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ARTIGOS
CLÁSSICOS FORENSE
DIREITO DIGITAL
REVISTA FORENSE
Direito ao esquecimento do consumidor diante do tratamento de dados pessoais na economia digital
Revista Forense
01/09/2021
Revista Forense – Volume 433 – Ano 117
JANEIRO – JUNHO DE 2021
Semestral
ISSN 0102-8413
FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO
FUNDADORES
Mendes Pimentel
Estevão Pinto
Edmundo Lins
DIRETORES
José Manoel de Arruda Alvim Netto – Livre-Docente e Doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Eduardo Arruda Alvim – Doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/FADISP
SUMÁRIO REVISTA FORENSE – VOLUME 433
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DOUTRINA NACIONAL
A) DIREITO ADMINISTRATIVO
- ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS: EFEITOS DA LEI 13.709/2018 NO REGIME DE LICITAÇÕES PÚBLICAS – Fabiane Araújo de Oliveira, Dr. Anderson Souza da Silva Lanzillo e Dr. Vladimir da Rocha França
- INSTRUMENTOS DO DIREITO ADMINISTRATIVO QUE FOMENTAM A GOVERNANÇA PÚBLICA, AUXILIANDO O GESTOR PÚBLICO NO ATENDIMENTO DAS DEMANDAS SOCIAIS – Euclides André do Nascimento Neto
B) DIREITO CIVIL
C) DIREITO CONSTITUCIONAL
- A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO COMO OMBUDSMAN NO BRASIL: A BUSCA PELA PROMOÇÃO E PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS – Daniela Vieira de Melo e Juliana Nascimento da Silva
- A DEMOCRACIA EM CRISE? – Fernando Moreira Freitas da Silva, Michel Canuto de Sena e Paulo Roberto Haidamus de Oliveira Bastos
- REFLEXÕES SOBRE A DECRETAÇÃO DE LOCKDOWN POR MEIO DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO MARANHÃO – Roberta Mucare Pazzian e Giulia Yumi Zaneti Simokomaki
D) DIREITO PENAL
E) DIREITO PROCESSUAL CIVIL
- A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA TUTELA COLETIVA DE PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS – Bárbara de Oliveira Iszlaji e Gustavo Goldoni Barijan
- A TUTELA DA EVIDÊNCIA E O SISTEMA DE PRECEDENTES NO CPC/2015 – Nelson Luiz Pinto e Beatriz Krebs Delboni
- EFICÁCIA PROBATÓRIA DA ESCRITURAÇÃO EMPRESARIAL NO DIREITO PROCESSUAL CONTEMPORÂNEO – Daniel Marques Raupp e Bárbara Marques Raupp
- TERMO DE COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA E SUA HOMOLOGAÇÃO PELO CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO – Dora Bussab
- A REDAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS COMO MECANISMO DE ACESSO À JUSTIÇA E À CIDADANIA: UMA NOVA LÓGICA INAUGURADA PELO CPC DE 2015 – Flávia Pereira Ribeiro e Julia Vianna Correia da Silva
- QUESTÕES DE ÓRDEM PÚBLICA INTERNACIONAL E A ESCOLHA DA LEI PROCESSUAL APLICÁVEL NA ARBITRAGEM – Marcus Victor Mezzomo
- POSITIVISMO JURÍDICO NORMATIVO E ARBITRARIEDADE JUDICIAL SEGUNDO JEREMY WALDRON – Patricia Prieto Moreira
F) DIREITO DO TRABALHO
- GRATUIDADE DA JUSTIÇA: REQUISITO DE ACESSO À JUSTIÇA E INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE E DA CIDADANIA DO TRABALHADOR – Dione Almeida Santos
- AUSÊNCIA DE CONTAMINAÇÃO PELA COVID-19 E O DEVER DE REPARAR OS DANOS EXTRAPATRIMONIAIS EM RAZÃO DO DESRESPEITO À RECOMENDAÇÃO DE ISOLAMENTO/QUARENTENA. UMA ANÁLISE FEITA SOB A ÓTICA DOS PRINCÍPIOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL –Dione Almeida Santos e Sarah Hakim
G) CADERNO DE DIREITO E INOVAÇÃO TECNOLÓGICA
- DIREITO AO ESQUECIMENTO DO CONSUMIDOR FRENTE O TRATAMENTO DE DADOS PESSOAIS NA ECONOMIA DIGITAL – José Henrique de Oliveira Couto e Andréa Luísa de Oliveira
- ÉTICA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL SOB A ÓTICA DO BIODIREITO – Janaína Alves de Araújo e Bento José Lima Neto
- INVESTIMENTO ESTRANGEIRO E CONTROLE INTERPRETATIVO – Vitor Galvão Fraga
JURISPRUDÊNCIA COMENTADA
