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Como recolocar a questão democrática no centro do debate jurídico
Paulo de Bessa Antunes
19/02/2021
1 – Introdução
Os textos jurídicos estão repletos de referências ao Estado, à divisão de poderes, ao controle de constitucionalidade e tantas outras questões “técnicas”, muito embora se refiram pouco à democracia. Este artigo, tem por objetivo recolocar a questão democrática no centro do debate jurídico[1]. O tema, no entanto, é fundamental para a formação do advogado. Com efeito, o preâmbulo da Constituição Federal de 1988 dispõe que:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
O preâmbulo constitucional, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, abriga “valores supremos”[2] que devem orientar toda a ação estatal, seja ela executiva, legislativa ou judiciária.
Em seu artigo 1º, a Constituição Federal estabelece que a República Federativa do Brasil é um “Estado Democrático de Direito”, motivo pelo qual o estudo da democracia é fundamental, pois o estudo do Direito sem a perspectiva democrática pode se confundir com um mero estudo de conjuntos normativos sem levar em consideração os valores fundamentais de uma sociedade. Assim, a Democracia, claramente, é uma opção feita pelo Brasil em 1988 que, no entanto, deve ser relembrada e cultivada. Como afirmou Otávio Mangabeira: “A democracia é uma planta muito tenra, a gente tem que cuidar todo dia.” [3]
A Democracia, tal como estruturada na Constituição de 1988 é representativa e participativa, com diferentes instâncias de participação direta do cidadão no controle dos governantes e da administração. Não é, todavia, perfeita. Não é isenta de crises. É, de fato, “o pior dos regimes políticos, a exceção de todos os outros.”, conforme a conhecida afirmação de Winston Churchill. Ela possui um valor universal, como foi reconhecido pelo líder comunista italiano Enrico Berlinguer: “A democracia é hoje não apenas o terreno no qual o adversário de classe é obrigado a retroceder, mas é também o valor historicamente universal sobre o qual fundar uma original sociedade socialista”.[4]
A Democracia é uma questão civilizatória. É uma questão de regras bem definidas e respeitadas, de possibilidade real de alternativa de poder. A democracia é o respeito pelos direitos humanos fundamentais em todas as suas dimensões. Cuida-se, portanto, de um valor que deve ser cultivado por todos os advogados. Sem Democracia, não há possibilidade da prática da advocacia. A Democracia, entretanto, está em risco. No caso brasileiro, os riscos para a Democracia são muito concretos. As milícias, o narcotráfico, a corrupção, o ataque sistemático às instituições democráticas etc., são ataques ao regime democrático. Também são riscos para a estabilidade do estado democrático de direito as agressões ao meio ambiente, o desemprego, a desiguale extrema, o racismo etc.
A Constituição de 1988 é “parcial” (SUNSTEIN, 2009), na medida em que faz opções no campo político, social e econômico de forma explícita. O artigo 3º da Constituição, por exemplo, estabelece como “objetivos fundamentais” de nossa república os seguintes: (1) construir uma sociedade livre, justa e solidária; (2) garantir o desenvolvimento nacional; (3) erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais e (4) promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Tais objetivos se materializam em um rol de direitos econômicos e sociais que discrepam dos modelos do século XIX ou anteriores. A “parcialidade” da Constituição de 1988, igualmente, pode ser percebida no artigo 225 que impõe ao “Poder Público e à coletividade o dever” de proteger o meio ambiente. A integração dos deficientes físicos também é outro exemplo de “parcialidade” constitucional.
Tal circunstância tem gerado críticas no sentido de que o rol de direitos constitucionais, de fato, é um “excesso de privilégios” que terminam por inviabilizar o estado brasileiro (GARSCHAGEN, 2018). Sem maior pesquisa e indagação, afirma-se “[a]lém da extensão, uma diferença marcante entre a Constituição Brasileira e a de outros países é a inserção de direitos sociais como parte do ordenamento constitucional e que são de difícil (em alguns casos impossível) cumprimento. “(p. 41).
