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O Dano Extrapatrimonial na Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) após o advento da MP 808/2017
Enoque Ribeiro dos Santos
23/11/2017
Não obstante o avanço do instituto do dano moral ou dano extrapatrimonial no Direto do Trabalho no Brasil, tanto na doutrina, como na jurisprudência, com o alargamento dos casos de incidência privilegiando a dignidade da pessoa humana, que constitui o fundamento de validade do Estado Democrático de Direito, a novel Lei n. 13.467/2017, denominada Reforma Trabalhista, veio apresentar um novo regramento, nesta temática, a partir do art. 223-A, revisto pela Medida Provisória n. 808, de 14/11/2017, que passaremos a analisar, de forma perfunctória, artigo a artigo, nas próximas linhas.
Preliminarmente, o legislador brasileiro passou a adotar a expressão dano extrapatrimonial em substituição a dano moral, semelhantemente como este instituto é denominado em Portugal, na Itália e Alemanha, em cujos países é denominado dano não patrimonial, especialmente por ser de mais amplo escopo, abrangendo inclusive o dano estético.
Em seguida, adotou a estratégia de tarifar ou de estabelecer um marco regulatório, em balizas mínimas e máximas para o dano extrapatrimonial, afastando, ou tornando mais difícil para o magistrado aplicar, de sponte própria, o arbitramento do dano extrapatrimonial em cada caso concreto. Eis o desafio que nos espera nas próximas linhas para compartilhar com o nobre leitor.
Um novo critério para determinação do valor da reparação por dano moral (extrapatrimonial) individual com o advento da Lei n. 13.467/2017 (nova CLT), revisto pela Medida Provisória n. 808/2017.
Com o objetivo de colaborar com debate acadêmico, doutrinário e jurisprudencial quanto à determinação do quantum satis do dano moral individual, agora dano extrapatrimonial, pelo seu caráter subjetivo que conduz a maior dificuldade, com base em nossa experiência anterior, apresentamos aos aplicadores do Direito, em nosso livro[1], uma reflexão quanto ao critério para fixação do valor da reparação, como consta da tabela abaixo.
É cediço que a honra, dignidade, intimidade, vida privada de um ser humano não tem preço, que só as coisas têm preços, como já dizia Kant, pois a pessoa é um ser único, insubstituível, feito à imagem e semelhança de Deus, dotado de livre arbítrio, inteligência, racionalidade, constituindo-se em um ser programável pela sua própria vontade, força física e mental, e determinação, porisso ainda não terminado, em constante transformação, ou como dizia Heidegger em “estado de permanente inacabamento”, daí sua dupla natureza jurídica, uma material e outra imaterial (espiritual) ou extrapatrimonial.
É natural que o Direito ampare o ser humano em sua totalidade, isto é, em seu duplo patrimônio: o material e o espiritual, este ainda mais importante, posto que deveria ser indevassável, por sua especial natureza, com traços de eternidade, já que liga o homem a seu Criador.
Porém, quando ocorre um vilipêndio a esta especial natureza do ser humano, por ato ilícito ou abusivo por outrem e a devida reparação se faz necessária, havendo a movimentação da máquina judiciária neste sentido, não será permitido ao julgador deixar de se pronunciar a respeito (princípio do non liquet), na fixação da justa reparação.
Portanto, é neste sentido que, em nome dos princípios mais elevados emanados da Constituição Federal de 1988, entre eles a isonomia, a segurança jurídica, bem como a previsibilidade das decisões judiciais, de modo a se evitar decisões colidentes, conflitantes ou contraditórias, consideramos, já no passado, de bom alvitre estabelecer critérios, de modo a parametrizar os valores das reparações por dano extrapatrimonial, mas sempre deixando ao livre arbítrio do magistrado, para que, dentro de seu juízo de ponderação, fixe a justa indenização ao caso concreto que se lhe apresente.
