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Técnica Legislativa, de Carlos Medeiros Silva

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Técnica Legislativa, de Carlos Medeiros Silva

REVISTA FORENSE 165

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25/07/2024

* A técnica legislativa, segundo a definição de F. GENY, consiste em um conjunto de preceitos visando a adaptação da lei escrita à sua finalidade específica, que é a direção das ações humanas, em conformidade com a organização jurídica da sociedade.

Pensadores mais antigos como BACON, MONTESQUIEU, BENTHAN e ROUSSET se preocuparam com a feitura das leis e elaboraram regras sôbre o assunto.

Mas foi a codificação civil alemã, decretada no fim do século passado, que despertou a atenção dos juristas para os problemas da técnica legislativa e deu-lhe cunho científico.

Recentemente GEORGES RIPERT dissertou com o brilho habitual sôbre “a arte de legislar” (“Les Forces Créatrices du Droit”, 1955, pág. 346).

Dizia GENY que uma boa, lei, como tôda a obra literária, deve ter unidade, ordem, precisão e clareza (“Le Code Civil, Livre du Centenaire”, 1904, tomo II, página, 996).

É sabido, como comenta RIPERT, que o mau emprêgo de vocábulos, a imprecisão das frases e outros erros de redação das leis, criam dificuldades e embaraços à sua aplicação.

A lei nova deve entrosar-se com os textos que continuam vigentes, tarefa esta que exige perfeito conhecimento dêstes e uma especial acuidade do redator.

A intervenção do Estado na ordem econômica, fenômeno que se acentua e generaliza, tornou ainda. mais árdua e penosa a feitura da legislação. Os técnicos de tonos os matizes passaram a disputar e a concorrer com os juristas na redação dos textos. Mas desconhecendo, aquêles, os princípios gerais da ordenação jurídica e ignorando as peculiaridades de seus variados compartimentos, cometem freqüentes erros e enganos lamentáveis.

Entre nós é bem conhecido o trabalho sôbre a técnica constitucional, de autoria de AURELINO LEAL (“Técnica Constitucional Brasileira”, 1914). Êste ilustre comentarista de nossa primeira Constituição republicana apontou nela vários erros de técnica que ensejaram controvérsias infindáveis.

Em nossas revistas jurídicas se encontram também preciosos estudos sôbre a elaboração e a técnica legislativa como os da lavra de TEMÍSTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI (“REVISTA FORENSE”, vol. 106. pág. 262). ANTÃO DE MORAIS (“REVISTA FORENSE”, vol. 110, pág. 529) e VÍTOR NUNES LEAL (“Rev. de Direito Administrativo”, vol. 2, pág. 429). HÉSIO FERNANDES PINHEIRO alinha regras salutares sôbre o assunto em sua obra sôbre “Técnica Legislativa” (1945).

Para remediar os defeitos da técnica legislativa preconizam os estudiosos uma maior participação dos juristas na elaboração das leis.

FILIPO VASSALI, professor da Universidade de Roma, em 1950, em tese apresentada a um congresso de direito comparado (“REVISTA FORENSE”, volume 148, pág. 50), exaltou a missão do jurista na tarefa legislativa e preconizou a criação de comissões especiais, junto aos órgãos do Poder Executivo, com o objetivo de colaborar mais intimamente com o Legislativo, visando à melhoria dos textos.

Em França, o Conselho de Estado tem desempenhado, em parte; essa função. Existe ali ainda a tradicional “Société d’études legislativas”, criada em 1904, por SALEILLES.

Na Itália, com o mesmo objetivo, há um Departamento Legislativo instalado no Ministério da Justiça. Em outros países também existem órgãos permanentes, fora do Parlamento, destinados ao aprimoramento das leis.

Em 1936, o ministro MACEDO SOARES, então à frente da pasta da Justiça e Negócios Interiores, propôs ao presidente da República a criação, junto a êste Departamento de Estado, de um órgão permanente denominado “Comissão de Estudos, para o progresso do Direito”. com tarefa similar (“REVISTA FORENSE”, vol. 72, pág. 202). Esta Comissão não chegou a funcionar porque o ministro deixava, logo depois, o Ministério.

FILADELFO AZEVEDO, na inauguração do Instituto Brasileiro de Direito Comparado e de Estudos Legislativos, em 1949, convocou os juristas para prestarem o seu concurso ao Congresso Nacional para o desempenho de sua complexa tarefa.

Em várias oportunidades tem o govêrno solicitado a colaboração de Faculdades de Direito, dos Tribunais e de Institutos de Advogados para a elaboração de textos legislativos, como aconteceu com o Cód. Civil e mais, recentemente, os Códs. Penal, de Proc. Civil e de Processo Penal. As Casas do Congresso costumam também ouvir técnicos e especialistas.

Mas, apesar destas providências, tendentes à melhoria da nossa legislação, não raro são postos em vigor textos contraditórios, contendo disposições esdrúxulas e ininteligíveis.