Os chamados direitos sociais, certamente, são reflexo da Revolução Russa que se espalharam pelos quatro cantos do mundo, inclusive no Brasil (BANDEIRA, 2017). Na amárica Latina, a Constituição mexicana de 1917[5] foi a primeira a incorporar as chamadas questões sociais, inclusive a função social da propriedade. Já na Europa foi a Constituição de Weimar a primeira a tratar dos problemas sociais[6].
Com efeito, a Alemanha em sua Constituição de 1949, com a Revisão de 2014 se define como um estado “federal, social e democrático” (artigo 20)[7] ; A Constituição francesa de 1958, com a redação dada pela revisão de 2008, em seu artigo 1estabelece que o país é “uma República indivisível, secular, democrática e social” (artigo 1) [8]. Inúmeros outros exemplos podem ser apresentados. Logo, a Constituição Brasileira de 1988 é uma Constituição contemporânea que segue uma tendência universal. É evidente que o financiamento dos direitos sociais, tais como previdência social, assistência médica e outros é uma questão complexa que exige responsabilidade fiscal do Estado para que tenha os recursos financeiros necessários para o cumprimento de suas tarefas constitucionais.
2 – Declarações de direitos
A tradição dos movimentos liberais em proclamar direitos universais tem um dos seus marcos iniciais na Declaração de Direitos de 1689[9] (Bill of Rights) surgida da Revolução Gloriosa na Inglaterra, entre os principais direitos constantes da Declaração podem ser arrolados os seguintes: a (1) tributação deveria ser autorizada pelo Parlamento, (2) a sucessão do trono deveria ser decidida pelo Parlamento, (3) proibição de que os monarcas interferissem em questões comerciais, (4) liberdade de expressão, (5) proibição de expropriação de propriedades privadas. Na mesma linha, no que tange às liberdades individuais e, em particular, no que diz respeito à autodeterminação dos povos, vem a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América em 1776, da qual merece destaque o seguinte trecho
Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade. Que a fim de assegurar esses direitos, governos são instituídos entre os homens, derivando seus justos poderes do consentimento dos governados; que, sempre que qualquer forma de governo se torne destrutiva de tais fins, cabe ao povo o direito de alterá-la ou aboli-la e instituir novo governo, baseando-o em tais princípios e organizando-lhe os poderes pela forma que lhe pareça mais conveniente para realizar-lhe a segurança e a felicidade.[10]
Em seguida, podemos trazer a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da Revolução Francesa (1789).
Os representantes do povo francês, reunidos em Assembleia Nacional, tendo em vista que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos Governos, resolveram declarar solenemente os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que esta declaração, sempre presente em todos os membros do corpo social, lhes lembre permanentemente seus direitos e seus deveres; a fim de que os atos do Poder Legislativo e do Poder Executivo, podendo ser a qualquer momento comparados com a finalidade de toda a instituição política, sejam por isso mais respeitados; a fim de que as reivindicações dos cidadãos, doravante fundadas em princípios simples e incontestáveis, se dirijam sempre à conservação da Constituição e à felicidade geral.
Em razão disto, a Assembleia Nacional reconhece e declara, na presença e sob a égide do Ser Supremo, os seguintes direitos do homem e do cidadão:[11]
A tradição liberal de proclamação de direitos não se restringiu às revoluções liberais. A Revolução Russa de 1917 também editou uma Declaração de Direitos do Povo Trabalhador e Explorado[12] que foi proclamada “[v]isando principalmente a suprimir toda exploração do homem pelo homem, a abolir completamente a divisão da sociedade em classes, a esmagar implacavelmente todos os exploradores, a instalar a organização socialista da sociedade e a fazer triunfar o socialismo em todos os países”
Um pouco antes do fim da 2ª Grande Guerra houve a fundação da Organização das Nações Unidas e a emissão da Declaração Universal dos Direitos Humanos[13] , em cujo Preâmbulo consta “o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”. Os horrores causados pela guerra e pela perseguição racial e religiosa, levaram à consideração de que “o desconhecimento e o desprezo dos direitos do Homem conduziram a atos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração do Homem”. No hemisfério americano há o Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), quanto a este acordo internacional, é importante observar que ele foi firmado em 22 de novembro de 1969, só tendo sido incorporado ao direito interno brasileiro em 1992 (Decreto nº 678, de 6 de novembro), o que demonstra a importância do regime democrático para a proteção dos direitos humanos.
