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Casamento de Menores de 16 Anos – Lei 13.811/2019
Rolf Madaleno
14/03/2019
Em 12 de março foi publicada a Lei 13.811/2019, que proíbe o casamento de menores de 16 anos, ao atribuir nova redação ao artigo 1.520 do Código Civil, que permitia em caráter excepcional, o casamento de quem ainda não tivesse atingido a maioridade civil. Pelo novo texto do artigo 1.520 do Código Civil está peremptoriamente proibido o matrimônio de menores de 16 anos, embora, curiosamente, a Lei 13.811/2019 não tenha revogado expressamente o artigo 1.517 do Código Civil, que permitia o casamento de menores com 16 anos mediante autorização de ambos os pais ou de seus representantes legais, e se houvesse divergência entre os progenitores quanto ao exercício do poder familiar era assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo (CC, art. 1.517, parágrafo único, c/c art. 1.631 parágrafo único), o que já se consistia em um avanço do atual Código Civil, dado que pelo diploma de 1916, na divergência prevalecia a vontade paterna.
Também no passado era permitido o casamento de menores para evitar a imposição ou o cumprimento de pena criminal, ou em caso de gravidez, e o juiz podia suprir o consentimento dos pais para evitar a aplicação de pena ao agressor. Esta excludente abrangia os delitos enumerados nos artigos 213 a 220 do Código Penal; entretanto, o artigo 5° da Lei 11.106/2005, revogou os incisos VII e VIII do artigo 107 do Código Penal, que extinguia a penalidade pelo casamento do agente com a vítima, ou pelo casamento da vítima com terceiro. Contudo, embora o casamento com a vítima não mais extinguisse a punibilidade, não estava descartado pela lei civil o suprimento do consentimento judicial e, nessa hipótese, o matrimônio devia se dar pelo regime obrigatório da separação de bens (CC, art. 1.641, inc. III).
Para minimizar um pouco este chocante contraste de um casamento de menores de 16 anos, o revogado artigo 214, parágrafo único, do Código Civil de 1916, estabelecia a possibilidade de o juiz determinar a separação de corpos dos cônjuges enquanto não atingissem a idade matrimonial, aguardando que os adolescentes se tornassem fisicamente adultos e isto só ocorria aos 21 anos de idade, ao tempo do Código Civil de 1916 e aos 18 anos a partir do Código Civil de 2002.
E tanto podia impactar o sentimento médio da sociedade, um casamento de dois adolescentes e cada qual com 16 anos de idade, ou com uma pequena diferença de idade entre eles, como podiam impactar os casamentos de um passado mais distante, notadamente entre reis e rainhas, cujos matrimônios políticos ocorriam com diferenças brutais de idade. Por exemplo, Elisabeth da França casou aos 14 anos de idade com Felipe da Espanha com 32 anos de idade, e existem diferenças de idade muito mais gritantes. Nessa época, a cultura do matrimônio estava muito mais assentada na ideia da procriação e a aptidão para reproduzir se dá muito antes dos 16 anos de idade.
Vozes talvez pudessem se levantar dizendo que não está proibido o estabelecimento de uma união estável aos 16 anos, como outras irão lembrar que a natureza da paixão exerce uma força atrativa irresistível, incapaz de impedir que adolescentes se juntem em fática relação afetiva, e isto é a mais absoluta verdade. Contudo, enquanto não atingirem os 16 anos de idade, os adolescentes estão proibidos de casar, e igualmente não será reconhecida qualquer união estável. Nesse sentido costumam concluir os tribunais asseverando que qualquer outra interpretação seria um desestímulo ao casamento, como concluiu a Terceira Turma do STJ no REsp. 1.369.860/PR, ao prescrever aos companheiros as mesmas limitações previstas para o casamento, em um caso onde um dos conviventes já contava com mais de sessenta anos.
Agora que o casamento de menor de 16 anos está terminantemente proibido, nada esclarece a Lei 13.811/2019 acerca de seus efeitos jurídicos. Mas trata-se de casamento proibido e, portanto, ingressa nos impedimentos do artigo 1.521 do Código Civil (lembrando que impedimento e incapacidade não são palavras sinônimas, porque a pessoa pode ter capacidade para casar, mas mesmo assim estar impedida de contrair núpcias, por exemplo, com seu ascendente ou outro parente em proximidade de grau).
Sendo regra geral a aptidão para o casamento, tratou o legislador de enumerar as proibições consideradas absolutas do artigo 1.521 do Código Civil, e os impedimentos traduzem a proibição imposta pela lei à realização de um casamento, contudo, se for transposta esta barreira, desavisada ou deliberadamente pelos nubentes, o ordenamento jurídico sanciona as núpcias com decreto de nulidade total, enquanto as causas suspensivas do artigo 1.523, impõem apenas a adoção obrigatória do regime de separação de bens.
Aparentemente, restaria um impasse diante da singeleza da Lei 13.811/2019, que se restringiu a alterar o artigo 1.520 do Código Civil e proibir o casamento de menores de 16 anos, nada referindo, por exemplo, acerca dos reflexos jurídicos dos artigos 1.517, 1.518, 1.519, 1.525, II, 1.537, 1.550, I e II, 1.551, 1.552, 1.553, 1.555, 1.560, § 1°, e 1.641, III do Código Civil, que incontestavelmente se encontram tacitamente derrogados diante do atual artigo 1.520 (Lei 13.811/2019), e do artigo 1.548, II, este também do Código Civil, que afirma ser nulo o casamento contraído por infringência de impedimento e impõe a decretação de nulidade, que inclusive é imprescritível, e pode ser promovida mediante ação direta, por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público (CC, art. 1.549).
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