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Complexa privatização da Eletrobras
Kiyoshi Harada
22/06/2021
O tão falado programa de privatização que vem de governos anteriores anda a passos de tartaruga, tamanho o apego da classe política na manutenção das estatais, voltadas para a exploração de atividades econômicas, como forma permanente de indicar e nomear pessoas próximas para os cargos de Diretoria e demais cargos ou funções destinadas a servidores graduados.
Com isso, a estatal perde eficiência no desempenho de suas atribuições e se transforma em cabide de empregos, gerando a partir desse quadro contínuos atos de corrupção.
Por conta disso, hoje, a corrupção, pode-se dizer, está institucionalizada de forma sistemática e planejada.
A Medida Provisória da privatização da Eletrobras, que o saudoso Roberto Campos denominava de Eletrossauro, em referência a ferozes dinossauros do passado que faziam estragos terríveis por onde passavam, recebeu uma porção de emendas, por meio de jabotis plantadas pelos senhores deputados em defesa de seus interesses discutíveis do ponto de vista do real interesse público.
Chegando ao Senado Federal o projeto de conversão, aprovado na Câmara, sofreu novas emendas, desta feita, por novos por jabotis, colocados estrategicamente pelos representantes dos Estados.
Os senhores senadores, para proteger os seus currais eleitorais localizados em vários Estados da Federação, direcionaram a construção de usinas térmicas a gás em locais inapropriados, onde não há produção de gás.
Essas emendas obrigam o governo a adquirir energia proveniente de usinas térmicas a gás a serem construídas em locais distantes de infraestruturas existentes. Esse fato obrigará a construção de gasodutos quilométricos a custos elevadíssimos.
Essas usinas são estendidas para a região sudeste não contemplada pelos jabotis da Câmara. Os jabotis do Senado preconizam, ainda, a localização das usinas térmicas a gás nas capitais de regiões metropolitanas e Estados onde não existem redes de distribuição de gás. As emendas privilegiam os Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, sem qualquer compromisso com os estudos técnicos e logísticos, obrigando a se efetuar investimentos da ordem de R$ 84 bilhões, a serem custeados pelos consumidores de energia por meio de tarifaços.
Essa “privatização” tem por objetivo imediato fazer “caixa” a curto prazo, pois, a União continua como acionista detendo 45% das ações, o suficiente para emplacar quase metade dos diretores da ex estatal.
O objetivo do programa de desestatização, bem como, o da desburocratização em sua versão original era o de reduzir o “custo Brasil”, devolvendo à iniciativa privada o desenvolvimento de atividades econômicas, ressalvadas as hipóteses do art. 173 da CF, bem como, substituir o modelo burocrático na prestação de serviço público pelo modelo gerencial, ágil e eficiente. Com esse objetivo foi inserido o princípio da eficiência no art. 37 da CF, por meio da Emenda Constitucional nº 19/1998, porém, sem qualquer compromisso com a sua efetividade.
Da mesma forma, o princípio da razoável duração do processo, trazido pela Emenda nº 45/2004, não passa de norma no campo puramente abstrato. Soluções legislativas por meio de normas desprovidas de efetividade nada resolvem. As normas não são auto operativas.
É preciso que alguém arregace as mangas e comece a trabalhar. Só que nenhum servidor do Estado, em seu sentido mais amplo, está vocacionado para desempenhar essa laboriosa atividade que o impede de curtir o merecido ócio.
Termino este artigo com as palavras do saudoso Roberto Campos, jurista, economista, diplomata e estadista que resume o conteúdo de nossa Constituição de 1988, que deu um grande avanço para trás:
“Nossa Constituição é uma mistura de dicionário de utopias e regulamentação minuciosa de efêmero; é, ao mesmo tempo, um hino à preguiça e uma coleção de anedotas; é saudavelmente libertária no político, cruelmente liberticida no econômico, comoventemente utópica no social; é um camelo desenhado por um grupo de constituintes que sonhavam parir uma gazela.”
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