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Revista Forense
CLÁSSICOS FORENSE
PROCESSO CIVIL
REVISTA FORENSE
O Ministério Público e o Processo Civil, de Guilherme Estelita
Revista Forense
30/12/2024
SUMÁRIO: O órgão da ação penal na jurisdição civil. Atuação do Ministério Público na jurisdição civil. Intervenção federal nos Estados. Argüição de inconstitucionalidade. Advogado da Fazenda Pública. Funções do Ministério Público na jurisdição civil. As cinco formas típicas. O Ministério Público na relação processual. Cód. do Ministério Público.
Atuando precìpuamente no campo da jurisdição criminal como órgão promotor da ação penal, o Ministério Público desempenha todavia, na jurisdição civil, funções de alta relevância e de extrema variedade de forma. Precisamente por esta última circunstância, menos fácil se torna bem caracterizar e definir as finalidades e a natureza de sua atuação no cível. Já no crime, sua atividade obedece sempre ao mesmo desígnio, preciso e exclusivo – servir à ação penal. Embora o serviço dêste leve, por vêzes, o promotor público a ingressar no campo da jurisdição civil. Assim acontece, por exemplo, em diversas hipóteses.
Intentada a ação penal, perante determinado juiz criminal, entre êste e um juiz do cível poderá surgir conflito de jurisdição a respeito do conhecimento da causa. Impor-se-á, nesse caso, ao promotor público diligenciar para a solução do conflito visando à eliminação do entrave criado ao desdobramento da ação penal. No Distrito Federal, apesar do disposto no Cód. de Proc. Civil (art. 803, II), não o poderá fazer diretamente perante o Tribunal de Justiça, e sim por intermédio do procurador-geral (Cód. de Org. Judiciária, arts. 11, c, e, 139, IV).
O órgão da ação penal na jurisdição civi
Quando o juiz criminal, na forma do art. 92 do Cód. de Proc. Penal, houver suspendido, por prazo marcado, o curso do processo penal, porque corra no juízo próprio ação cível em que se decidirá questão de cujo desate dependa o reconhecimento da existência da infração penal, também deverá o órgão da ação penal (se se tratar de crime de ação pública) ir à jurisdição civil. Mas aí seu papel limitar-se-á a intervir na ação, a fim de promover-lhe o rápido andamento (Cód. de Proc. Penal, art. 92 e parágrafo único; Cód. de Org. Judiciária, artigo 145, X, parág. único).
Antes mesmo do início da ação penal, ou do seu julgamento definitivo, poderá o promotor público recorrer à jurisdição civil para pedir a especialização da hipoteca legal sôbre os imóveis do indiciado ou do responsável civil, ou o seqüestro de bens seus, quer imóveis, quer móveis, suscetíveis de penhora (Cód. de Proc. Penal, art. 144). Basta, para tanto, que seja interessado em tais medidas a Fazenda Pública, ou que o ofendido, sendo pobre (art. 32, § 1º), lho tenha requerido (Código cit., art. 144).
No Distrito Federal caberá essa atribuição ao promotor substituto, designado pelo procurador-geral (Cód. de Org. Judiciária, art. 158, II).
Em caso de dúvida, sôbre quem seja o verdadeiro dono das coisas referidas nos arts. 74 e 100 do Cód. Penal, e como tais apreendidas, deve o juiz criminal remeter as partes para o juízo cível (Cód. de Proc. Penal, art. 120, § 4º). Incumbirá nesse caso o patrocínio do interessado pobre, ao órgão da ação penal? Não há na lei processual elementos para uma resposta segura, mas parece que no Distrito Federal, ex vi da regra geral do art. 154, X, parág. único, do Cód. de Org. Judiciária, a tarefa será do promotor criminal que exercite a ação penal.
Esmerou-se o legislador penal de 1940-1941 em assegurar a reparação civil do delito.
Por um lado, declarou efeito da condenação penal tornar certa a obrigação de indenizar o dano (Cód. Penal, art. 74, I). Pelo outro, autorizou, como vimos, medidas assecuratórias da efetivação dessa responsabilidade, antes mesmo de iniciada a ação penal ou do seu julgamento definitivo. Além disso, deixou expresso poderem o ofendido seu representante legal, ou seus herdeiros promover no juízo cível a execução da sentença condenatória desde que transitada em julgado (Cód. de Proc. Penal, artigo 83). Ainda mais: permitiu o exercício da ação cível antes mesmo de iniciada a ação penal (Código cit., arts. 63 a 64).
Não se contentou, porém, com essas providências tôdas: ainda assegurou ao titular do direito à reparação do dano a assistência judiciária do Ministério Público, quando seja êle pobre e o tenha requerido (Cód. de Proc. Penal, art. 88). Assistência que, no Distrito Federal, segundo o Cód. de Org. Judiciária, será prestada pelo promotor substituto para isso designado pelo procurador-geral (artigo 158, II).
Aluda-se, por fim, a uma outra forma de atuarão do promotor da ação penal na jurisdição civil. Ocorrerá quando se tenha de executar a fiança prestada pelo réu para defender-se sôlto, e ela, consista em hipoteca inscrita em primeiro lugar (Cód. de Proc. Penal, art. 330).
Nesse caso, a excussão da garantia será promovida no juízo cível e pelo órgão do Ministério público que exercita a ação penal (Cód. de Proc. Penal, art. 340).
No Distrito Federal, a tarefa deverá saber, por aplicação analógica do art. 158, III, do Cód. de Org. Judiciária, ao promotor substituto designado pelo procurador-geral.
Das várias hipóteses passadas em revista, conclui-se caber ao órgão da ação penal, em certos casos, o dever de atuar perante a jurisdição civil, embora o faça ainda em razão daquele encargo de ordem penal.
No Distrito Federal, como essa atuação ter-se-á de fazer, em regra, perante as Varas Cíveis, surgirá sempre o problema de determinar-se qual o órgão competente para agir, pois umas vêzes será o promotor criminal, outras o promotor substituto.
Aludimos à hipótese em que o Ministério Público, embora como órgão da ação penal e no exercício dessa função, é levado a ingressar na jurisdição civil, exercendo, portanto, atividades de exceção, eis que fora do âmbito normal do seu campo de agir, ou seja, a justiça criminal.
Funções do Ministério Público na jurisdição civil
Considere-se agora sua atuação na esfera da jurisdição civil, onde tantas e tão variadas funções é chamado a desempenhar.
Atenda-se em primeiro lugar ao seu alto dever, de ordem constitucional, de velar pela observância, nos Estados, dos princípios da organização política do país, definidos no inc. VII do art. 70, da Constituição, ou sejam: forma republicana representativa, independência e harmonia dos poderes, temporariedade das funções eletivas, proibição da reeleição de governadores e prefeitos para o período imediato, autonomia municipal, prestação de contas da administração, garantias do Poder Judiciário.
Quando se verifica num Estado ato que viola qualquer dêsses princípios, dar-se-á nêle intervenção do govêrno federal, decretada mediante lei. Uma lei, porém, só poderá ser votada de haver o Supremo Tribunal Federal declarado a inconstitucionalidade do ato. Mas, por sua vez, o pretório excelso só poderá fazer tal declaração se o procurador-geral da República lhe submeter a estame o ato.
A princípio, em face do disposto na Lei Orgânica do Ministério Público da União (lei nº 1.341, de 30-1-851, art. 30, VII), onde se dispunha competir ao procurador-geral da República “pronunciar-se de direito sôbre a conveniência, oportunidade ou legalidade da intervenção federal”, pensou-se caber-lhe o poder do dizer quanto ao mérito da argüição mas, logo nas primeiras hipóteses levadas ao exame do Supremo Tribunal, firmou-se a opinião restritiva, com apoio, aliás, no texto da Constituição. Daí ter sido votada em 1954 a lei nº 2.271, de 22 de julho, destinada especialmente a regular o exercício desta função do cheio do Ministério Público Federal, bem como o processo a observar na declaração da inconstitucionalidade. Segundo seu art. 1º ao procurador-geral da República, tôda vez que tiver conhecimento de ato nessas condições, cabe submetê-lo ao exame do Tribunal.
Embora não lhe caiba a atribuição de opinar sôbre a existência ou inexistência da inconstitucionalidade argüida, devendo limitar-se a submeter a argüição a exame e julgamento.
Todavia, uma dúvida se apresenta quanto a poder êle embargar o acórdão declaratório da existência ou inexistência do vício. Caso não haja unanimidade de votos na decisão, assenta a lei, caberá (textual) embargos (art. 4º). A quem será dado o direito de os oferecer? Aos interessados na questão? Não é de crer, pois sendo-lhes vedado levar diretamente ao Tribunal sua argüição, só podendo apresentá-la mediante representação ao procurador-geral, lógico não será admitir se lhes permita êsse mesmo acesso, depois de o Tribunal se ter pronunciado.
Objetar-se-á, no entanto: como terceiros interessados, deve ser lhes reconhecido o direito de recorrer. Argumento só na aparência fundado. Em verdade, nem se trata de verdadeiro pleito, nem são êles na questão verdadeiros terceiros, aos quais possa a sentença proferida entre as partes causar prejuízo: serão, ao contrário, os próprios interessados na declaração da inconstitucionalidade. Mas interessados a quem a lei, dada a natureza da controvérsia, não lhes permitiu possam diretamente submetê-la ao exame do Poder Judiciário. Restringindo ao procurador-geral o poder de levar o caso à decisão do Supremo Tribunal, parece evidente ter sido intuito do legislador constitucional não consentir que os próprios interessados o façam diretamente. Daí a conclusão mais defensável: só o procurador-geral poderá oferecer embargos. A isso, certo, se oporá: mas embargar com que intuito, pedindo o que, se inicialmente nada lhe é permitido pedir, se êle só pode é submeter a argüição do vício ao exame do Tribunal? Pedirá um novo exame, eis que o anterior se ultimou sem unanimidade de votos. É essa, pelo menos, a solução que se apresenta mais razoável, porque acorde com o sistema adotado na Constituição para a declaração de inconstitucionalidade nos casos do número VII, do art. 7º.
