores, advogados, magistrados, notários e registradores (Grupo este que tenho a honra de integrar) objetivando diagnosticar, avaliar e apresentar medidas voltadas à modernização e efetividade de atuação do Poder Judiciário, encontrando-se em pauta dentre outros assuntos, a desjusicialização e o PL 6.204/19.
[9] Vale lembrar que o PL em exame não admite a redistribuição de demandas em curso no Judiciário quando da entrada em vigor da nova lei, salvo se requerido pelo credor e desde que as serventias extrajudiciais estejam em condições adequadas para recebê-las e bem processa-las (art. 25).
[10] Registra-se que dados obtidos através de estudos feitos pelo Instituto de Pesquisa Datafolha (2016-2017) em âmbito nacional a respeito da satisfação dos consumidores em face dos serviços prestados pelos Cartórios Extrajudiciais, indicaram índices excepcionais de aprovação, inclusive liderando no quesito “confiabilidade”, à frente das instituições religiosas, Ministério Público, bancos, forças armadas e até do Poder Judiciário, dentre outros, além de liderar também a qualidade nos serviços públicos. Os levantamentos efetuados indicam também que a população é contrária à migração desses serviços para órgãos públicos ou empresas privadas (https://www.acritica.net/editorias/geral/pesquisa-datafolha-com-usuarios-elege-cartorios-como-instituicao-mais/186904/ – acesso em 11/5/21).
Dentre tantas outras manifestações elogiosas aos serviços prestados pelos Cartórios Extrajudiciais, merece destaque a recente entrevista concedida pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luis Felipe Salomão à Revista Cartórios 15, pp. 8 a 15 (1ª ed. Junho/21, Migalhas 5.014, de 1º/6/21, “Novidades”), em que reconhece a importância, excelência e elevado padrão dos trabalhos oferecidos aos consumidores, assim como ressalta o quanto já contribuem e haverão de contribuir em prol da desjudicialização.
Acrescenta-se também que durante o atual período de pandemia, os Cartórios Extrajudiciais continuaram a prestar seus serviços à população e empresas de maneira destacada, atentos ao exercício de direitos fundamentais, circulação de propriedade e obtenção de créditos com garantia real. Em sede de Registro Civil, foram incorporadas novas soluções eletrônicas para os registros de óbitos, nascimento e para celebração de casamentos durante a crise, enquanto Cartórios de Notas adotaram a videoconferência e implantaram o “ato eletrônico”, segundo norma nacional regulamentadora da prática de escrituras e procurações em meio digital, mantendo a segurança da manifestação da vontade e efetiva a circulação de propriedades; os Cartórios de Registro de Imóveis passaram a receber títulos digitais, dando cabal cumprimento ao Provimento n. 94/2020 do CNJ que disciplina o envio de documentos públicos e particulares nato-digitais ou digitalizados para o registro imobiliário e recebe o apoio de agentes do mercado imobiliário nacional. Nos primeiros meses de 2020, os Cartórios superam os bancos em números de operações suspeitas reportadas ao COAF, atingindo a marca de 132 mil comunicações, 14 mil a mais do que os bancos em todo o ano de 2019; por seu turno, a Central Nacional de Registro de Títulos e Documentos e de Registro Civil de Pessoas Jurídicas – RTDPJBrasil – conferiu novo relevo durante a pandemia para a prestação de serviços on line, com mudanças positivas para o trânsito de documentos eletrônicos em todo o território nacional. (cf. Revista Cartórios com Você, n. 20, de março de 2020 (publicação oficial ANOREG/BR, ANOREG/SP e SINOREG/SP).
[11] . Segundo dados estatísticos oficiais publicados no anuário “Cartório em Números 2020”, o protesto se apresenta como poderoso elemento inibidor de execuções e de eficiente recuperação de créditos, tendo em vista que aproximadamente 68% dos títulos protestados são pagos.
[12] V. dados fornecidos pelo CNJ em Justiça em Números 2020.
[13] As 99 serventias de protesto estão assim distribuídas nas capitais brasileiras: Região Norte 20 (Rio Branco – 2, Macapá – 2, Manaus – 6, Belém – 3, Porto Velho – 4, Boa Vista – 2 e Palmas – 1); Região Nordeste 26 (Maceió – 2, Salvador – 4, Fortaleza – 5, São Luís – 2, João Pessoa – 1, Recife – 4, Teresina – 4, Natal – 2 e Aracaju – 2); Região Centro-Oeste 21 (Goiânia – 2, Cuiabá – 1, Campo Grande – 3 e Brasília – 15); Região Sudeste 19 (Vitória – 1, Belo Horizonte – 4, São Paulo – 10 e Rio de Janeiro – 4) e na Região Sul 13 (Curitiba – 6, Florianópolis – 4, Porto Alegre – 3).
[14] Não nos esqueçamos também da execução hipotecária extrajudicial que remonta aos idos de 1966 (DL 70) que, mutatis mutandis, de certa forma poderíamos incluir ainda nesse rol, bem como a alienação fiduciária de bens imóveis (Lei 9.514/97).
[15] . Cf. Francesco Carnelutti.
[16] Não se pode olvidar dos deveres legais que os notários, tabeliães e registradores hão de observar, especificamente, no que concerne a prestação de serviços adequados, eficientes e céleres (Lei 8.935/94, art. 4º c/c art. 30, II), sem prejuízo da responsabilidade civil por todos os danos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso (art. 22), responsabilidade criminal (art. 24) e responsabilidade administrativa (art. 31), além do controle e fiscalização permanente a que estão submetidos por parte das Corregedorias-Gerais de Justiça e do Conselho Nacional de Justiça.
[17] v. Joel Dias Figueira Jr., in Arbitragem, Cap. II, n. 7, pp. 117/124. Rio de Janeiro: Forense, ed. 3ª, 2019.
Na mesma linha Arruda Alvim, in Arbitragem – Estudos sobre a Lei 13.129, de 26-5-2015 (coletânea de estudos, Org. Cahali e outros). “Sobre a natureza jurídica da arbitragem”, p. 143.