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CLÁSSICOS FORENSE

CONSTITUCIONAL

REVISTA FORENSE

Município – Desmembramento Territorial – Garantias Constitucionais, de Francisco Campos

FRANCISCO CAMPOS

REVISTA FORENSE 173 - ANO DE 1956

Revista Forense

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16/09/2025

– O desmembramento do território de um Município, para a criação de outro, mediante condições prescritas na Constituição estadual, não atenta contra a autonomia municipal.

– Na Constituição federal não se encontra outorgada qualquer garantia aos Municípios quanto à conservação dos seus limites territoriais.

PARECER

Desmembramento de municípios e autonomia local

A lei estadual n. 1.039, de 12 de dezembro de 1953, que alterou a divisão administrativa do Estado de Minas Gerais, desmembrou do Município de Capelinha o distrito de Água-Boa, elevando-o à categoria de Município com as mesmas divisas que lhe foral demarcadas pela lei estadual n. 336, de 28 de dezembro de 1948, quando da sua criação como distrito do Município de Capelinha.

Entendimento do STF sobre desmembramento de municípios

O egrégio Supremo Tribunal Federal tem entendido, em vários acórdãos, que a Assembléia Legislativa dos Estados não pode desmembrar o território municipal para o fim de criar novo Município sem que ouça prèviamente a Câmara dos Vereadores do Município a ser desmembrado (decisões proferidas nas representações ns. 130, 175, 193, 199, 206, 207, 209, 214, 215, 210, 224 e 233).

Ora, no caso de desmembramento do Município de Capelinha, para ser erigido em Município o seu distrito de Água-Boa, a Câmara dos Vereadores de Capelinha, pela resolução n. 15, deu o seu assentimento à criação do novo Município, com sacrifício do seu território, com a única ressalva de que as divisas do novo Município haveriam de ser as descritas na referida resolução.

A Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais, porém, entendeu de traçar ao Município de Água-Boa as mesmas divisas que lhe haviam sido fixadas pela lei estadual n. 336, de 28 de dezembro de 1948, não só com o fim de atender à conveniência da sua população, como porque o território e a população de Água-Boa já constituíam, como distrito do Município de Capelinha, uma unidade administrativa, embora de caráter meramente municipal. Tudo indicava que não deviam ser alteradas as divisas em questão, as quais, quando traçadas, haviam consultado as características inerentes àquele aglomerado humano, não só do ponto de vista geográfico, como do ponto de vista econômico e político. Na criação de novos Municípios não é justo que se desarticulem unidades geográficas, econômicas e políticas, fixando-lhes fronteiras arbitrárias e desgravitando-as do centro habitual dos seus interêsses e das relações humanas de vizinhança e de outras relações de natureza comunitária, a cuja ambiência as respectivas populações já se encontram habituadas.

Com o intuito de atender a tais considerações e, ainda, para que fôssem satisfeitos os requisitos exigidos pela Constituição do Estado de Minas Gerais para a criação de novos Municípios, a Assembléia Legislativa, ao fixar os limites do Município de Água-Boa, antigo distrito de Capelinha, resolveu manter para o novo Município as mesmas divisas que lhe haviam sido traçadas quando criado o distrito do mesmo nome pela lei n. 336, de 28 de dezembro de 1948. Não resulta suficientemente claro das decisões do egrégio Supremo Tribunal se êle entende que, em qualquer hipótese, a criação de novo Município pelo desmembramento do território de Município já existente não possa fazer-se por deliberação exclusiva da Assembléia Legislativa ou sem o assentimento expresso do Município a ser desmembrado, não só quanto ao desdobramento em si mesmo, mas também quanto à extensão e às características da área a ser desmembrada. Do fundamento invocado em vários votos proferidos, nas decisões sôbre a matéria, parece que aquêle ilustre Tribunal entende que o desdobramento depende da aquiescência do Município de que a Assembléia Legislativa pretenda destacar, para criação do novo Município, a porção de território e de população destinada a se transformar em unidade autônoma. Invocam, com efeito, aquêles votos o artigo em que a Constituição federal declara assegurar a autonomia dos Municípios:

“I, pela eleição do prefeito e dos vereadores;

II, pela administração própria, no que concerne ao seu peculiar interêsse e, especialmente:

a) à decretação e arrecadação dos tributos de sua competência e à aplicação das suas rendas;

b) à organização dos serviços públicos locais”.

