GENJURÍDICO
shutterstock_34458205_mini

32

Ínicio

>

Artigos

>

Penal

ARTIGOS

PENAL

Estupro de vulnerável e os desdobramentos da vulnerabilidade absoluta no âmbito da pornografia infantojuvenil

ADOLESCENTE

CÓDIGO PENAL

CRIANÇA

ECA

ESTUPRO DE VULNERÁVEL

INFANTOJUVENIL

PORNOGRAFIA

PRESUNÇÃO ABSOLUTA

PRESUNÇÃO RELATIVA

RELACIONAMENTO SEXUAL

Guilherme de Souza Nucci

Guilherme de Souza Nucci

08/10/2014

shutterstock_34458205_mini

Durante várias décadas, debateram a doutrina e a jurisprudência brasileiras o caráter da antiga presunção de violência, quando se tratasse de menor de 14 anos em relacionamento sexual. Dividiam-se em duas correntes: presunção absoluta, que não comporta prova em contrário; presunção relativa, que admite prova em contrário, a respeito da capacidade de consentimento da vítima). Após a reforma introduzida pela Lei 12.015/2009, criado o artigo 217-A do Código Penal, menciona-se constituir crime o contato sexual de qualquer espécie com menor de 14 anos (e ainda com enfermos mentais e pessoas que não possam consentir). Surgiram, então, as discussões acerca do caráter da vulnerabilidade: se absoluta ou relativa. Trata-se do mesmo cenário, com idêntica indagação: pode-se produzir prova de que o menor de 14 anos tem, no caso concreto, consentimento válido para o contato sexual? Se a resposta for afirmativa, trata-se da vulnerabilidade relativa. Porém, a jurisprudência majoritária, por ora, em particular dos Tribunais Superiores, tem firmado o entendimento de se tratar de vulnerabilidade absoluta, logo, sem possibilidade de prova em contrário.

Este texto não pretende ingressar nesse debate – vulnerabilidade absoluta ou relativa, embora a nossa posição, exposta em livros, é a da vulnerabilidade relativa. Mas, para os fins propostos nestas linhas, vamos considerar a vulnerabilidade absoluta como sendo a linha mestra.

Diante disso, a pessoa menor de 14 anos não pode, em hipótese alguma, ter contato sexual, pois configura, na posição de vítima, o estupro de vulnerável. Na sequência desse raciocínio, é completamente inviável aceitar-se a pornografia infantil como forma de arte, dando ensejo à participação de crianças ou adolescentes em filmes, fotos, novelas ou qualquer ensaio, mesmo que sob o pretexto de manifestação artística. Aliás, como preceitua o art. 240 do ECA, somente o fato de filmar, fotografar, produzir, reproduzir, dirigir ou registrar a cena sexual já é crime. Nem se diga que, em certos filmes, o jovem estaria apenas simulando o ato sexual, como fazem os adultos em películas não pornográficas, embora com cenas de sexo. Crianças e adolescentes – especialmente os menores de 14 – não estão preparados para discernir entre realidade e ficção, podendo sofrer as consequências disso na sua formação moral.

Mas se pode ir além. Quem tem o contato sexual com o menor de 14 não pratica o delito do art. 240, porém o crime do art. 217-A. Ilustrando, imagine-se uma cena de filme de cunho pornográfico-artístico, na qual uma modelo-atriz nua tem contato físico com um jovem, menor de 14 anos, igualmente nu, total ou parcialmente. O referido ato libidinoso – simulado ou real – gera um quadro lascivo na mente do garoto, sendo suficiente para caracterizar, segundo o entendimento jurisprudencial predominante hoje, a respeito da vulnerabilidade absoluta, o crime de estupro de vulnerável.

Lembre-se, ainda, que o estupro de vulnerável – na atualidade – é delito de ação pública incondicionada (art. 225, parágrafo único, Código Penal). Detectado o contato físico-sensual, cabe ao Ministério Público, recolhidas as devidas provas, denunciar o agente. No exemplo citado, aquela modelo, além do produtor, diretor e outros envolvidos, são acusados como partícipes.

E há mais um fator importante. Alterada a redação do art. 111 do Código Penal, onde se incluiu o inciso V, nos crimes contra a dignidade sexual de crianças ou adolescentes, a prescrição começa a ser computada quando a vítima completa 18 anos, como regra.

Considerando-se a pena prevista para o estupro de vulnerável, a prescrição em abstrato somente se dá em 20 anos. Portanto, quando a vítima do estupro completa 38 anos.

O exemplo supra mencionado indica que, nos termos da atual legislação, quem produz um filme pornográfico, promovendo o contato sexual de corpos nus se tocando, tratando-se de menor de 14 anos, juntamente com um maior de 18, permite a configuração do estupro de vulnerável. O ator/atriz responderá pelo crime hediondo, sem possibilidade de qualquer espécie de prova em contrário, pois a vulnerabilidade é absoluta. E não se depende de nada ou ninguém, pois o Ministério Público deve ajuizar ação penal, havendo provas suficientes. O seu prazo para isso começa a ser computado quando o ofendido completa 18 anos (e dura por 20 anos).

Em suma, não há justificativa alguma para inserir um menor de 14 anos em qualquer espécie de pornografia, nem mesmo sob a alegação de se tratar de obra artística, visto que a liberdade, nesse campo, encontra barreiras maiores ao se defrontar em face da dignidade sexual infantojuvenil.

A legislação brasileira, antes mais permissiva, tornou-se rígida nesse cenário. Para alguns, rigorosa demais. Para outros, perfeitamente adequada. Muito ainda se tem a debater, procurando o ponto ideal de equilíbrio, não somente para os menores de 14 anos, mas para todo o contexto dos crimes contra a dignidade sexual.

Assine nossa Newsletter

Li e aceito a Política de privacidade

GENJURÍDICO

De maneira independente, os autores e colaboradores do GEN Jurídico, renomados juristas e doutrinadores nacionais, se posicionam diante de questões relevantes do cotidiano e universo jurídico.

Áreas de Interesse

ÁREAS DE INTERESSE

Administrativo

Agronegócio

Ambiental

Biodireito

Civil

Constitucional

Consumidor

Direito Comparado

Direito Digital

Direitos Humanos e Fundamentais

ECA

Eleitoral

Empreendedorismo Jurídico

Empresarial

Ética

Filosofia do Direito

Financeiro e Econômico

História do Direito

Imobiliário

Internacional

Mediação e Arbitragem

Notarial e Registral

Penal

Português Jurídico

Previdenciário

Processo Civil

Segurança e Saúde no Trabalho

Trabalho

Tributário

SAIBA MAIS

    SAIBA MAIS
  • Autores
  • Contato
  • Quem Somos
  • Regulamento Geral
    • SIGA