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Princípio da juridicidade e o conceito de improbidade administrativa
05/11/2019
Etimologicamente, o vocábulo “probidade”, do latim probitate, significa aquilo que é bom, relacionando-se diretamente à honradez, à honestidade e à integridade. A improbidade, ao contrário, deriva do latim improbitate, que significa imoralidade, desonestidade.[1]
A probidade administrativa, na lição de Cármen Lúcia Antunes Rocha, “conta com um fundamento não apenas moral genérico, mas com a base de moral jurídica, vale dizer, planta-se ela nos princípios gerais de direito”.[2] O respeito à moral é uma característica básica que deve ser observada por todos aqueles que se relacionam com o Estado, especialmente os agentes públicos que possuem o dever jurídico de atuar com probidade.
Trata-se de uma decorrência lógica da própria exigência de boa-fé no âmbito da Administração Pública, uma vez que, no ensinamento clássico de Ruy Cirne Lima, “o Estado não é uma entidade amoral, nem utiliza para seu governo uma moral distinta da dos indivíduos”.[3] Existe uma íntima ligação entre a moral e o “bom administrador”, que é aquele que conhece as fronteiras do lícito e do ilícito, do justo e do injusto. [4] A respeito do tema, Diogo de Figueiredo Moreira Neto lembra que “enquanto a moral comum é orientada por uma distinção puramente ética, entre o bem e o mal, distintamente, a moral administrativa é orientada por uma diferença prática entre a boa e a má administração”.[5]
Diverge a doutrina a respeito da definição da (im)probidade administrativa. Alguns autores sustentam que a probidade é um subprincípio da moralidade administrativa.[6] Outros defendem que a moralidade é princípio constitucional e que a improbidade resulta da violação deste princípio.[7]
Entendemos que, no Direito positivo, a improbidade administrativa não se confunde com a imoralidade administrativa. O conceito normativo de improbidade administrativa é mais amplo que aquele mencionado no léxico. A imoralidade acarreta improbidade, mas a recíproca não é verdadeira. Vale dizer: nem todo ato de improbidade significa violação ao princípio da moralidade.[8]
Além dos atos que acarretam enriquecimento ilícito, lesão ao erário e aqueles decorrentes de concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário, a improbidade administrativa, no Direito pátrio, engloba toda e qualquer violação aos princípios que regem a Administração Pública, conforme dispõe o art. 11 da Lei 8.429/1992. Trata-se da consagração do denominado princípio da juridicidade, que impõe ao administrador o respeito não apenas à lei, mas também a todo o ordenamento jurídico. [9]
Com o pós-positivismo, a partir do denominado “neoconstitucionalismo”, implementado após a Segunda Guerra, supera-se a visão legalista (positivista)do Direito para aproximá-lo da moral, valorizando-se a normatividade dos princípios jurídicos.Uma das características principais do pós-positivismo é o reconhecimento da normatividade primária dos princípios constitucionais. Ao lado das regras, os princípios são considerados normas jurídicas e podem ser invocados para controlar a juridicidade da atuação do Estado. [10]
Vale lembrar que o positivismo reconhecia apenas o caráter de fonte normativa subsidiária aos princípios, uma vez que a sua aplicação somente ocorreria nos casos de lacuna da lei, conforme se verifica, ainda hoje, da leitura do art. 4.º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. Atualmente, os princípios são considerados normas jurídicas primárias e devem ser levados em consideração mesmo nas hipóteses em que existam regras jurídicas sobre determinado assunto.
No cenário pós-positivista, o princípio da legalidade administrativa convive, no mesmo plano hierárquico, com outros princípios constitucionais fundamentais, expressos ou implícitos, tais como a moralidade, a impessoalidade, a publicidade, a eficiência, dentre outros. Desta forma, a Constituição ocupa, na atualidade, a centralidade do ordenamento jurídico, e suas normas (regras e princípios) devem ser utilizadas como parâmetros para o controle da juridicidade dos atos administrativos.
Relação da improbidade administrativa com o princípio da juridicidade
A consagração do princípio da juridicidade não aceita a concepção da Administração vinculada exclusivamente às regras prefixadas nas leis, mas sim ao próprio Direito, o que inclui as regras e os princípios previstos na Constituição. Nesse sentido, no âmbito federal, o art. 2.º, parágrafo único, I, da Lei 9.784/1999 consagra a juridicidade aqui aventada: “Art. 2.º (…). Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: I – atuação conforme a lei e o Direito”. Há, portanto, estreita relação entre a improbidade administrativa e o princípio da juridicidade, pois a violação a qualquer princípio jurídico tem o potencial de configurar a prática da improbidade, desde que presentes os requisitos previstos na Lei 8.429/1992 e que serão destacados em momento oportuno.
