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A citação e a intimação para o advogado no novo CPC
13/06/2016
Ia escrever sobre tutela provisória no texto de hoje [1], até que eu me deparei com um ponto no artigo anterior dessa coluna, escrito pelo meu amigo Luiz Dellore, sobre a citação do condômino e o papel do porteiro [2],que necessitava de atenção imediata. De certa forma, portanto, esse texto é uma continuação da semana passada. Não vamos falar apenas, contudo, do advogado que tem escritório em um condomínio. Vamos falar, em termos gerais, da comunicação ao advogado no novo CPC.
Diário Oficial e intimações eletrônicas: mais do mesmo?
Tradicionalmente, os advogados se acostumaram, no regime do CPC/1973, a procurar o seu nome nas publicações realizadas pelo Diário Oficial. Essa era – e ainda é – a forma mais comum de intimação destinada ao advogado dos atos praticados no processo, deflagrando grande parte dos prazos processuais.
O novo CPC manteve essa tradicional forma de intimação, incorporando algumas regras específicas, para conferir maior segurança:
(i) nulidade da intimação que não contiver o nome do advogado e seu número de inscrição na OAB (art. 272, § 2º), o que já vinha sendo entendido pela jurisprudência sobre o tema na vigência do CPC/1973;
(ii) vedação a abreviaturas no nome do advogado, cuja grafia deve ser a mesma da procuração ou de seu registro na OAB (art. 272, § 4º) – nesse ponto, o novo CPC se distancia do CPC/1973 (que se contentava com os dados do advogado “suficientes para sua identificação” – art. 236, § 1º) e retorna ao sistema do CPC/1939 (que exigia, de forma mais rígida, que constassem da intimação “os nomes exatos dos advogados” – art. 168, § 1º) [3];
(iii) obrigação a que as intimações sejam dirigidas especificamente ao advogado indicado, se houver pedido expresso para que as comunicações sejam feitas em seu nome, sob pena de nulidade (art. 272, § 5º), o que nada mais representa do que consolidação da jurisprudência formada sobre a matéria.
Além disso, o novo CPC introduziu a possibilidade de que as intimações sejam feitas em nome da sociedade de advogados, desde que devidamente registrada na OAB (art. 272, § 1º). Essa previsão é importante, pois protege o escritório das vicissitudes que decorrem da natural movimentação de seus funcionários. Mesmo que as pessoas físicas dos advogados se alterem, não haverá dificuldades quanto à intimação, desde que a sociedade de advogados permaneça a mesma.
Contudo, o novo CPC deixou ainda mais claro que essa não é a modalidade preferencial de intimação, mas sim aquela realizada por meio eletrônico (art. 270).
Trata-se de previsão que reforça tendência já observada no CPC/1973, de cada vez mais priorizar as formas de comunicação por meio eletrônico, com dispensa da publicação no órgão oficial (art. 5º, Lei 11.419/2006). Tendência infeliz e impensada, como já tive a oportunidade de explicar de forma detalhada em outro texto [4].
Você já conversou com o porteiro?
Uma novidade importante do novo CPC encontra-se em seu art. 269, § 1º [5]. Permite-se que o advogado promova diretamente a intimação do advogado da parte contrária – sem a intervenção da serventia judicial – por meio do correio, juntando aos autos, a seguir, cópia do ofício de intimação e do aviso de recebimento.
O objetivo de tal previsão, naturalmente, é promover celeridade e desburocratizar a intimação do advogado. Embora o dispositivo em análise nada disponha a respeito, parece não haver impedimento para que essa intimação seja realizada por outros meios, como pelo Cartório de Títulos e Documentos (ainda mais formal que a intimação pelos correios) ou, ainda, mediante entrega em mãos e protocolo lançado diretamente pelo advogado destinatário, independentemente dos correios. O importante é que se comprove, com razoável segurança, a entrega da intimação a seu destinatário, por força do princípio da instrumentalidade das formas (art. 277, novo CPC).
Há, porém, um ponto que necessita ser discutido e para o qual o artigo da semana passada me chamou a atenção: não se pode descartar a hipótese de interpretação conjugada do art. 269, § 1º (que permite a intimação de um advogado pelo advogado da parte contrária pelos correios) com o art. 248, § 4º (que admite a citação pelos correios nos condomínios edilícios ou loteamentos com controle de acesso mediante entrega ao funcionário da portaria). Afinal, não é de hoje que se entende que a intimação recebe aplicação subsidiária das regras sobre citação, que estão disciplinadas de forma mais detalhada no código processual civil.
Onde quero chegar? Veja: se admitida a aplicação conjunta desses dois dispositivos e o advogado destinatário tenha seu escritório estabelecido em um condomínio edilício, será possível considerá-lo intimado desde que a correspondência tenha sido entregue ao funcionário da portaria do condomínio.
Dessa forma, em tempos de novo CPC, se você for um advogado com escritório em condomínio edilício, para evitar problemas, não custa conversar com a portaria ou com a administração do condomínio, para assegurar que haja um controle adequado de entrega de correspondências que serão dirigidas ao seu escritório [6].
Negócio jurídico processual e comunicação ao advogado no novo CPC
Nada impede, desde que preenchidos os requisitos do art. 190 do novo CPC, que a comunicação dirigida ao advogado seja regulada de forma distinta mediante negócio jurídico processual, o qual pode ser celebrado entre as partes antes ou após deflagrado o processo.