As alterações relativas ao dano extrapatrimonial na Lei 13.467/2017, com a revisão pela Medida Provisória n. 808/2017
Com o advento da Lei n. 13.467/2017 (Nova CLT), revista pela Medida Provisória n. 808, de 14/11/2017, passamos a comentar os novos dispositivos legais, como segue:
TÍTULO II-A
DO DANO EXTRAPATRIMONIAL
Art. 223-A. Aplicam-se à reparação de danos de natureza extrapatrimonial decorrentes da relação de trabalho apenas os dispositivos deste Título.
O legislador inicia o regramento do instituto do dano não patrimonial, ou moral, limitando as hipóteses de incidência apenas às elencadas neste título, o que não se coaduna com a própria realidade dos fatos, haja vista a dinâmica da sociedade moderna. A rigor, a norma acima se apresenta como numerus clausus, e não numerus apertus, como deveria ser.
O Código Napoleônico de 1804, na França, considerado um dos mais avançados na época, caminhou na mesma vertente, ao considerar que seus artigos poderiam enquadrar todos os fatos sociais da época, ou seja, fazer a subsunção do fato à norma, fenômeno que ficou conhecido como dogma da completude do ordenamento jurídico civilista.
Porém, o caminhar evolutivo da sociedade veio mostrar, em pouco tempo após a sua promulgação que, enquanto a lei é petrificada, estática, os fatos sociais são dinâmicos e no evolver das relações humanas criam novos fatos e novas situações que passam a não ser albergadas pelo direito posto ou pré-existente na norma cristalizada.
Na sociedade reurbanizada, globalizada, consumerista, politizada e altamente cibernética em que vivemos, não há possibilidade de estancar ou de represar a ocorrência de um instituto tão amplo como o dano não patrimonial.
Portanto, entendemos que uma legislação, por mais avançada e moderna que seja, não tem o condão de albergar todos os casos de incidência na contemporaneidade, como se extrai do dispositivo legal acima mencionado.
Além disso, em sua evolução, a sublimidade e nobreza do instituto do dano extrapatrimonial, longe de levar à sua banalização, como muitos já quiseram fazer crer, cada nova hipótese de ocorrência ou novidade jurídica o enobrece, pois é produto do desenvolvimento do próprio espírito humano. Isto provém exatamente do fato de que o dano moral segue a mesma trajetória do ser humano, pois um é corolário do outro.
Dentro deste contexto, entendemos que não há como limitar ou restringir a aplicação deste instituto do dano extrapatrimonial a apenas aos casos especificados neste estreito limite legal, como dispõe este novel artigo.
Art. 223-B. Causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são as titulares exclusivas do direito à reparação.
Este artigo além de trazer um conceito de dano moral limita sua ocorrência apenas aos titulares do direito material à reparação, o que refoge à realidade dos fatos. Muitas vezes os titulares do dano não patrimonial ultrapassam a pessoa do trabalhador, para atingir seus familiares mais próximos, situação que não se confunde com o dano indireto ou por ricochete.
Vejamos a situação de um pequeno núcleo familiar, constituído pelo trabalhador empregado, esposa e filhos, que vivem em situação de plena felicidade, saúde e estabilidade, partilhando tudo o que a natureza lhes pode proporcionar. A partir de uma doença profissional desencadeada no emprego ou um acidente de trabalho, por negligência do empregador, pode provocar uma completa desestruturação deste núcleo familiar.
Neste caso, entendemos que o titular do direito à reparação pelo dano não patrimonial sofrido não é apenas o trabalhador, mas também o cônjuge e membros da família, pois todos, sem exceção, foram atingidos pelo núcleo do instituto, ou seja, pela dor e angústia espiritual, já que juntos compartilhavam dos momentos de felicidade.
Como muitas vezes não será mais possível o retorno à situação anterior (status quo ante bellum), de forma equivalente à situação de não ocorrência do dano, ou o mais próximo possível dela, não restará outra opção a não ser o pagamento da indenização ou reparação à vítima e familiares próximos, conforme recomenda o princípio do restitutio in integrum.