LEIA O ARTIGO:
DIREITO AO ESQUECIMENTO DO CONSUMIDOR DIANTE DO TRATAMENTO DE DADOS PESSOAIS NA ECONOMIA DIGITAL
RIGHT TO CONSUMER OBLIVION FRONT THE PROCESSING OF PERSONAL DATA IN THE DIGITAL ECONOMY
SOBRE OS AUTORES
JOSÉ HENRIQUE DE OLIVEIRA COUTO
Graduando em direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Diretor de qualidade da Revista Dizer, periódico eletrônico da faculdade de direito da Universidade Federal do Ceará (UFC). Autor de obras jurídicas nas áreas civil, empresarial e digital.
ANDRÉA LUÍSA DE OLIVEIRA
Doutoranda integrante do PPGD em Direito pela UniCeub – Brasília (DF). Mestre em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (MG). Professora da pós-graduação e graduação. Advogada. Membro da Associação Nacional dos Profissionais de Privacidade de Dados (ANPPD).
Resumo: Com a economia digital vigente, os consumidores ficaram expostos às práticas dos agentes econômicos de coleta, armazenamento e compartilhamento de dados pessoais, no mais das vezes até sem consentirem. Partindo daí, o objetivo do presente trabalho é relevar que o consumidor tem direito ao esquecimento diante do tratamento de dados pessoais pelos empresários na economia digital. Estruturado no método de abordagem hipotético-dedutivo, com investigações qualitativas de doutrinas, artigos científicos e legislações, o presente trabalho alcançou a conclusão de que existem intensos compartilhamentos de informações personalíssimas dos consumidores, mesmo sem consentirem, e, então, se faz necessário que tenham o direito ao esquecimento.
Palavras-chave: Direito ao esquecimento; Consumidor; Dados pessoais; Economia digital; Banco de dados.
Abstract: With the digital economy of the present, consumers were exposed to the practices of economic agents of collection, storage and sharing of personal data, more than often even without consent. From there, the objective of this paper is to point out that the consumer has the right to forget about the processing of personal data by entrepreneurs in the digital economy. Structured in the hypothetical-deductive approach method, with qualitative investigations of doctrines, scientific articles and legislation, this paper reached the conclusion that there are intense sharing of very personal information of consumers, even without consent, and, then, it is necessary that they have the right to forget.
Keywords: Right to forgetfulness; Consumer; Personal data; Digital economy; Database.
1.Introdução
Os dados pessoais dos consumidores revelam características próprias nos âmbitos físicos, morais e psíquicos, bem como as opções particulares; e, à luz da LGPD, podem ser sensíveis ou não.
Em um contexto em que a economia digital está vigente, tais dados dos consumidores são extremamente demandados pelos que exercem atividade empresarial no ambiente digital, afinal lhes auxiliam no fomento de publicidades e na criação de tendências mercadológicas. Porém não é só isso, tais dados também podem ser alienados, no mais das vezes por valores altíssimos.
Em termos concretos, na economia digital os agentes econômicos compartilham, com frequência e agilidade, os dados pessoais dos consumidores, no mais das vezes até sem terem a declaração de vontade dos vulneráveis.
Partindo daí, o presente trabalho terá como objetivo demonstrar que os consumidores possuem o direito ao esquecimento diante do tratamento de dados pessoais na economia digital. Esse objetivo advém da concepção de que há uma problemática no tratamento de dados pessoais dos consumidores pelos agentes econômicos, pois eles partilham entre si tais conteúdos, sem se atentarem ao direito do vulnerável em ter fatos, dados e eventos pretéritos esquecidos das memórias humanas ou artificiais.