O poder constitucional dos Estados na criação de municípios

A interpretação em tais têrmos do poder constitucional, imputado aos Estado;, de preceder à divisão administrativa do seu território, organizando os Municípios e lhes fixando os limites da sua jurisdição territorial, resultaria; necessàriamente, na anulação de tal poder, pois, em última análise, caberia aos próprios Municípios decidir sobre as alterações da divisão administrativa e a criação de novos Municípios, mediante desmembramento territorial dos existentes.

Neste caso, o que se estaria aplicando em relação aos Municípios é o que o art. 2° da Constituição dispõe relativamente à subdivisão e ao desmembramento dos Estados. A êstes é que a Constituição assegura a faculdade de se subdividirem ou desmembrarem, mediante voto das respectivas assembléias legislativas, plebiscito das populações diretamente interessadas e aprovação do Congresso Nacional.

Ora, se depende da aquiescência dos Municípios a subdivisão ou o desmembramento dos seus territórios para o fim de se criarem novos Municípios, é evidente que o exercício do poder constitucional dos Estados de proceder à sua divisão administrativa fica subordinado ao consentimento, à aquiescência ou à aprovação das Câmaras dos Vereadores. Criado um Município, êle poderá conservar indefinidamente sob a sua jurisdição o território que a Assembléia Legislativa lhe demarcou ao exercício do seu govêrno, ainda que parte da sua população, em número suficiente para se constituir em unidade administrativa autônoma, reclame a sua emanciparão para melhor atender às suas conveniências e, particularmente, à aplicação dos tributos municipais com que concorre para o erário local em serviços destinados a beneficiá-la de modo mais direto e mais eficaz. O fato, porém, é que, deixando aos Estados a iniciativa da decisão quanto ao desmembramento dos seus territórios para se anexarem a outros ou formarem novos Estados, a Constituição silencia em relação ao desmembramento dos Municípios para a formação de novos. Atalha-se, porém, com o argumento de que a Constituição assegura aos Municípios autonomia, não só pela eleição do prefeito e dos vereadores, como pela administração própria no que concerne ao seu peculiar interêsse e, especialmente:

a) à decretação e arrecadação dos tributos de sua competência e à aplicação das suas rendas”.

O impacto do desmembramento na autonomia municipal

A verdade, porém, é que o desmembramento do território de um Município para a criação de outro Município. mediante o preenchimento das condições prescritas pela Constituição estadual, não atenta contra a autonomia do Município a ser desmembrado.

O Município, de que se desmembra parte do território para a formarão da nova unidade administrativa, continua no gôzo da sua autonomia, não sòmente no que respeita à constituição do seu govêrno, como à decretação e arrecadação dos tributos de sua competência e à aplicação das suas rendas.

O que é defeso aos Estados é intervir na organização do govêrno local na decretação e arrecadação dos tributos de competência do Município, assim como na aplicação das suas rendas próprias. Ora. a formação de novo Município mediante desmembramento de outro não atinge nenhuma das prerrogativas em que a Constituição federal decompõe a autonomia assegurada aos Municípios. O Município desmembrado continuará a exercer todos os poderes que a Constituição federal declara constituírem atributos intangíveis da autonomia por ela assegurada aos Municípios.

E bem verdade que o desmembramento importa em diminuirão da renda arrecadada pelo Município antes do desmembramento do seu território. Entretanto, a Constituição não assegura aos Municípios, em lhes garantindo a autonomia, uma determinada renda. A questão quantitativa nada tem a ver com a qualitativa, ou com a questão relativa aos atributos formais da autonomia. Êstes continuam em tôda a sua integridade a ser, depois do desmembramento, o que eram antes do desmembramento. O Município desmembrado continuará a exercera a mesma competência tributária, e livre de qualquer ingerência quanto à arrecadação e ao emprêgo ou à aplicação de sua receita.