Para aprofundar ainda mais a análise deste caso hipotético, imaginemos que o trabalhador, em decorrência da doença profissional ou do acidente ficou impotente sexualmente. Daí, configurada a culpa da empresa, teremos uma hipótese de dano sexual em face da privação da esposa a uma vida sexual normal, que ostentava anteriormente ao evento danoso, fato que, por se constituir em um direito da personalidade levará à extensão da reparação à pessoa da esposa.
Observamos desta forma, que a novel legislação deixou ao largo aspectos importantíssimos, como a responsabilidade objetiva (art. 927, parágrafo único do Código Civil), e o dano extrapatrimonial por ricochete, e a responsabilidade extrapatrimonial do empregador em relação aos acidentes de trabalho (art. 7º, XXVIII; 109, I; 201, § 1º todos da CF/88).
Art. 223-C. A honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa física.
Este artigo foi modificado pela Medida Provisória n. 808/2017 e passou a ter a seguinte redação:
“Art. 223-C. A etnia, a idade, a nacionalidade, a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, o gênero, a orientação sexual, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa natural.” (NR)
Em uma análise preliminar, sem maiores pretensões, podemos perceber que vários direitos da personalidade que encarnam a configuração do dano extrapatrimonial não foram compreendidos neste artigo, entre os quais o direito à vida privada, à vida familiar sã, plena e feliz, à beleza, a qualidade de vida, etc, o que exigirá do magistrado, no caso concreto, à devida subsunção do fato real à norma legal.
No entanto, a Medida Provisória n. 808/2017 incluiu outros direitos da personalidade, entre eles, a etnia, a idade e a nacionalidade ao texto original, que são bens já resguardados constitucionalmente, além de alterar a expressão “pessoa física” por “pessoa natural”.
Além disso, em lugar de “sexualidade” passou a se utilizar das expressões “gênero” e “orientação sexual”, como a responder às críticas doutrinárias divulgadas ao longo do período de vacatio legis em relação à impropriedade do termo na redação original.
Porém, continuou em falta o legislador ao não incluir no tópico qualquer referência a uma das mazelas nacionais de amplo espectro, sobretudo no plano das relações jurídicas de emprego, ou seja, no combate que devemos revelar em relação à todas as formas de discriminação racial, insculpida no art. 3º., IV, da CF/88, objeto de ampla atuação do Ministério Público do Trabalho por meio de Inquéritos Civis.
Vejamos os demais artigos da Lei da Reforma Trabalhista, no tópico:
Art. 223-D. A imagem, a marca, o nome, o segredo empresarial e o sigilo da correspondência são bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa jurídica.
A novidade jurídica deste artigo está relacionada ao reconhecimento de que a pessoa jurídica também pode ser afetada pelo dano extrapatrimonial, porém, de forma tão somente objetiva, já que por se constituir uma abstração, a empresa não possui espírito.
Como o núcleo basilar da responsabilidade subjetiva repousa no tripé dor, humilhação e angústia, a empresa ou pessoa jurídica não poderá ser acometida nesta vertente da responsabilidade civil.
Com efeito, o acolhimento da admissibilidade do dano não patrimonial em relação à pessoa jurídica veio acolher o disposto na Súmula n. 227 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
“Súmula n. 227 – A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”.
Obviamente tal especificidade de dano moral só recairá sobre a pessoa do empregado ou de terceiro, que por ação ou omissão, culpa (negligência, imprudência ou imperícia) ou dolo, cometer ato ilícito e lesar a imagem ou reputação da empresa ou empregador no mercado em que opera.
Se houver a judicialização da demanda empresarial, o Judiciário poderá condenar o ofensor a uma sanção pecuniária, por meio de pagamento de indenização, ou ainda em uma obrigação de fazer (retratação pública, publicação de anúncio em jornais ou revistas, ou prestação de serviços à comunidade).
Art. 223-E. São responsáveis pelo dano extrapatrimonial todos os que tenham colaborado para a ofensa ao bem jurídico tutelado, na proporção da ação ou da omissão.
Este artigo contempla a possibilidade de responsabilidade solidária ou subsidiária, com base no princípio da razoabilidade e proporcionalidade, de forma que o partilhamento da indenização seja feita de forma equitativa entre os co-responsáveis pela lesão.
