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Responsabilidade Civil Das Estradas De Ferro – Transporte De Café, de Antônio Alberto Alves Barbosa

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Responsabilidade Civil Das Estradas De Ferro – Transporte De Café, de Antônio Alberto Alves Barbosa

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01/03/2024

SUMÁRIO: PARTE I. 1. Introdução. 2. Ligeira notícia histórica. 3. Medidas tomadas pelas estradas. 4. Tendência para variar a jurisprudência. 5. O Tribunal Federal de Recursos altera a jurisprudência até então dominante. 6. O julgamento dos Srs. ministros JOSÉ DE AGUIAR DIAS e seus brilhantes e substanciosos votos. PARTE II. 7. A tolerância de 1%. 8. A tolerância é legal. 9. A tolerância na legislação comparada. 10. O repêso e o protesto. 11. Mau acondicionamento e causa inerente à própria natureza da mercadoria. 12. A integração da contestação. 13. Conclusão.

PARTE I

INTRODUÇÃO

1. A jurisprudência dominante até fins de 1953 sôbre a responsabilidade das vias férreas pelas perdas verificadas no transporte de café, ou melhor, pelas diferenças entre o pêso da procedência e o do destino, foi radicalmente alterada pelo egrégio Tribunal Federal de Recursos. Assim é que, de setembro de 1953 para cá, essa alta Côrte de Justiça proferiu nada menos do que 23 acórdãos,1 que marcam a apontada mudança.

Hoje, a jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal,2 é mansa e pacífica no sentido de excluir a responsabilidade das estradas de ferro pelas perdas até 1%.

Firmou ainda o egrégio Tribunal Federal de Recursos, sempre com aplausos do pretório excelso, o seguinte: a) o repêso não vale como ressalva ou protesto; b) a perda de pêso, por fôrça das condições higrométricas, não pode ser sofrida pelo transportador; c) o mau acondicionamento da mercadoria transportada é falta do dono da carga, que não pode ser imputada ao transportador.3

Essa salutar e radical mudança na jurisprudência do Tribunal Federal de Recursos encontrou eco em São Paulo, onde o Tribunal de Alçada deu provimento às apelações ns. 8.528 e 8.620, da Fazenda do Estado, para julgar improcedentes as respectivas ações, requeridas por Nioac & Cia. Ltda. e Vidigal Prado Comissária e Exportadora S. A.

Também na apelação n.º 8.326 o juiz CANTIDIANO GARCIA DE ALMEIDA, que de longa data conhece a questão do transporte de café, como titular que foi, e dos mais notáveis, da Vara da Fazenda Nacional em São Paulo, votou vencido, porque neste, como nos dois outros casos citados, de que foi relator, acolhia a tolerância de 1% o como legal.

É auspiciosa essa alteração jurisprudencial, porque a agora firmada, não há como negar, é a que melhor atende à lei e constitui um reclamo do jus aequum. Por isso mesmo, enseja-nos oportunidade de verificarmos que os nossos tribunais evoluem na aplicação do direito; penetram a realidade das questões que lhe são submetidas.

E bem andam em assim procedendo, porque a jurisprudência deve, precisa evoluir, sob pena de trair à sua finalidade. É o caso exato – o de que tratamos – em que a variação dos julgados apresenta-se como “um respiradouro da justiça”, segundo quer CARNELUTTI.

“Considerar que nada está feito enquanto houver ainda alguma coisa por fazer, – nil actum reputanssi quid superesset agendum“, – lembra César, na Farsália, de LUCANO.

A evolução da jurisprudência, como imperativo da lei e do melhor conhecimento das questões, é fator de segurança e de progresso. Demonstra coragem e superioridade por parte dos julgadores, que crescem no conceito de seus jurisdicionados.

A questão foi bem expressada por JOSÉ ANTOLIN DEL CUETO, jurista cubano, na frase “la ley reina y la jurisprudencia gobierna“.4

Sem dúvida, na alteração operada não se nos depara nenhuma instabilidade de julgados ou volubilidade de juízes, que por vêzes é prejudicial à “segurança das relações de vida que o direito disciplina”. Trata-se, sim, de necessário e desejado aperfeiçoamento, que vem propiciar a elaboração de julgados com segurança legal e doutrinária para a certeza do direito.

LIGEIRA NOTÍCIA HISTÓRICA

2. O café, produto valorizadíssimo, como é notório, é ensacado na procedência, quase sempre em sacos usados, que, por isso mesmo, são remendados, serzidos, recosturados, até furos apresentando alguns.

