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TRIBUTÁRIO

Parecer Jurídico – Regime jurídico-tributário

APELAÇÃO CÍVEL Nº 452-6/4

ART. 156 DA CF

ART. 36

CF

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

CTN

DO CTN

IPTU

IRPJ

ISS

ITBI

LEI Nº 9.934/1994

Kiyoshi Harada

Kiyoshi Harada

03/05/2019

Artigo escrito em coautoria com Marcelo Kiyoshi Harada

A Consulente esclarece que é associação civil sem fins lucrativos segundo o art. 1º de seus estatutos sociais e tem como finalidades:

I – promover a união dos registradores imobiliários e a dignificação profissional da classe;

II – representar seus associados, administrativa, judicial ou extrajudicialmente, perante órgãos públicos na defesa de seus interesses ou do sistema de registro imobiliário, estando autorizada a ajuizar medidas judiciais coletivas ou intervir na qualidade de assistente, amicus curiae, ou terceiro interessado;

III – zelar para que seus associados desempenhem com exação e eficiência as atribuições de sua delegação;

IV – promover o desenvolvimento e aprimoramento dos serviços de registro de imóveis, proporcionando aos registradores meios mais eficientes para a garantia da publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos de Registro.

V – disponibilizar interfaces eletrônicas para a interconexão dos registradores entre si, com o Poder Judiciário e entes da Administração Pública, com a Central de Serviços Eletrônicos Compartilhados dos Registradores de Imóveis e demais usuários em geral;

VI – disponibilizar aos registradores ambientes seguros para o armazenamento eletrônico de dados, imagens e cópias de segurança (backups) e virtualização de servidores, com mecanismos de auditoria para a preservação da integridade, interoperabilidade e disponibilidade das informações;

VII – integrar a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil como Autoridade Certificadora (AC), Autoridade de Registro (AR), Autoridade Certificadora de Tempo (ACT), Entidade Emissora de Atributo (EEA), ou outra modalidade que vier a ser criada;

VIII – pesquisar, desenvolver e disponibilizar aos registradores ferramentas eletrônicas baseadas nas tecnologias da informação e comunicação para a realização dos atos registrais, armazenamento e tráfego de documentos e informações;

IX – fazer recomendações aos seus associados das boas práticas a serem empregadas na execução dos atos registrais e na administração das serventias;

X – prestar serviços auxiliares aos associados visando a qualidade e eficiência dos atos praticados no exercício de suas atividades;

XI – assessorar e colaborar com os poderes públicos e entidades privadas nas questões pertinentes à atividade profissional de seus associados;

XII – firmar convênios com pessoas físicas ou jurídicas, estas de direito público ou privado, com a finalidade de proporcionar, em forma eletrônica, o tráfego de títulos, informações e certidões expedidas pelos registradores;

XIII – organizar treinamentos, simpósios, cursos, palestras e outras atividades voltadas ao desenvolvimento de estudos de direito imobiliário registral e matérias afins e manter a Universidade Corporativa do Registro de Imóveis (UniRegistral), com o exercício da atividade de docência, pesquisa, divulgação e cursos de extensão universitária;

XV – promover medidas a que seus associados, prepostos e auxiliares possam gozar de benefícios securitários, assistência médica e previdenciária. (Art. 2º).

Informa a Consulente que para bem cumprir suas finalidades institucionais vem celebrando convênios com a Prefeitura e outras entidades visando Cooperação para Intercâmbio de Informações por Meio Eletrônico. Informa, outrossim, que atualmente passou a ser prestadora de serviços, centralizando vários serviços cartoriais e firmando contratos com a CEF para prestação de serviços técnicos especializados nas atividades de intermediação de intimações e consolidações de propriedades de imóveis em processos decorrentes da Lei nº 9.514/97, mediante remuneração ajustada na forma da clausula 4ª do contrato que nos foi apresentado.

