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Joel Dias Figueira Júnior

Joel Dias Figueira Júnior

14/08/2020

O tema alusivo aos “precedentes judiciais” tem nos últimos anos, especialmente após o advento do Código de Processo Civil de 2015, adquirido particular relevância em nosso País, tornando-se objeto de estudo por considerável número de processualistas, dando azo ao aparecimento de centenas de artigos e dezenas de monografias, além das incursões não menos profundas e qualificadas em tópicos específicos de tantos cursos, manuais e comentários sobre o novel Diploma Instrumental.

A atenção dos doutos sobre o tema em voga é mais do que justificável, é oportuna e necessária, na exata medida em que o sistema brasileiro de precedentes é distinto daquele existente nos países de common law e de alguns países de civil law, tratando-se de certa maneira de assunto “novo” a ser explorado, compreendido e bem aplicado. Na verdade, estamos nos familiarizando paulatinamente com a técnica de observância da jurisprudência e dos precedentes, absorvendo e adaptando institutos típicos de common law, de maneira a formar-se uma espécie de modelo ou sistema de jurisdições mistas.[1]

Rodolfo de Camargo Mancuso, em sua excelente monografia intitulada sistema brasileiro de precedentes – natureza – eficácia – operacionalidade, aponta com acerto o que também nos parece ser, provavelmente, o principal fator que se encontra arraigado em nossa cultura jurídico-lusitana e que se descortina com o prestígio histórico à lei e o desapego à jurisprudência.

Nesse sentido, salienta Mancuso que “O Direito brasileiro, filiado à família romano-germânica dos direitos codicísticos (civil law), tem a lei como paradigma das condutas comissivas e omissivas (CF vigente, art. 5º e inciso II, replicando, no essencial, dispositivos das Cartas anteriores), donde terem sido escassas, durante muito tempo, as referências à jurisprudência enquanto forma de expressão ou mesmo fonte do Direito. Um instigante dado, um tanto quanto negligenciado, mas nem por isso menos importante, reside nisso que, dentre os meios de integração, credenciados para colmatar as lacunas da lei – costumes, analogia, equidade, princípios gerais, regras de experiência comum – não veio prevista a jurisprudência, assim na Lei de Introdução ao Código Civil (Dec.-lei 4.657, de 1942, art. 4º), como em sua versão atual, redenominada Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (nº 12.376/2010, art. 4º); análoga omissão se nota no CPC; arts. 126, 2ª parte e 127.

“Aliás, no citado art. 126 do CPC está clara a primazia da lei – fonte primária ou forma de expressão principal do Direito – ao dizer que cabe ao juiz ´aplicar as normas legais` (princípio da legalidade estrita); em ´não as havendo`(situações hoje ditas de norma necessitada) é que está o juiz autorizado a valer-se dos antes referidos meios de integração.

“O argumento de que onde o constituinte referiu-se à lei (art. 5º, caput e inc. II) teria dixit múnus quam voluit, querendo em verdade referir-se ao sistema jurídico como um todo, o que abarcaria outras fontes e formas de expressão, não resulta consistente, porque as situações onde tal aplicação é possível (e até mesmo aquelas onde isso não é autorizado – v.g. CTN, § 2º do art. 108, vedado o uso da analogia quando possa ´resultar na exigência de tributo não previsto em lei`), são ditadas por um texto legal, o que tudo, em fim de contas, acaba por refluir no império da lei.”[2]

Feito esse introito, é imperioso esclarecer que não temos por escopo aprofundar o estudo sobre o tema dos precedentes judiciais, mas sim traçar as linhas mestras acerca da (in) admissibilidade de sua aplicação ou necessária observância em sede de jurisdição privada.

Assim, para a adequada compreensão do tema, vale uma breve incursão acerca do que se entende por precedentes judiciais e, na sequência, a retomada da distinção entre os sistemas jurisdicionais (estatal e arbitral) e, em arremate, o delineamento dos contornos atinentes aos fundamentos jurídicos das decisões arbitrais de direito e a eventual (in) observância aos “precedentes judiciais”.

Precedente e jurisprudência não se confundem, exceto no que respeita à origem comum porquanto sempre fundadas decisões pretorianas (julgado), sendo fator diferencial determinante o critério de formação desses julgados, ou seja, qualitativo (precedente) e quantitativo (jurisprudência)[3] que, por sua vez, implicará na geração de efeitos persuasivos (de maior ou menor intensidade) ou de observância obrigatória (vinculativo).[4]