Colhido, beneficiado e ensacado, é o produto levado às estações de estrada de ferro para ser transportado.

Isso ocorre em período de safra, no Estado de São Paulo muito volumosa, pelo que há natural acúmulo nas estações ferroviárias. Sendo um produto básico na economia do Estado e do país, há grande interêsse na rápida emissão dos respectivos conhecimentos, a fim de que passem a girar no mundo dos negócios.

As operações de pesagem e conferência de pêso executam-se em condições bem diferentes. Na procedência, em básculas comuns de armazéns e, no destino, em balanças de pesar caminhões. Naquelas, os sacos são pesados, em geral, em pilhas, de 10 em 10, postos diretamente sôbre a respectiva plataforma; nestas, é tomado o pêso bruto do veículo carregado com 50, 60, 80 e mais sacos de café e dêle é descontada a tara do caminhão para se ter o pêso líquido (cf. ata n.° 77 da Reunião dos Representantes das Ferrovias Paulistas).

De se salientar, ademais, que em um grande número de casos as estradas de procedência não pesam o produto, aceitando o pêso em confiança. Muito comum é também tais estradas pesarem apenas 10 sacos e, pelo resultado obtido, encontrarem o pêso total mediante simples proporção.

As mais das vêzes os cafés percorrem grandes distâncias, que chegam a ser de 500 quilômetros, em linhas de diversas estradas de ferro.

Em face da política de defesa de preços e valorização do produto, as estradas estão sujeitas a normas obrigatórias estabelecidas pelo govêrno, dentre as quais avulta a permanência em armazéns reguladores.

A pesagem do café tôda vez que êle mude de uma estrada para outra seria medida evidentemente impraticável, ressaltando o que de inconvenientes traria para os que com êle negociam, bem como para a economia do país.

*

A lei que regula a responsabilidade civil das vias férreas, dec. legislativo número 2.681, de 1912 (vide nota 5), estabelece, contra elas, o princípio da culpa presumida.

Posteriormente a essa lei, vários outros diplomas legais surgiram, a saber: dec. executivo n.º 10.204, de 30 de abril de 1913, antigo Regulamento Geral de Transportes; dec. n.º 15.673, de 7 de setembro de 1922, Regulamento para Segurança, Polícia e Tráfego; dec. n.º 19.473, de 10 de dezembro de 1930, Lei dos Conhecimentos; dec. n.º 19.754, de 18 de março de 1931, que esclarece e simplifica algumas disposições do anterior; portaria n.º 575, de 23 de novembro de 1931, último Regulamento Geral dos Transportes.

Baseados no apontado princípio da culpa presumida da transportadora, os nossos Tribunais haviam firmado jurisprudência rigorosa ao extremo, para com as ferrovias, deixando muitas vêzes de aplicar os dispositivos das leis posteriores, sob vários fundamentos.

Entendiam, por exemplo, que o repêso, apesar de feito nas condições adiante apontadas, valia como protesto, mesmo depois de promulgado o Cód. de Proc. Civil; que a tolerância regulamentar prevista não era de ser reconhecida; que a citação das várias ferrovias que tomavam parte no contrato de transporte não era de ser decretada, etc.

Essa orientação permaneceu até operar-se a mudança de jurisprudência aqui comentada.

MEDIDAS TOMADAS PELAS ESTRADAS

3. As demandas oriundas das perdas de café no transporte ferroviário vêm de há muito, bastando notar-se que a lei que regula a responsabilidade civil das estradas de ferro é de 1912.5

Essa questão, ademais, preocupou e mereceu estudos especiais de CARVALHO DE MENDONÇA (José Xavier), que ensina: “os usos comerciais impõe certa tolerância dentro de limites razoáveis, que em sua porcentagem varia de acôrdo com a qualidade das mercadorias”.6

Assumindo proporções mais intensas em determinados períodos e de relativa calma em outros, o que é fato é que a questão é sobremodo vetusta.

Em fins de 1950, as ações objetivando indenização por perdas de café atingiram a um volume fora do comum.

Assim é que na Vara da Fazenda Nacional, em São Paulo, foram propostas, de 20 de novembro de 1950 até princípios de março de 1951, 28 ações cujo valor era da ordem de Cr$ 5.000.000,00. Ao mesmo tempo sobejavam ações desta natureza nas Varas da Fazenda Estadual.

Preocuparam-se as estradas de ferro com o problema e várias providências foram tomadas para resolver o assunto.

Na reunião dos representantes das estradas paulistas, foi a questão levantada pela Estrada de Ferro Santos a Jundiaí e mereceu acurados estudos por parte dos técnicos em assuntos de transporte.