As declarações de direitos, após a segunda metade do século XX proliferaram em todos os continentes e organizações internacionais e regionais. Todavia, diferentemente da primeira onda, elas não se limitaram mais aos direitos tradicionais de liberdade, segurança e propriedade pessoal. As novas declarações incorporaram os “direitos sociais” e de “minorais”. Em 1966, a Assembleia Geral das Nações Unidas (XXII Sessão, 19 de dezembro) aprovou o Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos Sociais e Culturais [PIDESC] que, no entanto, só foi ratificado pelo Brasil em 1992. É interessante observar que, em 1966, o Brasil já se encontrava sob o regime militar, só recuperando a democracia plenamente com a eleição de 1989, com a eleição de Fernando Collor que foi o Presidente que ratificou o PIDESC (Decreto nº 591, de 6 de julho de 1992).
No âmbito hemisférico há o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de São Salvador) que em seu artigo 11 inclui o direito ao meio ambiente sadio entre as suas normas. O Protocolo Adicional, de forma bastante clara, reconhece “a estreita relação que existe entre a vigência dos direitos econômicos, sociais e culturais e a dos direitos civis e políticos, por motivo de as diferentes categorias de direito constituírem um todo indissolúvel que tem sua base no reconhecimento da dignidade da pessoa humana, razão pela qual exigem tutela e promoção permanente, com o objetivo de conseguir sua plena vigência, sem que jamais possa justificar-se a violação de uns a pretexto da observação de outros.”
No campo específico de proteção às minorias étnicas, a Organização dos Estados Americanos, na terceira sessão plenária, realizada aos 15 de junho de 2016, aprovou a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas[14], da mesma forma que no âmbito global há declaração no mesmo sentido, aprovada na 107ª Sessão Plenária de 13 de setembro de 2007 da Assembleia Geral.[15]
3 – Modelo da Democracia Brasileira
O modelo democrático brasileiro está delineado pela Constituição de 1988, muito embora um regime democrático não se limite aos contornos jurídicos que são traçados pela sua Lei Fundamental. Certamente, o modelo institucional é da maior relevância, da mesma forma que a cultura política existente em um determinado território é fundamental para assegurar a prevalência dos valores democráticos que são verdadeiras regras informais (LEVITSKY e ZIBLATT, 2018). As regras informais começam pela aceitação dos resultados eleitorais, pela compreensão que a disputa política se faz pelos meios da política e da argumentação.
A democracia, manifestada pelo chamado princípio republicano, é um dos elementos fundadores de nosso regime constitucional. Ele tem como um de seus fundamentos o pluralismo político (artigo 1º, V), o que necessariamente implica na alternância no poder entre os diferentes partidos políticos legitimamente reconhecidos, mediante a realização de eleições em intervalões de tempo regulares. Estas condições são essenciais, assim como a existência de partidos políticos é fundamental no regime representativo, pois é principalmente por meio deles que são eleitos os membros dos poderes executivo e legislativo com a função de representar o povo.
O modelo representativo é uma das cláusulas sensíveis da Constituição Federal, pois atentados contra o modelo podem acarretar a intervenção federal nos Estados (artigo 34, VII, a da Constituição Federal).