Ressaltamos que a solidariedade não se presume, ela decorre da lei ou do contrato. Mais uma vez, ressaltamos que a responsabilidade objetiva e a indireta ou por ricochete não foi contemplada pela nova legislação.
Art. 223-F. A reparação por danos extrapatrimoniais pode ser pedida cumulativamente com a indenização por danos materiais decorrentes do mesmo ato lesivo.
§ 1º. Se houver cumulação de pedidos, o juízo, ao proferir a decisão, discriminará os valores das indenizações a título de danos patrimoniais e das reparações por danos de natureza extrapatrimonial.
§ 2º A composição das perdas e danos, assim compreendidos os lucros cessantes e os danos emergentes, não interfere na avaliação dos danos extrapatrimoniais.
Verifica-se dos artigos retro mencionados, o acolhimento também da Súmula n. 37 do STJ, que assim dispõe:
“Súmula 37 – São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato”.
Desta forma, poderá haver a cumulação de danos patrimoniais (danos emergentes e lucros cessantes), com os danos extrapatrimoniais, decorrentes da indenização por dano moral ou dano estético, decorrentes do mesmo evento lesivo e ultrapassado o filtro do nexo causal entre o dano e a lesão.
Ademais, a lei exige que o magistrado discrimine, caso a caso, os valores relativos a cada tipo de indenização ou reparação.
Já o parágrafo 2º do presente artigo é até mesmo redundante, na medida em que os magistrados, no caso concreto, atuam neste sentido, ou seja, não há interferência da avaliação dos danos patrimoniais com os danos morais, pois possuem natureza jurídica diversa, o que, por si só, enseja a cumulação dos respectivos pedidos.
Art. 223-G. Ao apreciar o pedido, o juízo considerará:
I. a natureza do bem jurídico tutelado;
II. a intensidade do sofrimento ou da humilhação;
III. a possibilidade de superação física ou psicológica;
IV. os reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão;
V. a extensão e a duração dos efeitos da ofensa;
VII. as condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral;
VII. o grau de dolo ou culpa;
VIII. a ocorrência de retratação espontânea;
IX. o esforço efetivo para minimizar a ofensa;
X. o perdão, tácito ou expresso;
XI. a situação social e econômica das partes envolvidas;
XII. o grau de publicidade da ofensa.
§ 1º Se julgar procedente o pedido, o juízo fixará a indenização a ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação:
I. ofensa de natureza leve, até três vezes o último salário contratual do ofendido;
II. ofensa de natureza média, até cinco vezes o último salário contratual do ofendido;
III. ofensa de natureza grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido;
IV. ofensa de natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido.
Certamente este artigo trata da parte mais tormentosa para os aplicadores do direito, especialmente os magistrados que deverão fixar o quantum satis da indenização, nos termos do art. 944 do Código Civil Brasileiro:
“Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização”.
O arbitramento da indenização por dano moral deve considerar a gravidade do dano e a dimensão dos prejuízos sofridos, a capacidade patrimonial dos ofensores, o princípio da razoabilidade e o caráter pedagógico da medida (arts. 5º, V e X da CF/88 e arts. 12, 186, 187 e 944, do Código Civil Brasileiro).
Sem dúvida que a reparação pecuniária do dano moral deverá ser pautada pela força criativa da doutrina e da jurisprudência, devendo o magistrado, diante do caso concreto, considerar, em linhas objetivas, todos os detalhes e aspectos, às vezes colocando-se no lugar do lesante e do lesado, para fazer a subsunção do caso concreto à norma legal, postando-se muitas vezes como se psicólogo fosse, para fixar a indenização que se afigure mais justa no caso concreto.
Embora o Superior Tribunal de Justiça, pela Súmula nº 281 tenha fixado o entendimento no sentido de que: “A indenização por dano moral não está sujeita a tarifação prevista na Lei de Imprensa“, cremos que o estabelecimento de critérios objetivos, como ora proposto pela Lei da Reforma Trabalhista (Lei n. 13.467/2017) promoverá uma parametrização do valor da reparação aos magistrados e aplicadores do direito, bem como uma maior previsibilidade e segurança jurídica aos atores sociais.