Levada que foi a questão ao então ministro da Viação e Obras Públicas, êste, pela portaria n.º 313, de 16 de maio de 1952 (“Diário Oficial” de 12-VII-1952), nomeou uma comissão para estudar uma possível modificação da lei vigente, da qual fazia parte, como presidente, o Dr. A. GONÇALVES DE OLIVEIRA, àquele tempo consultor jurídico do Ministério da Viação e Obras Públicas e depois consultor geral da República.

Essa modificação tinha como principal escopo imunizar as vias férreas da obrigação de indenizar, desde que a perda da mercadoria fôsse igual ou inferior a 1% da quantidade transportada.

O Dr. A. GONÇALVES DE OLIVEIRA, porém, inteirando-se dos fatos e estudando o assunto, julgou desnecessária a inclusão na lei do limite de tolerância proposto, porque estava certo de que os Tribunais, bem examinando a questão, mudariam a jurisprudência, como, aliás, mais tarde veio a demonstrar em parecer que emitiu sôbre o assunto.7 Daí ter declinado do convite que lhe fôra feito.

TENDÊNCIA PARA VARIAR A JURISPRUDÊNCIA

4. Na esfera judiciária, os juízes e tribunais mantinham a antiga jurisprudência contrária às estradas8 embora aparecessem, de quando em quando, alguns julgados esparsos, decretando a improcedência de ações dessa natureza.

Assim, em São Paulo, em janeiro de 1949, foi julgada improcedente, em primeira instância, uma ação requerida por Cunha Bueno & Cia. contra a Estrada de Ferro Santos a Jundiaí.9

Em princípio de 1952, o juiz JOÃO CARLOS SIQUEIRA, da Vara da Fazenda Estadual, julgou improcedente ação requerida contra a Fazenda do Estado de São Paulo (Estrada de Ferro Sorocabana), em longa e bem fundamentada sentença, em que, com rara superioridade, diz textualmente: “Reconhecemos a existência dos vários venerandos arestos do egrégio Tribunal, em que se arrima, no ponto em exame, a autora. Reconhecemos, por outro lado, que já tivemos ensejo de esposar o mesmo entendimento. Não faltaremos, porém, com a devida reverência às decisões superiores, se dissermos que vínhamos esposando o mesmo entendimento sem plena satisfaçãointelectual, ou com certa hesitação” (o grifo é nosso).10

O juiz CANTIDIANO GARCIA DE ALMEIDA, na Vara da Fazenda Nacional, após bem estudar a matéria, passou a julgar as ações procedentes apenas em parte, uma vez que exclui sistemàticamente da condenação as porções correspondentes às papeletas de repêso11 de que constasse a ressalva “com furos” ou “com pequenos furos” quanto à sacaria.12

Tais sentenças sempre mereceram confirmação na superior instância. Êsse ilustre magistrado, aliás, iria liderar, mais tarde, a mudança da jurisprudência no Tribunal de Alçada, como vimos no início.

No Tribunal Federal de Recursos o Sr. ministro DJALMA DA CUNHA MELO, relator da apelação cível n.º 1.824, entre artes Vidigal Prado Comissária e Exportadora e Estrada de Ferro Santos a Jundiaí, acolheu a defesa desta, para julgar improcedente a ação.13 Dêle divergiram, porém, os demais ministros, tendo surgido embargos que foram, a final, rejeitados.

Notam-se, pois, no Poder Judiciário, como se disse, manifestações esparsas no sentido de considerar melhor a questão e de conhecer as verdadeiras condições do transporte ferroviário, de maneira a não se fazer injustiça às vias férreas, que eram, como são, as mais das vêzes, completamente estranhas ao acontecimentos que dão margem às eventuais diferenças entre o pêso da procedência e do destino.

O TRIBUNAL FEDERAL DE RECURSOS ALTERA A JURISPRUDÊNCIA ATÉ ENTÃO DOMINANTE

5. Foi, contudo, o egrégio Tribunal Federal de Recursos que, reunindo uma plêiade de valores novos e brilhantes, sentiu os influxos do maravilhoso progresso realizado pelos modernos meios de transporte, e se capacitou de que a lei deve ser aplicada com excepcionais cuidados, depois de pacientemente escoimada do entendimento superado que se lhe timbrava dar. Ou melhor: resolve aplicar realmente a lei, examinando-a no seu conjunto, notando e obedecendo aquilo que até então não se notava e não se obedecia.