Uma dificuldade freqüente é saber quem redige o novo texto, quais os por êle atingidos, ou melhor, aquêles que não continuam em vigor.

Não basta o princípio legal de que a lei posterior revoga a anterior, quando há conflito, porque fica deferida a cada Intérprete a tarefa de procurar e evidenciar a contradição.

Usa-se, geralmente, uma expressão que diz muito e nada diz: “revogam-se as disposições em contrário”, como se o contrário fôsse de todos conhecido, como se a inexorável presunção – de que a ninguém é lícito ignorar a lei – fôsse uma realidade.

Na cauda das leis se costumam inserir outros “venenos”, que são as “disposições transitórias” destinadas a reger situações pretéritas, presentes e até futuras, permanecendo como um “quisto” na nova ordem legal.

Quanto à redação da linguagem. lembra ANTÃO DE MORAIS, seguindo os conselhos de MONTESQUIEU, que “o estilo das leis deve ser simples: a expressão direta se entende melhor que a expressão refletida. E nada mais necessário de ser imediatamente apreendido do que o sentido das leis”. “No entanto”, prossegue o mesmo autor, “rara é hoje a cláusula legislativa que se consegue compreender sem penoso esfôrço, graças, em boa parte, ao abuso e falta de gôsto e tato no emprêgo da ordem inversa. Se isto já é perigosa doença do estilo, quanto mais grave não se torna ela se sobrevêm, como quase sempre acontece, as complicações das frases Incidentes, que melhor constituiriam parágrafos distintos, as repetições da palavra específica em vez da genérica, da definição em lugar do têrmo próprio, os pormenores inúteis, a adjetivação desnecessária, as tautologias, as longas frases explicativas, em vez das elipses usuais, de sentido certo, e que tanta fôrça imprimem à escrita” (“REVISTA FORENSE”, vol. 110, página 531).

Alguns exemplos, que se poderiam multiplicar, mostram como a má feitura de uma lei enseja situações absurdas. A cobrança de honorários médicos prescrevia em um ano; baixou-se uma lei ampliando êsse prazo para cinco anos. Posteriormente o Congresso Nacional (lei n. 536, de 14 de dezembro de 1948), que entendeu ser muito longo o novo lapso de prescrição, revogou a lei que o protelara, sem restaurar; entretanto, a vigência da regra primitiva. O resultado foi dilatar-se a prescrição até 30 anos, quando o propósito era reduzi-la.

A Lei de Imprensa, elaborada em 1953 (lei n. 2.083, art. 52), fixou em dois meses, da data da publicação do escrito incriminando, o prazo da prescrição do delito. Mas, ó simples decurso dos prazos processuais ultrapassa, de muito, aquêla prazo. Desta forma, não havia, de fato, possibilidades de se punir quem infringisse a Lei de Imprensa. Êste mal acaba de ser remediado em lei recente, que ampliou o prazo para um ano.

Êstes colapsos da técnica ocorrem também em outros países da melhor tradição jurídica. RIPERT protestou contra a inclusão, no texto de leis francesas recentes, de fórmulas matemáticas. Assim é que a lei eleitoral de 1946, em fórmula de difícil entendimento, regula o número de cartazes que os candidatos podem utilizar; na Lei do Inquilinato, de 1948, também há uma fórmula para aferir-se de insolação dos prédios alugados.

Êstes exageros de especialistas tornam a lei ininteligível para a grande maioria da população, cujos interêsses ela regula. São desvios da boa técnica.

Outro defeito muito corrente é o de se incluírem nos textos matérias pertinentes a outros ramos do direito. No Cód. Civil, cuja elaboração foi objeto de criticas acuradas, com RUI BARBOSA à frente, sé encontram disposições de direito público e de direito processual.

E houve época em que, nas caudas orçamentárias, se inseriam preceitos de direito substantivo e adjetivo.

Todo o esfôrço dos legisladores, e especialmente dos juristas, deve concentrar-se no aprimoramento da técnica Jurídica. A tarefa é sôbre-humana. Como disse FRANCISCO CAMPOS, “a legislação é hoje uma imensa técnica de contrôle da vida nacional, em tôdas as suas manifestações”.

Ao Estado liberal, do século passado, sucedeu o Estado intervencionista, que a tudo provê. Daí a pletora de leis, cuja elaboração, ao sabor das contingências do momento, e sob a pressão de interêsses incoercíveis, traz a marca da precariedade e do particularismo.

Mas não poderá haver bom govêrno sem boas leis. É preciso, portanto, que todo o cidadão prestante dê a sua colaboração, como membro das associações de classe, ou profissional isolado, pela palavra escrita ou falada, ao Poder Legislativo, quando empenhado em baixar as leis que o pais reclama.

Sobre o autor: Carlos Medeiros Silva, Advogado no Distrito Federal

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Notas:

* Comentários feitos em reunião do Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio.

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