Esclarece que a sua receita é inteiramente aplicada na consecução de seus objetivos estatutários, não havendo remuneração dos membros da Diretoria e nem a distribuição de lucros. Suas receitas e despesas são escrituradas em livros próprios e sujeitas ao controle e fiscalização pelo Conselho Fiscal da entidade que examina as demonstrações financeiras do exercício financeiro emitindo parecer sobre elas.

Informa, também,  que vem recolhendo o ISS, sobre a sua atividade e que não incide ICMS, bem como que nunca recolheu o imposto de renda. Somente vem procedendo ao recolhimento da COFINS e do PIS/PASEP por exigência da Caixa Econômica Federal, uma de suas tomadoras de serviços, haja vista que mesmo com o recolhimento dos tributos o valor pago em remuneração aos serviços compensa.

Apresentando o estatuto, o convênio de cooperação para intercâmbio de informações por meio eletrônico firmado com diversas entidades, o contrato firmado com a CEF, bem como balancetes e demais documentos solicita nosso parecer acerca do regime jurídico-tributário da Consulente, notadamente quanto à incidência do Imposto sobre a Renda, formulando os quesitos ao final transcritos e respondidos.

Como se verifica de seus objetivos estatutários, a Consulente

qualifica-se como uma entidade que desenvolve trabalhos de apoio e colaboração, sem intuito lucrativo, aos exercentes de cargos relacionados com a prestação de serviço público delegado pelo Estado, ou seja, apoiar e colaborar com os Oficiais de Registros de Imóveis que exercem serviço público de registradores por delegação da União, mediante percepção de custas que no dizer do Supremo Tribunal Federal tem a natureza de tributo, enquadrável na espécie taxa:

“EMENTA: I. Ação direta de inconstitucionalidade: L. 959, do Estado do Amapá, publicada no DOE de 30.12. 2006, que dispõe sobre custas judiciais e emolumentos de serviços notariais e de registros públicos, cujo art. 47 – impugnado – determina que a “lei entrará em vigor no dia 1º de janeiro de 2006”: Procedência, em parte, para dar interpretação conforme à Constituição ao dispositivos questionado e declarar que, apesar de estar em vigor a partir de 1º de janeiro de 2006, a eficácia dessa norma, em relação aos dispositivos que aumentam ou instituem novas custas e emolumentos, se iniciará somente após 90 dias da sua publicação. II. Custas e emolumentos: serventias judiciais e extrajudiciais: natureza jurídica. É da jurisprudência do Tribunal que as custas e os emolumentos judiciais ou extrajudiciais tem caráter tributário de taxa. III. Lei tributária: prazo nonagesimal. Uma vez que o caso trata de taxas, devem observar-se as limitações constitucionais ao poder de tributar, dentre essas, a prevista no art. 150, III, c, com a redação dada pela EC 42/03 – prazo nonagesimal para que a lei tributária se torne eficaz” (ADI n° 3694/AP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 6-11-2006, p. 30).

Quem presta serviço a título de colaboração com os registradores que executam serviço público delegado, sem qualquer intuito lucrativo, não pode sujeitar-se ao regime jurídico tributário aplicável às empresas em geral.

Se a Consulente não distribui qualquer parcela de seu patrimônio ou rendas a qualquer título, e aplica integralmente a sua receita no País, na consecução de seus objetivos estatutários, como prescrevem o § 3º, do art. 2º e art. 34 de seu estatuto, conformando-se com os dispostos nos incisos I e II, do art. 14 do CTN [1],  resta claro que ela não detém qualquer capacidade contributiva de que cuida o § 1º, do art. 145 da Constituição, legitimador da imposição tributária. A conclusão mais importante que se extrai desse inciso II (aplicação integral dos recursos na consecução dos fins institucionais) é que a entidade Consulente passa a NÃO TER qualquer capacidade econômico-contributiva, de que cuida o § 1º do art. 145 da CF, que é um pressuposto indispensável para a tributação.

Se as atividades exercidas pela Consulente não tem intuito lucrativo inexistirá expressão econômica que pudesse ser eleita como veículo de incidência tributária (elemento objetivo ou nuclear do fato gerador da obrigação tributária).