Constituindo função precípua do Ministério Público velar pelo cumprimento e guarda da Constituição, leis e regulamentos, impõe-se verificar se lhe cabe argüir de inconstitucional lei ou ato do poder público.
Não há na Constituição, nem nas leis de processo civil, disposição que expressamente verse a questão. Também na Lei Orgânica do Ministério Público na União, nem no Cód. de Org. Judiciária do Distrito Federal, nem ainda no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (art. 30), nem no do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (ato nº 10), se confere ao chefe do Ministério Público a atribuição de suscitar a argüição: neste último diploma apenas se lhe assegura o direito de ser ouvido em 10 dias (art. 139, III, e). Todavia, na lei interna do pretório excelso, é prevista a hipótese de êle requerer a suspensão do julgamento do feito até que se resolva como prejudicial a inconstitucionalidade argüida (arts. 85 e 86). E na do Tribunal de Justiça do Distrito Federal se lhe assegura a audiência sôbre argüição que haja ido feita.
Apesar do exposto, parece-nos nada existir que justifique uma solução negativa. Se aos litigantes, ao juiz de primeira instância, aos juízes componentes dos tribunais, se outorga, àqueles, o poder de argüir, aos demais, o de declarar inconstitucional lei ou ato do poder público, não vemos sonso se passa negar aquela faculdade ao Ministério Público, precisamente o órgão incumbido, de modo especial e expresso, de velar pelo cumprimento e a guarda da Constituição. Nada seria menos lógico e razoável. À conta de inadvertência do legislador deve-se levar o silêncio das leis.
Advogado da Fazenda Pública
Função das mais importantes do Ministério Público, a ser exercida perante a jurisdição civil, é a de advogado da Fazenda Pública, federai ou estadual, nas causas em que esta seja autora, ré, assistente ou opoente, ou por qualquer forma interessada. Aí desempenha o Ministério Público as funções de procurador perante a Justiça da Fazenda, da União ou do Estado, praticando todos os atos inerentes ao mandato judicial, guardadas, é claro, as restrições legais. Dentre estas é de notar-se a proibição expressa em lei, aos procuradores da República, de transigir, comprometer-se, confessar, desistir ou fazer composição, salvo quando especialmente autorizados pelo procurador-geral da República (lei nº 1.341, de 1951, artigo 23). Norma extensiva, é óbvio, a qualquer órgão do Ministério Público que defenda em juízo qualquer Fazenda Pública. Não recorrer da sentença contrária à Fazenda inclui-se implìcitamente na proibição, gerando, além do mais, a obrigação de indenizar os danos assim conseqüentes, aliás hoje afastados pela instituição do recurso ex officio.
Apesar de advogado da Fazenda Federal, não parece deva o Ministério, Público Federal pronunciar-se, nessaqualidade, sôbre o pedido de seqüestro do crédito aberto para pagamento das condenações judiciais impostas à União Federal, pedido feito no caso de ter sido o requerente preterido em seu direito de precedência nos pagamentos, estabelecida de acôrdo com a ordem de apresentação dos precatórios. Realmente, em tal caso, a Constituição manda apenas ouvir o chefe do Ministério Público competente e ao leis relativas à matéria prescrevem ao subprocurador-geral da República a atribuição de “pronunciar-se como de direito” (Regimento Interno do Tribunal Federal de Recursos, art. 21, VI). Se deve pronunciar-se como de direito, não o poderá fazer como advogado da Fazenda. Tanto mais quanto o pedido de seqüestro é mais uma providência contra a autoridade que desrespeitou a precedência recomendada na Constituição do que, pròpriamente, ato contra a Fazenda devedora.
No Distrito Federal, onde a Fazenda Municipal não tem por advogado o Ministério Público, êsse pronunciamento de direito, ainda menos indubitável, ainda mais obrigatório se faz, dada a circunstância.
Registre-se, por último, saber ao Ministério Público dos Estados (promotores de justiça) o patrocínio judicial dos interêsses da Fazenda Federal, promovendo a cobrança da dívida ativa da União, quando a ação houver de ser proposta em outro fôro que não seja o do Distrito Federal ou do Território do Acre e das capitais dos Estados; nesses casos, terão aquêles promotores as atribuições dos procuradores da República. Justifica-se a providência por medida de ordem prática, visando dispensar a criação, nesses foros, de lugares de procurador da República; mas também se apóia na razão relevante da unidade conceitual da instituição; embora servindo a interêsses públicos de natureza diversa.
É de acentuar conquanto de passagem, um aspecto concernente a essa tradicional reunião, num mesmo órgão, de funções inteiramente diversas.
Em verdade, sempre estêve a cargo do Ministério Público uma dupla tarefa: defender em juízo os interêsses de ordem patrimonial da Fazenda Pública e, ainda, a de velar pelos interêsses de ordem pública, mediante a promoção da observância das leia. Tanto promovendo, na jurisdição criminal, a ação penal, como na jurisdição civil, exercendo a tutela de todos os interêsses daquela natureza que por vêzes aparecem entrelaçados, nas causas cíveis, com os dos particulares litigantes.
Aliás, pela história, explica-se, fàcilmente, essa cumulação de funções, tão heterogêneas. Inicialmente, o Ministério Público foi apenas o procurador do rei, o defensor do fisco, isto é, dos interêsses da fazenda real; mais tarde, evoluindo a concepção jurídica do Estado e a Justiça, tornou-se indispensável criar uma defesa especial do império da lei e de certos interêsses sociais, em número sempre crescente, por ela protegidos. Daí se terem entregues as novas tarefas ao órgão criado para o serviço da outra.
Todavia, já se tornou evidente a necessidade de realizar essa dissociação de funções, hoje consideradas heterogêneas, atribuindo cada uma delas a um órgão judicial próprio. Tal como acontece há muitos anos no Distrito Federal. Aqui a Fazenda do Município tem seu corpo especial de advogados (os procuradores da Prefeitura), nenhuma tarefa cabendo mais, nesse particular, ao Ministério Público local, ao contrário do que ainda ocorre na maioria dos Estados.
Por sua vez, pode-se considerar como função quase exclusiva do Ministério Público da União representar esta em Juízo e aí defender-lhe os interêsses patrimoniais.
Consoante a orientação evolucionista acima aludida, São Paulo já libertou seu Ministério Público da tarefa de defensor judicial da Fazenda Pública. Organizou-o tão-sòmente para o exercício de suas funções próprias, de defensor do império da lei e dos interêsses da sociedade, concedendo-lhe autonomia de direção; seu chefe passou a intitular-se “procurador-geral da Justiça”, eis que do Estado já não é. Mais ou menos no mesmo sentido foi o Ministério Público organizado em alguns Estados (Bahia, Piauí, Rio Grande do Norte).
Examinadas as formas de atuação do Ministério Público, por assim dizer especiais, vamos prosseguir, passando ao estudo das várias outras funções suas na jurisdição civil, umas de ordem geral, outras de natureza mais restrita, porque servindo a finalidades específicas. No exame de tôdas elas nos deteremos grupando as que se assemelharem, pondo em destaque as de sentido particular, para, em conjunto e a final, examinar aspectos de natureza processual que o exercício de umas e outras oferece, dada sua variedade e sua especialização.
Entre as funções mais gerais atribuídas ao Ministério Público no Cód. de Organização Judiciária (art. 127), inclui-se a de promover e fiscalizar o cumprimento e a guarda das decisões.
Há nesse texto, legal como demasia que salta aos olhos: essas decisões não podem ser tôdas, mas tão-sòmente as criminais ou as cíveis em cuja execução haja um interêsse da ordem pública.
Note-se, aliás: a lei nº 218, de 9-1-948, que dispôs sôbre o Ministério Público no Distrito Federal, eliminou a referência a decisões.
Também no Cód. de Org. Judiciária aponta-se como dever dos órgãos do Ministério Público defender a jurisdição das autoridades judiciárias (Código citado, art. 129, VIII). Ainda aqui cabe distinguir, esclarecer. No tocante às autoridades da jurisdição civil, essa defesa há de restringir-se ao que se relacione com a competência absoluta, pois a infração dos preceitos legais concernentes à competência relativa é deixada belo Cód. de Proc. Civil à iniciativa das partes (art. 148, I), considerando-se prorrogada a jurisdição quando o réu não opuser a competente exceção (artigo cit., número I). Logo ao Ministério Público não assiste qualidade senão para pugnar pelo respeito àquela espécie de competência.
Mesmo nessa defesa há restrições de meios a consignar: p. ex.: o órgão do Ministério Público não pode, segundo o Código de Org. Judiciária, suscitar conflito de jurisdição, um dos meios legais de resolver as questões sôbre competência (Código de Proc. Civil, art. 152). Tal poder é reservado, como vimos antes, ao procurador-geral, como chefe do Ministério Público e seu representante perante o Tribunal de Justiça (Cód. de Org. Judiciária, art. 139, IV). Mas é lícito inquirir: pode essa disposição prevalecer ante os têrmos amplos, irrestritos, do art. 803 do Cód. de Proc. Civil, autorizando o órgão do Ministério Público á suscitar dito conflito? A nosso ver, prevalece é a disposição da lei processual, já por se tratar de matéria nela regulada, já ex vi da disposição do seu art. 1.049.
Convém fique acentuado caber aos procuradores da República o direito de suscitar conflito de jurisdição, segundo está expresso na Lei Orgânica do Ministério Público da União (art. 38, IV). Não se compreende nem se justifica essa capitisdeminutio imposta aos órgãos do Ministério Público do Distrito Federal.
Ainda quando dúvida a êsse respeito pudesse restar, na hipótese de o Ministério Público apenas intervir no processo, ela não poderá caber no caso em que seja êle a própria parte no processo ou preste assistência judiciária a uma delas. Porque, aí, sua condição será a de um perfeito litigante ou de seu advogado e, sendo assim, nunca se lhe poderá negar o uso de um dos meios legais para resolver as questões de competência, como é o conflito.