Prova eloqüente do acêrto dos julgados proferidos é a circunstância de que o pretório excelso, em todos os casos em que houve recurso extraordinário, manteve as decisões recorridas, firmando assim, em definitivo, nova jurisprudência.

O JULGAMENTO DOS SRS. MINISTROS JOSÉ DE AGUIAR DIAS E SEUS BRILHANTES E SUBSTANCIOSOS VOTOS

6. Os Srs. ministros DJALMA DA CUNHA MELO,14 ALFREDO BERNARDES,15 HENRIQUE D’ÁVILA16 e MACEDO LUDOLF,17 sempre acolheram as razões de defesa das estradas de ferro.

Os Srs. ministros CÂNDIDO LOBO e CUNHA VASCONCELOS,18 que outrora votavam contra as transportadoras, têm admitido a tolerância de 1% e votado a favor destas, reiteradamente.

O Sr. ministro J. F. MOURÃO RÚSSEL, nos julgamentos em que tem tomado parte, tem-se colocado ao lado dos que acolhem a defesa das vias férreas.

Os Srs. ministros ELMANO CRUZ19 e JOÃO JOSÉ DE QUEIRÓS20 têm votado vencidos contra as transportadoras.

O Sr. ministro JOSÉ DE AGUIAR DIAS, profundo conhecedor dêsse ramo do Direito, autor de livros especializados do porte de “Da Responsabilidade Civil” e de “Cláusula de não-indenizar”, enfrenta então a matéria, examina-a nos seus escaninhos, e, através de argumentos sòlidamente jurídicos, que atendem integralmente à realidade existente, coloca-a nos seus devidos têrmos para fazer rigorosa justiça. É êsse ilustre ministro quem quebra o tabu da culpa presumida, tabu êsse que se erigiria em muralha chinesa que impedia o real exame da questão. Mostra êle que “se há presunção de culpa contra a estrada por haver recebido a mercadoria sem protesto, deve haver também, lógica e justamente, presunção de culpa contra o dono que a recebeu sem protesto”.21

Provocou AGUIAR DIAS, em suma, aquela variação de jurisprudência de início referida e querida por CARNELUTTI, que chega como “respiradouro da justiça”.

De fato, todos os pontos firmados, quer pelo Sr. ministro AGUIAR DIAS, nos recursos de que foi relator, quer pelos demais senhores ministros, nos venerandos acórdãos em que deram pela improcedência das ações respectivas, estão alicerçados em sólidos fundamentos jurídicos, além de atenderem perfeitamente bem aos fatos ocorrentes.

Apenas num ponto, data venia, divergimos dos egrégios julgadores: é a questão da citação das demais ferrovias partícipes do contrato de transporte para integrar a contestação, o que nos parece um imperativo da moderna processualística e do transporte ferroviário. A êste ponto dedicaremos a parte final destas notas.

PARTE II

A TOLERÂNCIA DE 1%

7. O Regulamento Geral de Transportes, não há como sustentar-se o contrário, tem a função de regulamento do dec. legislativo n.º 2.681, de 1912. Regula aquilo que a lei não poderia ter regulado.

Ora, o Regulamento Geral de Transportes, de forma coerente com o dec. legislativo n.° 2.681, estabeleceu a tolerância de 1%. A tolerância é inafastável, constituindo princípio universalmente aceito. De se notar, ainda, que tal tolerância não representa novidade criada pelo Regulamento Geral de Transportes; vem de há muito, como dentro em pouco se demonstrará.

O Regulamento Geral de Transportes nada mais fez do que estabelecer, de forma igual à que já o fôra anteriormente, o quantum da tolerância e atender a princípios e determinações legais.

Releva notar-se – e êsse ponto é importantíssimo – que, como é óbvio, a Lei da Responsabilidade Civil (dec. legislativo n.º 2.681, de 1912) é substantiva. E tanto o é que o decreto executivo vindo a público logo em seguida, isto é, em 30 de abril de 1912, e sob o n.º 10.204, já dispunha no art. 132, § 2.º:

“A verificação da pesagem dos volumes na estação de destino deverá ser feita pelo pessoal do consignatário, em presença do da estrada, e nenhuma restituição será feita desde que a diferença não exceda de 1% do pêso mencionado no despacho”.

Aliás, a própria Lei de Responsabilidade Civil deixa claro que carece ser regulamentada. Assim é que no art. 9.°, por exemplo, ao tratar da prescrição, declara expressamente que o prazo em que deve ser entregue a mercadoria será fixado pelos regulamentos.

Como se vê, a questão é bem antiga e não data do regulamento aprovado pelo govêrno da República pela portaria número 575, de 23 de novembro de 1939, por intermédio do Sr. ministro da Viação, (arts. 68, § 3.°, e 165, h).