É caso, pois de imunidade de impostos que surge como contrapartida de serviços prestados a título de colaboração com os registrários do país que desempenham a prestação de serviço público delegado.  Por assim dizer, estão pagos os tributos in natura, in labore, porque seus bens e serviços não lucrativos estão vinculados a consecução de sua finalidade pública à medida que complementa e apoia a atividade dos prestadores de serviço público delegado.

O que é juridicamente relevante é a inexistência de propósito lucrativo da Consulente, ou seja, que a totalidade de sua receita esteja vinculada à consecução de seu objetivo estatutário de agir como coadjuvante do prestador de serviço público delegado que, diferentemente da Consulente, executa o serviço público mediante percepção de emolumentos fixados pelo poder público. Os registrários não têm a obrigação de aplicar integralmente a suas receitas na consecução do serviço público, o que levou a Suprema Corte a não distinguir, para efeitos tributários, o serviço público delegado, do serviço público concedido. Concessionários e delegatários de serviços públicos pagam tributos pela remuneração percebida, seja a que título for. Não é o caso da Consulente que é uma associação de natureza civil.

É oportuno lembrar a lição do Professor Ruy Barbosa Nogueira, introdutor da cadeira de Direito Tributário no Brasil, referindo-se às entidades filantrópicas imunes, quando afirma com propriedade que “o primeiro requisito para consideração da FILANTROPIA é precisamente este: 1. os recursos da entidade só podem ser aplicados nos fins previstos nos estatutos” [2].

Em outra passagem, o Professor Ruy Barbosa Nogueira aduz:

“Na verdade e em razão da própria natureza das coisas, essas situações realizadas por tais entidades não têm qualquer conteúdo ou resultado econômico para serem tributadas, ou como se diz na técnica da tributação, não existe física nem legalmente qualquer base de cálculo que é a expressão econômica ou de grandeza do próprio cerne do fato gerador do imposto (vide art. 97, item IV do CTN).

É mesmo um princípio universal de justiça social em matéria de tributação a consideração econômica (Die Wirtschafliche Batrachtungsweise), pela qual somente podem e devem ser escolhidas pelo legislador como assento ou base de cálculo do imposto, as relações fáticas de expressão ou conteúdo econômico e potencialmente contributiva.” [3]

Outrossim, a Consulente está longe da figura do empresário que exerce a atividade econômica com finalidade lucrativa. O conceito de empresário está expresso no art. 966 do CC, e o seu parágrafo único define quem não é empresário, in verbis:

“Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.”

Ora, por expressa disposição legal estão excluídos do conceito de empresário os exercentes de profissão intelectual, de natureza científica, como é o caso da Consulente que por meio de seus sócios, todos registradores públicos, executa atividade intelectual de natureza científica (incisos III a XIII, do art. 2º de seu estatuto).

Não há lugar para a incidência da parte final do parágrafo único do art. 966 do CC, porque a Consulente não exerce qualquer outra atividade que não estejam contidos nos limites de seu art. 2º, com uma única exceção mais adiante examinada.

Os serviços prestados a terceiros – Prefeitura e outras entidades – decorrem de convênios firmados visando cooperação para intercâmbio de informações por meio eletrônico. O convênio outra coisa não é senão um acordo firmado entre as partes para execução de um determinado objeto de interesse comum, portanto, sem finalidade lucrativa, contrapondo-se ao contrato que é um acordo de vontades entre as partes com objetivos opostos, como na compra e venda, aonde um quer vender e o outro quer comprar, dando origem a um ato negocial, caracterizador da finalidade lucrativa.

A Consulente enquadra-se na categoria de entidade imune, ou na hipótese de não incidência pura por estar fora do campo abrangido pela tributação. A lei delimita o campo de incidência tributária por meio de normas que definem os fatores geradores dos impostos. O que estiver foram desse campo abrangido pela tributação configura não incidência pura que difere do ponto de vista formal da não incidência juridicamente qualificada (imunidades estatuídas na Constituição, e não incidência expressas em lei). As atividades da Consulente  são atípicas. Essa situação de imunidade ou de não incidência pura  pode ser reconhecida a qualquer tempo mediante provocação do interessado.