Velar pela fiel observância das formas processuais, de modo a evitar despesas supérfluas e a omissão das formalidades legais, eis outra das atribuições gerais do Ministério Público especificadas no Cód. de Org. Judiciária, (art. 129, XI). Significa, noutros têrmos, o dever de opor-se ao emprêgo dos recursos da chicana por parte do réu ou do autor, reprimidos na forma prescrita nos arts. 3º e 63, §§, do Cód. de Proc. Civil. Por outro lado, impõe-lhe a obrigação de vigilância por que se não deixem de cumprir as exigências legais que previnem a ocorrência de nulidades. Apesar dos têrmos amplos, incondicionados, da norma, parece-nos, o exercício dessa dupla obrigação, só é cabível se nos processos houver interêsses de incapazes, ou de ordem pública, que no mesmo legitimem a intervenção do Ministério Público. Em qualquer outro processo, nem mesmo lhe será possível exercê-las.
As cinco formas típicas
Considerada do ponto de vista de sua natureza e profundidade, a atuação do Ministério Público nos processos cíveis assume aspectos bastante variados. Mas pode ser reduzida a cinco formas típicas:
1ª forma – Propõe ações ou promove processos, agindo em nome próprio, em razão da função;
2ª forma – É o procurador judicial do litigante, seja autor, seja réu, funcionando como seu advogado, presta-lhe, numa palavra, assistência judiciárias.
3ª forma – É chamado ao processo como defensor dos interêsses de certas pessoas capazes ou incapazes, autoras ou não, revéis ou não. Exerce, nesses casos, a curadoriaà lide, dada a esta expressão um sentido amplo, genérico, para abranger variadas formas de defesa judicial, tal como o faz o Cód. de Proc. Civil, no art. 80.
4ª forma – Seu papel é zelar por um interêsse, puramente social, de relevância extrema, pôsto em jôgo no feito, a dizer, a defesa do vínculo matrimonial.
5ª forma – O Ministério Público apenas intervém ou funciona no processo, com o fim especial, preciso, de velar pela observância das leis na parte em que elas resguardam os chamados interêsses de ordem pública. Esta é a atuação mais geral e ampla, no sentido de exercer-se no maior número de processos. Aí o Ministério Público apenas diz dedireito ou oficia, como se define na prática forense.
Convém indicar exemplos dessas diversas formas de atuação. Assim melhor se caracterizará o papel em cada uma delas desempenhado pelos diversos órgãos do Ministério Público.
Age na 1ª forma, quando: propõe ação de nulidade de casamento (Cód. Civil, art. 209); promove a interdição dos absolutamente incapazes ou perturbados mentais por abuso de tóxicos (Cód. Civil, art. 448; dec. nº 24.559, art. 27, § 3°; Cód. de Proc. Civil, arts. 606 e segs.); propõe ação de perda ou suspensão do pátrio poder (Cód. Civil, art. 394; Cód. de Org. Judiciária, art. 143, V); promove a inscrição da hipoteca, legal; promove a venda e o arrendamento, de bens de ausentes; promove a busca e apreensão de menores; promove a arrecadação de bens de defuntos; de ausentes e vagos; promove a abertura de inventário; promove a nomeação e remoção de inventariantes, tutôres, e curadores e lhes exige contas; promove ações de nulidade de patentes de invenção e de registro de marcas de indústria, comércio, etc.; promove a dissolução de sociedades civis e comerciais; promove a cassação de declaração de utilidade pública de sociedades civis, associações civis e fundações; promove o seqüestro dos bens de diretores de bancos e casas bancárias (lei nº 1.808, de 7-1-953); propõe ação de dissolução da sociedade civil que promover atividade ilícita ou imoral (decreto-lei nº 8.085, de 25-3-943, art. 6º, parágrafo único); promove a elaboração dos estatutos das fundações; propõe ação anulatória dos atos dos seus administradores, contrários aos estatutos; promove o seqüestro dos bens das fundações ilegalmente alienados ou adquiridos por seus administradores ou funcionários; promove a extinção das fundações; promove a exibição e o cumprimento dos testamentos; promove os processos de cobranças de soldadas ou alimentos devidos a menores; promove o cumprimento dos legados pios; promove a execução do Cód. Civil, na parte relativa à sucessão testamentária; promove a abertura da sucessão provisória ou definitiva do ausente; promove a cobrança das dívidas ativas do ausente; interrompe a prescrição das mesmas; requer a prestação de contas do síndico, do liquidatário e dos que administram bens da massa falida; promove a destituição de síndicos ou liquidatários; promove anotações, averbações, retificações, cancelamento ou restabelecimento de atos do registro civil das pessoas naturais.
É essa a forma de atuação mais rara, mas, em compensação, é a de maior importância, pois é através dela que o Estado exercita a defesa mais ativa daqueles interêsses por êle considerados de tanta relevância, que a si mesmo se impõe o dever de por êles impugnar. Quando exercita função dessa natureza, o Ministério Público frui todos os poderes inerentes ao seu bom desempenho. Nenhuma restrição lhe deve ser criada ao uso dos meios processuais permitidos aos litigantes em geral.
Atua o Ministério Público na 2ª forma, isto é, prestando assistência judiciária ao interessado, quando:
– propõe, como advogado da vítima de acidente no trabalho, ou dos seus beneficiários, a competente ação de indenização, bem como a ação de revisão da sentença (dec.-lei n° 7.036, de 10-11-944, art. 57; Cód. de Org. Judiciária, art. 152, II). Pode, todavia, o interessado dispensar essa assistência, constituindo advogado próprio (artigo 68). Mas já na ação especial contra terceiros (art. 32), não contará o interessado com a assistência judiciária do curador de acidente no trabalho;
– promove, no juízo civil, em nome do interessado pobre, a execução da sentença penal condenatória para o fim de tornar efetiva a obrigação de indenizar o dano conseqüente ao delito (Cód. de Org. Judiciária, art. 158, III). Sendo esta uma função de assistência judiciária, é lhe aplicável, sem dúvida, por analogia, a disposição do art. 190 do mesmo Código, em virtude da qual o dever de assistência é exercido sem prejuízo da escolha do advogado pela parte ou pelo serviço de assistência judiciária;
– presta assistência judiciária aos necessitados, nos têrmos da lei nº 1.060, de 5-2-950. Devem os Estados ter para êsse fim serviço organizado: costumam dar ao Ministério Público essa incumbência, quando não a possuem. No Distrito Federal, p. ex., os antigos advogados de oficio, embora sem pertencerem ao Ministério Público, desempenhavam a tarefa, sob a supervisão do procurador-geral. A partir de 1948, passaram a integrar os quadros do Ministério Público, com a denominação de defensores públicos, mantidas, porém, suas atribuições (lei nº 216) de prestar assistência Judiciária. Funcionam, no cível, perante as Varas de Família, de órfãos e Sucessões, e de Menores (Cód. de Org. Judiciária, art. 188);
– defende o funcionário público nas causas cíveis quando haja, nessa defesa interêsse público (dec.-lei nº 5.335, de 22-3-943). Regula êsse diploma a prestação da assistência ao funcionário público federal, cabendo ao procurador-geral designar o procurador da República que haja de prestá-la, valendo como procuração judicial a portaria de designação. Já em relação ao funcionário público municipal, a assistência judiciária, no Distrito Federal, é dada por um dos advogados com exercício na Procuradoria da Prefeitura e restrita ao processo criminal (dec.-lei n° 4.241, de 9-4-912).
Sob a 3ª forma, atua o Ministério Público como detentor, na lide dos interêsses de certas pessoas, cuja situação especial está a também a necessidade de essa defesa ser entregue a órgãos oficiais. Como isso acontece em condições as mais variadas, demos a essa forma de atuação do Ministério Público a denominação genérica de curadoriaà lide, para indicar restringir-se a defesa a um determinado processo.
Sem dúvida, em todos os casos ora grupados sob a terceira forma de atuação do Ministério Público, também se apresenta esta com a natureza e a finalidade de uma assistência judiciária. Mas difere, inegàvelmente, da forma antes examinada, entre outras razões e motivos, por ser essencialmente ligada às condições especiais, características da situação das pessoas assistidas. Assim é que, na forma anterior; trata-se de litigantes plenamente capazes do ponto de vista civil, mas em cujo socorro vem o Estado por lhes falecerem os meios, sobretudo de ordem material, indispensáveis ao exercício da defesa judicial de seus direitos, impondo-se, destarte, o auxílio oficial. Aqui, diversa, e muito, é a situação das pessoas assistidas: não interessados de vária espécie, uns incapazes, outros incertos, outros enfim ausentes, todos, portanto, em condições excepcionalmente desfavoráveis a proverem à defesa em juízo de seus direitos. É em atenção a tais circunstâncias que o Estado assume, por seus órgãos, a proteção dêsses interêsses, os resguarda até que seus titulares possam prover a respeito.
Convém todavia acentuar, desde logo, o conceito histórico, preciso, da expressão curadoria à lide, a fim de evitar confusões e mal-entendidos. O curador à lide, ou inlitem, não é, no processo, o representante judicial do incapaz; é, apenas, o seu defensor na causa, isto é, na lide o seu advogado no processo, e por isso mesmo funciona ao lado daquele representante, suprindo-lhe a revelia ou as deficiências da defesa que venha produzindo. Êsse é o conceito tradicional da curadoria à lide, tal como instituída no final do § 9º do tít. 41 do Livro 3º das Ordenações Filipinas, onde se prescreve, como dever do curador, “defender o menor o melhor que puder”. TEIXEIRA DE FREITAS o definia um defensorjudicialcomdenominaçãoprópria, explicando a diferença existente entre defensoreprocurador: age êste em virtude de mandato; aquêle, sem mandato (nota 134 às “Primeiras Linhas” de PEREIRA E SOUSA).
Tanto essa é a função do antigo curador à lide que a Lei Orgânica da Justiça do Distrito Federal prescreve aos curadores de órfãos, de família e de ausentes a atribuição de “defender, como seu advogado, os direitos dos incapazes”, não apenas quando seja revel o representante legal dos mesmos, isto é, não haja apresentado defesa, mas ainda quando seja insuficiente a defesa oferecida (Cód. de Org. Judiciária, arts. 143, III, 146, V, e 153, III).