Há, ainda, a responsabilidade dos agentes públicos e políticos (impedimento, artigos 52, I e II da Constituição Federal), a obrigatoriedade de prestação de contas e a transparência administrativa como caracterizadores do modelo republicano.
4 – A necessidade de valorizar o regime democrático
Conforme a interessante observação de Timothy SNYDER (2017, p. 9), a História não se repete, mas, instrui. A história constitucional brasileira, como de resto a nossa história política, demonstra que a democracia no Brasil é uma exceção, ou quase.
Das sete Constituições, quatro foram promulgadas por assembleias constituintes, duas foram impostas – uma por D. Pedro I e outra por Getúlio Vargas – e uma aprovada pelo Congresso por exigência do regime militar. Na história das Constituições brasileiras, há uma alternância entre regimes fechados e mais democráticos, com a respectiva repercussão na aprovação das Cartas, ora impostas, ora aprovadas por assembleias constituintes.[16]
François OST (1997, p. 306) afirma que a vida pública, nas democracias representativas tem sofrido um enorme déficit de interesse e participação dos cidadãos, enquanto que a necessidade de “pilotagem da atividade coletiva nunca foi tão intensa como hoje”. E acrescenta, “no próprio momento em que a procura de democracia é mais forte, esta parece esgotar-se”.
A liberdade política e, portanto, a Democracia, é fundamental para o desenvolvimento econômico, pois conforme afirmado por Amartya SEN (2010, p. 16) o desenvolvimento requer que as principais fontes de privação da liberdade, tais como pobreza e tirania, falta de oportunidades econômicas e a “destruição social sistemática”, a falta ou má qualidade de serviços públicos e a “intolerância ou interferência excessiva” de estados opressores sejam removidas. SEN acrescenta que
[à]s vezes a ausência de liberdades substantivas relaciona-se diretamente com a pobreza econômica que rouba das pessoas a liberdade de saciar a fome, de obter uma nutrição satisfatória ou remédios para doenças tratáveis, a oportunidade de vestir-se ou morar de modo apropriado deter acesso à água tratada ou saneamento básico. (p. 17)
O regime democrático não é puramente formal, ou seja, sem qualquer vínculo com a realidade concreta dos indivíduos. É por meio do regime democrático que as reivindicações são feitas, que as opções políticas são definidas e, portanto, que se materializam os progressos sociais necessários. Logo, as “liberdades não são apenas os fins primordiais do desenvolvimento, mas também os meios principais” (p.25).
O grande exemplo do valor da democracia que Amartya SEN apresenta é o das grandes fomes. Segundo o autor, não há registro de grandes fomes em regimes democráticos. Também na questão da proteção ao meio ambiente a democracia é fundamental.
Durante o regime militar, o Brasil conheceu os chamados municípios de interesse para a segurança nacional, tal como definidos pela Lei nº 5.449, de 4 de junho de 1968. Os graves problemas decorrentes da poluição industrial, notadamente nas áreas com grandes concentrações urbanas fizeram com que os estados mais industrializados, em resposta à inercia do governo central, tomassem medidas concretas para fazer frente à questão.
Em 1968, no Estado de São Paulo foi criada a CETESB, por meio do Decreto no 50.079, de 24 de julho, a medida foi, evidentemente, uma resposta aos crescentes casos de poluição no estado, com destaque para a situação de Cubatão que chegou a ser conhecida como o “Vale da Morte”, resultado das atividades geradas pelo polo industrial implantado na década de 50 do século XX. Cubatão é um dos berços da industrialização brasileira, tendo sido o “símbolo da transformação do Brasil rural Brasil industrial na década de 50”[17], a cidade encravada em um vale na Serra do Mar, ficava próxima ao porto de Santos e do grande centro consumidor de São Paulo.
