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Derrubada de vetos e reflexos na Lei nº 13.964/2019: primeiras impressões
Douglas Fischer
26/04/2021
Quando da sanção ao projeto que originou a Lei nº 13.964/2019, o Presidente da República, na época, dezembro de 2019, vetou vários dispositivos.
Conforme previsto nos §§ 4º e 6º do art. 66 da CF (na redação da Emenda Constitucional nº 76, de 2013), respectivamente, “o veto será apreciado em sessão conjunta, dentro de trinta dias a contar de seu recebimento, só podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos Deputados e Senadores”, e “esgotado sem deliberação o prazo estabelecido no § 4º, o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata, sobrestadas as demais proposições, até sua votação final”.
Contudo, de forma absolutamente tardia e sem qualquer justificativa plausível para tanto, o Congresso Nacional rejeitou 16 dos 24 vetos no dia 19 de abril de 2021. Assim, esses novos dispositivos deverão entrar em vigor assim que promulgada pelo Presidente, ou então, observado o disposto no § 7 do art. 66 da CF: “Se a lei não for promulgada dentro de quarenta e oito horas pelo Presidente da República, nos casos dos § 3º e § 5º, o Presidente do Senado a promulgará, e, se este não o fizer em igual prazo, caberá ao Vice-Presidente do Senado fazê-lo”.
Quais os dispositivos que nos interessam mais no processo penal?
Destacamos desde já que faremos aqui eventuais remissões aos Comentários ao CPP em coautoria com o Professor Eugênio Pacelli.
As observações complementares que ora são divulgadas decorrem, unicamente, de nossa visão individual. E como dito no título: são considerações iniciais, de parte dos vetos (as “principais” sob a ótica do processo penal, segundo pensamos) e passíveis de retificações.
JUIZ DE GARANTIAS. O PL nº 6.341/2019 determinava um prazo de 24 horas para a apresentação do preso ao juiz de garantias, em audiencia com o MP e Defensoria Pública ou advogado constituído pelo preso, vedando-se a videoconferência, porque, supostamente, geraria insegurança jurídica.
Eis a redação do dispositivo (que seria o § 1º do art. 3-B do CPP): “O preso em flagrante ou por força de mandado de prisão provisória será encaminhado à presença do juiz de garantias no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, momento em que se realizará audiência com a presença do Ministério Público e da Defensoria Pública ou de advogado constituído, vedado o emprego de videoconferência”.
As razões do veto foram as seguintes:
“A propositura legislativa, ao suprimir a possibilidade da realização da audiência por videconferência, gera insegurança jurídica ao ser incongruente com outros dispositivos do mesmo código, a exemplo do art. 185 e 222 do Código de Processo Penal, os quais permitem a adoção do sistema de videoconferência em atos processuais de procedimentos e ações penais, além de dificultar a celeridade dos atos processuais e do regular funcionamento da justiça, em ofensa à garantia da razoável duração do processo, nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (RHC 77580/RN, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 10/02/2017). Ademais, o dispositivo pode acarretar em aumento de despesa, notadamente nos casos de juiz em vara única, com apenas um magistrado, seja pela necessidade de pagamento de diárias e passagens a outros magistrados para a realização de uma única audiência, seja pela necessidade premente de realização de concurso para a contratação de novos magistrados, violando as regras do art. 113 do ADCT, bem como dos arts. 16 e 17 LRF e ainda do art. 114 da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2019 (Lei nº 13.707, de 2018).”
Em nossos Comentários ao CPP e sua jurisprudência, escritos juntamente com o Professor Eugênio Pacelli (2021, 13ª ed., item 306.4), assim tratamos (em alguns excertos) do tema da audiência de custódia:
306.4. Audiência de custódia. Faz-se a devida análise do tema no bojo do art. 306 do CPP diante, sobretudo, do PLS nº 554/2011 e do disposto na Lei nº 13.964/2019, que alterou a redação do art. 310 do CPP para estabelecer alguns parâmetros atinentes à audiência de custódia.
Originariamente, a proposta era de alteração apenas do § 1º do art. 306, que passaria a dispor que “no prazo máximo de vinte e quatro horas depois da prisão, o preso deverá ser conduzido à presença do juiz competente, ocasião em que deverá ser apresentado o auto de prisão em flagrante acompanhado de todas as oitivas colhidas e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública”.
Já com o texto final do substitutivo consolidado segundo as Emendas nºs 1, 2, 5, 11 e 13 – CJJ, aprovadas em turno suplementar (atualizado até 22.9.2015), a redação das alterações seria a seguinte:
Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente pela autoridade policial responsável pela lavratura do auto de prisão em flagrante ao juiz competente, ao Ministério Público e à Defensoria Pública quando não houver advogado habilitado nos autos, bem como à família do preso ou à pessoa por ele indicada.
§ 1º Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado pela autoridade policial ao juiz competente e ao Ministério Público o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública respectiva.
§ 2º O descumprimento do prazo previsto para a apresentação do preso perante o juiz competente, por si só, não enseja o relaxamento da prisão.
§ 3º No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade policial, com o motivo da prisão, capitulação jurídica, o nome do condutor e os das testemunhas.
§ 4º Imediatamente após a lavratura do auto de prisão em flagrante, diante da alegação de violação aos direitos fundamentais da pessoa presa, a autoridade policial em despacho fundamentado determinará a adoção das medidas cabíveis para a preservação da integridade do preso, além de determinar a apuração das violações apontadas, instaurando de imediato inquérito policial para apuração dos fatos, requisitando a realização de perícias, exames complementares, também determinando a busca de outros meios de prova cabíveis.
§ 5º No prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas após a lavratura do auto de prisão em flagrante, o preso será conduzido à presença do juiz para ser ouvido, com vistas às medidas previstas no art. 310 e para que se verifique se estão sendo respeitados seus direitos fundamentais, devendo a autoridade judiciária tomar as medidas cabíveis para preservá-los e para apurar eventual violação.
[…]
Já a Lei nº 13.964/2019 alterou a regra do art. 310 do CPP, passando a prever, expressamente, que, “após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente: I – relaxar a prisão ilegal; ou II – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança”.