Para tanto, ter-se-á adotado o método de abordagem dedutivo, com investigações de legislações nacionais, doutrinas e artigos científicos, com a finalidade de melhor compreensão da temática.
2.Dados pessoais dos consumidores
Em princípio, cumpre destacar que, advinda da expressão latina datum, a terminologia “dado” representa uma informação numérica ou não que representa elementos ou fatos.1
Partindo daí, tem-se que há dados pessoais de consumidores consistindo em informações que os identifiquem ou permitam identificá-los, consoante Natalia Hernández.2 Essa definição está sob a égide do art. 5º, I, da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), a qual sacramenta que o dado pessoal do consumidor é a informação relacionada ao consumidor identificado ou identificável.3
Portanto, o dado pessoal do consumidor assume duas feições, a primeira é a de ser uma informação que está direta e especificamente lhe identificando, a segunda é a de permitir sua identificação, de modo indireto ou direto.4–5
O legislador agiu com lucidez ao não elencar um rol taxativo de dados pessoais, pois, conforme Viviane Nóbrega Maldonado:6
(…) nem a LGPD nem o GDPR trazem uma listagem do que poderia constituir um dado pessoal, na medida em que a avaliação deve sempre ser levada a efeito de maneira contextual. Se uma determinada informação potencialmente é capaz de tornar uma pessoa identificável, então ela pode vir a caracterizar-se como dado pessoal naquele específico contexto.
Indo além, em um contexto com fluidez de modificações econômicas, sociais e culturais, há novos e alterados dados pessoais dos sujeitos vulneráveis economicamente. Assim, foi feliz o legislador ao percorrer as correntezas da abstratividade, conquanto depende do contexto identificar as informações particulares dos consumidores.
Diante de tal omissão legislativa, frequentemente a doutrina aponta que os dados pessoais dos consumidores podem ser sobre:
(…) o nome, o endereço, o telefone, os números dos documentos de identificação, mas também currículos escolares, dados profissionais, fiscais e bancários, dívidas e créditos, meios de pagamento, o endereço eletrônico, o IP (Internet Protocol – que permite a identificação do usuário de computador).
Os consumidores também têm dados pessoais com naturezas sensíveis, e, à luz do art. 5º, II, da LGPD, eles são sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico.7
José Faleiros Júnior8 define esses dados frágeis como informações que revelam as características morais, psíquicas e físicas dos consumidores, bem como suas escolhas pessoais, tal como os gostos e preferências.
Viviane Nóbrega,9 com exacerbada lucidez, destaca que esses dados sensíveis são extremamente particulares da pessoa, incluindo aí o consumidor, o que demanda uma proteção maior para serem tratados.
Importante se atentar ao que Stefano Rodotà sacramenta. Conforme tal autor,10 a informação personalíssima do destinatário final de produto ou serviço deve ser analisada à luz do caso concreto, porque não possui valor em si mesma, “mas em virtude do contexto no qual está inserida, ou pelas finalidades para as quais é utilizada, ou pelas outras informações às quais tem sido associada”.
Assim, o dado pessoal do consumidor, em um caso concreto, poderá assumir-se com a natureza de sensível, bastando que seu tratamento cause lesão ou riscos para os titulares. Em termos concretos, o dado pessoal não frágil do consumidor perderá essa natureza, a depender de como está sendo tratado, assumindo-se, então, a roupagem de ser sensível. Nesse sentido, Carlos Konder11 pondera que:
A definição de certo dado pessoal como dado sensível não pode ser estabelecida em abstrato. Deve-se averiguar em concreto, à luz do contexto de utilização daquele dado e da relação que se pode estabelecer com as demais informações disponíveis, a potencialidade de que seu tratamento possa servir como instrumento de estigmatização ou discriminação, à luz da privacidade, identidade pessoal e, de modo geral, da dignidade da pessoa humana.
Portanto, em que pese a LGPD bifurcar os dados pessoais dos consumidores em sensíveis ou não, na realidade, é à luz de um caso concreto que tal natureza será conhecida.12
Partindo daí, tem-se que os dados pessoais dos consumidores revelam suas características próprias, nos âmbitos físicos, morais e psíquicos; e, também, suas opções, atos e fatos pessoais.
