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STF decide Prazo Prescricional do FGTS
Gustavo Filipe Barbosa Garcia
14/11/2014
A prescrição torna inexigível a pretensão relativa ao direito subjetivo violado, em razão de inércia do seu titular, preservando-se, assim, a estabilidade e a segurança jurídica nas relações sociais.
A Constituição da República, art. 7º, inciso XXIX, dispõe sobre a prescrição a ser aplicada às relações de trabalho.
Nesse enfoque, a partir da (ciência da) violação do direito, o trabalhador tem o prazo de cinco anos para exigir a sua satisfação, por meio do ajuizamento da respectiva demanda, devendo respeitar, também, o biênio prescricional, contado da extinção do contrato de trabalho[1].
Cabe esclarecer que a prescrição é instituto de Direito material, embora possa ter aplicação no processo, por acarretar a resolução do feito com exame do mérito[2].
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, por seu turno, é atualmente previsto no art. 7º, inciso III, da Constituição Federal de 1988, como direito dos trabalhadores urbanos e rurais.
A Lei 8.036/1990, no art. 23, § 5º, parte final, prevê, especificamente quanto ao FGTS, a “prescrição trintenária”.
A mesma previsão consta do art. 55 do Regulamento do FGTS, aprovado pelo Decreto 99.684/1990.
Desse modo, prevalecia o entendimento constante na Súmula 362 do Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de ser “trintenária a prescrição do direito de reclamar contra o não recolhimento da contribuição para o FGTS, observado o prazo de 2 (dois) anos após o término do contrato de trabalho”.
O prazo prescricional de trinta anos para a cobrança das contribuições do FGTS também é previsto na Súmula 210 do Superior Tribunal de Justiça.
Entendia-se, assim, que o referido art. 23, § 5º, da Lei 8.036/1990, ao prever prazo prescricional superior àquele fixado na Constituição da República, não era inconstitucional, por se tratar de norma mais favorável ao empregado, que deveria prevalecer em razão do princípio da proteção, adotado, inclusive, no caput do art. 7º da Constituição.
De todo modo, ainda quanto ao tema, como explicita a Súmula 206 do TST, a “prescrição da pretensão relativa às parcelas remuneratórias alcança o respectivo recolhimento da contribuição para o FGTS”.
Apesar do acima exposto, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, em 13 de novembro de 2014, no Recurso Extraordinário com Agravo nº 709.212/DF, com repercussão geral reconhecida, decidiu que o prazo prescricional aplicável às cobranças dos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço é o previsto no art. 7º, inciso XXIX, da Constituição da República, por se tratar de direito dos trabalhadores urbanos e rurais, expressamente arrolado no inciso III do referido dispositivo constitucional.
Prevaleceu, assim, o entendimento de ser aplicável ao FGTS o prazo de prescrição de cinco anos, a partir da lesão do direito (e não apenas o prazo prescricional bienal, a contar da extinção do contrato de trabalho), tendo em vista, inclusive, a necessidade de certeza e estabilidade nas relações jurídicas.
Vale dizer, uma vez respeitado o prazo prescricional de dois anos, que se inicia com o término da relação de emprego, somente são exigíveis os valores devidos nos últimos cinco anos que antecedem o ajuizamento da ação.
Com isso, decidiu-se que o prazo prescricional de 30 anos, previsto no art. 23, § 5º, Lei 8.036/1990 (e no art. 55 do Regulamento do FGTS, aprovado pelo Decreto 99.684/1990), é inconstitucional, por violar o já mencionado art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal de 1988.
Ademais, prevaleceu no STF o entendimento de que não se aplica ao caso o chamado princípio da proteção, por não se tratar de direito mínimo, que possa ser ampliado por meio de lei ordinária. Quanto ao tema, a Constituição da República determinou, de forma expressa e precisa, o prazo prescricional para se exigir a cobrança dos créditos resultantes das relações de trabalho, como ocorre justamente quanto ao FGTS, que tem natureza jurídica de direito social e trabalhista.
Argumentou-se, ainda, conforme voto do relator, Min. Gilmar Mendes, que “a legislação que disciplina o FGTS criou instrumentos para que o trabalhador, na vigência do contrato de trabalho, tenha ciência da realização dos depósitos pelo empregador e possa, direta ou indiretamente, exigi-los”.