Portanto, mesmo no caso de revelia do representante legal do incapaz, o mandato legal dêsses curadores é o de simples defensores, advogadosdoincapaz, e não o de seus representantes judiciais. Em verdade, ocorrendo a revelia acima prevista, a representação judicial do incapaz cabe é ao testamenteiro e tutor judicial, pois será ela uma forma de ausência dêsse representante (Cód. de Org. Judiciária, art. 281, II, b).
Já o representante judicial de incapaz, diferentemente do curador à lide, tem outras funções que são exercidos por outros órgãos. Convém indicá-los:
Consoante se dispõe no art. 80 do Cód. de Proc. Civil, em obediência às prescrições da lei civil, a representação em juízo dos absolutamente incapazes e a assistência aos relativamente incapazes cabem aos pais, tutôres ou curadores.
Quando, porém, o incapaz não tiver representante legal, ou, tendo-o, seus interêsses colidirem com os do representado, aí faz-se necessário dar-lhe um representante especial no feito, naquele feito. A êsse representante chama o Código, impròpriamente, curador à lide, ensejando assim, a confusão de figuras e funções que não podem e não devem, sob sérios inconvenientes, ser confundidas. Quem será êsse representantejudicial do incapaz no processo, quando ocorra qualquer das hipóteses acima previstas, isto é, não existir seu representante legal investido na função, segando as normas do direito civil, ou existir, mas colidirem, com os seus, os interêsses do seu representado?
O Cód. de Proc. Civil resolveu o problema, adotando, em ambos os casos, esta solução: se na comarca houver um representante judicial de incapazes, isto é, um funcionário público a quem incumba tal representação, êsse será, no processo, o representante judicial do incapaz. Sua presença no feito suprirá a inexistência do representante legal, ou o seu impedimento, dada a colisão de interêsses, antes mencionada. Se, porém, na comarca não houver dito representante judicial de incapazes, então, dispõe o Código, o juiz nomeará ao incapaz um curador à lide.
Ora, chamar a êsse representante judicial do incapaz curador à lide, é dar-lhe uma denominação imprópria, pois sua função não é a de um curador à lide, isto é, a de um simples defensor do incapaz, mas sim a de seu representantejudicial, embora supletivo da ausência ou do impedimento do representante legal segundo as normas do direito civil. Uma coisa é a representaçãojudicial do incapaz, outra a suadefesa, embora possa aquele representante promover essa defesa, constituindo procurador judicial que a produza. Mas jurídica e legalmente, não há como confundir as duas funções e os dois órgãos a que cada uma delas incumbe.
Por outro lado, é de lembrar-se que no § 2º do mesmo art. 80 manda o código intervenha obrigatòriamente o órgão do Ministério Público nos processos onde houver interêsse de incapazes. Para que, com que fim? Outro não pode ser senão o de produzira defesa do interêsse do incapaz pois essa é a função precípua do Ministério Público. Defesa que não exclui, antes completa ou supre, aquela outra, produzida pelo representante legal do incapaz, mediante o procurador judicial para êsse fim constituído. Resulta do exposto que essa intervenção do Ministério Público realiza exatamente a função da antiga curadoria à lide, tal como instituída nas Ordenações do Reino. E tanto isso é exato que o Cód. de Org. Judiciária do Distrito Federal, reproduzindo leis anteriores ao Cód. de Proc. Civil, encerra uma disposição dêste teor:
“Nos feitos em que intervier e funcionar o Ministério Público é dispensada a nomeação de curador à lide” (art. 120).
Exposto o sistema segundo o qual a Lei do Processo regula, no país inteiro, a representação judicialdos incapazes, quando se verifique falta ou impedimento do representante legal (art. 80, § 1º, letra a), atente-se ao modo por que êsse sistema se cumpre no Distrito Federal. Como aqui, há um funcionário público a quem se deu, por atribuição do cargo, funcionar como curadorespecial: a) no caso de ausência de titular de pátrio poder, de tutor e de curador; b) no caso de colidirem os interêsses do incapaz com os do seu representante legal (Cód. de Organização Judiciária, art. 281, II, letras a e b), patente se torna não se fazer necessário, na comarca do Distrito Federal, nomear curador à lide, com a função de representar em juízo o incapaz, eis que essa representação será feita, caberá fazê-la, ao dito funcionário, ou seja o testamenteiro e tutor judicial.
Ainda neste passo é de notar a inconsideração com que se houve o legislador chamando a êsse funcionário nos casos ora examinados, curadorespecial. Título usado pelo Cód. Civil, é certo (artigo 387), mas apenas para designar o curador a ser nomeado na hipótese da colisão de interêsses. Entretanto, o legislador, ao organizar a Justiça do Distrito Federal, estendeu-o também a hipótese bem diversa – a da ausência (inexistência) de representante legal do incapaz. Fêz mais: embora se reporte ao art. 80 do Cód. de Proc. Civil, não obedeceu, como seria natural e acertado, à denominação técnica usada na lei remetida. Assim, em obediência ao sistema do Cód. de Proc. Civil, o legislador posterior deverá ter-se referido à representação judicial do incapaz, e dado a êsse representante o título ali adotado – curador à lide. Nunca, dar a êsse representante o título de curador especial, que é figura diversa e restrita ao caso da colisão de interêsses previsto no Cód. Civil, art. 387, e aplicada aos casos análogos.
Seja como fôr, uma coisa é certa e deve ficar assente: no Distrito Federal, o testamenteiro e tutor judicial é o representante judicial do incapaz e não o seu curador à lide. Até porque, êsse curador só se nomeia nas comarcas onde não há quem represente judicialmente os incapazes, e isso no Distrito Federal não acontece.
De concluir, portanto, que entre nós o Ministério Público não desempenha essa função, que pertence ao dito funcionário da Justiça.
Uma forma especial de assistência judiciária, muito assemelhável às enquadradas sob a rubrica de curadoria à lide, é a que presta, o Ministério Público, ao interditando, nos processos em que não é êle o promovente da interdição (Código Civil, art. 449; Cód. de Proc. Civil, arts. 809, parág. único, 807, 809, 812, 613 e 616).
Exclui êsse patrocínio legal a possibilidade de o interditando constituir procurador próprio? Sem dúvida, não, mas também verdadeira será a recíproca: a existência de defensor privado não afasta o órgão oficial, a quem a lei a outorgou, como medida de ordem pública.
No Distrito Federal, a função está a cargo do curador de órfãos (Cód. de Org. Judiciária, arts. 144 e 52, I, b).
Uma outra função do Ministério Público no processo civil é a de representar o revel que foi citado por éditos ou com hora certa, ou está prêso (Cód. de Processo Civil, art. 80, § 1º, letra b). Não se fasta de um incapaz: apenas de um capaz, porém, revel.
Embora a lei processual fale em curador à lide, não se deve dar a êsse curador o papel limitado de o defender, conforme a figura tradicional, mas sim o de um representante judicial do revel. Pelo menos no Distrito Federal, o Cód. de Org. Judiciária, impõe ao curador de ausentes a atribuição de representar êsses revéis (art. 150, XIV). Representar é muito mais que defender, pois o representante age em nome do representado e na qualidade dêste, enquanto o defensor apenas defende a pessoa ou os interêsses do litigante. Evidentemente são diversos, em natureza e extensão, os poderes do representante e os do simples defensor.
Nem é de confundir, por outro lado, essa atribuição de curador de ausentes em relação aos aludidos revéis, com a outra sua, também inerente ao cargo e dêle especifica, qual a de funcionar nas causas movidas contra ausentes, em que êstes forem interessados, ou naquelas em que se houver de nomear curador à lide (lei cit., art. 150). Os revéis aludidos, conquanto não seja segundo o direito civil, ausentes, são pessoas presumidamente ou não, citadas ou impedidas de se defenderem. Daí a necessidade de se verem representados no processo, por alguém que as defenda com plenitude de poderes. Já no tocante aos verdadeiros ausentes, a função do aludido órgão do Ministério Público é de simples fiscalização na aplicação da lei, no que diga respeito aos interêsses dos ausentes, pois estarão êstes presentes em juízo, ou por seus representantes legais, ou por seu representante judicial, que no Distrito Federal é, ainda, o testamenteiro e tutor judicial (lei cit., art. 281, II, in fine).
Convém tratar, ainda, de um caso especial de revelia: do citado por éditos, ou com hora certa. Sendo êle casado, pode a mulher vir a juízo em sua defesa (Cód. de Proc. Civil, art. 82, I).
Verificada esta intervenção uxória, dispensada estará a representação do revel pelo curador à lide? Ou devem ser admitidas, ao mesmo passo, as duas representações?
JORGE AMERICANO vê nessa faculdade conferida à mulher casada uma ampliação do princípio pelo qual se lhe permite assumir a chefia da sociedade conjugal quando o marido em lugar remoto, ou não sabido. Mas, a nosso parecer, sem guardar coerência com o princípio legal invocado, opina pela permanência do curador dado ao revel, apesar da intervenção da mulher. Em verdade, se neta se reconhece a qualidade de chefe da sociedade conjugal, não será razoável considerar ainda revel o marido, para manter-lhe o curador à lide, a êsse título nomeado.
Também a PONTES DE MIRANDA parece admissível a concomitância de dois defensores do revel, o curador à lide e a mulher, notando não estar o juiz adstrito a nomeá-la, nem também poder negar-lhe o ingresso; achando, todavia, perder a mulher a posição própria com que ingressou em guizo se vier a ser nomeada curador à lide.
No entanto, BATISTA MARTINS reconhece à mulher, no caso em aprêço, a posição de representante do revel e, pois, com poderes idênticos aos dêle. Êsse, por igual, o ponto de vista de CARVALHO SANTOS. Ambos, porém, não se pronunciam explìcitamente sôbre o problema se, ingressando a mulher em juízo, deve subsistir o curador à lide; mas é óbvio que sejam pela negativa, dados os poderes que reconhecem à mulher.
A nosso ver, a curadoria à lide é excluída desde que a mulher ingressa em juízo; em defesa dos interêsses do casal. Em verdade, a citação-edital permite-a o Cód. de Proc. Civil na mesma situação de fato (art. 177, I), em que o Cód. Civil outorga à mulher a chefia da sociedade conjugal (art. 251, I).