3.Osdados pessoais dos consumidores na economia digital
Bruno Bioni13 ensina que a economia digital é marcada por um intenso monitoramento eletrônico do consumidor, o qual consiste em coleta, armazenamento e compartilhamento de suas informações pessoais.
A economia digital tem como matérias-primas a observação e o divulgamento constantes dos hábitos, preferências, ideologias e características físicas, psíquicas e morais dos que a movimentam, os consumidores. Nesse sentido, Bruno Bioni14 destaca que, para a operacionalização de tal economia, “há uma complexa rede de atores que transaciona as informações pessoais dos consumidores, agindo cooperativamente para agregar mais e mais dados”.
Os dados pessoais dos consumidores são considerados como ativos da economia digital, porque, ao serem partilhados, impulsionam o desenvolvimento da atividade empresarial no ambiente digital.15 Trata-se de business intelligence, que “é a aplicação de um conjunto de técnicas e ferramentas”, com base nos conteúdos dos consumidores, “para auxiliar na administração de um negócio e na tomada de decisões”, consoante Santos.16–17
Assim, na economia digital, os consumidores são tratados como produtos por seus dados, ao serem distribuídos, servirem para os agentes econômicos tomarem decisões estratégicas, principalmente.18
Enganam-se os autores que afirmam ou afirmaram que os dados pessoais dos consumidores são como os combustíveis fósseis do petróleo (principal ativo da economia industrial). Como bem adverte Clarissa Moura,19 os dados pessoais são inesgotáveis, por serem utilizados diversas vezes e ainda se manterem intactos, duráveis, podendo ser armazenados, usados, dispostos e reivindicados por semanas, meses e anos, e reutilizáveis; já o petróleo é esgotável, não durável e reutilizável, a depender de como está sendo manejado.
Os dados pessoais dos consumidores, portanto, são multiplicáveis, substituíveis, transferíveis, difusivos e compartilháveis. Justamente por tais características é que, inseridos na economia digital, os agentes econômicos, enquanto pessoas físicas ou jurídicas que atuam com profissionalismo, organização e frequência, os compartilham não apenas para aumentar suas receitas, mas também para se manterem no ambiente mercantil.20–21
Assim, na economia digital as informações personalíssimas dos consumidores assumem-se como os principais ativos, no mais das vezes extremamente valiosos por tantas utilidades que fornecem aos agentes econômicos, especialmente a de servir como base para tomada de decisões estratégicas.
Como adverte Rosane Leal da Silva,22 na economia digital há massivos compartilhamentos das informações pessoais dos consumidores armazenadas nos bancos de dados, em virtude de serem úteis para expandir os ganhos financeiros.
Os bancos de dados com informações sobre os consumidores e suas características são organizados e estruturados de tal modo que os agentes econômicos os compartilham globalmente, em questão de segundos; e, por estarem inteligíveis, são atrativos em todos os territórios.23
Nesse sentido, Héctor Santana e Rafael Viana24 sacramentam que “as empresas, dos mais variados ramos, possuem o objetivo de aumentar, o quanto for possível, a sua base de dados”, para posteriormente compartilhar, onerosamente ou não, tais arquivos com outros agentes econômicos, com fulcro no lucro.
Fazem isso, no mais das vezes, sem obter o devido consentimento do consumidor, violando não apenas os deveres de lealdade e boa-fé, próprios de todos os negócios, mas também a Lei Geral de Proteção de Dados pessoais, a qual impõe que, para haver compartilhamento de informações pessoais dos destinatários finais de produtos ou serviços, é necessário o consentimento inequívoco.25–26
Reza Danilo Doneda que os bancos de dados com informações particulares de consumidores seguem a lógica utilitarista de proporcionar a extração do máximo de proveito possível.27 Assim, para terem o máximo proveito financeiro possível, os agentes econômicos compartilham milhares de informações pessoais dos consumidores que estão nos bancos de dados.
Partindo daí, temos que, em uma economia digital, os dados personalíssimos dos destinatários finais de produtos ou serviços são tratados para finalidades meramente financeiras, de tal modo que conteúdos, desde seus gostos, preferências e ideologias até características próprias, ficam no fluxo contínuo e interrompível de circulação entre os agentes econômicos; e isso ocorre, com frequência, sem o consentimento inequívoco e expresso deste.