Leciona José Rogério Cruz e Tucci que “na atualidade, o direito brasileiro adota um modelo misto quanto à eficácia dos precedentes judiciais a saber: (a) precedentes com eficácia meramente persuasiva; (b) precedentes com relativa eficácia vinculante; e (c) precedentes com eficácia vinculante”; no modelo (a), segundo o festejado Doutrinador, estão os precedentes dos tribunais superiores transitados em julgado, no modelo (b), enquadram-se os precedentes sumulados, que gozam de grande força persuasiva (binding de facto) e, finalmente no modelo (c) encontram-se os precedentes com eficácia vinculante, tais como as súmulas do STF, as decisões proferidas pelo STF e Tribunais de Justiça, no âmbito  do controle concentrado de constitucionalidade, e, as decisões proferidas em incidentes de processos repetitivos.[5]

Por sua vez, a jurisprudência representa a reiteração de julgados por determinado tribunal, em matérias idênticas ou semelhantes, sempre no mesmo sentido conclusivo do acórdão, ou seja, decisões colegiadas reiteradas, no mesmo sentido e sobre o mesmo thema decidendum, revestindo-se de caráter meramente persuasivo, com variações de grau sem contornos definidos, na medida em que o sistema brasileiro criou três classes desses julgados, a saber: jurisprudência, jurisprudência dominante e jurisprudência pacífica.

Nessa linha distintiva, o caráter quantitativo “consiste na aplicação do precedente a um caso concreto, ao contrário da jurisprudência, em que há uma pluralidade de decisões relativas a vários e diversos casos concretos. Neste caso, é difícil estabelecer qual é a decisão realmente relevante para o julgador na hora de aplicar a jurisprudência. (…) No que diz respeito à diferença de caráter qualitativo, observa-se que o precedente fornece uma regra que pode ser aplicada como critério de decisão no caso sucessivo, em função da identidade dos fatos relevantes do primeiro e do segundo caso. É o juiz do caso sucessivo que estabelece se existe ou não precedente e assim cria o precedente, sendo que essa análise é sempre fundada nos fatos, ou seja, um só precedente é suficiente para fundar a decisão do caso sucessivo”.[6]

Queiramos ou não, existe um enorme traço distintivo no que concerne à operacionalização do direito pretoriano brasileiro no confronto com os países integrantes do sistema de common law e, neste ponto, Sérgio Gilberto Porto resume muito bem a questão, ao salientar que, nestes últimos, “o precedente representa, em verdade, um ponto de partida para a análise e julgamento do caso concreto e não uma restrição ao poder de julgar, deixando, desse modo, bem claro a diferença entre o stare decisis e a chamada súmula vinculante que, nesta quadra da história, preocupa a comunidade jurídica nacional. Note-se, pois, diferença fundamental entre uma e outra situação. Na espécie stare decisis a decisão de adotar o precedente, como já registrado, cabe ao juiz posterior, ou seja, aquele que está no momento julgando e não se constitui numa imposição do juízo anterior como no caso da edição de súmula, máxime quando e se de caráter vinculante.”[7]

Em arremate, nos dizeres de Rodolfo Mancuso, “o efeito vinculativo de um ou mais julgados se estabelece, se assim podemos nos expressar, ´de traz para diante`: os juízes dos casos precedentes, ao assentarem jurisprudência dominante ou emitirem súmula, firmam os parâmetros exegéticos para o julgamento de casos análogos pelos juízes subsequentes, ao passo que no common law a dinâmica é em sentido contrário: cabe ao juiz posterior aferir se dos julgados pretéritos sobre o  thema decidendum é possível identificar e extrair uma ratio decidendi suficientemente convincente a ponto de elevar-se a um binding precedente, idôneo a formatar a resolução dos casos afins, estando o juiz autorizado a valer-se de técnicas excludentes, tais como o distinguishing e o overruling.”[8]

O Código de 2015, por sua vez, em algumas passagens faz uso das expressões “enunciado de súmula”, “jurisprudência” e “precedente” (art. 489, V e VI)[9] e, mais adiante “precedente”, súmula vinculante”, “jurisprudência”, “jurisprudência dominante”, “jurisprudência pacificada”, “orientação do plenário ou do órgão especial” e “julgamento de casos repetitivos” (art. 926, §§ 1º e 2º[10] e art. 927[11]), formando um quadro exótico tipicamente brasileiro de difícil ou rara compreensão sobre o que, efetivamente,  significa cada um desses fenômenos ou institutos; por conseguinte, fica prejudicada a identificação precisa de suas especificidades, valorações qualitativas e quantitativas, força e  eficácia, gerando sérias dúvidas do que venha a ser, em nosso sistema, os tão decantados “precedentes”.

Porém, o que de tudo isso ao menos fica claro é que os Tribunais haverão de assentar a sua “jurisprudência” de maneira uniforme e mantê-la estável, íntegra e coerente (CPC, art. 926, caput), em sintonia com a ideologia da previsibilidade e do princípio da igualdade entre os jurisdicionados, em busca permanente do valor denominado segurança jurídica.[12]

Dentro da jurisdição estatal, infere-se claramente que todo o sistema nomoempírico há algum tempo volta-se com absoluta ênfase aos “precedentes” para tentar superar os sérios problemas que acometem histórica e patologicamente a qualidade e a eficiência da tutela jurisdicional oferecida pelo Estado-juiz, servindo como mecanismo não apenas voltado à segurança jurídica, mas também à rapidez na solução do conflito, a começar pela Constituição Federal com o autorizativo da súmula vinculante.