Logo, se esta é a situação legal da mulher, não vemos como, depois de seu ingresso, ainda se possa considerar revel o marido. Salvo se no objeto da cansa não tiver a mulher interêsse algum, mas isso não é de presumir, em razão mesma do seu ato, chamando a lide a si. Concluímos, portanto, pela cessação da curadoria à lide, tanto se verifique o ingresso da mulher do revel e ofereça ela defesa. Porque, não o fazendo, desaparece a razão de ser do afastamento do curador à lide.
Importa aludir, por fim, a mais uma forma de assistência judiciária devida pelo Ministério Público a certos litigantes, dadas as condições especiais, em que se encontrem. E a que o Cód. de Org. Judiciária do Distrito Federal impõe ao curador de ausentes, ou seja representar, nos executivos fiscais, os revéis presos, ou citados por editais ou com hora certa (Cód. de Org. Judiciária, art. 153, XIV, in fine). Não obstante os têrmos claros e indubitáveis do dispositivo, não parece deva ser havida como líquida sua fôrça obrigatória. O processo chamado dos executivos fiscais é regulado por uma lei especial (dec.-lei nº 960, de 18-8-939), cuja vigência se acha ressalvada de modo expresso no art. 1º do Cód. de Processo Civil.
Ora, segundo essa lei, não cabe nas ações para a cobrança da dívida ativa da lenda Pública a nomeação de curador à lide ao revel, pois de tal nomeação só se cogita no art. 82, isto é, na hipótese de falecer o devedor ou na de perder sua capacidade civil. Por outro lado, o artigo 75 dessa lei não permite outros têrmos e atos além dos por ela admitidos. De concluir, pois, ser duvidoso o império da norma legal em exame.
Como o dec.-lei nº 960 dispõe mandando servir êsse curador à lide até que no processo se habilite o representante legal do falecido ou interdito, pode acontecer que êste último venha a ter, ao mesmo tempo, dois representantes, um provisório, no processo do executivo, e o outro definitivo, constituído segundo as leis civis.
Cabe ao Ministério Público (no Distrito Federal, ao curador de resíduos, Código de Org. Judiciária, art. 148; XIV) promover a extinção da fundação que se encontre nos casos do art. 654 do Código de Proc. Civil. Conquanto citados seus administradores, deve-se dar à fundação curador à lide. No Distrito Federal, êsse curador será o de ausentes, ex vi do artigo 150, I, in fine. Que função lhe caberá? Mero curador à lide na feição tradicional, ou representante judicial da ré? Sem dúvida, a primeira figura, pois a nomeação é feita, apesar de citados os administradores da fundação (art. 854, in fine). Mas se forem êstes revéis, após citados com hora certa, ou éditos, ou estiverem presos? Aí, haverá uma outra e nova situação legal. Já o curador de Ausentes terá de representar a fundação-ré: não mais poderá funcionar apenas como um defensor seu. Nessa hipótese, dever-se-á aplicar o disposto no art. 136 do Cód. de Org. Judiciária: a intervenção do Ministério Público representando a ré, tornará dispensável a nomeação do curador à lide.
Não nos permitem os breves limites do tampo reservado à palestra abordar, sequer de leve, várias outras situações em que o Ministério Público é chamado a atuar exercendo a defesa de interêsses postos pela lei sob o amparo da instituição. Através, porém, dos casos que puderam ser estudados, tornou-se possível caracterizar seu papel no conjunto das situações compreendidas sob a rubrica de curadoria à lide.
4ª forma – Atua o Ministério Público na 4ª forma típica quando desempenha a função de defensor do vínculo matrimonial, nas causas de nulidade e anulação de casamento (Cód. Civil, artigo 222). Provém a figura, como é sabido, do direito canônico, tendo ingressado na legislação civil com o dec. número 181, de 1890 (art. 115). É uma das tarefas, ali, do famoso e utilíssimo “advogado do diabo”.
Dos fins e da relevância dessa função disse magnìficamente CLÓVIS, ao observar:
“É o interêsse social que êsse defensor dos casamentos representa. A sociedade repousa sôbre a organização das famílias, sôbre a tranqüilidade dos lares. Tomou a si, por isso mesmo, regular, previdente e carinhosamente, a união dos cônjuges, dando ao instituto do casamento um lugar distinto nas suas leis. E, portanto, o próprio interêsse da sociedade, a organização jurídica da família, a persistência do vínculo, nupcial, a ordem moral preponderante no casamento, que o curador defende, e não o interêsse do cônjuge, contra quem é proposta a ação de nulidade, ou anulação do matrimônio.
Questão de particular interêsse no assunto é fixar a extensão da obrigatoriedade dessa defesa. Pode o curador ao vínculo pedir ou mesmo concordar com a anulação ou nulidade do casamento? Repugna-nos a solução afirmativa. O dever de defesa é de cumprir-se ainda que o defensor esteja convencido da procedência da ação. Já o decreto do Govêrno Provisório republicano lhe impunha a obrigação de defender o vínculo até a apelação inclusive (dec. nº 181, artigo 119). A apelação obrigatória das sentenças que declaram nulo ou anulam o casamento é preceito hoje definitivamente incorporado à legislação processual ordinária (Cód. de Proc. Civil, art. 822, parág. único, II).
Se a lei impõe ao juiz o dever de apelar da própria sentença que prolatou contra o vínculo, como admitir-se, sem ofensa à lógica, não prescreva essa mesma obrigação ao defensor do vínculo? Na seqüência do raciocínio, cabe questionar: como pretender-se possa êsse defensor atacar o vínculo (concordando com a sua dissolução) se obrigado está a defendê-lo, mesmo depois de decretada a dissolução? Não se compreenderia. Ademais, exercendo o Ministério Público, em tais hipóteses, o patrocínio de um interêsse social, é-lhe vedado desampará-lo. Nem se invoque a liberdade de conduta que desfruta em face do encargo do exercício da ação penal. Negar-se o órgão do Ministério Público ao seu exercício, em determinada hipótese de fato, não é situação que se resolva ou defina com o simples ato pessoal de recusa do funcionário. Carece do reconhecimento judicial da procedência da recusa e, falhando aquêle, o chefe da instituição é quem afinal decide. A nosso ver, só pode o órgão do Ministério Público concordar, opinar pelo desfazimento do vínculo matrimonial quando no processo lhe caiba simplesmente dizer de direito, isto é, quando no processo tenha apenas o dever geral de velar pela, observância das leis. Investido da defesa do vínculo, não a pode desamparar.
Note-se, todavia: no processo canônico, apesar de ser obrigado a apelar da sentença contrária ao vínculo, pode o defensor opinar contra a subsistência dêste quando é o próprio Ministério Público quem promove a ação anulatória, fundado que o faz em razões de ordem pública. Mesmo em tais condições, não nos parece lhe caiba, em nosso direito, essa faculdade. Cada órgão do Ministério Público estará, na hipótese, desempenhando uma função própria e específica: um atacando o vínculo; o outro, defendendo-o. Se êles tendem a fins opostos, êsses fins devem seus defensores especiais sustentá-los em tôda a linha, pois ao judiciário é que compete resolver qual dêles deverá prevalecer.
No Distrito Federal a defesa do vínculo está, entregue aos órgãos do Ministério Público (curadores de família) que funcionam junto às Varas de Família onde correm as ações contra êle (Cód. de Org. Judiciária, art. 145, VI). Ligados a êsse patrocínio nos têrmos antes considerados, não parece razoável admitir-se possam êsses curadores opinar contra o vínculo, mesmo quando tenham de dizer de direito em tais ações. Haverá que prevalecer em tal hipótese, sôbre sua função geral de fiscais da lei, a função especial e obrigatória de defensores do vínculo. Se no desempenho dos dois deveres surgir manifesta, oposição de pontos de vista, o remédio será chamar um outro órgão do Ministério Público a quem se confie, no processo, o desempenho da função de dizer de direito. Essa é, aliás, a solução prevista e autorizada no Código de Org. Judiciária, art. 132.
Atua o Ministério Público sob a 5ª forma quando nos feitos cíveis desempenha, de um modo geral sua função ampla, de órgão da lei e fiscal de sua execução. Apresenta êsse modo de agir notável variedade de formas e uma grande eficiência, pois abrange todos os processos onde há interêsses de pessoas ou de instituições pelas quais o Estado vela. Todos os interêsses de incapazes ou pessoas em condições análogas, todos aquêles princípios que presidem à organização social do Estado, e que por isso mesmo dêle mereceram especial proteção.
Para ter-se uma idéia da amplitude da ação do Ministério Público basta notar que por seus múltiplos órgãos intervém êle em todos os processos em que incapazes são interessados; onde se cumpra testamento ou se aplique a legislação relativa a menores e acidentes no trabalho; nos que disserem respeito aos direitos de família e à capacidade civil; nos de falências e concordatas; nos referentes aos registros públicos; nos recursos de revistas; ações rescisórias; conflitos de jurisdição e argüições de inconstitucionalidade. Isso, para aludir tão-sòmente aos de maior importância e de ocorrência mais freqüente.
Tão variada é esta forma de intervenção, obedece a finalidades tão diversificadas que a lei precisa especificar, em cada caso, o que incumbe ao órgão do Ministério Público fazer, e como fazê-lo. Mas sempre enquadrada sua ação no princípio geral de pugnar pela observância das leis na parte em que protegem pessoas e instituições, consideradas merecedoras da tutela do Estado. Por vêzes, a vigilância e a fiscalização do Ministério Público se reduzem a opinar sôbre o mérito das causas, dizendo de direito, isto é, defendendo o Império da lei; em outras, isso só não basta: tem êle que assumir papel mais ativo requerendo e promovendo medidas tendentes à boa e perfeita execução da norma legal.
O Ministério Público na relação processual
Expostas, como foram, separadamente, as diversas formas de atuação do Ministério Público, faz-se oportuno considerá-las em conjunto, para o fim de examinar, embora persummacapita, problemas de ordem processual que podem surgir no exercício de tôda essa vasta e onímoda atividade forense, ou seja, o Ministério Público na relação processual.