Com efeito, a Declaração Universal dos Direitos Humanos prevê que toda pessoa presa ou detida deverá ser levada, o mais rápido possível, à presença de uma autoridade judicial. Exatamente é nisso que se constitui a chamada audiência de custódia: a apresentação do preso perante um juiz, permitindo o contato direto de modo a assegurar o respeito aos direitos fundamentais daquele que teve a liberdade limitada pelo ato prisional. Registramos compreensão de que este contato do juiz com o preso não necessariamente precisa ser físico – no mesmo ambiente –, pois entendemos plenamente possível a realização da audiência de custódia, de forma excepcional, por intermédio de videoconferência, mesmo que ausente previsão expressa quanto ao tema, já que hoje regulamentada sua utilização quanto ao interrogatório judicial – art. 185, § 2º, CPP. Reforçam nossa compreensão há muito defendida as razões do veto ao § 1º do art. 3º-B do Código de Processo Penal (“O preso em flagrante ou por força de mandado de prisão provisória será encaminhado à presença do juiz de garantias no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, momento em que se realizará audiência com a presença do Ministério Público e da Defensoria Pública ou de advogado constituído, vedado o emprego de videoconferência”). Na Mensagem nº 726, de 24 de dezembro de 2019, o Presidente da República justificou o veto com as seguintes razões: “a propositura legislativa, ao suprimir a possibilidade da realização da audiência por videoconferência, gera insegurança jurídica ao ser incongruente com outros dispositivos do mesmo Código, a exemplo do art. 185 e 222 do Código de Processo Penal, os quais permitem a adoção do sistema de videoconferência em atos processuais de procedimentos e ações penais, além de dificultar a celeridade dos atos processuais e do regular funcionamento da justiça, em ofensa à garantia da razoável duração do processo […]”. Com efeito, o Brasil é signatário da Convenção Americana dos Direitos Humanos e nela há previsão da audiência de custódia, incidindo ao caso o disposto no art. 5º, § 2º, CF: “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federal do Brasil seja parte”.
Assim, aplicável ao Brasil a regra do art. 2º da CADH no sentido de que se os direitos e liberdades mencionados no art. 1º ainda não estiverem garantidos por disposições legislativas ou de outra natureza, os Estados-partes comprometem-se a adotar, de acordo com suas normas constitucionais, as medidas legislativas ou de outra natureza que forem necessárias para tornar efetivos tais direitos e liberdades.
Impende referir que consta expressamente ainda no item nº 5 do art. 7º do Pacto de San José da Costa rica que toda pessoa presa deverá ser conduzida “sem demora” à presença de um juiz, cuja finalidade precípua da regra é exatamente a possibilidade de averiguação – o mais rápido possível – de eventual ilegalidade na prisão efetuada.
Na legislação brasileira vigente, há previsão genérica de que o simples envio dos autos de prisão em flagrante no prazo de 24 horas (art. 306, § 1º, CPP) já teria o condão de atender à previsão convencional. Entretanto, como bem anotam Mauro Fonseca Andrade e Pablo Rodrigo Alflen em excelente obra sobre o tema (ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo. Audiência de custódia no processo penal brasileiro. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2017), este entendimento se caracterizaria como contrário à evolução e compatibilização do Direito Penal e os direitos humanos.
A previsão legal vigente hoje não é suficiente para atender os princípios e regras norteadoras especialmente do Pacto de San José da Costa Rica, na medida em que esta aferição direta e pessoal pelo magistrado das condições em que efetuada a prisão não tem como ser plenamente atendida pela mera remessa apenas do auto ao juiz no prazo estipulado, muito menos possibilita a aferição de hipótese de eventual cautelar substitutiva (se ausentes os pressupostos da prisão preventiva).
Diante deste verdadeiro vácuo (e longo débito na edição de legislação para regulamentar o tema), o Conselho Nacional de Justiça teve a iniciativa (em conjunto inicialmente com o Tribunal de Justiça de São Paulo) de implantar a audiência de custódia no país, conforme consta do Provimento Conjunto nº 3/2015. Em princípio, o diploma só valeria para o Estado de São Paulo, e seu art. 2º diz claramente que a aplicabilidade da audiência de custódia será gradativa, obedecendo a cronograma de afetação dos distritos policiais aos juízes competentes. No entanto, vários outros Tribunais já aderiram à medida (como são os casos dos Estados de Minas Gerais, Maranhão, Rio de Janeiro, Espírito Santo etc.).
O regulamento traz proposta de solução para alguns problemas, como, por exemplo, qual seria o prazo definido pela lei como “sem demora” (24 horas, de acordo com o art. 1º – critério também adotado pelo PLS 554/2011), se haveria participação do defensor do detido e do Ministério Público (sim, conforme os arts. 5º e 6º), e se a autoridade em questão poderia ser um Delegado de Polícia (não, a competência para presidir a audiência é exclusivamente de um magistrado, nos termos do art. 3º).
Há críticas (e algumas relevantes, sem dúvidas) no sentido de que não poderia o CNJ editar referida regulamentação, reservada exclusivamente para lei em sentido estrito (atribuição do Poder Legislativo). Em 20.8.2015, o Supremo Tribunal Federal enfrentou a questão (ADI 5.240, autora Associação dos Delegados de Polícia do Brasil e julgou improcedente o pedido), entendendo que a iniciativa do CNJ/TJSP se coaduna com o Pacto de San José da Costa Rica, que por sua vez tem status supralegal, e que não houve inovação jurídica – apenas explicitação de conteúdo normativo já existente, e seria impositivo, obrigatório ao ordenamento jurídico interno. Temos entendimento no sentido da validade de tal regulamentação (embora reconheçamos como de relevo argumentos em sentido contrário) e compreendemos que, por uma excepcionalidade diante da inércia do legislador pátrio, poderia o CNJ adotar providências (art. 92, CF/88 c/c o art. 103-B, I, ambos da Constituição da República) para tentar ordenar da melhor forma o sistema vigente às convenções internacionais até que a legislação em sentido estrito seja editada, especialmente se a finalidade for a criação de procedimentos para a melhor proteção de direitos fundamentais do preso.
De qualquer modo, quanto à audiência de custódia em si, há se observar que nela não há espaço para uma eventual análise da versão defensiva quanto aos fatos, contraditório e realização de um verdadeiro interrogatório. Exatamente por isso é que o § 7º (após o substitutivo de setembro de 2015) que se pretende incluir no art. 306 do CPP (PLS 554/2011) prevê que “a oitiva a que se refere o parágrafo anterior será registrada em autos apartados, não poderá ser utilizada como meio de prova contra o depoente e versará, exclusivamente, sobre a legalidade e necessidade da prisão; a prevenção da ocorrência de tortura ou de maus-tratos; e os direitos assegurados ao preso e ao acusado”.
Portanto, não há possibilidade neste momento para uma incursão acerca das circunstâncias e elementares do delito sob suspeita. A audiência de custódia destina-se exclusivamente ao exame direto pelo juiz da observância dos requisitos legais para a custódia e se há, de fato, necessidade para a manutenção da prisão, notadamente a viabilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da preventiva. Naturalmente que as partes (Ministério Público e Defesa) devem também ser ouvidas, mas não para fins de esclarecimento do crime e para a inquirição do preso sobre os fatos. Então a advertência: todo cuidado aqui é pouco e a regulamentação não poderá entrar nestas searas. Exatamente foi nesse sentido a alteração promovida pela Lei nº 13.964/2019 ao art. 310 do CPP.