Única questão que suscita dúvida é a informação da Consulente de que ultimamente passou a celebrar contratos com a Caixa Econômica Federal para prestação de serviços técnicos especializados nas atividades de intermediação de intimações e consolidações de propriedades de imóveis em processos decorrentes da Lei nº 9.514/97, mediante remuneração previamente ajustada.

Examinando o conteúdo de um desses contratos que nos foi apresentado verifica-se a presença de todos os elementos estruturais de um contrato, quais sejam, as partes, o acordo de vontade e o preço do serviço ajustado na forma da cláusula 4ª do contrato. Esse tipo de ajuste, que não tem previsão estatutária, caracteriza, em princípio, a prática de atos com finalidade lucrativa.

Mas, é preciso atentar que esse tipo de prestação de serviço não é uma regra geral, pois não faz parte dos objetivos da Consulente. O contrato de prestação de serviços é celebrado em caráter excepcional sendo que o preço percebido pela Consulente continua sendo inteiramente aplicado na consecução de suas finalidades institucionais, quer prestando serviços de assistência técnica a seus associados (todos registradores públicos), quer firmando convênios com entidades públicas e privadas para proporcionar, em forma eletrônica, o tráfego de títulos, informações e certidões expedidas pelos registradores, quer organizando treinamentos, simpósios, cursos, palestras e outras atividades afins voltadas ao desenvolvimento de estudos de direito imobiliário registral e manter a Universidade Corporativa do Registro de Imóveis – UniRegistral.

O que é mais importante no reconhecimento da imunidade é a aplicação total de rendas da entidade imune na consecução de sua finalidade institucional. Por isso, o Supremo Tribunal Federal vem relevando o exercício atípico e esporádico das atividades da entidade imune, como vendas ocasionais de mercadorias pela entidade imune, ou a aplicação no mercado de capital de suas rendas disponíveis, desde que as receitas decorrentes dessas operações esporádicas sejam integralmente aplicadas na consecução da finalidade estatutária, como assinalado no nosso livro.[4]

Aliás, cumpre registrar que a Corte Suprema, em matéria de imunidade em geral, vem dando interpretação ampla de sorte a preservar a finalidade do benefício tributário: Súmula 657; ADI 1802-DF; RREE 257.700, 97.708, 116.188, 186.175 e 193.969; AGRAGs 155.822 e 177.283; e ERE 210.251; e AI nº 5359222.

A Consulente não pratica qualquer ato típico que a leve à incidência de impostos estaduais ou federais, com exceção do imposto de renda do qual é imune, como visto. Ainda que assim não fosse, a Consulente estaria amparada pelo instituto da isenção, como veremos a seguir.

Ainda que se desconsidere a imunidade do IRPJ a Consulente está amparada pela expressa previsão de desoneração desse imposto por meio de isenção prevista no art. 174 do RIR, Decreto nº 3.000/00 que, fundado no art. 15 da Lei nº 9.532/97 assim  prescreve:

“Art. 174. Estão isentas do imposto as instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos”.

A atividade da Consulente consiste em prestar serviços a seus associados, todos oficiais efetivos ou interinos do Registro de Imóveis, colaborar com as entidades públicas e privadas mediante convênios para prestação de serviços técnicos e promover simpósios, palestras, cursos voltados ao desenvolvimento de estudos de direito imobiliário registral, como retromencionados.

O contrato firmado com a CEF, de forma excepcional, para prestação de serviço mediante remuneração como retrocitado não deve ser interpretado de forma literal, para enxergar aí uma atividade lucrativa como um fim em si mesmo. O relevante para definição do regime jurídico-tributário é a destinação total de suas rendas na consecução de suas atividades-fins, de forma a exaurir sua capacidade contributiva. Percepção do preço do serviço prestado de forma excepcional não é um fim em si mesmo, pelo que não se caracteriza a finalidade lucrativa. O exercício esporádico dessa atividade atípica objetiva obter receitas extras para sua aplicação no país, a fim de alcançar plenamente os seus objetivos estatutários.