Exercitando suas funções em juízo em razão do cargo que desempenha, não precisa, é óbvio, o órgão do Ministério Público exibir a prova de sua investidura; basta seja esta comunicada à autoridade judiciária perante a qual tenha êle de funcionar.
Em certos casos, entretanto, far-se-á mister legitimar sua qualidade para agir em juízo. Assim, quando tenha de prestar assistência judiciária a alguém como autor ou réu: por exemplo, o funcionário público. Servirá, nesse caso, de mandato, a portaria do procurador-geral da Republica, designando o procurador da República incumbido de assistir judiciàriamente o litigante. Há uma situação semelhante: quando o órgão da ação penal houver de promover no juízo cível, em nome e a benefício do ofendido ou seus herdeiros, a ação civil do art. 64 do Código de Proc. Penal, ou a execução da sentença condenatória (art. 63), visando à reparação do dano ex delicto, só o poderá fazer comprovando a existência da condição legal de que depende essa iniciativa – o requerimento do interessado pobre (art. 88). Sem o fazer, não estará legitimado a prestar essa assistência. E no Distrito Federal, haverá ainda o promotor substituto de exibir sua designação para o encargo, feita pelo procurador-geral (Cód. de Org. Judiciária, artigo 158, II).
Questão das mais difíceis e ainda sem solução na doutrina e nas leis é a da posição do Ministério Público no processo civil, sob o ponto de vista de sua qualificação como parte na causa. Sobretudo porque dessa posição vai depender a delimitação do poder de recurso, poder deixado em aberto pelo Cód. de Proc. Civil, art. 814. Abordamos o problema do ponto de vista doutrinário em nosso estudo sôbre o litisconsórcio (“Do Litisconsórcio do Direito Brasileiro”).
Quando age propondo ações ou promovendo processo, parece não se poder negar-lhe a condição de parte.
A essa posição deve ser equiparada a em que se situa, quando é advogado do incapaz, seu defensor no feito, máxime tendo-se em conta ser-lhe conferido êsse mandato não só em nome dum interêsse de ordem pública, mas ainda para suprir a defesa, omitida ou insuficiente do representante legal do incapaz. Incidiria em ilogismo dar o Estado ao incapaz um advogado oficial no processo, mas recusando a êsse defensor os meios indispensáveis a tornar real e eficiente o patrocínio. Tanto isso é incontestável que na hipótese de o Ministério Público servir de defensor do interditando, a lei o autoriza, em que pêse à infeliz redação do art. 610 do Cód. de Proc. Civil, a recorrer da sentença pronunciando a interdição.
Na mor parte das vêzes, age o Ministério Público intervindo no processo para dizer de direito sôbre o seu objeto, oficiando, como se diz na linguagem do fôro. É, nessas condições, também parte? A nosso ver, pela afirmativa, sem dúvida nenhuma, embora pugne por interêsse de ordem pública muita vez inteiramente diverso dos interêsses individuais defendidos pelos litigantes. Realmente, como deixar de considerar parte quem intervém num processo em nome de um certo interêsse e para pugnar pelo seu reconhecimento? Qualifique-se como parte “adjunta”, como no direito francês, ou parte “acessória”, como na doutrina italiana, inegável será sempre sua posição de parte: Tanto mais entre nós; onde se reconhece no órgão do Ministério Público não apenas o poder de oferecer conclusões, mas o de colaborar na produção da prova do processo e opinar afinal sôbre a solução a ser dada à controvérsia objeto do mesmo. “Pronunciar-se sôbre o mérito da causa” é atribuição do curador de órfãos nos processos em que apenas funciona, assim estando declarado na Lei Orgânica da Justiça do Distrito Federal (art 143, I).
Se sua intervenção na causa faz-se em nome de um interêsse social, a bem da observância das leis de ordem pública, não se compreende como negar-lhe o direito de exercer plenamente êsse mandato legal.
Coerente com essa orientação, o legislador processual pôs a cargo da parte autora as custas dos atos judiciais praticados a requerimento do Ministério Público (sem distinguir as condições em que o mesmo atue no processo) e isentou de preparo os recursos por seus órgãos interpostos (Cód. de Proc. Civil, arts. 56, § 1º, e 814 infine). Foi além: sujeitou a parte promovente do processo a pagar as custas devidas ao próprio órgão do Ministério Público (Cód. de Proc. Civil, art. 58).
A respeito de prazos processuais, agiu porém o Código injustificadamente: concedeu aos advogados da Fazenda Pública vantagem excepcional: deu-lhes, para contestar o feito, o prazo das partes mas quadruplicado, enquanto, em face do Ministério Público, declarou ter o prazo igual ao das partes, para falar nos autos (art. 21), sendo entendido, por isso, caber-lhe, para contestar, o mesmo prazo das partes. Aqui falou mais alto, mereceu mais aprêço o interêsse do Fisco, que a observância das leis de ordem pública. Todavia, de certa forma reparou a injustiça, dando ao procurador-geral, quando oficia oralmente perante o Tribunal de Justiça, o poder de fazê-lo sem limitação de tempo e em qualquer assunto ou feito cível, falando depois das partes e após o relatório do processo (Cód. de Org. Judiciária, art. 139, I).
Excedendo o órgão do Ministério Público o prazo que tenha para praticar ato processual, fica sujeito a penas que, em verdade, não se lhe impõem, apesar de prescritas formalmente na lei. Assim, no art. 24 do Cód. de Proc. Civil se manda descontar-lhe tantos dias de vencimentos quantos os do excesso verificado, dias perdidos em dôbro para os efeitos de promoção e de tempo de aposentadoria. Disposição entre nós sem cumprimento, como tantas outras.
Já no tocante a intimações para ciência dos atos do processo, a letra do artigo 168 do Cód. de Proc. Civil, tem permitido certa mitigação do rigor com que foram tratados os órgãos do Ministério Público, havidos como fôssem litigantes iguais aos demais.
Como ali só se alude “às partes”, tem-se entendido, com boas razões, não vigorar a intimação por publicação no “Diário da Justiça” em relação aos órgãos do Ministério Público, senão quando são êles as partes principais do processo isto é, quando o promovem, ou nêle representam o réu. Quando nêle intervêm ou funcionam, dizendo apenas de direito, já não se acham sujeitos àquela forma de intimação; devem ser pessoalmente cientificados dos atos processuais. Há mesmo no Cód. de Proc. Civil, disposição especial mandando intimar o órgão do Ministério Público da sentença de interdição em qualquer hipótese (art. 609).
Constitui aplicação dêsse princípio a prática usual de dar ao procurador-geral a ciência efetiva dos acórdãos do Tribunal de Justiça, não se lhe contando o prazo para recorrer dos mesmos, da publicação de suas colusões no “Diário da Justiça”, como é o regime legal quanto às partes (Cód. de Proc. Civil, arts. 834, 854 e 864). Isso porque, não cabendo, de ordinário ao chefe do Ministério Púbico senão a atribuição de oficiar nos recursos e processos da competência do Tribunal, é conforme àquele princípio dar-lhe ciência efetiva dos acórdãos antes de sua publicação no órgão oficial, destinada, como se sabe, às partes. O próprio Regimento Interno do Tribunal acolheu essa praxe, consignando-a nos §§ 1º e 3º do art. 39 do ato regimental nº 12.
Outrora, no primeiro Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, se prescrevia ao ministro-procurador-geral da República o dever de declarar ao pé das assinaturas dos juízes subscritores dos acórdãos: “Fui presente”. Mas isso só lhe era exigido quando devesse assistir ao julgamento do feito (art. 21). Mais tarde, em 1913, por proposta do ministro MUNIZ BARRETO, emendou-se o Regimento nestes têrmos: “A declaração do procurador-geral de que foi presente ao julgamento não supre a publicação ou “intimação que lhe deve ser feita pessoalmente”. Separou-se, destarte; a documentação de sua presença ao julgamento da intimação para ciência do julgado. Hoje nem disso cuida o Regimento.
Na Justiça do Distrito Federal, o procurador-geral só é obrigado a assistir às sessões do Tribunal Pleno (Cód. de Organização Judiciária, art. 139, I). Mas, mesmo dos acórdãos do Tribunal, a ciência é-lhe dada por intimação pessoal, a cargo do secretário do Tribunal, como já foi notado.
De notar, finalmente, haver o Código de Org. Judiciária (art. 197) impôsto ao escrivão do feito, em juízos e casos determinados, a obrigação de inteirar pessoalmente os antigos advogados de ofício, aí incumbidos de prestar assistência judiciária, dos atos relativos aos feitos em que funcionam, dando-lhes ciência dos mesmos, embora impondo a tais advogados o dever de, para êsse fim, comparecerem diàriamente aos respectivos cartórios. Obrigação especialmente recomendada quanto à ciência da data do julgamento do feito e, da sentença no mesmo prolatada. São os juízes aludidos, como vimos, os das Varas de Família, Órfãos e Sucessões, e de Menores.
Há, entretanto, que notar e indagar: transformados êsses “advogados de ofício” em membros do Ministério Público, com o título de “defensores públicos” (lei nº 216, de 9-1-948), continuarão a fruir da vantagem daquela intimação que os forra do dever de estarem atentos ao andamento do processo onde funcionem, mediante a leitura do “Diário da Justiça”? Se se admitir a afirmativa, ter-se-á criado a seu favor uma situação especial, não concedida aos demais órgãos do Ministério Público, mesmo quando prestam assistência judiciária, onde, portanto, são simples advogados da parte. Por outro lado, em virtude da transformação aludida, já não se poderá impor-lhes a obrigação de assinar o livro de presença em cartório, eis que, como prescrito no art. 183, os órgãos do Ministério Público não estão sujeitos a ponto (Cód. de Org. Judiciária, art. 183). Mas é possível ver nessa obrigatoriedade de presença em cartório apenas uma forma do exercício da função especial a êles atribuída.
Quanto ao direito de receber do escrivão os autos com vista lei iguala aos procuradores das partes os órgãos do Ministério Público, a uns e outros o concedendo (art. 123).