Tamanha é a importância dos “precedentes” na jurisdição estatal que se tem entendido que a respectiva observância, ainda que de forma indireta, serve como uma espécie de afirmação dos direitos fundamentais. Significa dizer, em outras palavras, que o respeito aos precedentes judiciais pelos órgãos integrantes do Poder Judiciário, mesmo que os julgados não tratem de direitos fundamentais, “cumpre papel determinante para a vida em sociedade, pois fortalece a segurança jurídica, propiciando uniformidade, estabilidade, previsibilidade e isonomia, bem como ajuda os cidadãos a definir expectativas e pautar suas formas de conduta. Estes, aliás, são valores indissociáveis a qualquer país que se intitule como um Estado Democrático de Direito”.[13]

Não foi por menos que o Código de 2015 assentou que os juízes e os tribunais observarão as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; os enunciados de súmula vinculante; os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados (CPC, art. 927, I a V), e, será nula a decisão judicial (acórdão, sentença ou interlocutória) por ausência de fundamentação que “deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento” (grifamos) (CPC, art. 489, § 1º, VI).

Superada a abordagem acerca dos “precedentes judiciais”, passa-se, na sequência, à breve revisitação do tema alusivo à jurisdição arbitral, pois já versado de maneira exaustiva em capítulos anteriores, especialmente no primeiro e no segundo, não restando qualquer dúvida no que tange ao paralelismo e autonomia existente entre as duas jurisdições (pública e privada), tanto no plano nacional quanto internacional.

A compreensão dicotômica da jurisdição é ponto de partida e de chegada para a conclusão acerca da inaplicabilidade, como regra, dos precedentes judiciais aos julgamentos arbitrais.

Esse tema tem sido muito debatido nos últimos anos no Brasil, seja pelo prisma constitucional, no que concerne à incidência da súmula vinculante, e, infraconstitucional, notadamente após o advento do Código de 2015 que, dentre outras passagens, aponta como nula a sentença judicial por vício de fundamento que “deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento” (art. 489, § 1º, VI).

Assinala-se que o tema em voga encontra ressonância somente em sede de arbitragem de direito, pois os debates doutrinários travados e as dissenções a esse respeito cingem-se, de maneira praticamente absoluta, a esta forma autorizativa de julgamento, sobretudo quando verificada a escolha pela incidência das regras do direito nacional em cotejo com a (in) observância da ordem pública (LA, art. 2º, caput e § 1º), razão pela qual não encontra espaço para maiores digressões sobre precedentes judiciais em sede de arbitragem de equidade.

Constata-se que não são poucos os estudiosos que se debruçaram e ainda se debruçam a analisar e discorrer sobre assunto, vindo à lume artigos diversos e algumas monografias, além de exposições em tantos conclaves jurídicos, seja para defender a tese da necessidade de observância de precedentes judiciais em sede de jurisdição arbitral,[14] ou, contrariamente, para rejeitá-la.[15]

De nossa parte, temos entendimento eclético acerca do tema da aplicação dos precedentes judiciais em jurisdição arbitral, pois a conclusão a respeito da observância obrigatória ou facultativa, ou, da inobservância por parte dos árbitros no momento da prolação da sentença, dependerá de algumas premissas a serem estabelecidas e variáveis que precisam ser consideradas. Em outras palavras, o que se exige investigar e concluir é se a jurisdição arbitral de direito submete-se aos “precedentes judiciais” e, se positiva a resposta, quais são os tipos de “precedentes” que devem ser seguidos pelos árbitros, em que hipóteses, em que medida, e, em que extensão; em arremate, há de analisar-se também quais são as consequências da não observância de precedentes judiciais (vinculantes ou não) na sentença arbitral, isto é, se é passível de anulação. Vejamos, então.

Conforme já afirmado no início deste trabalho, a primeira e principal premissa a ser estabelecida reside nas diferenças existentes entre as jurisdições estatal e a particular, e, como bem assenta Owen Fiss, inclusive no que concerne aos precedentes, pois os “árbitros são pagos pelas partes, escolhidos pelas partes; e influenciados por uma série de práticas (como relutância em redigir opiniões ou gerar precedentes) que localizam ou privatizam a decisão. A função do árbitro é resolver uma disputa. A função do juiz, por outro lado, deve ser compreendida em termos inteiramente diferentes: ele é um agente público, não é escolhido pelas partes, mas pelo público ou seus representantes [ ou por outros processos públicos, como o concurso público de provas e títulos], e investido pelos órgãos públicos [ no Brasil, exceto no primeiro grau de jurisdição] para criar e impor normas de amplitude social (…) como um meio de dar sentido aos nossos valores públicos”.[16]

Por isso, é ponto de partida para a compreensão sobre o tema da não aplicação dos precedentes judiciais em sede arbitral o delineamento dicotômico e de relativa simetria entre a jurisdição privada e a pública.