Assim, a Consulente ainda que não fosse imune enquadra-se perfeitamente na hipótese de isenção do imposto de renda, na forma do art. 174 do Regulamento.

Resta, agora, examinar o regime jurídico tributário em relação a impostos municipais.

Importante assinalar que a legislação municipal de São Paulo, sob o título de isenção mistura casos de imunidade que se situam no campo de definição de competência tributária (normas constitucionais), com os casos de isenção propriamente dita que se situam no campo do exercício da competência tributária (leis infraconstitucionais). Daí a extrema utilidade das considerações de natureza jurídica acerca da imunidade, como as tecidas nos tópicos antecedentes.

Com relação ao ISS dispõe o art. 61 da Lei nº 6.989/66, com a redação conferida pela Lei nº 7.410/69:

“São isentas do imposto as prestações do serviço efetuadas por:

I – proprietário de um único imóvel veículo de aluguel dirigido por ele próprio e utilizado no transporte de passageiros, sem qualquer auxiliar ou associado;

III – associações culturais e as desportivas, sem venda de “poules”, talões e apostas;

….

VII – jornais ou periódicos destinados à publicação de noticiário e informação de caráter geral e de interesse da coletividade – e desde que satisfaçam as condições estabelecidas na letra “e” do item II do art. 18, estações radioemissoras e de televisão, exceto, quanto às duas últimas, as diversões públicas realizadas em teatros ou auditórios e os serviços referidos nos incisos LIII, LV e LXIV do art. 49;

XI – parques zoológicos, nos termos da Lei nº 6.758, d3e 29 de novembro de 1995”.

Vislumbra-se, desde logo, que a isenção do inciso VII – jornais e periódicos – são casos de imunidade objetiva previstas no art. 150, inciso VI, letra d da Constituição Federal. Sendo uma limitação constitucional do poder de tributar descabe à lei local restringir o seu alcance e conteúdo, como  fez o inciso VII sob comento, subordinando a fruição da imunidade  “à publicação de noticiário e informação de caráter geral e de interesse da coletividade – e desde que satisfaçam as condições estabelecidas na letra “e” do item II do art. 18”.

O legislador ordinário só pode impor condições que entender convenientes para a fruição da isenção, assim mesmo observados os princípios constitucionais da isonomia e outros aplicáveis à espécie. Não pode adentrar na seara das limitações do poder de tributar indo além das restrições previstas no texto constitucional. Isso aconteceu no caso sob exame por causa da mistura generalizada entre os institutos da imunidade e da isenção.

A Consulente enquadra-se na previsão do inciso III, primeira parte, que se refere às associações culturais. A palavra “cultura” que vem do latim colere significa cultivar. Em sentido amplo, a cultura abrange tudo aquilo que é produzido pela inteligência humana como o conhecimento, a arte, as crenças, a religião, o esporte, a literatura, a lei, a moral, a ética, as vestimentas, os costumes, os hábitos, as aptidões, os símbolos e práticas sociais apreendidos de geração em geração, através da vida em sociedade. Em sentido social seria uma espécie de herança social de um povo.

Inegável pois, que a Consulente à vista de seus objetivos estatutários enquadra-se na categoria de associação de natureza cultural de que cuida o inciso III não lhe sendo pertinentes as restrições previstas para as associações esportivas.

De conformidade com o art. 18 da Lei nº 6.989/66:

“São isentos do imposto:

I – os conventos e os seminários, quando de propriedade de entidades religiosos de qualquer culto, ou por elas utilizados;

II – os imóveis construídos pertencentes ao patrimônio:

  1. de governos estrangeiros, utilizados para sede de seus consulados, desde que haja reciprocidade de tratamento declarada pelo Ministério das Relações Exteriores;
  2. de entidade culturais, observado o disposto em lei federal complementar quando às instituições de educação ou de assistência social;

l – da companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – SABESP, enquanto a empresa executar os serviços que legalmente lhe são atribuídos”.