No tocante à revelia, convém afirmar-se o princípio de não ser possível ocorrer, de órgão do Ministério Público, a não ser quando êle aja no processo como autor, propondo a ação ou promovendo o processo, eis que, aí, estará sujeito ao regime comum das partes. Quando, porém, nêle intervém para funcionar como defensor de um interêsse de ordem pública, sua revelia não pode ocorrer eis que, verificada, importará na nulidade do processo (Cód. de Proc. Civil, art. 84). Por estranho que pareça, êsse é o regime legal, pois a revelia do Ministério Público, promotor da ação ou prestando assistência judiciária, há de ter conseqüências idênticas às do litigante, a quem é por lei equiparado. Em verdade, se à audiência de instrução e julgamento não comparece o autor ou seu advogado, o réu pode pedir a absolvição da instância ou o julgamento do feito, à revelia do ausente. Como na causa intentada pelo órgão do Ministério Público, êste é, ao mesmo tempo, autor e procurador judicial, a conseqüência da dupla revelia não pode deixar de ser a que a lei processual prescreve para a do litigante privado (Cód. de Proc. Civil, art. 266). Dir-se-á o mesmo quando o órgão do Ministério Público preste assistência judiciária, exerça a função de advogado da parte. Todavia, se o órgão do Ministério Público funcionar no feito como fiscal da lei, sendo sua presença indispensável a essa audiência, onde tem êle de praticar o ato supremo da função, isto é, dizer de direito, nesse caso, sua ausência importará na nulidade do processo, carregando-se-lhe as custas correspondentes aos atos adiados ou que tiverem de repetir-se (Cód. de Processo Civil, arts. 984, 272, parág. único, 84 e 62).
Relativamente à suspeição e impedimentos do órgão do Ministério Público, cumpre observar: Circunstância que particulariza a atuação do Ministério Público no processo civil é o dever de conduzir-se com imparcialidade, isto é, pugnando tão-sòmente pelo cumprimento da lei pela efetivação dos ditames da Justiça, sem se ligar aos interêsses privados das partes em face dos quais atua. Daí, CARNELUTTI dizê-lo parte imparcial, denominação impugnada por PONTES DE MIRANDA como viciosa pela contradictioinadjecto que encerra.
Observe-se, contudo: essa imparcialidade não lhe pode ser exigida quando o Ministério Público age como autor ou como representante ou defensor do réu, mas apenas quando intervém ou funciona no processo como órgão de defesa de um interêsse público, pugnando pela observância da lei, dizendo, portanto, de direito. Neste caso, deve guardar imparcialidade e por isso mesmo goza de liberdade de ação, desfruta plena autonomia de orientação no exercício do mandato especial que exerce, de órgão da lei; podendo opinar a favor ou contra o interêsse individual do incapaz envolvido no processo. Liberdade de opinião que os tribunais fàcilmente lhe reconhecem.
Da suspeição dos órgãos do Ministério Público só cogita o Cód. de Processo Civil para atribuir ao juiz o poder de julga-la; mas negando efeito suspensivo ao incidente surgido com a argüição; embora afaste desde logo o argüido, chamando ao processo o seu substituto legal (art. 189). As causas de suspeição, não as define, como fêz em relação ao juiz e ao perito (arts. 185 e 129, parág. único). É na Lei Orgânica da Justiça que iremos encontrá-las enumeradas (arts. 176 e 178). Aí se estende quase integralmente aos órgãos do Ministério Público o regime de suspeições e impedimentos dos juízes, constante do Cód. de Proc. Civil e do Cód. de Org. Judiciária.
Impõe-se, no entanto, uma observação de importância: os órgãos do Ministério Público são suspeitos ou impedidos, nos têrmos acima aludidos, quando dêles se exige no exercício da função imparcialidade, isto é, nas hipóteses antes referidas. Pois é precisamente a suspeita de parcialidade do juiz que o torna suspeito ou impedido para funcionar na causa. Quando o órgão do Ministério Público age como autor, ou presta assistência judiciária a um particular interessado no processo, não há razão para se lhe exigir uma imparcialidade desnecessária ao bom desempenho da função. Êste, parece-nos, o sentido a ser dado às restrições com que o legislador estendeu aos órgãos do Ministério Público o regime das suspeições: no que fôr aplicável (art. 176). Essa a razão por que declarou não lhe constituir impedimento o fato de o próprio órgão do Ministério Público, ou seu parente, já haverem intervindo no processo (artigo cit., in fine).
No tocante às nulidades do processo, de tão conhecido, não se faz necessário relembrar o preceito de lei segundo o qual a falta de intervenção do Ministério Público no feito em que deva intervir produz a nulidade do respectivo processo (Código de Proc. Civil, art. 84). Mas, convém aludir à disposição constante da Lei Orgânica da Justiça do Distrito Federal, art. 131, onde se autoriza o órgão do Ministério Público a deixar de requerer a decretação da nulidade, apesar de verificado o vício que a determina, se entender não ocorreu prejuízo para o direito cuja guarda lhe incumbe. É mera aplicação do princípio geral do sistema de nulidades do Cód. de Proc. Civil (art. 275), afastando a decretação da nulidade quando da inobservância da lei processual, não tenha resultado prejuízo para o interessado no feito.
No processo civil assiste ao Ministério Público função de relevância, mas a cujo exercício quase nunca é chamado. É a de ser cientificado, pelo juiz, de haver o perito prestado informações inverídicas, agindo por dolo ou culpa grave, para o fim de promover contra o faltoso a competente ação penal (Cód. de Processo Civil, art. 132; § 2°). Não há entre os preceitos da lei civil e da lei penal coincidência na definição da conduta punível do perito (Cód. Penal, art. 342). Parece fora de dúvida ligar-se a ciência aludida ao exercício da ação penal, só podendo esta basear-se. é óbvio, na definição da lei própria. No sistema do Código de Proc. Civil o perito é um auxiliar da Justiça; a que deve servir com a mesma imparcialidade exigida ao juiz. Na prática forense deixou, todavia, de ser um consultor técnico da parte, para tornar-se um seu advogado, embora atuando apenas nos aspectos técnicos da causa. Desvirtuamento de função que se refletiu sensìvelmente sôbre o valor moral das informações e pareceres dos peritos dos litigantes.
Não há nas leis reguladoras do Ministério Público da União ou do Distrito Federal disposições especiais relativas ao poder de produzir provas, concedido aos órgãos da instituição. Foi isso, naturalmente, deixado ao critério de seus aplicadores, desde que o Cód. de Proc. Civil também se omitiu a respeito. Em face disso, deve considerar-se o órgão do Ministério Público autorizado a requerer e produzir as provas indispensáveis à elucidação dos fatos, cuja certeza de existência se torne precisa ao exato desempenho da função que lhe compita exercer no processo. Variando extremamente a extensão dêsse encargo que pode ir do simples opinar de direito até o preenchimento total do ônus de provar, na medida do dever que lhe fôr impôsto em cada processo; se encontrará o justo limite do seu direito, e, pois, do seu poder e do seu dever de provar. Mas o ônus do custeio dessas provas, pago a final põe-no a lei a cargo do vencido (Cód. de Proc. Civil, art. 56, § 1º). As custas devidas ao próprio órgão do Ministério Público é que são da responsabilidade do autor ou promovente do processo, e pagas desde logo (Código cit., art. 58).
Que poderes de disposições na ordem processual tem o órgão do Ministério Público, quando propõe ações ou promove processos, presta assistência judiciária sob qualquer forma, ou simplesmente intervém e funciona no processo para dizer de direito? Nada há nas leis a respeito. Apenas a Lei Orgânica do Ministério Público da União veda de um modo geral aos procuradores dá República transigir, confessar, desistir ou fazer composições, só lhes permitindo a prática de qualquer dêsses atos quando autorizados pelo procurador-geral (art. 23). Por sua vez, quanto ao exercício da ação penal, a Lei Orgânica da Justiça do Distrito Federal proíbe aos seus promotores, depois de intentada, dela desistir, impedir seu julgamento ou transigir sôbre o seu objeto. Só lhes é assegurado o direito da livre manifestação do pensamento nas ocasiões próprias (art. 135).
Na atividade do Ministério Público relativa aos processos cíveis, critérios idênticos devem ser invocados. Intentada a ação ou promovido o processo em razão do oficio, não deve ser permitido ao Ministério Público dêle desistir, pois fazê-lo será proclamar a improcedência do seu pedido. Mas isto será chamar a si o exercício de jurisdição, atributo privativo do Poder Judiciário. Tanto mais quanto em tais casos age em virtude de um mandamento legal, não lhe sendo lícito fugir ao seu império, depois de haver afirmado a existência da situação legal, com tomar a iniciativa da ação ou do processo. Pela própria natureza do direito que lhes serve de objeto, excluem-se as definais formas de supressão da iniciativa oficial.
Se presta assistência judiciária a um litigante, prêso estará aos deveres do procurador judicial, tendo poderes limitados em harmonia com o disposto no art. 108 da Lei de Processo.
No exercício de assistência judiciária especial, como, por exemplo, a curadoria à lide, a representação dos ausentes ou a defesa do interditando, é óbvio não poder desamparar essa defesa, pois a lei lha impõe.
Só mesmo quando lhe caiba apenas dizer de direito, é que ao órgão do Ministério Público na jurisdição civil é livre opinar no sentido que melhor lhe parecer a respeito dos interêsses de cuja vigilância o Estado o incumbiu.
No tocante ao poder de recurso, nota-se uma disparidade flagrante entre o Ministério Público da União e o do Distrito Federal. Enquanto aos membros daquele é assegurado, de modo formal e irrestritamente, essa atribuição (lei número 1.341, de 1951, art. 38, X), aos do órgão local é ela posta em dúvida; senão negada, na maior parte dos processos em que os agentes da instituição funcionam. Essa, de fato, a orientação do legislador que organizou a Justiça do Distrito Federal. E como o Cód. de Proc. Civil, no art. 814, prescreve poder o Ministério Público recorrer “quando caso em lei“, daí resulta só lhe ser concedida tal atribuição nos casos especiais em que exista disposição geral a respeito ou mesmo especial, como acontece quanto à sentença que decreta a interdição.
É fácil demonstrar a desigualdade acima apontada.