O processo de industrialização teve início com a implantação em 1955 da Refinaria Presidente Bernardes e, logo a seguir, da Companhia Siderúrgica Paulista. Evidentemente, a oferta de empregos gerada teve o condão de atrair grande contingente humano. As condições de dispersão atmosféricas não eram boas e, rapidamente, o problema da poluição do ar, com todas as suas consequências de fez presente. Note-se que, por força da Lei nº 5.449, de 4 de junho de 1968, Cubatão era declarada como de “interesse da segurança nacional”, fazendo com que o controle exercido pelo Estado fosse parcial e sempre submetido aos superiores interesses da segurança nacional. Outros estados e municípios viveram situações similares, como foi o caso de Angra dos Reis, Duque de Caxias, Volta Redonda no estado do Rio de janeiro e Contagem (MG).
Das cidades acima mencionadas é fácil perceber que, em todas elas, estavam instaladas atividades com alto potencial poluidor e que, certamente, as externalidades negativas causadas pela atividade industrial geravam enormes problemas de saúde pública. A fata de democracia, portanto, servia para abafar tais realidades. A restauração do regime democrático, se não resolveu inteiramente os problemas, permitiu que a população mostrasse livremente a sua indignação r que medidas concretas para a mitigação e redução da poluição fossem tomadas.
5 – Os ataques à Democracia
A democracia está em recuo no mundo. “Em todas as regiões do mundo a democracia está sob ataque de lideres populistas e grupos que rejeitam o pluralismo”[18] . Tal fenômeno tem sido tratado como “recessão democrática” (MOUNK, 2019, p. 9). Por populismo, o que tem se entendido no contexto específico é a “reivindicação de representação exclusiva do povo” (p. 10), com uma evidente relutância em tolerar as oposições e respeitas as instituições democráticas e independentes.
A queda do muro de Berlim e o fim da União Soviética fizeram com que muitos cientistas políticos se precipitassem e chegassem à conclusão que História tinha chegado ao fim, com a prevalência da democracia liberal sobre os modelos autoritários de diferentes países.
A manifestação mais evidente desse otimismo foi a tese de Francis Fukuyama sobre o “fim da história”. Escrevendo poucos meses antes da queda do Muro de Berlim, Fukuyama argumentava que a evolução ideológica da humanidade havia chegado ao fim. Embora vários movimentos políticos do século 20 houvessem prometido substituir o liberalismo ocidental, no final do século seu ímpeto havia arrefecido. O comunismo ainda poderia contar com “alguns fiéis devotos isolados” em lugares remotos como “Manágua, Pyongyang ou Cambridge, Massachusetts”, mas já não era um adversário viável na disputa pela hegemonia ideológica. Sem alternativas críveis, o mundo era um lugar seguro para a democracia liberal: “O Estado que emerge no fim da história é liberal na medida em que reconhece e protege, através de um sistema jurídico, o direito universal do homem à liberdade, e é democrático na medida em que somente existe com o consentimento dos governados”.[19]
A chamada visão triunfalista da História, a concepção de que a Humanidade anda sempre para frente e de que o futuro será sempre melhor que o presente, infelizmente, não corresponde à realidade dos fatos.
Conclusão
A democracia e as liberdades políticas são fundamentais para a melhoria das condições de vida das populações e a proteção do meio ambiente e dos direitos humanos e devem ser defendidas como essenciais. O advogado, necessariamente, deve se bater pela vigência da Democracia e contra os ataques que são constantemente perpetrados contra o regime democrático, pois não há exercício livre da advocacia sob as ditaduras.
Referências
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. O Ano Vermelho – A Revolução Russa e seus Reflexos no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 4ª edição. 2017
GARSCHAGEN, Bruno. Direitos máximos, deveres mínimos. Rio de Janeiro/São Paulo: Record. 2018.
LEVITSKY, Steven e ZIBLATT, Daniel. Como as Democracias Morrem (tradução de Renato Aguiar). Rio de Janeiro: Zahar. Kindle. 2018
MOUNK, Yascha. O Povo contra a Democracia – porque a nossa liberdade corre perigo e como salvá-la (tradução de Cássio Arantes Leite e Débora Landsberg). São Paulo: Companhia das Letras. 2019.