O problema que se afigura e que terá que ser aferido pelo magistrado no caso concreto é que a dignidade humana não é mensurável, não tem preço, possui um valor inestimável em face da natureza insubstituível e única da personalidade humana, que nada tem a ver com as funções ou atribuições que cada um exerce no dia a dia, seja na vida profissional ou privada, daí a imponderabilidade de se usar idênticos parâmetros para todos os indivíduos. Em outras palavras, colocar todos na mesma balança.
Surge aqui a clássica dúvida de que os estóicos, de coração seco, como já dizia Ripert no direito romano, não deveriam nada receber a título de indenização por dano moral, já que nada sentiam, ao contrário, dos indivíduos que grande sensibilidade e de coração mole deveriam ser contemplados com quantias razoáveis, em virtude de seu enorme sofrimento espiritual, por ofensas com fulcro na dor – vergonha – humilhação.
Um outro exemplo: um diretor de uma grande empresa, com remuneração elevada, certamente terá uma indenização muito superior a um operário que labora no chão de fábrica, com remuneração muito inferior. Será que a dignidade do diretor é superior axiologicamente à dignidade do operário? Em termos de indenização pela ocorrência do dano extrapatrimonial, o valor pecuniário da indenização do diretor se apresentará muito superior à do operário, ensejando uma situação de não equidade, como se a dignidade do operário fosse considerada de segunda linha. Mas este é apenas um dos inúmeros percalços que deverão ser solucionados pela doutrina e pela jurisprudência futura.
Deste fato decorreu nossa reflexão no sentido de se estabelecer parâmetros de fixação do valor da reparação, em uma escala de valores, mas sempre deixando uma janela aberta ao magistrado, para em seu juízo de ponderação, fixar a justa indenização em cada caso concreto que se lhe fosse apresentado.
De outra parte, após muito refletir nesta questão, achamos mais razoável a fixação de parâmetros não com base na remuneração do trabalhador, para evitar as distorções acima, mas com fundamento no tamanho da empresa (se micro, pequena, média ou grande), partindo de um marco regulatório mínimo, de forma que as indenizações se apresentem ao trabalhador lesado de forma mais justa e humana.
Entretanto, a Medida Provisória n. 808/2017, como a atender um clamor dos juristas e da doutrina, alterou parcelas do art. 223-G, como segue:
“§ 1º Ao julgar procedente o pedido, o juízo fixará a reparação a ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação:
I – para ofensa de natureza leve – até três vezes o valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social;
II – para ofensa de natureza média – até cinco vezes o valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social;
III – para ofensa de natureza grave – até vinte vezes o valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social; ou
IV – para ofensa de natureza gravíssima – até cinquenta vezes o valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
§ 3º Na reincidência de quaisquer das partes, o juízo poderá elevar ao dobro o valor da indenização.
§ 4º Para fins do disposto no § 3º, a reincidência ocorrerá se ofensa idêntica ocorrer no prazo de até dois anos, contado do trânsito em julgado da decisão condenatória.
§ 5º Os parâmetros estabelecidos no § 1º não se aplicam aos danos extrapatrimoniais decorrentes de morte.”
A tarifação do dano extrapatrimonial, como se vê, foi alterada em sua base de cálculo para o “valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social”, afastando o parâmetro salarial dos ofendidos, que representava uma ofensa à dignidade dos trabalhadores com menores rendimentos, quando em cotejo com os trabalhadores mais privilegiados, em termos de retribuição financeira. Como já nos manifestamos, a aferição do dano extrapatrimonial pelo magistrado se dá in re ipsa, pela constatação do que geralmente e realmente acontece, na análise caso a caso pelo magistrado.
No § 2º foi mantida a redação original, que têm como parâmetro o salário do empregado, para fixação da reparação do dano extrapatrimonial, quando o ofendido for o empregador.