Ademais, não se pode perder de vista que a “ausência do controle estatal, até mesmo sobre a regulamentação dos conflitos, caracteriza o projeto neoliberal. Ou melhor: o projeto neoliberal deseja a mínima interferência possível do Estado e, assim, certamente pressupõe as ideias de autorregulação e autorresolução dos conflitos, tendo a arbitragem como mecanismo próprio para tanto, e, dessa maneira, como parte da engrenagem para o desenvolvimento livre do mercado”.[17]

Para os fins deste estudo, consideraremos como “precedentes judiciais” aqueles arrolados no art. 927 do CPC que, na jurisdição estatal, haverão de ser observados pelos juízes e tribunais, quais sejam: “ (…) I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II – os enunciados de súmula vinculante; III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional (…)”.

De início, impende observar se uma das partes litigantes na jurisdição arbitral é ente público da administração direta ou indireta, nas esferas federal, estadual ou municipal, na exata medida em que a eles estendem-se as decisões definitivas de mérito proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade (CF, art. 102, § 2º) bem como os enunciados de súmulas vinculantes (CF, art. 103-A).

Nas demais arbitragens, em que as pessoas jurídicas de direito público não são partes – diga-se de passagem, grande e expressiva maioria – o espectro que tenta assombrar a decisão arbitral fundada em direito e que desconsidera os precedentes judiciais parece-nos de pouca envergadura, abrangência e consequência.

Se, por um lado, a jurisdição privada é jurisdição paralela e independente da jurisdição estatal, em tudo e por tudo, não menos verdadeiro é também a observância pelos árbitros às regras de direito definidas pelas partes em convenção arbitral, tudo em estrita sintonia ao devido processo legal.

Por seu turno, a motivação do julgado pressupõe a formação de silogismo perfeito entre fato, norma e conclusão, o que exige dos árbitros a cognição articulada de elementos probatórios e teses jurídicas constantes do processo, considerando-se o direito não apenas a norma jurídica, produto de elaboração parlamentar, mas todo o arcabouço normativo que servirá de base para os fundamentos legais da decisão arbitral.

Nessa linha, considera-se a arbitragem de direito como sendo aquela em que as partes concedem aos julgadores poder jurisdicional para conhecer e resolver os conflitos que lhes são apresentados com fulcro no arcabouço normativo indicado em convenção arbitral, ou, se omissa, em observância ao sistema normativo do país que sedia o painel.

De outra banda, tem-se como sistema normativo todas as fontes do direito, primárias e secundárias, a serem observadas pelos árbitros na fundamentação de suas decisões. Contudo, tal assertiva não significa o dever de observância dos árbitros aos precedentes forjados pelos tribunais (superiores ou de segunda instância) para a resolução de conflitos a serem decididos dentro da própria jurisdição estatal.

Aliás, a Constituição Federal quando dispõe acerca da vinculação e observância obrigatória às decisões do Supremo Tribunal Federal deixa patente que a submissão a esses precedentes respeita aos órgãos do Poder Judiciário e à administração pública, direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, sem qualquer pertinência ou reflexo à jurisdição arbitral.

Com a devida vênia daqueles que entendem diferentemente, parece-nos equivocada a doutrina que defende a tese de observância de precedentes vinculantes ou vinculativos estatais quando da prolação da sentença arbitral, sob os fundamentos de que o árbitro é, como diz a Lei de regência (art. 18), “juiz de fato e de direito” e, como tal, em se tratando de arbitragem de direito, haverá de observar todas as normas jurídicas na sua mais ampla acepção, donde exsurge a sujeição aos precedentes judiciais já mencionados.

Tanto não estão os árbitros jungidos aos precedentes estatais que não só a Constituição Federal deixou de fazer qualquer referência a esse respeito quando tratou do tema alusivo à observância das súmulas vinculantes e aos julgados do Supremo Tribunal Federal em ações diretas de inconstitucionalidade e nas declaratórias de constitucionalidade, como também permaneceu silente o Código de Processo Civil de 2015 e a Lei 13.129/2015, que alterou e atualizou a Lei 9.307/1996.