O próprio Regulamento para Segurança, Polícia e Tráfego de Estradas de Ferro, baixado pelo dec. n.° 15.673, de setembro de 1922, também faz referência, no art. 118, parág. único, a que:

“Em qualquer caso se terá em consideração a diminuição espontânea de pêso, conforme a natureza e o grau de fragilidade do objeto em relação aos abalos naturais do meio de transporte”.

CARVALHO DE MENDONÇA, conforme inicialmente demonstrado, não é estranho às circunstâncias que determinam a perda de pêso da mercadoria transportada (v. “Tratado”, vol. 5, n.º 45, pág. 46, edição de 1938), nem às tolerâncias, das quais cuidou acuradamente, concluindo que elas constituem uso e costume comercial dos mais remotos.

Com a sua grande autoridade, mostra, já ficou dito, que “os usos comerciais impõem certa tolerância dentro dos limites razoáveis, que em sua percentagem varia de acôrdo com a qualidade das mercadorias”.

Releva notar ainda que a tolerância constitui preceito especial do sistema legal de medidas e é objeto de legislação especial.

O engenheiro LUÍS ORSINI DE CASTRO, acatado técnico em matéria ferroviária, salienta, em parecer de que nos dá notícia a ata n.º 77, de 16 de maio de 1951, da Reunião dos Representantes das Ferrovias Paulistas:

“As tolerâncias estabelecidas no artigo 68 do Regulamento Geral de Transportes e no seu anexo n.º 3, foram inequìvocamente consagradas ou corroboradas por dispositivos claros da portaria n.º 63, de 17 de novembro de 1944 (publicada no “Diário Oficial”, da União, de 25-XI-1944, e no Boletim do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, número 124, de dezembro de 1944, pág. 76), por sua vez baixada em cumprimento ao disposto no art. 34 do Regulamento para execução do dec.-lei n.º 592, de 4 de agôsto de 1939, sôbre o sistema legal de unidades de medidas, Regulamento êsse aprovado por dec. federal n.º 4.257, de 6 de junho de 1939 (publicado no “Diário Oficial”, da União, de 17-VI-1939, e no Boletim daquele Ministério, n.° 59, de julho de 1939, pág. 71).

“Essas tolerâncias “admissíveis para os erros de medições de massas ou pesagens” são impostas pela impossibilidade mesma de se evitarem pequenas diferenças nos resultados de tais operações, ou melhor, pela fatalidade de tais erros”.

Em seguida, mostra ser impossível pesagens feitas em balanças diferentes, ainda que pelo mesmo observador, apresentarem resultados rigorosamente iguais, do mesmo modo que as realizadas por observadores diversos, ainda que servindo-se da mesma balança. Daí decorrem erros inevitáveis, a saber: a) êrro instrumental; b) êrro pessoal (v. ata n.º 77 da Reunião dos Representantes das Ferrovias Paulistas).

Um ponto que nos parece importantíssimo é o seguinte: não há possibilidade de se considerar as pesagens como certas e, portanto, hábeis para apresentar um resultado capaz de indicar se houve ou não perda, se esta se verificou durante o transporte, ou durante o tempo em que a mercadoria estêve sob a guarda da ferrovia. Basta atentar-se para a circunstância de que, em São Paulo, transitaram pelas linhas da Estrada de Ferro Santos a Jundiaí, vindas de outras vias férreas, em 1952, 4.918.005 sacas de café, ou 295.080.013 quilos. E, agora, o principal: a mesma estrada entregou a mais do que o pêso da procedência 290.018 quilos. É evidente a variação, e, nessa conformidade, jamais a papeleta de repêso poderá ser considerada como meio hábil para servir de base a uma ação.

Tem que haver uma tolerância, é evidente.

A TOLERÂNCIA É LEGAL

8. A questão ficou, porém, superada, em virtude de ter o egrégio Tribunal Federal de Recursos22 acolhido a tese sustentada pelo Dr. A. GONÇALVES DE OLIVEIRA, aceita in totum pela Procuradoria da República (“Diário da Justiça”, da União, de 9-VIII-1954, pág. 8.048), de que o dec. n.º 19.473, de 10 de dezembro de 1930, deu fôrça de lei ao Regulamento Geral de Transportes.