Remetemos novamente para as consistentes análises críticas quanto à audiência de custódia na obra antes mencionada, deixando consignado que não vemos incompatibilidade em adoção do prazo de 24 horas para a realização do ato (em atendimento à exigência de que o preso deveria ser apresentado “sem demora” ao juiz), sem embargo de que, diante das peculiaridades do caso concreto – notadamente as distâncias do país continental que é o Brasil – se possa ter, excepcionalidade (mas sempre com bastante rigor na fundamentação e justificação) uma elasticidade no prazo que atenderia ao preceito geral de proteção dos direitos fundamentais do preso, sem porém descurar do relevante interesse coletivo também presente no caso. Talvez por isso é que, no substitutivo, se tenha previsto que (§ 2º do art. 306 do CPP segundo a consolidação de setembro de 2015) “o descumprimento do prazo previsto para a apresentação do preso perante o juiz competente, por si só, não enseja o relaxamento da prisão”. Nesse sentido, remetemos às ponderações destacadas no item 310.1.
Convém referir ainda que, em 15 de dezembro de 2015, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, seguindo os mesmos moldes da regulamentação anterior, porém mais detalhadamente, editou a Resolução nº 213 (que dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas), com aplicabilidade a partir de 1º de fevereiro de 2016 (art. 17).Essas regras procedimentais, em nosso sentir, não colidem com as previsões agora incorporadas (mesmo que sem detalhamentos) pela Lei nº 13.964/2019.
A pergunta que se pode fazer é: qual é o impacto real no sistema desse dispositivo, cujo veto foi derrubado, quando passar a vigorar como lei ?
Vamos deixar claro que a regra inserida é de extrema relevância, na linha do que já defendíamos anteriormente (vide excertos transcritos, além de outros textos esparsos).
Entretanto, a apresentação já se fazia necessária para fins de audiência de custódia no prazo de 24 horas.
Não se olvide, porém, que a jurisprudência já vinha reconhecendo (mesmo após a edição da Lei nº 13.964/2019) que “a não realização de audiência de custódia não induz a ilegalidade do decreto preventivo, cujos fundamentos e requisitos de validade não incluem a prévia realização daquele ato, vinculados, por força de lei, ao que dispõem os arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal (Precedentes). […] (Habeas Corpus nº 598.525/BA, STJ, 6ª Turma, unânime, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 20.10.2020, publicado no DJ em 28.10.2020)”. Igualmente que “a falta de audiência de custódia constitui irregularidade, não afastando a prisão preventiva, uma vez atendidos os requisitos autorizadores do artigo 312 do Código de Processo Penal e observados os direitos e garantias versados na Constituição Federal[…].” (Habeas Corpus nº 196.947/MG, STF, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em sessão virtual de 12.2.2021 a 23.2.2021, publicado no DJ em 12.3.2021).
Claro que o tema específico deverá passar pelo plenário do STF, mas não há se olvidar decisão monocrática do Ministro Edson Fachin que julgou procedente reclamação para “determinar a realização, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, de audiência de apresentação, inclusive, caso necessário, por meio de videoconferência, incumbindo ao Juízo da causa o implemento desta decisão” (Reclamação nº 45.347/SP, STF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 24.2.2021, publicado no DJ em 8.3.2021).
Também de relevo decisão da 2ª Turma (igualmente relatoria do Ministro |Edson Fachin) em que se reconheceu, pontualmente, que: 1. “O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADPF 347-MC, assentou, em provimento de eficácia geral e vinculante, a obrigatoriedade da realização da audiência de apresentação em caso de prisão em flagrante. Trata-se de direito subjetivo do preso decorrente dos artigos 9.3 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, bem como do artigo 310 do Código de Processo Penal”; 2. “A pandemia causada pelo novo coronavírus não afasta a imprescindibilidade da audiência de custódia, que deve ser realizada, caso necessário, por meio de videoconferência, diante da ausência de lei em sentido formal que proíba o uso dessa tecnologia. A audiência por videoconferência, sob a presidência do Juiz, com a participação do autuado, de seu defensor constituído ou de Defensor Público, e de membro do Ministério Público, permite equacionar as medidas sanitárias de restrição decorrentes do contexto pandêmico com o direito subjetivo do preso de participar de ato processual vocacionado a controlar a legalidade da prisão”; (Habeas Corpus nº 186.421/SC, STF, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Celso de Mello, Redator do Acórdão Min. Edson Fachin, julgado em sessão virtual de 9.10.2020 a 19.10.2020, publicado no DJ em 17.11.2020).
Assim, cremos que a jurisprudência caminhará no sentido de que a regra deverá continuar sendo a apresentação no prazo de 24 horas, mas não gerando, automaticamente, nulidade da prisão (notadamente nos casos de “prisões preventivas – art 312, CPP”), como sustenta-se genericamente. Há se analisar, sempre fundamentadamente, as razões de eventual decurso do prazo limitativo previsto em lei. Depois, mesmo com a “vedação” de realização da custódia por videoconferência, cremos que, em situações absolutamente excepcionais também (como o caso da pandemia vivida), há se admitir a realização do ato, desde que o contato virtual permita a realização, na plenitude, de todas as garantias fundamentais do preso.
PROVA PARA DEFESA E CAPTAÇÃO AMBIENTAL. São dois os dispositivos que foram vetados:
§ 2º do art. 8º-A da Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, com a redação dada pelo art. 7º do projeto
A instalação do dispositivo de captação ambiental poderá ser realizada, quando necessária, por meio de operação policial disfarçada ou no período noturno, exceto na casa, nos termos do inciso XI do caput do art. 5º da Constituição Federal.
§ 4º do art. 8º-A da Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, com a redação dada pelo art. 7º do projeto
A captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público poderá ser utilizada, em matéria de defesa, quando demonstrada a integridade da gravação.
Os vetos tinham os seguintes conteúdos, respectivamente:
“A propositura legislativa, gera insegurança jurídica, haja vista que, ao mesmo tempo em que admite a instalação de dispositivo de captação ambiental, esvazia o dispositivo ao retirar do seu alcance a ‘casa’, nos termos do inciso XI do art. 5º da Lei Maior. Segundo a doutrina e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o conceito de ‘casa’ deve ser entendido como qualquer compartimento habitado, até mesmo um aposento que não seja aberto ao público, utilizado para moradia, profissão ou atividades, nos termos do art. 150, § 4º, do Código Penal (v. g. HC 82788, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 12/04/2005).”
“A propositura legislativa, ao limitar o uso da prova obtida mediante a captação ambiental apenas pela defesa, contraria o interesse público uma vez que uma prova não deve ser considerada lícita ou ilícita unicamente em razão da parte que beneficiará, sob pena de ofensa ao princípio da lealdade, da boa-fé objetiva e da cooperação entre os sujeitos processuais, além de se representar um retrocesso legislativo no combate ao crime. Ademais, o dispositivo vai de encontro à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que admite utilização como prova da infração criminal a captação ambiental feita por um dos interlocutores, sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público, quando demonstrada a integridade da gravação (v. g. Inq-QO 2116, Relator: Min. Marco Aurélio, Relator p/ Acórdão: Min. Ayres Britto, publicado em 29/02/2012, Tribunal Pleno).”