4.Direito ao esquecimento do consumidorem face do tratamento de dados pessoais na economia digital
Ao serem levantados indagamentos sobre o direito ao esquecimento, à primeira vista surgem memórias dos casos de Aída Jacob Curi28 e Lebach.29Entretanto, o direito ao esquecimento também está presente no ambiente consumerista, não se restringindo apenas em relações privadas e não econômicas.30
Luciana Ferriani31 sacramenta o ideário de que o direito ao esquecimento diz respeito ao direito do consumidor de não ser lembrado por erros praticados na vida privada, isto é, trata-se do esquecimento de um passado com erros, seja na vida econômica ou não. Logo, por exemplo, o consumidor tem o direito de ser esquecido por um dado pessoal sobre como e quando ficou endividado, não se podendo eternizar seu compartilhamento entre os agentes econômicos.
O enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil pondera que o direito ao esquecimento serve para manutenção da dignidade humana, até mesmo a do consumidor. Tal enunciado está em consonância com a finalidade máxima da economia digital moderna, a de proteger o indivíduo, esteja ele ou não com roupagem de ser um adquirente de bens ou serviços; entretanto, a sua justificativa foi infeliz por dispor que o direito de estar só não atribui “a ninguém o direito de reescrever a própria história, mas apenas assegura a possibilidade de discutir o uso que é dado aos fatos pretéritos, mais especificamente o modo e a finalidade com que são lembrados”. Em realidade, contribui muito para que o consumidor reescreva sua história, tendo outras oportunidades, ganhos e vantagens, por exemplo, por ter dados personalíssimos sobre dívidas apagados de memórias artificiais e humanas.32
Assim, é cristalizado que uma das faces do direito ao esquecimento é uma faculdade individual do consumidor para que sua vida passada financeira com erros não se torne novamente pública e altamente conhecida pelos agentes econômicos, afinal pode-lhe causar graves sequelas no desenvolvimento com o bem-estar assegurado.33
Como leciona Cláudia Lima Marques,34 é prática recorrente dos agentes econômicos organizar banco de dados com informações dos consumidores, para posteriormente compartilhar em âmbitos global e nacional. Entretanto, pelo direito ao esquecimento, ao consumidor tem que ser fornecido o direito de ver seus dados pessoais indevidamente partilhados apagados, não sendo lícito que estejam sempre em um fluxo circular e contínuo de circulação; e, para isso, basta a autodeterminação informativa, que é o controle sobre o que poderá estar disponível para terceiros.35
Justamente por isso é que René Dotti36 ensina que o direito ao esquecimento é uma faculdade do consumidor para “não ser molestado por atos ou fatos do passado; trata-se do reconhecimento jurídico à proteção da vida pretérita, proibindo-se a revelação do nome, da imagem e de outros dados referentes à personalidade”.
Aline Feliciano e Sandra Goettenauer37 enfatizam que do direito ao esquecimento decorre o fato de o consumidor estar protegido de que “fatos anteriores, mesmo que verdadeiros”, e dados personalíssimos não “sejam difundidos e relembrados sem limitações”. Assim, os dados de características físicas, morais e psíquicas até as preferências individuais dos consumidores terão que estar livres de eternos compartilhamentos, quando aquele assim consentir para tal fim.