Pode o órgão do Ministério Público do Distrito Federal, segundo a lei referida, recorrer em duas hipóteses: 1ª) quando no feito fôr parte principal ou o puder ser; 2ª) quando o recurso visar à observância e execução das leis de ordem pública (art. 129, III).
À primeira vista parece muito ampla a margem aberta aos membros do Ministério Público, eis que sua função nos processos é quase sempre velar pela observância e execução de tais leis. Todavia, se se percorrer a discriminação das atribuições especiais de cada um dêles, verificar-se-á que, em matéria de recursos, só é concedido, de modo expresso, aos curadores de órfãos, de família, de ausentes, o direito de recorrer das sentenças ou decisões proferidas nos processos em que funcionarem, “quando fôr caso” (artigos 143, IV, 145, VII, e 150, III). Além dêsses, os únicos órgãos do Ministério Público aos quais a lei em exame concede, de modo expresso, tal como exige o Código de Proc. Civil, o direito de recorrer, são os promotores do Registro Civil, e, das sentenças e decisões proferidas pelos juízes do mesmo Registro, nos feitos de sua competência (art. 157, V).
Ora, tôdas as vêzes em que não estiver expresso em lei, seja por uma fórmula geral, seja em disposição especial, o direito de recorrer, entra êste em dúvida, e em face do Cód. de Processo, deve ser recusado.
Atente-se, por outro lado, no fato de haver a mencionada lei excluído dos órgãos do Ministério Público a atribuição de oficiar nas apelações interpostas pelas partes nos processos em que êles funcionam. Em verdade só lhe prescreve o dever de arrazoar as apelações, e isso mesmo quando nelas sejam parte principal, apelante ou apelado (art. 133). No entanto, ilògicamente, conservou-se essa atribuição em relação aos agravos. Nada, porém, justifica dispensar a audiência nos recursos contra a sentença definitiva e mantê-la no recurso em geral concedido contra as decisões interlocutórias. Quer dizer: prescindiu-se da opinião do órgão do Ministério Público a respeito do mérito dos recursos interpostos pelas partes contra sentenças definitivas, até mesmo nos processos em que obrigatória foi sua audiência. Justifica-se essa norma? Por que dispensar, depois da sentença, a opinião do Ministério Público, quando, antes, foi ela tida por indispensável? Se a parte, autora ou ré, apela por que suprimir a audiência do Ministério Público sôbre o que pede no recurso? Dir-se-á, não se suprime, eis que o procurador-geral será chamado, na instância superior, a dizer de direito sôbre o recurso. Mas em que a audiência do chefe da instituição poderá vir a ser prejudicada pela do seu chefiado, na primeira instância? Esta só lhe poderá ser é útil, tanto mais quanto ligado não está o procurador-geral à orientação do seu subordinado.
É verdade, note-se, que, segundo o art. 137, pode aquêle, em matéria cível, autorizar curadores ou promotores a sustentarem oralmente, perante o Tribunal de Justiça, suas conclusões, oferecidas nos processos em que funcionaram. E uma concessão, quando devera constituir um direito, uma prerrogativa da função, tanto na hipótese de ser apelante ou apelado o órgão do Ministério Público, quanto na outra, mais geral, de apenas haver intervindo, em razão do cargo, no processo onde se interpôs o recurso.
Nem se invoque por justificativa a tantas restrições o fato de ser o procurador-geral o chefe da instituição e seu representante perante o Tribunal, como diz a lei (art. 138). Uma coisa pão leva à outra: também a lei de 1911, que organizou, a Justiça, fazia declaração idêntica, e no entanto concedia aos órgãos da instituição largos poderes de recurso e lhes assegurava o direito de serem ouvidos em tidos os recursos das partes. Além disso, a mais ampla possível é a ação coordenadora que o procurador-geral pode exercer sôbre os seus chefiados, expedindo-lhes ordens e instruções concernentes ao desempenho de suas atribuições (artigo cit., nº XIII).
É de notar, ainda, constituir êsse regime de limitações postas ao poder de recurso dos órgãos do Ministério Público do Distrito Federal um novo sinal da orientação restritiva, pois as leis anteriores lhes reconheciam faculdades que não têm resistido à impugnação é ao combate dos interessados em eliminar ou diminuir os embaraços criados aos seus desígnios, pela ação fiscalizadora do órgão público. Não há como negar essa evolução contrária aos fins sociais da instituição. Nas Leis de organização Judiciária de 1911 e 1923, permitia-se aos órgãos do Ministério Público interpor os recursos legais de tôdas as sentenças proferidas nos processos ou causas em que funcionassem ou oficiassem (arts. 164, § 4°, e 133, X). Na lei de 1940 (dec. nº 2.035), êsse poder de recorrer, de fiscalizar, já apareceu limitado às causas em que funcionassem (artigo 79, IV). Na lei vigente, ainda mais restrito se mostra, como vimos, pois até mesmo a atribuição de oficiar nas apelações interpostas pelas partes foi eliminado, mercê do disposto no art. 133.
Nem se alegue inexistir qualquer prejuízo para á consecução dos objetivos da instituição com as restrições criadas à ação de seus órgãos, dado o fato de poder o procurador-geral dizer de direito sôbre qualquer feito, haja ou não recurso de órgão do Ministério Público. Essa alta vigilância só terá ocasião de verificar-se se o feito chegar à segunda instância; sem recurso, tal não se dará. Portanto, a privação do poder de interpô-lo eliminará pràticamente a oportunidade do exercício daquela vigilância.
Em conclusão: De manifesta inconveniência são os têrmos em que se põe atualmente o problema legal dos poderes de recurso do Ministério Público do Distrito Federal. O Cód. de Proc. Civil exige expressa disposição concessiva e, no entanto, os têrmos da lei geral, reguladora da matéria, não permitem uma interpretação segura, isenta de dúvidas, salvo no caso de o órgão do Ministério Público ser parte na causa, embora constitua um problema, no campo da doutrina, a sua posição de parte no processo.
Dúvidas, por outro lado, enseja a verificação da hipótese – quando êle puderserparte. Ter-se-á que consultar a legislação, apurar se, na hipótese, o Ministério Publico poderia em parte. Ficará, destarte, a legitimidade do recurso dependendo da solução que se dê a uma questão jurídica, as anais das vêzes opinativa: se o Ministério Público poderia ser parte na causa. Nem é só. Fofa dessas duas hipóteses (ser ou poder ser parte na causa), o recurso lhe será concedido se com êle visar o recorrente a observância e a execução das leis de ordem pública. Conceito êste, por vêzes, inegàvelmente impreciso e incerto, máxime dada a revisão profunda por que vêm passando os princípios gerais, outrora assentes, da ciência jurídica. Não ficará, porém, aí, no terreno doutrinário, a incerteza. A lei em exame poderá ser havida como de ordem pública, mas um novo problema talvez se imponha: o que se pretende com o recurso, visa sua observância – e execução? Será essa uma outra questão, agora de fato, mas também passível de dúvidas na solução que ofereça.
Tudo isso está a mostrar a procedência de nossas observações. Torna-se imperioso definir com segurança e clareza, quando pode o Ministério Público recorrer, pois a lei própria, o Cód. de Processo Civil, omitiu-se lamentàvelmente a respeito.
Se considerarmos a matéria sob o aspecto da chefia do Ministério Público, ainda mais se acentua aquela diversidade dos planos em que se encontram o órgão federal e o local.
Entre as atribuições do procurador-geral da República não se inscreve a de recorrer das decisões do Supremo Tribunal Federal, colégio judiciário perante o qual exerce suas diversas e relevantes funções (lei nº 1.341, de 30-1-951, artigo 80). Certa vez, em 1925; quis o procurador-geral opor embargos à homologação de uma sentença estrangeira de desquite. Negando-lhe êsse direito o relator do feito, agravou-se êle com apoio no art. 44 do Regimento Interno, mas seu recurso não foi provido, sob o fundamento de não ser parte e assim não poder recorrer. Data venia da escassa maioria vencedora, a boa doutrina sustentou-a, dentre os Vencidos, o ministro HERMENEGILDO DE BARROS. Não obstante o precedente, os diplomas posteriores, inclusive o vigente, não, proveram a respeito. Insustentável é, no entanto, a restrição. Sobretudo em face do amplo poder de recurso outorgado aos simples procuradores da República, em quaisquer processos onde funcionam.
Na Justiça do Distrito Federal, ao chefe do Ministério Público é dado, de modo expresso, o poder de usar de recursos para o Supremo Tribunal Federal, fórmula cuja amplitude tem permitido recorrer sempre que o exigem o pleno desempenho de suas funções interpondo recursos extraordinários cíveis.
Nada, porém, justifica essa diversidade de posições, no tocante ao poder de recursos, entre os chefes do Ministério Público, no plano federal e no plano local.
Cód. do Ministério Público
Sem dúvida, virá corrigir essas faltas e muitas outras o Cód. do Ministério Público, cuja elaboração legislativa há tempos se anuncia. São os nossos votos pelo seu próximo advento, por que nêle se dê solução a todos os problemas que constituem obstáculo à plena eficiência do Ministério Público em geral.
Numa antecipação oportuna e feliz, embora limitada pela natureza do ato, a êsse Código, tão necessário, é de consignar o recente regulamento baixado pelo ministro da Justiça, para o Ministério Público que atua perante a Justiça do Distrito Federal (dec. nº 39.135, de 5 de junho de 1956). Em muitas de suas disposições puderam encontrar remédio adequado dentro das limitações aludidas, é claro, diversos problemas do órgão local. Constitui além disso uma sistematização de normas reclamadas pelas necessidades do serviço público. Só naquele Código, porém, hão de encontrar solução definitiva e cabal os inúmeros problemas do Ministério Público, como instituição pública de âmbito nacional.
_________
Notas:
* N. da R. Dissertação feita no Curso de Altos Estudos, organizado para membros do Ministério Público do Distrito Federal pelo procurador-geral Dr. VÍTOR NUNES LEAL.
LEIA TAMBÉM O PRIMEIRO VOLUME DA REVISTA FORENSE
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 1
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 2
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 3
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 4
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