De fato, o art. 10 do aludido diploma legal dispõe:

“Os conhecimentos de despacho de bagagem, encomenda, animais, valores, transportes a domicílio, continuarão a reger-se pelo Regulamento Geral de Transportes, que subsistirá em vigor, mesmo no concernente a mercadorias, em tudo quanto não colida com as disposições dêste decreto e da lei n.º 2.681, de 7 de dezembro de 1912”.23

O Regulamento, consoante tem sido reiteradamente proclamado, não colide, antes se harmoniza, de forma a mais perfeita, quer com o dec. n.º 19.473, quer com a lei n.º 2.681, de 7 de dezembro de 1912. Convém não omitir que o art. 9.° do dec. legislativo n.º 2.681, tratando da prescrição, faz referência aos dispositivos regulamentares.

Indubitável, pois, a fôrça de lei dada ao Regulamento dos Transportes pelo mencionado dec. n.º 19.473.

Cabem bem aqui as palavras do Dr. CANTIDIANO GARCIA DE ALMEIDA ao relatar a apelação n.º 8.528, no egrégio Tribunal de Alçada de São Paulo: “Não mais se sustenta a invocação da sentença, a mesma sempre repetida, inclusive pelo relator do acórdão, tanto em primeira como em segunda instância, de que o Regulamento dos Transportes, simples regulamento, não consegue se sobrepor “à presunção legal de responsabilidade das ferrovias, decorrente do dec. legislativo n.º 2.681, de 1912”.23-A

Não há dúvida que o citado dec. federal n.º 19.473, baixado pelo Govêrno Provisório, que chamara a si, “em tôda a sua plenitude, as funções e atribuições não só do Poder Executivo, como também do Poder Legislativo” (cf. Prof. VALDEMAR FERREIRA, “O Conhecimento do Transporte Ferroviário”, ed. 1932, pág. 37), tem fôrça de lei, como reiteradamente têm reconhecido todos os nossos Tribunais, inclusive o Supremo. Tal decreto federal, aliás, é conhecido como “Lei do Conhecimento”.

VÍTOR NUNES LEAL, em magnífico e completo estudo sôbre “Lei e Regulamento” (v. “Rev. de Direito Administrativo”, vol. I, pág. 384), salienta que, “no tocante às leis do Govêrno Provisório, instituído em 1930, êsse exame tem de ser ainda mais cuidadoso, porque os atos, tanto legislativos como regulamentares, eram expedidos mediante decretos, e não havia na chamada “Lei Orgânica do Govêrno Provisório” (dec. n.º 19.398, de 11 de novembro de 1930) disposições especiais instituindo uma competência regulamentar. Além disso, a numeração dos decretos era seguida, quer se tratasse de lei, quer se tratasse de regulamentos. Se o intuito do poder público é alterar alguma das disposições legais em vigor, está obrigado a servir-se da lei formal, não lhe bastando para isso o regulamento”.24

Ora, em seu citado livro “O Conhecimento do Transporte Ferroviário”, o Prof. VALDEMAR FERREIRA assinala que, de simples documento comprobatório da recepção da mercadoria pela emprêsa de transporte e de sua obrigação de entregá-la no lugar do destino, transformou-se o conhecimento em título representativo da própria mercadoria, dotado de poder circulatório, por via de endôsso, em virtude do dec. n.º 19.473.

Evidente, pois, o intuito do poder público de alterar disposições legais em vigor, pelo que só lei poderia baixar.

Aliás, VALDEMAR FERREIRA (ob. cit., págs. 39-40) observa que a lei (refere-se ao dec. n.º 19.473), sem embargos de lhe não dar (ao conhecimento) a fôrça de escritura pública, como fêz o Cód. de Comércio, deu-lhe feitio todo especial, emprestando-lhe requisitos capazes de lhe conferir liquidez e certeza. E logo adiante, ao encerrar o inciso, ainda aqui considera fel o dec. n.º 19.473.

Dúvida não há, conseguintemente, de que o decreto em tela – n.° 19.473, de 10 de dezembro de 1930, lei do conhecimento ferroviário – deu fôrça legal ao Regulamento de Transportes, em tudo que com êle não colide, nem com o dec. legislativo n.° 2.681, de 1912.

Já verificamos de forma clara que tais diplomas legais (dec. legislativo número 2.681, dec. n.º 19.473 e a portaria com a qual baixou o Regulamento Geral de Transportes) se harmonizam, de maneira perfeita, inclusive completando-se.

Deflui, dessarte, que a tolerância de 1% prevista constitui preceito legal, e como tal tem que ser aplicada.

Deixar de reconhecê-la será desatender à lei.

De seguir-se, pois, o exemplo do juiz CANTIDIANO GARCIA DE ALMEIDA25 atendendo à recomendação de PORTALIS: “les dispositions de la loi ne doivent jamais être éludées“.