Houve a alteração da redação do § 3º no sentido de estabelecer que, em caso de reincidência de quaisquer das partes, o juízo poderá elevar ao dobro o valor da reparação por dano extrapatrimonial, porém o § 4º estabeleceu uma espécie de moratória para a aludida reincidência, que será apurada até o prazo de dois anos, a partir do trânsito em julgado da decisão condenatória.
Além disso, houve a inclusão do § 5º, como a atender também ao clamor da doutrina, para acomodar o dano moral por óbito do trabalhador, considerado o pior de todos os danos ao espírito humano na figura tridimensional subjetiva da dor-angústia-sofrimento dos ofendidos, já que não existe dor mais profunda do que a perda de uma pessoa querida. Este parágrafo dispõe que: “Os parâmetros estabelecidos no § 1º não se aplicam aos danos extrapatrimoniais decorrentes de morte”.
Portanto, não se aplicará os parâmetros fixados no § 1º, do art. 223-G, remetendo ao livre alvedrio do magistrado, na análise caso a caso, a fixação do quantum debeatur do dano extrapatrimonial nestas hipóteses.
Finalmente, não há como deixar de registrar que todas estas alterações foram registradas por meio de uma Medida Provisória, que de acordo com o art. 62 da Constituição Federal deve primar pelos requisitos da urgência e relevância, quando, na verdade, é cediço que teve por real escopo adequar ou corrigir as incompatibilidades da Lei da Reforma ao que tinha sido avençado pelo Governo Federal com o Senado da República, ao tempo de sua votação naquela Casa Legislativa.
Conclusões
É de sabença comum que a honra, dignidade, intimidade, vida privada de um ser humano não tem preço, que só as coisas são monetizadas, como já dizia Kant, pois a pessoa é um ser único, insubstituível, feito à imagem e semelhança de Deus, daí sua dupla natureza ou duplo patrimônio, um de índole material e outro imaterial ou extrapatrimonial.
Da mesma forma, podemos dizer que tanto o dano moral individual, como o dano moral coletivo ou transindividual (metaindividual) foram albergados, de forma definitiva, em nosso ordenamento jurídico, de forma que ocorrendo o ilícito, ou abusividade, e preenchidos os seus elementos caracterizados em juízo de ponderação, e não apenas de subsunção do fato à norma, a regra geral será pela procedência da justa e devida reparação.
Sendo assim, ocorrendo um vilipêndio a esta especial natureza do ser humano, que deveria ser indevassável, por ato ilícito ou abusivo por outrem e a devida reparação se faz necessária, havendo a movimentação da máquina judiciária neste sentido, não será permitido ao julgador deixar de se pronunciar a respeito (princípio do non liquet), na fixação da justa reparação.
Portanto, é neste sentido que em nome dos princípios mais elevados emanados da Constituição Federal de 1988, entre eles, a isonomia, a segurança jurídica, bem como a previsibilidade das decisões judiciais, de modo a se evitar decisões colidentes, conflitantes ou contraditórias consideramos de bom alvitre estabelecer critérios, de modo a parametrizar os valores das reparações por dano extra patrimonial, mas sempre deixando ao livre arbítrio do magistrado, para que, dentro de seu juízo de ponderação, fixe a justa e devida indenização ao caso concreto que se lhe apresente, não com base no salário do empregado, mas no tamanho da empresa (se micro, pequena, média ou grande).
Referências:
BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais. 2ª. ed. São Paulo: Ltr, 1990
CAHALI, Yussef Said. Dano e indenização. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981
ZENUN, Augusto. Dano moral e sua reparação. Rio de Janeiro: Forense, 1994
SANTOS, Enoque Ribeiro dos. O dano moral na dispensa do empregado. 6ª. ed. São Paulo: Ltr, 2017
[1] SANTOS, Enoque Ribeiro dos. O dano moral na dispensa do empregado. 6ª. edição, revisada e ampliada com a Lei n. 13.467/2017. SP: Editora Ltr, 2017, p. 295-296.
Veja também:
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