Em relação ao primeiro dispositivo: a regra geral é de que “a instalação do dispositivo de captação ambiental poderá ser realizada, quando necessária, por meio de operação policial disfarçada ou no período noturno”. Nessa parte, nenhum “problema maior” no seu conteúdo isoladamente visto, pois o procedimento de captação ambiental está regulado pelo caput do art. 8º-A da Lei nº 9.296, em que (já) se exige a autorização judicial para tanto (veja-se que não se está falando aqui de gravação ambiental por um dos interlocutores, mas de uma técnica que exige emprego de aparelhos específicos para a captação ambiental de imagens/vozes).
Realmente não se justifica(ria), do modo como está posto, por uma “razoável técnica legislativa”, a “exceção” em relação à “casa”, pois também para ela ser realizada é necessária a prévia autorização judicial. Noutras palavras, mesmo com o “exceto” estando em vigor, em todos os casos de gravação ambiental já se exige a prévia autorização judicial. Poderá ser autorizada a instalação do dispositivo apto para tanto durante o “dia” (quando se pode entrar no local por ordem judicial), mesmo que a gravação seja realizada diuturnamente e dentro da “casa”. O que não pode ser feita é a “instalação” na casa em período noturno, talvez nessa compreensão faça maior sentido a redação proposta. Essa é a “interpretação” que nos parece mais correta e coerente diante dos preceitos constitucionais e interpretação sobre garantia à inviolabilidade do domicílio, notadamente do STF.
Pouco “mais problemática” é a redação do § 4º do art. 8º-A, dispondo que ‘a captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público poderá ser utilizada, em matéria de defesa, quando demonstrada a integridade da gravação”.
Quanto à exigência de “integridade das provas”, ótima providência em deixar expressa em lei, inclusive como já defendemos em nossos escritos e, recentemente, em texto publicado aqui no site sobre o uso de “provas ilícitas em favor da defesa”.
Repetimos: prova ilícita sempre poderá ser utilizada em prol da defesa, desde que haja demonstração da integridade da prova a ser utilizada.
Mas a condicionante “sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público” significa que as provas, noutras circunstâncias, não poderão ser utilizadas pela defesa?
Em nossa compreensão, a interpretação não pode ser excludente, pena de retirar/limitar a possibilidade de defesa e, mais que isso, em determinadas situações afastar a validade da prova da prática de um crime em que a vítima faz a gravação “clandestina” (e ela é a própria prova do crime), fato já admitido há muito pela jurisprudência.
Vamos rememorar, conforme nosso entendimento exposto nos Comentários ao CPP e sua Jurisprudência (2021, 13ª edição, item 648.6.1.9. Interceptação ambiental):
“Denomina-se gravação ambiental aquela realizada no meio ambiente. Não se está falando aqui de hipóteses de gravação clandestina (em vídeo ou voz, feita por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro), mas de efetivamente uma interceptação (portanto, sem conhecimento dos envolvidos) de voz ou imagens em ambiente a partir de autorização judicial específica.
Nos termos do art. 3º, II, da Lei nº 12.850/13, que revoga expressamente a Lei nº 9.034/95, para fins de procedimentos investigatórios que versem sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por organizações criminosas conforme ali definidas, é permitida a captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e o seu registro e análise, mediante circunstanciada autorização judicial.
Suplementando a alteração legislativa acima indicada, supervenientemente a Lei nº 13.964/2019 trouxe acréscimos à Lei nº 9.296/96, dispondo-se, inicialmente no (novo) art. 8º-A que, para a investigação ou instrução criminal, mediante requerimento policial ou do Ministério Público, poderá ser autorizada pelo juiz a captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, desde que preenchidos (cumulativamente) os seguintes requisitos: I – a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e igualmente eficazes; e II – houver elementos probatórios razoáveis de autoria e participação em infrações criminais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos ou em infrações penais conexas.
Os requisitos legais guardam certa similitude com aqueles previstos para as interceptações telefônicas (art. 2º da Lei nº 9.296/96). Há identidade de pressuposto de que a utilização dessa técnica deva ser subsidiária, ou seja, somente poderá se cogitar da captação ambiental se a prova pretendida acerca das práticas criminosas não puder ser realizada por outros meios disponíveis e igualmente eficazes. A prova dessa necessidade deverá ser feita por quem requerer ao juízo a determinação da medida. Ulteriormente, a contraprova (de eventual desnecessidade, pois existiriam outros meios igualmente eficazes) é de quem alegar o fato (art. 156, CPP), nos exatos termos do que ocorre em relação à interceptação telefônica (vide item 648.6.1.5).
Se para a interceptação telefônica limita-se apenas que o crime apurado seja punido (pelo menos com reclusão – pois não se admite, para o fato investigado, que seja hipótese de punição apenas com detenção), o requisito para a captação ambiental é diverso: as penas máximas dos crimes investigados devem ser superiores a quatro anos (mas podem ser punidos com detenção ou reclusão) ou em infrações conexas. Aqui um cuidado muito relevante há de se ter. Não se está falando de descoberta fortuita de fatos diversos dos investigados, situações nas quais a jurisprudência (corretamente) já pacificou entendimento de que são absolutamente válidas as apurações probatórias, mesmo que não haja conexão entre os fatos e que os descobertos fortuitamente sejam punidos inclusive com detenção. Compreendemos a previsão legal no sentido de que, havendo fatos conexos entre si desde já investigados, em que apenas um deles atenda o requisito da pena máxima superior a quatro anos, será plenamente válida a prova de investigação também quanto ao outro (cuja pena máxima seja inferior a esse patamar). Ao tema de conexão probatória, remetemos às anotações do art. 76 do CPP, sempre enfatizando que a conexão (e assim já o diz há muito a jurisprudência), não é uma questão de mera utilidade de investigação, mas verdadeira necessidade de apuração conjunta.
Prosseguindo, ainda quanto aos requisitos, o requerimento deverá descrever circunstanciadamente, tanto quanto possível, o local e a forma de instalação do dispositivo de captação ambiental (§ 1º do art. 8º-A), tudo com a finalidade de se poder, ulteriormente, sindicar se o procedimento foi executado corretamente e conforme a autorização judicial prévia.
Tal qual a interceptação telefônica, a captação ambiental não poderá exceder o prazo de 15 dias (vide anotações ao item 648.6.1.5, sobre excepcionais situações), sendo possível sua renovação (sempre com prévia autorização judicial), por igual período, se igualmente comprovada a indispensabilidade da prova e quando presente atividade criminal permanente, habitual ou continuada (nos termos do § 3º do art. 8º-A). Aqui a lei já deixou bem claro o que restou solvido pela jurisprudência em relação à interceptação telefônica: pode haver sucessivas renovações da medida, desde que comprovada a necessidade, mediante a devida fundamentação judicial.