E mais: o Código de 2015 não passou ao largo do instituto da arbitragem; muito pelo contrário, erigiu-a ao patamar de norma fundamental do processo civil, inserindo-a na Parte Geral, Livro I, Capítulo I, art. 3º, § 1º (“é permitida a arbitragem, na forma da lei”) além de reconhecê-la como jurisdição, nos exatos termos da redação do caput do citado dispositivo que, sabiamente, assentou que “não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito”, ou, em outras palavras, não se excluirá da apreciação da jurisdição estatal e da jurisdição arbitral ameaça ou lesão a direito.

E mais; o legislador de 2015 foi além, pois em diversas passagens do Código, de uma forma ou de outra, traz à tona o instituto da arbitragem, ao versar sobre a competência (art. 42), cooperação nacional, carta arbitral e confidencialidade dos atos (art. 69, § 1º, e arts. 189, IV, 237, IV, 260, § 3º e 267), preliminar de contestação (art. 337, X, §§ 5º e 6º), sentença que extingue o processo, sem resolução do mérito (art. 485, VII), títulos executivos judiciais (art. 515, VII), competência para o cumprimento de sentença arbitral (art. 516, III), homologação de decisão arbitral estrangeira (art. 960, § 3º), efeito devolutivo a ser conferido ao recurso de apelação interposta contra sentença que acolhe o pedido de instituição de arbitragem (art. 1.012, § 1º, IV), cabimento de agravo de instrumento contra a decisão que rejeita a alegação de convenção de arbitragem (art. 1.015, III), além de ter alterado, no art. 1.016, o art. 33, § 3º, da LA.

Em nenhum momento, repita-se, o legislador estendeu aos árbitros a observância aos precedentes judiciais, pois oportunidades não lhe faltou, sobretudo no caput do art. 927, quando então poderia ter assentado que os juízes, os tribunais e os árbitros observarão…

Ledo engano concluir que o legislador ao se referir aos “juízes” e “tribunais” no aludido art. 927 do CPC estaria deixando subentender, por simetria, a observância aos precedentes estatais ali apontados também aos árbitros e aos tribunais arbitrais, tendo-se por base a disposição contida no art. 18 da LA. Essa conclusão, com todas as vênias, é mais do que ingênua, é jocosa, pois a norma insculpida no mencionado art. 18 tem por escopo maior firmar o poder jurisdicional do árbitro e, por conseguinte, chancelar a natureza da arbitragem, ao arrematar que a sentença por ele proferida não ficaria sujeita a recurso ou a homologação do Poder Judiciário.

Ademais, quando o legislador desejou, por exemplo, estender os efeitos das decisões tomadas pelos tribunais estaduais ou federais em incidentes de resolução de demandas repetitivas aos juizados especiais, assim o fez, expressamente, segundo se infere do disposto no art. 985, I, do CPC, mesmo sem necessidade, pois os juizados especiais cíveis estaduais e federais são órgãos integrantes do Poder Judiciário e, portanto, submetidos aos precedentes estatais (art. 927).

Assim, e com maior razão, se desejasse o legislador estender à jurisdição arbitral a observância dos precedentes judiciais assim teria dito e assentado. E, não deixou de fazê-lo por ser desnecessário, ou por estar subentendido ou, ainda, por um “cochilo”; assim procedeu permanecendo em silêncio em todas as passagens do Código de 2015 justamente por não se aplicar os precedentes judiciais aos árbitros, que não integram a jurisdição estatal e aos juízes togados não se submetem, em aspecto algum, muito menos aos seus “precedentes”, vinculantes ou não.

Nada obstante, se as partes optam na convenção arbitral por um julgamento fundado em regras de direito nacional, é de bom alvitre que, se desejarem, façam menção expressa à observância pelos árbitros às decisões judiciais com ou sem eficácia vinculante, em sintonia com o rol do art. 927 do Código de Processo Civil.

Diferentemente, se a convenção arbitral nada dispuser a esse respeito, limitando-se as partes a apontar que a arbitragem nacional será apenas de direito, ressalvada a participação de ente público, os árbitros estarão livres para decidir com base no sistema normativo, sem a necessária observância às súmulas ou precedentes chancelados pelo Poder Judiciário, pois a elas não estão jungidos, repita-se.

O tema da segurança jurídica que envolve múltiplos aspectos sintonizados com o devido processo legal, neste ponto de nosso estudo imbrica-se com a garantia de previsibilidade, “previsibilidade esta que permite à sociedade conhecer qual a norma de conduta a ser seguida, aquela que é estabelecida pela lei e aplicada pelo Poder Judiciário”,[18] e não pelo juiz privado, exceto nos casos já apontados acima (participação de ente público ou definição prévia em convenção arbitral).