Basta o sujeito vulnerável requisitar que deseja ter seus dados pessoais esquecidos diante dos tratamentos de dados pelos agentes econômicos, para haver direito ao esquecimento. Isso lhe garante a autoridade para controlar quais memórias e informações pessoais podem ser divulgadas, o que “possibilita a criação de sua identidade pessoal sem que seja aprisionada por fatos ocorridos no passado e que não integra a sua realidade na atualidade”, consoante Aline Feliciano e Sandra Goettenauer.38
Com a presença das novas tecnologias de informação e comunicação (TIC’s) na economia digital, o dado personalíssimo do consumidor passou a ser ampla e velozmente compartilhado entre os agentes econômicos. Nesse cenário, o direito ao esquecimento do consumidor ficará afetado negativamente, no sentido de suas informações particulares sempre estarem sendo compartilhadas, com agilidade e em larga escala, entre os agentes econômicos, ainda que aquele tenha ignorância sobre tal fato ou que não expresse sua declaração de vontade.39–40–41–42–43
Como bem descreve François Ost,44 “o direito ao esquecimento, consagrado pela jurisprudência, surge mais claramente como uma das múltiplas facetas do direito a respeito da vida privada”. Isso porque, sem a autodeterminação informativa do destinatário final de bens ou serviços para seus dados pessoais circularem continuamente, tem-se uma economia desorganizada e com ausência de respeito à vida privada, consagrada para que todos, até mesmo os consumidores, tenham suas múltiplas particularidades livres de interferências e conhecimentos por parte de terceiros.
Quando os agentes econômicos tratam os dados pessoais dos consumidores com compartilhamentos e sem o devido consentimento para tal, tem-se que o direito de estar só,45 sem terceiros saberem de eventos, fatos e dados daqueles, resta sopesado pela livre-iniciativa, entretanto terá que ser ao contrário, a liberdade dos que atuam na economia digital tem que ser limitada, de modo que tais dados daqueles não fiquem sempre no fluxo de compartilhamento, quando não há consentimento para isso.
Portanto, o consumidor tem o direito ao esquecimento, e através da autodeterminação informativa poderá exigir que dados e eventos pretéritos não fiquem eternamente sendo compartilhados pelos agentes econômicos.
5.Considerações finais
Na economia digital, que é marcada fortemente pelo uso de tecnologias, os agentes econômicos tratam indevidamente os dados pessoais dos consumidores, conquanto os compartilham sem consentimento – isso quando o vulnerável tem ciência.
Enquanto efeito dominó, os destinatários finais de produtos ou serviços restam-se com as informações particulares lembradas, há um não esquecimento, é isso.
Os consumidores, neste cenário de big data econômico, possuem o direito ao esquecimento, que consiste na desmemória de seus dados das mentes humanas ou dos sistemas computacionais, tal como em um banco de dados; e, para isso, basta ele ter a autodeterminação informativa para controlar o que de sua vida passada poderá estar pública.
Referências
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- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 6
NORMAS DE SUBMISSÃO DE ARTIGOS
I) Normas técnicas para apresentação do trabalho:
- Os originais devem ser digitados em Word (Windows). A fonte deverá ser Times New Roman, corpo 12, espaço 1,5 cm entre linhas, em formato A4, com margens de 2,0 cm;
- Os trabalhos podem ser submetidos em português, inglês, francês, italiano e espanhol;
- Devem apresentar o título, o resumo e as palavras-chave, obrigatoriamente em português (ou inglês, francês, italiano e espanhol) e inglês, com o objetivo de permitir a divulgação dos trabalhos em indexadores e base de dados estrangeiros;
- A folha de rosto do arquivo deve conter o título do trabalho (em português – ou inglês, francês, italiano e espanhol) e os dados do(s) autor(es): nome completo, formação acadêmica, vínculo institucional, telefone e endereço eletrônico;
- O(s) nome(s) do(s) autor(es) e sua qualificação devem estar no arquivo do texto, abaixo do título;
- As notas de rodapé devem ser colocadas no corpo do texto.
II) Normas Editoriais
Todas as colaborações devem ser enviadas, exclusivamente por meio eletrônico, para o endereço: revista.forense@grupogen.com.br
Os artigos devem ser inéditos (os artigos submetidos não podem ter sido publicados em nenhum outro lugar). Não devem ser submetidos, simultaneamente, a mais do que uma publicação.
Devem ser originais (qualquer trabalho ou palavras provenientes de outros autores ou fontes devem ter sido devidamente acreditados e referenciados).
Serão aceitos artigos em português, inglês, francês, italiano e espanhol.
Os textos serão avaliados previamente pela Comissão Editorial da Revista Forense, que verificará a compatibilidade do conteúdo com a proposta da publicação, bem como a adequação quanto às normas técnicas para a formatação do trabalho. Os artigos que não estiverem de acordo com o regulamento serão devolvidos, com possibilidade de reapresentação nas próximas edições.