Como dissemos, não se pode(rá) fazer uma interpretação no sentido de que as gravações (denominadas de clandestinas) feitas por um dos interlocutores (mesmo sem prévia ciência de qualquer pessoa, autoridades públicas ou não) não possam ser utilizadas em duas circunstâncias (pressupondo, obviamente, a “integridade” dessa gravação):
a) como própria defesa da pessoa que gravou (mas jamais podendo incriminar terceiros);
b) for a própria prova do crime praticado (como no delito de extorsão, por exemplo).
Nesse sentido, aliás, a jurisprudência há muito sedimentada, que, cremos, não será modificada por conta dessa (péssima) redação desse dispositivo em voga:
[…] Gravação ambiental pela genitora da vítula. Prova lícita. […] Nos termos da jurisprudência da Corte, é lícita a prova produzida pela genitora da menor vítima de crime sexual, consistente em gravação audiovisual ambiental, dado o seu legítimo poder-dever de proteger a infante e desvendar o ato criminoso, situação que se assemelha à gravação de conversa telefônica feita com a autorização de um dos interlocutores, sem ciência do outro, quando há cometimento de delito por este último, hipótese já reconhecida como válida pelo Supremo Tribunal Federal. […] (Habeas Corpus nº 578.058-SP, STJ, 6ª Turma, unânime, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 8.9.2020, publicado no DJ em 14.9.2020).
[…] É pacífico, neste Superior Tribunal e no Pretório Excelso, que a gravação ambiental, realizada por um dos interlocutores, com o objetivo de preservar-se diante de atuação desvirtuada da legalidade, prescinde de autorização judicial. […] (Agravo Regimental no Recurso em Habeas Corpus nº 104.363-SE, STJ, 5ª Turma, unânime, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 18.8.2020, publicado no DJ em 24.8.2020).
[…] O acórdão hostilizado encontra-se em harmonia com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem o consentimento do outro, é lícita, ainda que obtida sem autorização judicial, podendo ser validamente utilizada como elemento de prova, uma vez que a proteção conferida pela Lei nº 9.296/1996 se restringe às interceptações de comunicações telefônicas. No caso, a gravação ambiental ocorreu no domicílio do paciente, com o conhecimento de um dos interlocutores – ex-secretário de governo que agiu na condição de informante e colaborador –, sendo realizada com a devida autorização judicial. Na ocasião, o acusado convidou o servidor público municipal a entrar e permanecer na sua residência, não restando evidenciado na hipótese o caráter secreto da conversa captada, tampouco a obrigação jurídica de sigilo. […] (Habeas Corpus nº 222.818-MS, STJ, 5ª Turma, unânime, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 18.11.2014, publicado no DJ em 25.11.2014).
[…] No Recurso Extraordinário com Repercussão Geral nº 583.937 a Corte firmou a tese de que: “É lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro”, guiada pela premissa de que “quem revela conversa da qual foi partícipe, como emissor ou receptor, não intercepta, apenas dispõe do que também é seu e, portanto, não subtrai, como se fora terceiro, o sigilo à comunicação (…)”. […] (Agravo Regimental no Habeas Corpus n. 141.157-PE, STF, 1ª Turma, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em Sessão Virtual de 22.11.2019 a 28.11.2019, publicado no DJ em 11.12.2019).
[…] A gravação ambiental meramente clandestina, realizada por um dos interlocutores, não se confunde com a interceptação, objeto cláusula constitucional de reserva de jurisdição. É lícita a prova consistente em gravação de conversa telefônica realizada por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, se não há causa legal específica de sigilo nem de reserva da conversação. Precedentes. Agravo regimental desprovido (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 560.223-SP, STF, 2ª Turma, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgado em 12.4.2011, publicado no DJ em 29.4.2011).
PERFIL GENÉTICO. Conforme noticiado pelo Senado em sua página oficial, o PL 6.341/2019 previa a extração obrigatória de DNA de condenados por crime doloso praticado com violência grave. A mesma regra valeria para condenados por crimes contra a vida, contra a liberdade sexual e crimes sexuais contra vulnerável. Para o presidente da República, ao vetar o dispositivo, a medida “contraria o interesse público” por excluir “alguns crimes hediondos considerados de alto potencial ofensivo”, como o genocídio, o porte ilegal de arma de fogo de uso restrito.
O projeto aprovado pelo Congresso também previa regras para o uso e descarte de amostra biológica para a identificação de perfis genéticos. O texto vedava o uso do material para a fenotipagem genética ou a busca familiar. O veto se deu pelo fato de o Bolsonaro Presidente entender que a utilização da amostra para fenotipagem e busca familiar poderia “auxiliar no desvendamento de crimes reputados graves”, como o estupro. Além disso, o descarte imediato da amostra biológica poderia prejudicar a defesa do acusado, que ficaria impedido de solicitar um novo teste para fins probatórios. Ainda de acordo com o PL 6.341/2019, a coleta da amostra biológica e a elaboração do laudo seriam realizadas por perito oficial. O presidente da República vetou por entender que a coleta deve ser apenas “supervisionada pela perícia oficial, não necessariamente realizada por perito oficial”. “Tal restrição traria prejuízos à execução da medida e até mesmo a inviabilizaria em alguns estados em que o número de peritos oficiais é insuficiente”.
Os dispositivos (que entrarão em vigor) são os seguintes:
“Caput” do art. 9º-A da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, com a redação dada pelo art. 4º do projeto
O condenado por crime doloso praticado com violência grave contra a pessoa, bem como por crime contra a vida, contra a liberdade sexual ou por crime sexual contra vulnerável, será submetido, obrigatoriamente, à identificação do perfil genético, mediante extração de DNA (ácido desoxirribonucleico), por técnica adequada e indolor, por ocasião do ingresso no estabelecimento prisional.
§ 5º do art. 9º-A da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, com a redação dada pelo art. 4º do projeto
A amostra biológica coletada só poderá ser utilizada para o único e exclusivo fim de permitir a identificação pelo perfil genético, não estando autorizadas as práticas de fenotipagem genética ou de busca familiar.
§ 6º do art. 9º-A da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, com a redação dada pelo art. 4º do projeto
Uma vez identificado o perfil genético, a amostra biológica recolhida nos termos do caput deste artigo deverá ser correta e imediatamente descartada, de maneira a impedir a sua utilização para qualquer outro fim.
§ 7º do art. 9º-A da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, com a redação dada pelo art. 4º do projeto
A coleta da amostra biológica e a elaboração do respectivo laudo serão realizadas por perito oficial.