Eduardo Talamini, quando aborda esse tema da (in) observância dos precedentes em sede arbitral afirma tratar-se de um “falso problema”, com o argumento de que os árbitros costumam atentar ao ordenamento positivo que lhes cabe aplicar no caso concreto, no que se incluem os precedentes, decisões-quadros e orientações consolidadas na jurisprudência dos tribunais estatais. Em conclusão, observa Talamini que o “falso problema” pode tornar-se real se mal resolvido, isto é, se a decisão arbitral desconsiderar o precedente jurisprudencial estatal dando azo à eventual controle pelo Judiciário, “mediante a invocação de uma cláusula geral de ´violação à ordem pública` ou a importação da ideia do Manifest Disregard of the Law – ambas hipóteses não previstas no art. 32 da Lei de Arbitragem (…)”[19]

O pensamento do festejado professor paranaense, com o qual comungamos, vem ao encontro do que afirmamos e reforça o ponto da necessidade de cautela das partes quando da elaboração da convenção arbitral no que concerne à definição dos contornos e extensão das normas que incidirão na arbitragem de direito, certos de que, repita-se, a inobservância de precedentes estatais nos julgamentos privados não agasalham a possibilidade de formulação de pedido anulatório em ação a ser proposta perante o Poder Judiciário, pois não se enquadra em nenhuma das hipóteses taxativas elencadas no art. 32 da LA.

Sem dúvida, “os precedentes judiciais são fonte de direito, compõem o ordenamento jurídico e devem ser ponderados pelos árbitros no exercício de sua função jurisdicional. A afirmação não implica, contudo, na imediata importação à arbitragem dos remédios processuais (como reclamação) ou das mudanças procedimentais (como suspensão, julgamento de improcedência liminar, tutela de evidência) previstas para o processo judicial.

“Do mesmo modo, sendo o precedente aplicável à arbitragem na mesma medida que a lei, mas, a nosso ver, não mais que isso, não há ´novas` hipóteses de anulatória, tampouco deve haver o alargamento das já previstas para permitir o controle judicial tão só pelo argumento de ofensa ao precedente”.[20]

Em outras palavras, a verdade é que, em termos práticos, a não observância pelos árbitros de precedentes judiciais ou súmulas vinculantes, equipara-se à não observância ou interpretação equivocada da lei, o que se constitui em nada mais, nada menos que, em erro de julgamento que, por sua vez, não dá azo à propositura de demanda (exitosa) desconstitutiva da sentença arbitral perante o Poder Judiciário, seja em se tratando de sentença nacional ou estrangeira.[21]

Não se pode olvidar também que as regras a serem observadas no processo arbitral estão delineadas no art. 21 da Lei de regência que, por seu turno, exige o respeito aos “… princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento”, segundo se infere da redação insculpida no § 2º.

Portanto, em interpretação sistemática do art. 21 da LA, com o art. 927 do Código de Processo Civil e arts. 102, § 2º e 103-A, ambos da Constituição Federal, conclui-se que os árbitros não estão obrigados a observar orientações pretorianas de qualquer natureza, ressalvadas as hipóteses, como já indicamos, em que algum ente público integre um dos polos da demanda arbitral, no que concerne às súmulas vinculantes e ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade, em decisões definitivas de mérito oriundas do Supremo Tribunal Federal.[22]

O que a lei exige é a observância por parte dos árbitros dos princípios jurídicos fundamentais,[23] e, neste particular, do livre convencimento motivado, em sintonia com o as normas de direito indicadas pelas partes em convenção ou termo arbitral. Por certo, o escopo da jurisdição (pública e privada) é resolver o conflito com justiça, o que não passa, necessariamente, pelo acerto ou desacerto da decisão.

Ademais, essa conclusão “não é diferente do que acontece em qualquer outro caso de má aplicação do direito pelo árbitro na solução dada ao mérito da causa. Seria paradoxal conferir um instrumento de controle de inobservância do precedente quando não há mecanismo de controle de violação direta da lei. Se, ao resolver o mérito do conflito, p. ex. o árbitro, equivocadamente aplica lei revogada ou confere à determinada disposição legal interpretação errada, de que ninguém jamais cogitou (a ponto de a questão nem mesmo ter merecido qualquer discussão e consolidação jurisprudencial), esse erro não é judicialmente controlável”.[24]

Em arremate, é bom frisar para que dúvidas não pairem, que esses motivos todos expostos não convergem para fomentar ou para fazer apologia ao descumprimento de precedentes judiciais pelos árbitros; muito pelo contrário, pois não temos a menor dúvida de que, como já dissemos, os precedentes judiciais, sobretudo os vinculantes, compõem as fontes do direito e integram o ordenamento jurídico nacional, motivo pelo qual servem perfeitamente aos árbitros como elementos hábeis a integrar a formação de convencimento motivado dos julgadores. Ademais, os árbitros – profissionais altamente qualificados que são – saberão aplicar não só a norma jurídica ao caso em exame, como também, se assim entenderem cabível, os precedentes judiciais.