As partes podem, por exemplo, afastar a possibilidade de intimação de um advogado diretamente pelo advogado da outra. Podem, ainda, exigir que tal intimação seja cercada de maiores formalidades, além das estabelecidas pela lei, ou mesmo estipular que tal comunicação seja realizada apenas para alguns atos processuais.
Inversamente, podem as partes ampliar a incidência do art. 269, § 1º também para a citação. Como escrevi em outra oportunidade, “não se previu [no novo CPC] a possibilidade de o mandatário do autor ou do exequente promover a citação da parte contrária, evitando a burocracia dos cartórios e secretarias judiciais, ao contrário de outros ordenamentos, como nos Estados Unidos e até mesmo em reforma processual aprovada há décadas em Portugal” [7].
Contudo, “[e]mbora o art. 269, § 1º não possa ser aplicado automaticamente à citação – modalidade de comunicação mais solene que a intimação –, nada impede que as partes, valendo-se da cláusula geral de negócio jurídico processual para as causas sobre direitos que admitam autocomposição (art. 190), ajustem previamente que, caso instaurado processo judicial versando sobre o objeto abrangido por essa cláusula, a citação de uma delas poderá ser promovida pelo advogado da outra parte” [8].
* * *
A comunicação dirigida ao advogado é um desses assuntos em que, aparentemente, não houve grandes novidades no novo CPC. Mas as inovações pontuais verificadas são importantes e os profissionais do direito devem estar atentos a elas, para que não sejam surpreendidos.
Hoje, ficamos por aqui. Um abraço e até a próxima!
[1] Obrigado a todos que participaram da pesquisa que eu fiz em minha página no Facebook (https://www.facebook.com/roquecpc/) e no Twitter (@AndreVRoque). Ganhou o tema da “tutela provisória”, que vem sendo fonte de muita controvérsia e discussão e que será tratado em breve neste espaço.
[2] Luiz Dellore, O Novo CPC permite que a citação do condômino seja recebida pelo porteiro?, JOTA, publicado em 6.6.2016, disponível em https://www.jota.info/o-novo-cpc-permite-que-citacao-condomino-seja-recebida-pelo-porteiro.
[3] Sobre o ponto, v. comentários de Zulmar Duarte em Fernando da Fonseca Gajardoni; Luiz Dellore; Andre Vasconcelos Roque e Zulmar Duarte de Oliveira Jr., Teoria Geral do Processo – Comentários ao CPC de 2015. São Paulo: Método, 2015, p. 795/796.
[4] Andre Vasconcelos Roque, O processo eletrônico do século XIX, Migalhas, disponível em http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI199438,91041-O+processo+eletronico+do+seculo+XIX. Não é erro de digitação, escrevi mesmo “século XIX” no título, para enfatizar que a lei do processo eletrônico parte da premissa de que o advogado ainda tem tempo para cuidar de forma artesanal de seus processos, mesmo em uma sociedade massificada, como a que vivemos hoje.
[5] Art. 269, § 1º do CPC/2015: “É facultado aos advogados promover a intimação do advogado da outra parte por meio do correio, juntando aos autos, a seguir, cópia do ofício de intimação e do aviso de recebimento”.
[6] Para Luiz Dellore, seguem as seguintes sugestões para os condomínios: “Vejamos o que pode ser feito – e que já é adotado por alguns condomínios, antes mesmo do NCPC: a) em relação a todas as correspondências, lançamento pelo porteiro, no ato do recebimento, de carimbo com a data em que a carta foi recebida – exatamente para ser possível comprovar, em relação a cada uma das correspondências, a data de recebimento na portaria; b) criação de um livro de protocolo na portaria, com o lançamento de todas as correspondências recebidas com aviso de recebimento; assim, quando o porteiro assinar um AR, essa informação será lançada nesse livro; c) entrega ao condômino das correspondências com AR apenas mediante assinatura do morador nesse mesmo livro de protocolo, de modo a comprovar que o porteiro entregou a correspondência para o condômino; d) cada condômino deverá informar, por escrito nesse mesmo livro, a situação de ausência de algum morador (como o óbito de alguma pessoa), de modo que o porteiro possa informar ao carteiro – nos termos do § 4º do art. 248, que o condômino está ausente; isso de modo a resguardar o porteiro da alegação eventualmente falsa de que um morador está ausente e, na verdade, está apenas se esquivando do Poder Judiciário; e) até que todas essas medidas sejam implantadas, é possível ao síndico orientar os porteiros que cartas de citação com o Poder Judiciário como remetente sejam recusadas, de modo a não haver risco dos graves prejuízos decorrentes de uma carta não entregue” (Luiz Dellore, O Novo CPC permite que a citação do condômino seja recebida pelo porteiro?, Jota, publicado em 6.6.2016, disponível em https://www.jota.info/o-novo-cpc-permite-que-citacao-condomino-seja-recebida-pelo-porteiro).
[7] Fernando da Fonseca Gajardoni; Luiz Dellore; Andre Vasconcelos Roque e Zulmar Duarte de Oliveira Jr., Teoria Geral do Processo – Comentários ao CPC de 2015. São Paulo: Método, 2015, p. 751.
[8] Idem, ibidem.