Aos vetos e justificativas, respectivamente:
“A proposta legislativa, ao alterar o caput do art. 9º-A, suprimindo a menção expressa aos crimes hediondos, previstos na Lei nº 8.072, de 1990, em substituição somente a tipos penais específicos, contraria o interesse público, tendo em vista que a redação acaba por excluir alguns crimes hediondos considerados de alto potencial ofensivo, a exemplo do crime de genocídio e o de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, além daqueles que serão incluídos no rol de crimes hediondos com a sanção da presente proposta, tais como os crimes de comércio ilegal de armas, de tráfico internacional de arma e de organização criminosa.”
“A propositura legislativa, ao vedar a utilização da amostra biológica coletada para fins de fenotipagem e busca familiar infralegal, contraria o interesse público por ser uma técnica que poderá auxiliar no desvendamento de crimes reputados graves, a exemplo de identificação de irmãos gêmeos, que compartilham o mesmo perfil genético, e da busca familiar simples para identificar um estuprador, quando o estupro resulta em gravidez, valendo-se, no caso, do feto abortado ou, até mesmo, do bebê, caso a gestação seja levada a termo.”
“A proposta legislativa, ao prever o descarte imediato da amostra biológica, uma vez identificado o perfil genético, contraria o interesse público tendo em vista que a medida pode impactar diretamente no exercício do direito da defesa, que pode solicitar a refeitura do teste, para fins probatórios. Ademais, as melhores práticas e recomendações internacionais dizem que após a obtenção de uma coincidência (match) a amostra do indivíduo deve ser novamente testada para confirmação do resultado. Trata-se de procedimento de controle de qualidade com o objetivo de evitar erros.”
“A proposta legislativa, ao determinar que a coleta da amostra biológica ficará a cargo de perito oficial, contraria o interesse público, notadamente por se tratar de mero procedimento de retirada do material. Ademais, embora a análise da amostra biológica e a elaboração do respectivo laudo pericial sejam atribuições exclusivas de perito oficial, já existe um consenso que a coleta deve ser supervisionada pela perícia oficial, não necessariamente realizada por perito oficial. Além disso, tal restrição traria prejuízos à execução da medida e até mesmo a inviabilizaria em alguns estados em que o número de peritos oficiais é insuficiente.”
Antes a análise, reproduzimos o que sustentamos a respeito do tema nos Comentários ao CPP e sua Jurisprudência (2021, 13ª edição):
[…] 186.8. A identificação genética: A Lei nº 12.654, de 28 de maio de 2012, com vigência prevista para 180 (cento e oitenta) dias após sua publicação, trouxe importantíssima alteração no quadro das intervenções corporais na legislação brasileira, com modificações também ulteriores pela Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019. Antes limitadas aos exames grafotécnicos, ao teste de alcoolemia (bafômetro), ao reconhecimento de pessoa e à identificação datiloscópica e fotográfica, introduziu-se, então, a coleta de material genético, para fins de identificação da autoria por esse meio. A via escolhida foi a alteração da Lei nº 12.037/09, que cuida da identificação criminal. Digna de registro, também aqui, a ampliação dos testes de alcoolemia trazidos pela Lei nº 12.760/12, que, ao lado do bafômetro, prevê a perícia médica e exames clínicos (art. 277, Lei nº 9.503/97, com redação dada pela Lei nº 12.760/12).
Referida legislação prevê duas espécies distintas de coleta de material genético, a saber:
(a) a primeira, para fins tipicamente investigatórios, submetida ao atendimento de importantes requisitos, conforme adiante veremos; e
(b) a segunda, imposta coercitivamente (obrigatoriamente) a todos aqueles que tiverem sido condenados (com trânsito em julgado) por crimes praticados com violência grave.
Se não vemos maiores problemas na primeira espécie probatória, desde que atendidos os mencionados e inafastáveis requisitos legais, já em relação à segunda modalidade, não há como não guardarmos reservas quanto ao seu campo de validade.
Vejamos, então, o conteúdo normativo das novas regras, iniciando com aquela do art. 3º, IV, c/c art. 5º, parágrafo único, Lei nº 12.037/09, com redação dada pela Lei nº 12.654/12.
A identificação – coleta de material genético – para fins de investigação encontra seu fundamento de validade, primeiro, na Constituição da República, art. 5º, XII, no qual se declina a extensão da proteção de direitos individuais inclusive para fins de processo criminal, e se encontra, claramente, uma regra de exceção, constitucionalmente adequada, é dizer: a cláusula da reserva da jurisdição, para o controle de legalidade do tangenciamento dos direitos ali consagrados expressamente (intimidade, privacidade e imagem, sobretudo).
Nesse passo, pode-se concluir que nosso constituinte acatou a possibilidade de previsão legal de intervenções estatais no âmbito da vida privada, se e desde que: (a) atendido o princípio da legalidade; (b) a medida se fizesse necessária, em uma relação de meio a fim (prova indispensável para a apuração da autoria); (c) a diligência probatória não seja demasiado invasiva, ao menos em níveis superiores àqueles mencionados no próprio texto constitucional (violabilidade de domicílio, de comunicações telefônicas e de dados etc.); e (d) tudo isso a ser examinado, fundamentadamente, por ordem judicial.
Não há, aqui, qualquer violação ao tantas vezes reclamado nemo tenetur se detegere. Desnecessário repetir o que já lançamos ao exame do aludido princípio, em abordagem feita nesse mesmo art. 186, e, mais precisamente, nos itens 186.1 e 186.2, aos quais remetemos o leitor. E, no particular, a Lei nº 12.654/12 se acomoda perfeitamente às exigências constitucionais do controle judicial das intervenções na vida privada.
No plano legal, segundo fundamento de validade da medida, tem-se que referida modalidade de identificação não ultrapassa os limites do devido respeito à dignidade corporal e ao princípio da não culpabilidade, tal como se encontra disposto na Lei nº 12.037/09, relativamente às já previstas e aceitas identificações datiloscópicas e fotográficas. A coleta de saliva, por exemplo – meio mais utilizado no direito comparado –, não produz um constrangimento ou uma violação corporal superior à corriqueira coleta de impressões digitais.
De resto, e como já o dissemos em outras oportunidades, a providência, se é novidade no processo penal, não é, contudo, no direito civil, consoante se vê do disposto no art. 232, do Código Civil, que prevê a possibilidade de submissão da parte a exames periciais corporais. Naturalmente, não estamos a traçar paralelo entre a relevância do reconhecimento de paternidade, por exemplo, e a identificação da autoria de um delito qualquer. Mas o que pode e deve ser realçado é que, mesmo em nível constitucional, há previsão para a tutela penal dos direitos fundamentais. E em diversos dispositivos (vide a censura expressa ao racismo, aos crimes hediondos, à tortura, além da possibilidade da intervenção do particular na ação subsidiária da pública – art. 5º, LIX).