O que não se pode exigir, salvo se estipulado pelas partes em convenção arbitral, é que os árbitros observem (caráter impositivo) os precedentes judiciais aos quais estão jungidos os juízes togados, e que eventual inobservância desta ordem agasalhe pedido de anulação de sentença arbitral, porquanto impossível juridicamente, por não integrar o rol apontado no art. 32 da LA.

Pelas mesmas razões, inexiste possibilidade de manejo de reclamação em face de decisão proferida na jurisdição privada, assim como não haverá suspensão de processo arbitral em razão de decisão emanada do Poder Judiciário em incidente de resolução de demandas repetitivas ou repercussão geral em recurso extraordinário ou especial repetitivo.

De qualquer forma, não resta a menor dúvida de que a tormentosa questão alusiva à observância ou não de precedentes estatais em sede de jurisdição privada está longe de chegar a um consenso; esperamos que, ao menos em breve, tenhamos um posicionamento menos fracionado e mais uniforme a respeito do tema, a começar pela doutrina.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[1] Sobre o tema, v. Fabíola U. Haselof, inJurisdições mistas – Um novo conceito de jurisdição, 2018. Nessa interessante monografia, a citada Autora traça um paralelo entre os sistemas de civil law e de common law demonstrando não serem excludentes, mas complementares (“integração de códigos e casos”); aponta a tendência contemporânea da mistura de sistemas jurídicos e, em especial, o Brasil com a criação da vinculação ao sistema de precedentes (stare decisis), condução do processo, produção de provas e colaboração das partes, todas características do common law.

[2]Sistema brasileiro de precedentes, p. 583, 2014.

[3] Assim também Michele Taruffo. “Precedente e giurisprudenza”, in Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, vol. 3, pp. 710-718.

[4] Diante das inovações processuais inseridas no sistema brasileiro, a doutrina contemporânea identifica a criação de uma terceira espécie de “julgado”, que se soma à jurisprudência e aos precedentes, qual seja, a chamada tutela judicial plurindividual que se situa numa faixa intermediária entre a tutela coletiva e a individual. Sobre o tema, escreve Bruno Dantas Nascimento, em sua tese de doutoramento defendida na PUC-SP, em 23/8/2013, intitulada Tutela recursal plurindividual no Brasil: formulação, natureza, regime jurídico, efeitos (publicada posteriormente sob os auspícios da Editora Revista dos tribunais, com o título Teoria dos Recursos Repetitivos: tutela plurindividual nos recursos dirigidos ao STF e ao STJ (art. 543-B e 543-C do CPC), que esse fenômeno tem origem no “mau funcionamento do modelo de tutela coletiva de direitos individuais homogêneos, somado à necessidade de se adotar técnicas que permitam a eficiência e a racionalização da atividade do Poder Judiciário, foi a causa eficiente da elaboração em nosso país de técnicas de tutela plurindividual” (p. 151, conclusão 33).

Nesse tertium genus, incluem-se as decisões do STF em controle concentrado de constitucionalidade, os acórdãos em incidente de assunção de competência ou resolução de demandas repetitivas (denominadas de “decisões-quadro” em se tratando de julgados repetitivos pelos tribunais superiores).

Ainda sobre esse tema, v. Rodolfo Mancuso, ob. cit., pp. 439/569.

[5] “Parâmetros de eficácia e critérios de interpretação do precedente judicial” Direito jurisprudencial (coord. Teresa Arruda Alvim Wambier) p. 111-119, 2012.

[6] . Daniela Pereira Madeira. “A força da jurisprudência”, in O novo processo civil brasileiro: o direito em expectativa (reflexões acerca do projeto do novo Código de Processo Civil) (coord. Luiz Fux), pp. 526/527.

[7] “Sobre a common law, civil law e o precedente judicial”, disponibilizado no site da Academia Brasileira de Direito Processual Civil, pp. 10/11. Neste estudo, Sérgio Porto faz interessante comparação e distinção entre stare decisis e res judicata (item n. 5).

Lembra bem Sérgio Porto, citando Guido Soares, que “stare decisis é o que sobrou da expressão latina ‘stare decisis et non quieta movere’; ao pé da letra: ‘que as coisas permaneçam firmes e imodificadas, em razão das decisões judiciais’” (item n. 5.3).

[8]. Sistema brasileiro de precedentes, p. 439.

[9] “Art. 489. São elementos essenciais da sentença: (…) § 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (…) V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento” (grifamos).

[10] “Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. (…) § 1o Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante. § 2o Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação” (grifamos).

[11] “Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão: I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II – os enunciados de súmula vinculante; III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados. § 1o Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1o, quando decidirem com fundamento neste artigo. § 2o A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese. § 3o Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica. § 4o A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia. § 5o Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores”.

[12] No que concerne à edição de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal, essa questão está bem colocada na Constituição Federal, art. 103-A, in verbis: “Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica”.

[13] Hélio Krebs, Sistema de precedentes e direitos fundamentais, p. 265, ed. 2015.