Os artigos aprovados na primeira etapa serão apreciados pelos membros da Equipe Editorial da Revista Forense, com sistema de avaliação Double Blind Peer Review, preservando a identidade de autores e avaliadores e garantindo a impessoalidade e o rigor científico necessários para a avaliação de um artigo.
Os membros da Equipe Editorial opinarão pela aceitação, com ou sem ressalvas, ou rejeição do artigo e observarão os seguintes critérios:
- adequação à linha editorial;
- contribuição do trabalho para o conhecimento científico;
- qualidade da abordagem;
- qualidade do texto;
- qualidade da pesquisa;
- consistência dos resultados e conclusões apresentadas no artigo;
- caráter inovador do artigo científico apresentado.
Observações gerais:
- A Revista Forense se reserva o direito de efetuar, nos originais, alterações de ordem normativa, ortográfica e gramatical, com vistas a manter o padrão culto da língua, respeitando, porém, o estilo dos autores.
- Os autores assumem a responsabilidade das informações e dos dados apresentados nos manuscritos.
- As opiniões emitidas pelos autores dos artigos são de sua exclusiva responsabilidade.
- Uma vez aprovados os artigos, a Revista Forense fica autorizada a proceder à publicação. Para tanto, os autores cedem, a título gratuito e em caráter definitivo, os direitos autorais patrimoniais decorrentes da publicação.
- Em caso de negativa de publicação, a Revista Forense enviará uma carta aos autores, explicando os motivos da rejeição.
- A Comissão Editorial da Revista Forense não se compromete a devolver as colaborações recebidas.
III) Política de Privacidade
Os nomes e endereços informados nesta revista serão usados exclusivamente para os serviços prestados por esta publicação, não sendo disponibilizados para outras finalidades ou a terceiros.
ABREVIATURAS E SIGLAS USADAS
ACP – Ação Civil Pública
ADIn. – Ação Direta de Inconstitucionalidade
AF – Arquivo Forense
AFMT – Anais Forenses do Estado de Mato Grosso
Ag. de Instr. – Agravo de instrumento
Ag. de Pet. – Agravo de petição
AgRg – Agravo regimental
Ag. Reg. – Agravo regimental
Ag. Reg. em REsp. – Agravo regimental em recurso
especial
AGRGRCL – Agravo regimental na reclamação
AJ – Arquivo Judiciário
AMB – Boletim da Associação dos Magistrados Brasileiros
AMJNI – Arquivos do Ministério da Justiça e Negócios
Interiores
AMS – Apelação em Mandado de Segurança
Ap. – Apelação cível ou criminal
AR – Ação Rescisória
ATA – Arquivos do Tribunal de Alçada do Rio de Janeiro
C. Civ. – Código Civil
C. Com. – Código Comercial
C. Contabilidade – Código de Contabilidade da União
Cor. Par. – Correição Parcial
CP – Código Penal
CPC – Código de Processo Civil
CPP – Código de Processo Penal
CDC – Código de Defesa do Consumidor
CE – Constituição Estadual
CF – Constituição Federal
CJ – Conflito de jurisdição
CLT – Consolidação das Leis do Trabalho
CNT – Código Nacional de Trânsito
Col. – Colendo(a)
Conf. de Compet. – Conflito de competência
CT – Carta Testemunhável
CTN – Código Tributário Nacional
D. – Decreto
DE – Decreto Estadual
DJ – Diário de Justiça
DJU – Diário da Justiça da União
DL – Decreto-Lei
DL Compl. – Decreto-Lei Complementar
DLE – Decreto-Lei Estadual
D. leg. – Decreto legislativo
DLF – Decreto-Lei Federal
DLM – Decreto-Lei Municipal
DM – Decreto Municipal
DO – Diário Oficial
DOE – Diário Oficial do Estado
DOU – Diário Oficial da União
EC – Emenda Constitucional
Edcl. – Embargos de declaração
Eg. – egrégio(a)
Embs. de Decl. – Embargos de declaração
Embs. de Diver. em REsp. – Embargos de divergência
em Recurso especial
Embs. Infrs. – Embargos Infrigentes