Releva notar, ainda, que a exigência de autorização judicial parece ser suficiente para a efetiva proteção dos investigados, devendo atentar-se o magistrado para a concreta necessidade da prova, tendo em vista, também, a natureza do crime. Por certo que o aludido meio de prova, antes de qualquer outra consideração, dependerá de terem sido encontrados vestígios do delito, sem os quais seria inócua qualquer providência comparativa. Um delito sexual, por exemplo, evidencia a necessidade de coleta de material genético, até mesmo em razão das dificuldades probatórias (prova testemunhal) inerentes ao fato. Se é certo que a identificação genética somente comprovará a relação sexual, outras evidências corporais (lesões) poderão atestar a violência.
O controle judicial é também fundamental em face da previsão constitucional de proteção àquele civilmente identificado. E, mais ainda: a forma de coleta escolhida deverá obedecer às prescrições relativas à proibição de ingerências abusivas e desnecessárias, consoante se encontra disposto nos Tratados Internacionais sobre o tema.
A Lei previa, ainda, a exclusão do perfil genético ao final do prazo prescricional do delito investigado (art. 7º-A, Lei nº 12.037/09, c/redação da Lei nº 12.654/12). Por idênticas razões, sempre defendemos que o mesmo deveria ocorrer na hipótese de absolvição ou de decisão extintiva da punibilidade já passada em julgado. Aliás, essa era a solução legal prevista em relação à identificação fotográfica (art. 7º – Lei nº 12.037/09 – para rejeição da denúncia, arquivamento definitivo). Mas a Lei nº 13.964/2019 conferiu nova redação ao art. 7º-A, prevendo, agora, e de forma expressa, que a exclusão dos perfis genéticos dos bancos de dados ocorrerá em caso de absolvição (inciso I), ou, então, mediante requerimento do acusado, quando condenado, após decorridos 20 anos do cumprimento da pena (que é o prazo máximo em abstrato da prescrição no sistema legal brasileiro, art. 109, I, CP).
Nas hipóteses legais em que a defesa requerer a identificação criminal em favor do investigado, tal requerimento não poderá ser recusado sob nenhuma circunstância, tendo em vista, por primeiro, a idoneidade probatória da prova, e, em segundo lugar, a necessidade de se evitar, o quanto antes e possível, a submissão de um inocente à persecução penal.
Uma última consideração: se a recusa ao teste do bafômetro impede a produção da prova, na medida em que a pessoa não poderá ser coagida ou compelida a fazer o exame – o comportamento há de ser ativo! –, já na identificação genética isso não corre. A recusa, com efeito, não impedirá a coleta forçada do material genético, feitas as ponderações e observações antes mencionadas, sobretudo no que toca ao grau de invasão corporal do meio utilizado (por isso, falamos em saliva, fio de cabelo etc.). Do mesmo modo que a submissão à perícia médica ou ao exame clínico dos quais não se exige qualquer comportamento ativo do agente, nos termos do art. 277, Lei nº 9.503/97, com redação dada pela Lei nº 12.760/12, nada tem de inconstitucional, abstratamente.
A segunda modalidade de identificação genética, conduzida pela inclusão do art. 9º-A, na Lei de Execuções Penais (Lei nº 7.210/84), é bem mais complexa e problemática.
É que ela institui a obrigatoriedade de recolhimento compulsório de material genético de todos aqueles que estejam em cumprimento de pena pela prática de crimes praticados com grave violência. A finalidade, ainda que não expressamente declarada, seria a de facilitação da descoberta de futuros delitos para os quais, tendo sido deixados vestígios no local do crime, seja possível a identificação de autoria por meio da comparação de material genético. Institui-se, para tanto e então, um Cadastro ou Banco Geral de material genético de condenados (naqueles crimes já apontados). Mais que isso: a Lei nº 13.964/2019 previu que a recusa à realização dessa coleta de dados caracteriza-se como falta grave, nos termos do § 8º do art. 9-A c/c art. 50, VII, ambos incorporados à Lei nº 7.210/1984.
A medida, em princípio, pode até comportar uma interpretação conforme a Constituição, para fins de redução necessária do alcance da norma.
Explica-se.
A referência legislativa aos crimes praticados mediante grave violência não parece suficiente para acautelar os receios do legislador quanto a possíveis reiterações criminosas de idêntica natureza. Há, com efeito, homicídios passionais, praticados com grave violência, mas que não indicam razões suficientes para as preocupações e para a justificativa de inclusão no citado Cadastro Geral de condenados. E nem todos os crimes dessa natureza costumam deixar vestígios de autoria, ou seja, nem sempre o agente deixa no local material genético passível de exame. Já por isso, a ampla extensão dada pela Lei nº 12.654/12 ao Cadastro Geral pode se revelar desnecessária e abusiva.
É verdade que a legislação atual já autoriza a manutenção temporária do registro de condenações, para fins de antecedentes criminais. No entanto, a diferença de fundamentação para as duas espécies de registros (o genético e o da condenação) é rica em consequências no que toca à legitimidade e à validade da nova regra. Uma coisa é a manutenção de registros para fins de controle de política criminal e, inclusive, para justificar o agravamento de apenação em caso de futura aplicação de pena. Outra, muito diferente, é a instituição de um banco genético de condenados com o propósito indisfarçável de facilitar futuras investigações.
E eis aqui o problema. A existência do Cadastro Geral pode prestar-se a uma perigosa inversão de rumos da investigação, partindo-se das informações disponíveis para o início das investigações, ao invés de se iniciar a busca de elementos informativos pelos meios e fontes de prova disponíveis a cada caso concreto. Em síntese: corre-se o risco de se partir do autor do crime passado para a identificação do crime presente. Nesse passo, dificilmente se deixará de arranhar o princípio da não culpabilidade.
Há outra questão. Diz a Constituição da República que aquele civilmente identificado não se submeterá à identificação criminal, conforme dispuser a lei. Ora, tem-se aqui, à evidência, regra geral no sentido de se reservar apenas às situações especiais outras formas de identificação daquele já civilmente identificado. Ou seja, a regra seria a suficiência da identificação civil; a criminal, ou outra, deverá ser excepcional e constitucionalmente adequada.
E, conforme dissemos, algumas infrações penais, segundo os dados disponíveis no percurso das estatísticas de criminalidade, produzem alarmes suficientes para eventual receio de reiteração criminosa. É o caso dos crimes contra a dignidade sexual, por exemplo. Via de regra, pode-se recolher algum material genético do agente do delito, diante das singularidades presentes em sua execução. Assim, o cadastro genético para tais delitos não nos soa demasiado ou abusivo, desde que somente se tenha acesso a ele nos casos em que o delito tenha efetivamente deixado vestígios, para fins de comparação. Se a infração não deixar vestígios, o acesso ao banco ou cadastro, sem outros elementos de prova, incorrerá naquele mesmo risco já apontado: o de partir-se da presunção de culpa daquele que já tenha sido condenado. De qualquer maneira, registramos a preocupação inserida pela Lei nº 13.964/2019 ao § 3º do art. 9-A da Lei nº 7.210/84, dispondo que se deve viabilizar ao “titular de dados genéticos o acesso aos seus dados constantes nos bancos de perfis genéticos, bem como a todos os documentos da cadeia de custódia que gerou esse dado, de maneira que possa ser contraditado pela defesa”.