Nesse sentido, o art. 17 da Lei 8.036/1990 prevê que os empregadores são obrigados a comunicar mensalmente aos trabalhadores os valores recolhidos ao FGTS e repassar-lhes todas as informações sobre suas contas vinculadas recebidas da Caixa Econômica Federal ou dos bancos depositários. Além disso, a CEF, como agente operador do FGTS, envia aos trabalhadores, a cada dois meses, extratos atualizados dos depósitos. O art. 25 da Lei 8.036/1990 possibilita não apenas ao próprio trabalhador, seus dependentes e sucessores, mas também ao sindicato a que estiver vinculado, acionar diretamente a empresa por intermédio da Justiça do Trabalho, para obrigá-la a efetuar os depósitos das importâncias devidas a título de FGTS.
Ainda nesse contexto, a Lei 8.844/1994, no art. 1º, dispõe ser atribuição do Ministério do Trabalho e Emprego a fiscalização e a apuração das contribuições ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. O art. 2º do mesmo diploma legal, por seu turno, prevê que compete à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a inscrição em Dívida Ativa dos débitos para com o FGTS, bem como a representação judicial e extrajudicial do FGTS, para a correspondente cobrança, relativamente à contribuição e às multas e demais encargos devidos.
Concluiu-se, portanto, que “a existência desse arcabouço normativo e institucional é capaz de oferecer proteção eficaz aos interesses dos trabalhadores, revelando-se inadequado e desnecessário o esforço hermenêutico do Tribunal Superior do Trabalho, no sentido da manutenção da prescrição trintenária do FGTS após o advento da Constituição de 1988” (voto do Min. Gilmar Mendes).
Ficou decidido, ainda, ser necessária a mitigação do princípio da nulidade da lei inconstitucional, com a consequente modulação dos efeitos da referida decisão, atribuindo-lhe efeitos ex nunc, ou seja, prospectivos, tendo em vista a necessidade de segurança jurídica, por se tratar de modificação e revisão da jurisprudência adotada por vários anos no STF (bem como no TST), com fundamento no art. 27 da Lei 9.868/1999, aplicável também ao controle difuso de constitucionalidade.
Desse modo, “para aqueles [casos] cujo termo inicial da prescrição ocorra após a data do presente julgamento, aplica-se, desde logo, o prazo de cinco anos. Por outro lado, para os casos em que o prazo prescricional já esteja em curso, aplica-se o que ocorrer primeiro: 30 anos, contados do termo inicial, ou 5 anos, a partir desta decisão. Assim se, na presente data, já tenham transcorrido 27 anos do prazo prescricional, bastarão mais 3 anos para que se opere a prescrição, com base na jurisprudência desta Corte até então vigente. Por outro lado, se na data desta decisão tiverem decorrido 23 anos do prazo prescricional, ao caso se aplicará o novo prazo de 5 anos, a contar da data do presente julgamento” (STF, Pleno, ARE nº 709.212/DF, voto, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13.11.2014).
Em face da relevância do julgado em questão, transcreve-se a respectiva ementa:
“Recurso extraordinário. Direito do Trabalho. Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Cobrança de valores não pagos. Prazo prescricional. Prescrição quinquenal. Art. 7º, XXIX, da Constituição. Superação de entendimento anterior sobre prescrição trintenária. Inconstitucionalidade dos arts. 23, § 5º, da Lei 8.036/1990 e 55 do Regulamento do FGTS aprovado pelo Decreto 99.684/1990. Segurança jurídica. Necessidade de modulação dos efeitos da decisão. Art. 27 da Lei 9.868/1999. Declaração de inconstitucionalidade com efeitos ex nunc. Recurso extraordinário a que se nega provimento.” (STF, Pleno, ARE nº 709.212/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13.11.2014).
Como se pode notar, com o importante julgado em destaque, deixa de prevalecer o prazo prescricional de 30 anos, que era reconhecido nas Súmulas 362 do TST e 210 do STJ, passando-se a adotar o prazo de cinco anos também quanto ao FGTS.
[1] Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 1231.
[2] Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito processual do trabalho. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 380.