Embs. Nul. Inf. Julg. – Embargos de nulidade e infringentes
do julgado
ERE – Embargos em Recurso Extraordinário
Extr. – Extradição
fl. – folha
fls. – folhas
GATT – Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e
Transportes
HC – Habeas Corpus
inc. – inciso
L. – Lei
LC – Lei Complementar
LACP – Lei de Ação Civil Pública
LCP – Lei de Contravenções Penais
LD – Lei Delegada
LE – Lei Estadual
LF – Lei Federal
LICC – Lei de Introdução ao Código Civil
LM – Lei Municipal
LTr. – Legislação Trabalhista
MP – Ministério Público
MPE – Ministério Público Estadual
MPF – Ministério Público Federal
MS – Mandado de Segurança
n. – número / números
Pr. Adm. – Processo Administrativo
p. – página / páginas
Q. cr. – Queixa-Crime
r. – respeitável
RBDP – Revista Brasileira de Direito Processual
RCGRS – Revista da Consultoria-Geral do Rio
Grande do Sul
RD – Revista de Direito
RDA – Revista de Direito Administrativo
RDM – Revista de Direito Mercantil
RDP – Revista de Direito Público
RDT – Revista de Direito Tributário
RE – Recurso Extraordinário
Rec. de Rev. – Recurso de revista
Rec. el. – Recurso eleitoral
REsp. – Recurso especial
Recl. – Reclamação
Reg. – Regimento
Repr. – Representação
RISTF – Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal
RHC – Recurso em Habeas Corpus
RIAB – Revista do Instituto dos Advogados Brasileiros
RJ – Revista Jurídica
RJTJRJ – Revista de Jurisprudência do Tribunal
de Justiça do Rio de Janeiro
RJTJRS – Revista de Jurisprudência do Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul
RJTJSP – Revista de Jurisprudência do Tribunal
de Justiça de São Paulo
RMPRS – Revista do Ministério Público do Rio
Grande do Sul
RMS – Recurso em Mandado de Segurança
RO – Recurso Ordinário
ROAB – Revista da Ordem dos Advogados do Brasil
ROMS – Recurso Ordinário em Mandado de Segurança
Rec. de Rev. – Recurso de Revista
RSE – Recurso em Sentido Estrito
RSP – Revista do Serviço Público
RT – Revista dos Tribunais
RTJ – Revista Trimestral de Jurisprudência
SE – Sentença estrangeira
SEC – Sentença Estrangeira Contestada
STF – Supremo Tribunal Federal
STJ – Superior Tribunal de Justiça
STM – Superior Tribunal Militar
SL – Suspensão de liminar
Súmula – Súmula de Jurisprudência Predominante
do Supremo Tribunal Federal e do Superior
Tribunal de Justiça
TA – Tribunal de Alçada
TACiv.SP – Tribunal de Alçada Civil de São Paulo
TACrim.SP – Tribunal de Alçada Criminal de São
Paulo
TAMG – Tribunal de Alçada de Minas Gerais
TAPR – Tribunal de Alçada do Paraná
TARJ – Tribunal de Alçada do Rio de Janeiro
TCU – Tribunal de Contas da União
TJ – Tribunal de Justiça
TJAC – Tribunal de Justiça do Acre
TJAL – Tribunal de Justiça de Alagoas
TJAM – Tribunal de Justiça do Amazonas
TJBA – Tribunal de Justiça da Bahia
TJCE – Tribunal de Justiça do Ceará
TJDFeT – Tribunal de Justiça do Distrito Federal
e Territórios
TJES – Tribunal de Justiça do Espírito Santo
TJMG – Tribunal de Justiça de Minas Gerais
TJMS – Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul
TJMT – Tribunal de Justiça de Mato Grosso
TJPB – Tribunal de Justiça da Paraíba
TJPR – Tribunal de Justiça do Paraná
TJRJ – Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
TJRS – Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
TJSC – Tribunal de Justiça de Santa Catarina
TJSE – Tribunal de Justiça de Sergipe
TJSP – Tribunal de Justiça de São Paulo
TRF – Tribunal Regional Federal
TRT – Tribunal Regional do Trabalho
TSE – Tribunal Superior Eleitoral
TST – Tribunal Superior do Trabalho
v. – vide
vol. – volume
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