É importante destacar que a improbidade administrativa não se confunde com a mera irregularidade ou ilegalidade, destituída de gravidade e do elemento subjetivo do respectivo infrator. A improbidade é uma espécie de ilegalidade qualificada pela intenção (dolo ou, excepcionalmente, culpa grave) de violar a legislação e pela gravidade da lesão à ordem jurídica.
Vale dizer: a tipificação da improbidade depende da demonstração da má-fé ou da desonestidade, não se limitando à mera ilegalidade, bem como da grave lesão aos bens tutelados pela Lei de Improbidade Administrativa. Não obstante a dificuldade na conceituação da improbidade administrativa, o termo pode ser compreendido como o ato ilícito, praticado por agente público ou terceiro, geralmente de forma dolosa, contra as entidades públicas e privadas, gestoras de recursos públicos, capaz de acarretar enriquecimento ilícito, lesão ao erário, concessão ou aplicação indevida de benefícios financeiros ou tributários, bem como violação aos princípios que regem a Administração Pública.
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O objetivo desta obra é apresentar ao leitor um verdadeiro manual sobre as principais questões jurídicas que envolvem o tema da improbidade administrativa. A abordagem é didática, com linguagem simples e objetiva, mencionando as principais polêmicas doutrinárias e jurisprudenciais, com destaque para a jurisprudência do STF e do STJ.
O tema é atual e de extrema relevância para o País, pois envolve a ética na gestão de recursos por parte dos agentes públicos e dos particulares que se relacionam com a Administração Pública. De fato, a Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa) representa um marco na busca pela moralização da administração, o que denota a importância do seu estudo no atual estágio de evolução do Direito Público.
De forma inédita, os autores uniram as suas especialidades e experiências profissionais a fim de apresentar ao leitor um livro completo: o professor Rafael Carvalho Rezende Oliveira, especialista em Direito Administrativo, aborda os aspectos relacionados ao Direito material, e o professor Daniel Amorim Assumpção Neves, especialista em Processo Civil, apresenta as principais questões processuais.
Além disso, visando complementar o estudo do tema, analisam o Sistema Brasileiro de Combate à Corrupção e a Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupção).
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[1] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 1.086 e 1.640.
[2]ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Improbidade administrativa e finanças públicas. Boletim de Direito Administrativo, dez. 2000, p. 920.
[3] LIMA, Ruy Cirne. Princípios de direito administrativo brasileiro. 3. ed. Porto Alegre: Sulina, 1954. p. 177. Sobre o princípio da boa-fé no Direito Administrativo como via de aproximação entre o Direito e a moral, confira-se: GONZÁLEZ PÉREZ, Jesús. El principio general de la buena fe en el derecho administrativo. 4. ed. Madrid: Civitas, 2004. p. 25. Na lição de Paulo Modesto, enquanto a boa-fé é aplicável nas relações externas da Administração com os administrados, a moralidade exige uma atuação ética do administrador em suas relações externas, perante os administrados, e internas, relativas ao funcionamento e estruturação do aparato administrativo. MODESTO, Paulo. Controle jurídico do comportamento ético da Administração Pública no Brasil. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 10, jun./jul./ago. 2007, p. 7. Disponível em: <www.direitodoestado.com.br/rere.asp>. Acesso em: 20 jan. 2012.
[4] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 84.
[5] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 105.
[6] MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 101; FREITAS, Juarez. O princípio da moralidade e a Lei de Improbidade Administrativa. Fórum Administrativo, Belo Horizonte, n. 48, p. 5.078, fev. 2005.
[7] Nesse sentido: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 803; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 24. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 984.
[8]No mesmo sentido: DECOMAIN, Pedro Roberto. Improbidade administrativa. São Paulo: Dialética, 2007. p. 24; GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 125.
[9] Sobre o princípio da juridicidade, vide nossa obra: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. A constitucionalização do direito administrativo. 2. ed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2010.
[10]Para análise aprofundada sobre o Pós-positivismo e a distinção entre princípio e regras, vide: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Princípios do direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
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