Seria levar muito longe, ou além do seu conteúdo constitucional, o sentido do conceito de autonomia municipal, fazendo derivar dó preceito constitucional que assegura a autonomia dos Municípios a garantia de que não poderão os Estados proceder à criação de novos Municípios sem o consentimento dos existentes, como se a Constituição houvesse garantido aos Municípios a imutabilidade das suas fronteiras e a invariabilidade de sua receita. Nenhuma dessas garantias é conferida aos Municípios pela Constituição. Definindo a autonomia que assegura aos Municípios, a Constituição enumera os seus atributos e entre nenhum dêles se encontra, desde que mantidos os tributos de sua competência e a liberdade quanto à aplicação das suas rendas, o que se refere ao direito do Município a uma determinada renda, ou a continuar com o quantum de receita que vinha arrecadando anteriormente ao seu desdobramento por força do poder constitucional da Assembléia Legislativa de proceder à divisão administrativa do Estado e, portanto, a redivisões de acôrdo com o aumento dá população e da riqueza estadual. No caso em foco, porém, houve o assentimento da Câmara dos Vereadores do Município de Capelinha à criação, com o desmembramento do seu território, do novo Município de Água-Boa. Ao dar, porém, o seu consentimento, a Câmara dos Vereadores fixou os limites do Município a ser criado. Ora, no que se refere à fixação dos limites do novo Município, o interêsse não é só do Município a ser desmembrado, mas, igualmente, do Município a ser criado e, ainda mais, das fronteiras do novo Município depende o preenchimento das condições a que a Constituição estadual subordina a criação de novos Municípios.

No caso da criação do Município de Água-Boa, a Assembléia Legislativa manteve para o novo Município os seus antigos limites distritais, de maneira a não quebrar a unidade administrativa, geográfica e econômica que já tinha quando parte do Município de Canelinha e por serem tais limites os que melhor consultavam as conveniências da população do Município a ser criado.

Em todo caso, na Constituição federal não se encontra outorgada qualquer garantia aos Municípios quanto à conservação dos seus limites territoriais; a Integridade territorial é tão-sòmente assegurada aos Estados, que não poderão ser subdivididos a não ser mediante a própria iniciativa, e, mesmo assim, com o voto das populações diretamente interessadas e aprovação do Congresso Nacional. Ora, se fosse intenção da Constituinte assegurar aos Municípios a mesma garantia, a Constituição o teria estendido expressamente às entidades municipais. Não o fêz, porém. E quando, ao assegurar a autonomia municipal, definiu-a de tal maneira que a limitou exclusivamente aos atributos formais do govêrno autônomo, excluindo-o da ingerência dos. Estados tão-sòmente no que se refere à natureza dos poderes do govêrno local, a que não imputou nem a perpetuidade das suas fronteiras, nem o direito a conservar para o futuro a receita que venha arrecadando, desde que, ao desmembrar o seu território, o Estado não intervenha na organização do govêrno municipal, na decretação dos tributos de sua competência e na aplicação da sua receita.

Conclusão do parecer

Ora, com a criação do novo Município de Água-Boa, o Município de Capelinha continua a exercer, no território que lhe restou depois da sua divisão, todas as prerrogativas enumeradas no artigo 28 da Constituição como atributos essenciais ao conceito constitucional da autonomia assegurada aos Municípios. A criação do Município de Água-Boa, pelo desmembramento do de Capelinha, não retirou, portanto, a êste Município nenhum dos privilégios, prerrogativas ou poderes que a Constituição federal assegura expressamente aos Municípios ao lhes assegurar o gozo de autonomia no que se refere à constituição do seu govêrno, à decretação e arrecadação dos tributos da sua competência, à aplicação das suas rendas e à organização dos serviços públicos locais.

É o meu parecer, s. m. j.

Rio de Janeiro, 10 de novembro de 1956. – Francisco Campos, professor da Faculdade Nacional de Direito.

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