OST, François. A Natureza à Margem da Lei – A Ecologia à Prova do Direito (tradução de Joana Chaves). Lisboa: Instituto Piaget. 1997
SEN, Amartya. Desenvolvimento como Liberdade (tradução de Laura Teixeira Motta). São Paulo: Companhia das Letras. 2010
SNYDER, Timothy. On Tyrany – Twenty Lessons from the Twentieth Century. New York: Tim Dugan Books. 2017.
SUNSTEIN, Cass R. A Constituição Parcial (Tradução de Manassés Teixeira Martins e Rafael Triginelli). Belo Horizonte: Del Rey. 2009
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[1] Versão modificada de capítulo específico da 3ª edição de Uma nova introdução ao direito, em preparação.
[2] [ADI 2.649, voto da rel. min. Cármen Lúcia, j. 8-5-2008, P, DJE de 17-10-2008.]”
[3] Disponível em < Otávio Mangabeira, nascido Octavio MangabeiraGCSE (Salvador, 27 de agosto de 1886 — Rio de Janeiro, 29 de novembro de 1960) foi um engenheiro, professor e político brasileiro. Foi governador da Bahia e membro da Academia Brasileira de Letras. > acesso em 04/11/2020
[4] Disponível em < https://www.marxists.org/portugues/coutinho/1979/mes/democracia.htm > acesso em 04/11/2020
[5] Disponível em < https://pdba.georgetown.edu/Constitutions/Mexico/mexico1917.html > acesso em 06/11/2020
[6] Disponível em < https://en.wikisource.org/wiki/Weimar_constitution > acesso em 06/11/2020
[7] Disponível em < https://www.constituteproject.org/constitution/German_Federal_Republic_2014?lang=en > acesso em 06/11/2020
[8] Disponível em < https://www.constituteproject.org/constitution/France_2008?lang=en > acesso em 06/11/2020
[9] Disponível em ¸< http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/decbill.htm > acesso em 06/11/2020
[10] Disponível em < http://www4.policiamilitar.sp.gov.br/unidades/dpcdh/Normas_Direitos_Humanos/DECLARA%C3%87%C3%83O%20DE%20INDEPENDENCIA%20DOS%20EUA%20-04%20de%20julho%20de%201776%20-%20PORTUGU%C3%8AS.pdf > acesso em 04/11/2020
[11] Disponível em < http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html > acesso em 04/11/2020
[12] Dispoonível em < http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-dos-direitos-do-povo-trabalhador-e-explorado-1918.html > acesso em 06/11/2020
[13] Diponível em < https://www.ohchr.org/en/udhr/documents/udhr_translations/por.pdf > acesso em 06/11/2020
[14] Disponível em < https://www.oas.org/en/sare/documents/DecAmIND_POR.pdf > acesso aos 07/11/2020
[15] Disponível em < http://www.funai.gov.br/arquivos/conteudo/cogedi/pdf/LEGISLACAO_INDIGENISTA/Legislacao-Fundamental/ONU-13-09-2007.pdf > acesso em 08/11/2020
[16] Disponível em < http://www.senado.gov.br/noticias/especiais/constituicao25anos/historia-das-constituicoes.htm > acesso em 10/11/2020
[17] PIRES, Fernanda. “Vale da Morte” foi o símbolo de Cubatão, in, https://www.valor.com.br/brasil/2570976/vale-da-morte-foi-o-simbolo-de-cubatao, acesso aos 26/04/2019
[18] Disponível em < https://freedomhouse.org/issues/democracies-decline > acesso em 10/11/2020
[19] MOUNK, Yascha. O fim da história revisitado. Disponível em < https://estadodaarte.estadao.com.br/yascha-journal-fim-historia-revisited / > acesso em 10/11/2020