Por fim, de se mencionar o caráter estigmatizante da medida, dado que a pessoa que se encontrar cadastrada como condenado, e com material genético disponível aos poderes públicos, carregará efetivamente (até quando?) a marca indelével da culpa.
Em síntese: pensamos que apenas deverão se submeter a esse cadastro os condenados em crimes sexuais ou em crimes de execução sumária, praticados sem qualquer motivação que não seja a eliminação de pessoas para satisfação de interesses escusos e em circunstâncias não reconhecidas pelo direito, caso, por exemplo, e como dissemos, dos crimes passionais (por provocação da vítima, por transtorno circunstancial do agente etc.). Fora daí, será difícil a conformação legislativa da norma com as orientações constitucionais pertinentes (não culpabilidade, restrição de identificação criminal, por exemplo).
Nossa análise.
Em relação ao caput do art. 9º-A, a restrição apontada no veto tinha certa procedência. Mas o que temos aqui é, agora, uma limitação (válida apenas a partir de quando se tornar lei) das hipóteses em que os “condenados” deveriam ser submetidos à identificação do perfil genético. Vide ao que já destacamos em doutrina acima.
O tema é objeto de repercussão geral já reconhecida no STF, como se vê:
[…] 1. Repercussão geral. Recurso Extraordinário. Direitos fundamentais. Penal. Processo Penal. 2. A Lei 12.654/12 introduziu a coleta de material biológico para a obtenção do perfil genético, na execução penal por crimes violentos ou por crimes hediondos (Lei 7.210/84, art. 9º- A). Os limites dos poderes do Estado de colher material biológico de suspeitos ou condenados por crimes, de traçar o respectivo perfil genético, de armazenar os perfis em bancos de dados e de fazer uso dessas informações são objeto de discussão nos diversos sistemas jurídicos. Possível violação a direitos da personalidade e da prerrogativa de não se autoincriminar – art. 1º, III, art. 5º, X, LIV e LXIII, da CF. 3. Tem repercussão geral a alegação de inconstitucionalidade do art. 9º-A da Lei 7.210/84, introduzido pela Lei 12.654/12, que prevê a identificação e o armazenamento de perfis genéticos de condenados por crimes violentos ou por crimes hediondos. 4. Repercussão geral em recurso extraordinário reconhecida (RG no RE nº 973.837-MG, STF, unânime, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 23.6.2016, publicado no DJ em 11.12.2016).
Prosseguindo, agora o § 5º do art. 9º-A prevê outra restrição, que a “amostra biológica coletada só poderá ser utilizada para o único e exclusivo fim de permitir a identificação pelo perfil genético, não estando autorizadas as práticas de fenotipagem genética ou de busca familiar”.
Do que visualizamos até aqui – e em momento inicial -, parece não haver nenhum problema maior. Veja-se que a restrição é unicamente em relação à amostra coletada do agente. Identificado o perfil genético, existe a possibilidade de, a ele, agregar quaisquer outras provas que demonstrem o crime. Assim, não visualizamos óbice que, num delito de estupro, sejam coletados dados fornecidos pela vítima para fins de comparação de dados acerca da autoria. É dizer, não se pode limitar legalmente a produção probatória que, para além da identificação, não interfira em outros direitos do suposto autor do fato.
No § 6º prevê-se que, “uma vez identificado o perfil genético, a amostra biológica recolhida nos termos do caput deste artigo deverá ser correta e imediatamente descartada, de maneira a impedir a sua utilização para qualquer outro fim”. De fato, a justificativa do veto até conteria uma certa plausibilidade. Mas é de fácil solução, salvo melhor juízo: basta que a própria defesa solicite a manutenção da amostra para eventuais reanálises futuras, se necessário, evitando-se o erro.
Não se olvide que se trata de uma restrição de garantias individuais, em relação às quais não há impedimento algum a ressalva do próprio interessado no eventual exercício da sua defesa. Certamente que, não solicitando nenhuma manutenção das amostras, não poderá ulteriormente alegar nulidade por não ter a possibilidade de produção probatória defensiva por esse meio.
Por fim, o § 7º do art. 9º-A, referindo que a “coleta da amostra biológica e a elaboração do respectivo laudo serão realizadas por perito oficial”.
Veja-se que a lei fala que a coleta e o laudo deverão ser realizadas por perito oficial.
O tema não é novo nos debates e embates doutrinários e jurisprudenciais.
No art. 158-C, incluído também pela Lei nº 13.964/2019, já se dispunha que “a coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial, que dará o encaminhamento necessário para a central de custódia, mesmo quando for necessária a realização de exames complementares”.
Verdade que, aqui, diz que deverá ser preferencialmente, e nessa parte o § 7º do art. 9º-A é silente.
São as (ausências de) técnicas do nosso legislador, mas há se buscar uma solução jurídica.
Conforme nossos comentários a esse novel dispositivo do art. 158-C (op cit., p. 558 e seguintes), “guardando similitude com a previsão do art. 159, CPP (vide, a seguir), no caput do art. 158-C prevê-se que a coleta deverá ser realizada preferencialmente (logo, não obrigatoriamente) por (um) perito oficial. Não se incluiu previsão expressa aqui, mas, como proceder se não houver perito oficial no local onde for efetivada a coleta do vestígio? Pensamos que a solução deva ser buscada, por compreensão sistemática, no próximo § 1º do art. 159 do CPP. Ora, se a legislação admite que, ausente perito oficial, a própria perícia seja feita por duas pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica, dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do crime, não há sentido em não se admitir que a própria coleta seja feita por outras duas pessoas com capacidade técnica para tanto”.
Segundo pensamos, a solução passará por esse compreensão sistemática: a coleta poderá ser, excepcionalmente, feita por quem não o seja “perito oficial”, desde que realizada a produção com todas as cautelas exigidas, mas o laudo deverá ser formulado por um perito oficial, observando-se, suplementarmente, as regras retromencionadas.
Considerações finais. Como dito no início, são algumas abordagens dos textos que passarão a vigorar em breve como lei. Não há a pretensão de esgotar os temas, muito menos dizer que há “uma certeza” sobre essas “conclusões provisórias” (digamos assim), a respeito dos tópicos. Eventuais complementos ou até retificações sempre podem ocorrer, pois a busca das melhores soluções sempre demandam releituras e novas compreensões sobre os temas debatidos, notadamente aqueles que se apresentem como novidades.
Era mais ou menos isso, e salvo melhor juízo. Sempre.
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