[14] Márcio Bellocchi. Precedentes Vinculantes e a aplicação do direito brasileiro na convenção de arbitragem. RT, 2017; José Rogério Cruz e Tucci. “O árbitro e a observância do precedente judicial”. Consultor jurídico. http://www.conjur.com.br(1º/11/2016) (acesso em 22/10/2018); Georges Abboud. “Jurisdição constitucional vs. Arbitragem: os reflexos do efeito vinculante na atividade do árbitro”, in RePro, vol. 214/289-295; Matheus Leite. “Incidente de resolução de demandas repetitivas: desmistificando a sua influência e o tema da suspensão de processos em razão da sua admissibilidade”, in RePro vol. 281/353-365, jul/2018; Ana Tereza Basilio, “Arbitragem e a sua controversa vinculação aos precedentes do novo Código de Processo Civil”, in Justiça & Cidadania, edição 217, pp. 32/34 –  set.2018.

[15] Carlos Alberto Carmona, “Precedentes na arbitragem”, palestra proferida na OAB-RJ, em 27/9/2017, em seminário promovido pela Comissão de Arbitragem do citado Órgão; Rômulo Greff Mariani, Precedentes na arbitragem. Fórum, 2018; André Roque e Fernando Gajardoni, “A sentença arbitral deve seguir o precedente judicial do novo CPC? – Precedente vinculante não pode ser causa da ruína da arbitragem no Brasil”, in Jota Info (7/11/2016) (acesso em 30/10/2018); Marcela Kobalch, “Vinculação do árbitro aos precedentes judiciais após a vigência do CPC/2015”, in http://www.processualistas.jusbrasil.com.br/artigos (acesso em 7/2/2017); Ana Carolina Weber, “Relembrando: no Brasil, o Código de Processo Civil não é automaticamente aplicado a procedimentos arbitrais” inwww.jusbrasil.processualistas.com.br/artigos (acesso em 30/10/2018); Scripes Wladeck, Impugnação da sentença arbitral, pp. 144/146, 2014.

[16] “The forms of justice”, Harvard law review, pp. 30/31 (apud Luiz Guilherme Marinoni, “Rápidas observações sobre a arbitragem e jurisdição” (p. 7), http://www.marinoni.adv.br/home/artigos (acesso em 14/11/2017).

[17] Luiz Guilherme Marinoni, estudo cit. (pp. 8/9), baseado em Karl-Heinz Ladeur (“Post-modern constitucional theory: a prospect for the self-organising society”, The modern law review, v. 60, n. 5, pp. 617/629).

[18] Pedro Miranda de Oliveira, Novíssimo sistema recursal – conforme o CPC/2015, item 12.2, p. 204, ed. 2015.

Aliás, grande parte da doutrina que discorre acerca do tema dos “precedentes” no direito brasileiro, costuma dirigir toda a atenção exclusivamente à observância estrita pelo Poder Judiciário, nos moldes delineados na Constituição Federal e Código de Processo Civil, passando totalmente ao largo da aplicabilidade à jurisdição privada, o que parece ser um forte indicador no sentido de que a esta última não se dirige mesmo.

[19] “Arbitragem e precedentes: cinco premissas cinco conclusões, um epílogo (e um vídeo)”. Exposição sobre o tema durante as XII Jornadas Brasileiras de Direito Processual (Belho Horizonte – 22 a 24 de agosto de 2018), (epílogo), in http://www.justen.com.br/arbitragem-e-precedentes/ e www.migalhas.com.br (acessos em 18/10/2018).

[20] Sofia Temer, “Precedentes judiciais e arbitragem: reflexões sobre a vinculação do árbitro e o cabimento de ação anulatória”. RePro, vol. 278/540-541.

[21] Assim também Rafaela Ferraz. “Arbitragem comercial internacional e enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal”, in Revista de Arbitragem e Mediação, vol. 17/105-108.

[22] Em sentido oposto a conclusão de Ana Basilio sobre o tema, quando escreve que “… a arbitragem não pode desprezar a incidência dos princípios constitucionais (Lei 9.307/96, art. 21), sob pena de afrontar a unidade do ordenamento jurídico, deixando-o à míngua de qualquer ordem e unidade, permeando-o de contradições e casuísmos, a dispersá-lo, na célebre expressão de Canaris, ´numa multiplicidade de valores singulares desconexos” (idem, p. 34).

[23] Para aprofundamento sobre o tema, v. interessante e profundo estudo realizado por Selma Maria Ferreira Lemes, intitulado “Arbitragem, Princípios jurídicos fundamentais. Direito brasileiro e comparado”, Arbitragem e mediação – doutrinas essenciais (org. Arnoldo Wald), vol. I, pp. 215/245, n. 8.

[24] Eduardo Talamini, idem, 4ª conclusão.

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