A jurisprudência é hoje mansa e pacífica no sentido de acolher a tolerância de 1%.

O Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de reconhecer expressamente tolerância.26

TOLERÂNCIA NA LEGISLAÇÃO COMPARADA

9. Na legislação comparada encontramos a tolerância como regra.

O mesmo Dr. LUÍS ORSINI DE CASTRO, que fêz parte da Comissão de Redação do Regulamento Geral de Transportes, acentua que a Comissão Redatora do Estatuto de 1939 (Regulamento Geral de Transportes), diante da necessidade de fixar a tolerância e tendo estudado e pesquisado, meticulosamente, as normas a estabelecer, acabou por se inspirar nos arts. ns. 274 e 276 do Regulamento General de Ferrocarriles argentino, de 12 de setembro de 1936.27

Esclarece ainda o Dr. ORSINI que êsse regulamento argentino havia entrado em vigor em 1.º de janeiro de 1937. Fôra elaborado por altas autoridades daquele país em matéria de técnica e jurisprudência ferroviárias. Era, então, um dos mais recentes e mais completos estatutos da espécie que à Comissão fôra dado manusear. Natural, pois, que esta nêle se inspirasse, para melhorar dispositivos concernentes às quebras ou diferenças naturais de pêso ocorridas durante o transporte, dos regulamentos brasileiros.

Daí a redação do § 3.° do art. 68 e do anexo n.° 3, e que faz referência, do Regulamento Geral de 1939.

O REPÊSO E O PROTESTO

10. O repêso que dá origem às papeletas, com base nas quais são intentadas as ações contra as vias férreas, é feito de acôrdo com o art. 68, § 1.º, do Regulamento Geral de Transportes, que dispõe:

“A verificação de pêso em viagem ou no destino deve fazer-se, sempre que possível, quando não retarde o transporte ou a entrega.

§ 1.º Efetuar-se-á obrigatòriamente, havendo meios, quando:…

d) fôr pedida pelo consignatário antes da retirada.”

Êsse dispositivo é a regulamentação do art. 117 do dec. n.º 15.673, de 7-IX-1922, verbis:

“Na estação de destino, poder-se-ão verificar os erros de pêso e de frete porventura cometidos na estação de despacho. Neste caso, quando a pesagem ou contagem forem feitas a pedido do destinatário, as despesas correspondentes a tais operações correrão por conta dêste, uma vez que se apure igual ou maior quantidade do que a consignada no conhecimento”.

Evidencia-se, pois, que o repêso tem por objetivo corrigir erros de pêso e de frete porventura cometidos na estação de despacho.

Não é, portanto, medida hábil para suprir o protesto, a que a lei impõe solenidade especial.

Em verdade, a reclamação ou protesto, pela relevância que assume na execução do contrato de transporte, exige precauções específicas que a lei define com clareza.

Eis o que diz o art. 120 do citado dec. n.° 15.673:

“As verificações que os destinatários tiverem a fazer, na estação de destino, sôbre mercadorias que apresentem sinais externos de falta ou avaria, deverão ser feitas em presença do agente da estação e de mais duas testemunhas”.

E o Regulamento de Transportes estabelece minuciosamente o modo de apurar, com exatidão, as responsabilidades, tanto da estrada entregadora da mercadoria, como do destinatário recebedor, nos seguintes dispositivos:

“Art. 148…

a) as reclamações por avarias ou perda parcial devem ser apresentadas por escrito ao chefe da estação pelo interessado, antes da retirada das expedições”.

Art. 150. As verificações julgadas necessárias pelo destinatário deverão ser feitas em presença do agente da emprêsa e de duas testemunhas idôneas, a ela estranhas.

§ 1.° As faltas e avarias serão de forma completa e precisa reduzidas a têrmo, assinado pelo chefe da estação e pelo consignatário, ou seu preposto autorizado, mencionando-se com clareza o número, natureza e pêso dos objetos em falta, dos existentes avariados e intatos, bem como a natureza e extensão de cada avaria, que deverá ser descrita circunstanciadamente e avaliada”.

“Art. 151. Lavrado o têrmo, de conformidade com o disposto no artigo anterior, os volumes deverão ser retirados pelo consignatário”.

Como se vê, pois, bem diferentes são as solenidades legais exigidas para o têrmo de reclamação das prescritas para o simples repêso.

Êsse repêso é feito em balanças de pesar veículos, sem necessidade de serviço braçal, nos caminhões carregados, após a retirada da mercadoria dos armazéns da estrada.