A exemplo da legislação do ISS, aqui também, houve mistura das hipóteses de imunidade com as de isenção. A isenção do inciso I é na verdade uma hipótese de imunidade prevista no art. 150, VI, b da CF. E a isenção da letra a, do inciso II decorre da Convenção de Viena sobre relações consulares subscrita pelo Brasil em 24-4-63, aprovada pelo Decreto Legislativo de nº 6/67, ratificado e promulgado pelo Decreto nº 61.078, de 26-6-67. Independe, pois, de previsão na lei local, pois o Estado Federal Brasileiro está vinculado aos termos dessa Convenção. A proibição do inciso III[5], do art. 151 da CF refere-se à União enquanto pessoa jurídica de direito público interno, nunca enquanto representante do Estado Federal Brasileiro no plano internacional.

A Consulente enquadra-se na isenção da letra b, do inciso II sob exame, considerada a palavra “cultura” em seu sentido amplo, como já vimos. Desenvolver e aprimorar serviços de registro de imóveis, pesquisar e desenvolver ferramentas eletrônicas baseadas nas tecnologias da informação e da comunicação; organizar treinamentos, cursos, simpósios, palestras de direito imobiliário registral e matérias afins e manter a Universidade Corporativa do Registro de Imóveis (UniRegistral), como consta de seus estatutos, sem dúvida, implica  desenvolvimento de  atividade no campo cultural, a exemplo das  entidades culturais referidas no inciso legal sob análise. As restrições previstas na parte final da letra b referem-se aos requisitos para o gozo da imunidade previstos no já mencionado art. 14 do CTN que, por sinal, a Consulente os preenche satisfatoriamente.

  1. Qual o regime tributário da Consulente em relação do IRPJ?

R: Do que foi exposto no corpo deste parecer a Consulente, por preencher os requisitos do art. 14 do CTN, pode ser considerada entidade imune, embora não tenha expressa previsão na letra c, do inciso VI, do art. 150 da CF que cuida das entidades imunes. É certo, porém, que ela não pratica com habitualidade atos tipificados na legislação tributária pelo que ela se situa-se no campo da não incidência pura. Na pior das hipóteses a Consulente está amparada, de forma expressa, pela isenção do IRPJ por força do disposto no art. 174  Regulamento do Imposto de Renda – RIR –, Decreto nº 3.000/99 que tem base legal nos art. 15 da Lei nº 9.532/97.

  1. Qual o regime tributário em relação ao ISS e ao IPTU?

R: A Consulente pode usufruir da isenção do ISS e do IPTU, na forma da legislação municipal de São Paulo citada no corpo deste parecer.

  1. Qual ou quais as medidas a serem adotadas em face das respostas dadas aos quesitos anteriores?

R: Com relação ao IRPJ, como o fisco não vem exigindo o seu pagamento ao longo do tempo, há um reconhecimento tácito da imunidade, da não incidência ou da isenção. Não vemos necessidade de requerer o reconhecimento da imunidade ou da isenção. A questão poderá ser dirimida se e quando ocorrer a exigência do imposto pelo fisco federal.

Quanto ao ISS e ao IPTU que a Consulente vem pagando poderá, em o querendo, requerer o reconhecimento da isenção dirigido ao Diretor de Rendas Mobiliárias e ao Diretor de Rendas Imobiliárias, respectivamente, da Secretaria de Finanças do Município de São Paulo.

É o nosso parecer, salvo melhor juízo.


[1] Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9 º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:
I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, qualquer título;
II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;
III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
[2]Imunidades. São Paulo: Resenha Tributária, 1990, p.136.
[3]A imunidade tributária das entidades fechadas de previdência  privada, co-autoria. São Paulo: Resenha Tributária, 1984, p. 74.
[4] Cf. nosso Direito financeiro e tributário, 25ª ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 421-422.
[5] Proibição de a União instituir isenções de tributos estaduais e municipais como acontecia no regime de anomalia jurídica.

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