Tais balanças são instrumentos grosseiros pelo seu grande tamanho e resistência, e não servem para pesagens acuradas, como seria de exigir-se em se tratando de apurar-se a falta de pêso de mercadoria.

Já mostramos, neste comentário, como são efetuadas tais operações.

Se não bastassem os dispositivos citados para evidenciar, quantumsatis, a completa diferença que existe entre o repêso e o protesto ou têrmo de reclamação e o valor que cada um dêles assume no campo jurídico, temos, ainda, para evidenciar a precariedade daquele, o estabelecido no art. 756 do Cód. de Processo.

Comentando êsse artigo, diz o desembargador JOÃO M. CARNEIRO LACERDA: “A responsabilidade civil das estradas de ferro pela perda total ou parcial, furto ou avaria das mercadorias que recebem para transportar, é regulada por lei especial, qual seja o citado de decreto n.° 2.681, de 1912. Mas essa lei que define direitos e obrigações também não fixou normas pelas quais se devam fazer efetivos aquêles direitos. Provendo a êsse respeito, não há dúvida, preencheu o Cód. de Processo uma sensível lacuna. Dispõe o art. 756, ora comentado, que se o destinatário recebe a bagagem, ou mercadoria, sem protesto, presume-se que a entrega se deu em bom estado e na conformidade do documento de transporte. Essa presunção, porém, é juris tantum, pois que admite prova em contrário, diz o texto e o confirma o § 4.º do artigo, pelo fato de admitir ação contra o transportador que agiu com fraude, ainda quando não tenha havido protesto no ato do recebimento e entrega ou nos prazos fixados” (“Código de Processo Civil Interpretado”, vol. IV, págs. 293-294).

Na papeleta de repêso não fazem os consignatários ou recebedores qualquer ressalva.

Cabem bem aqui as palavras do Prof. JOÃO BONUMÁ, catedrático da Universidade de Pôrto Alegre: “Quando o conhecimento ou documento de transporte já tiver sido devolvido ao transportador sem a ressalva nêle lançada pelo destinatário, ou seu representante, o protesto se fará judicialmente, com citação pessoal do transportador, ou de seu representante, ou agente, nos têrmos prescritos pelos arts. 720 e segs. do Cód. de Processo para os protestos, notificações e interpelações em geral” (“Direito Processual Civil”, 3.° vol., págs. 450-451).

HUGO SIMAS, tratando da hipótese, observa que “do recebimento começa a correr o prazo para a reclamação, e, pois, se êle se verifica sem protesto, dentro em três ou cinco dias, conforme se trate de bagagens ou de mercadorias, e presumida a entrega em bom estado e em conformidade com o documento de transporte” (“Comentários ao Código de Processo Civil”, ed. “REVISTA FORENSE”, vol. VIII, pág. 399).

Dir-se-ia: mas a questão é que o repêso equivale ao protesto, pelo que deverá entender-se êste como efetivado tôda vez que tenha havido repêso. Não, porque na técnica ferroviária e de acôrdo com os usos e costumes existentes são êles coisas completamente diversas, conforme demonstrado (vide, além das aqui feitas, as observações sôbre a tolerância de 1% neste comentário).

Ressalte-se que o egrégio Supremo Tribunal Federal já estabeleceu a necessidade do protesto de acôrdo com o artigo 756 do Cód. de Proc. Civil (cf. “Jurisprudência” in “Diário da Justiça”, da União, de 12-5-1950, pág. 1.341).

O Sr. desembargador PERCIVAL DE OLIVEIRA, do Tribunal de Justiça de São Paulo, sempre entendeu que o repêso não equivale ao protesto.28

A exoneração do transportador exsurge, na falta dêste, dos têrmos expressos no art. 8.° do dec. n.° 2.681:

“O pagamento do preço do transporte feito pelo destinatário, e bem assim o recebimento da mercadoria sem reserva ou protesto, exonerará a estrada de ferro de qualquer responsabilidade”.

É também essa exoneração emerge do art. 109 do Cód. Comercial:

“Não terá lugar reclamação alguma por diminuição ou avaria dos gêneros transportados, depois de se ter passado recibo de sua entrega sem declaração de diminuição ou varia”.

Deflui, por conseguinte, ultima ratio, ou o interessado deve subordinar-se às solenidades previstas para o têrmo de reclamação, ou intentar o protesto disciplinado no art. 756 do Cód. de Processo.

Pedir apenas o repêso, cuja finalidade outra, para depois acionar a transportadora, parece-nos contra legem.

MAU ACONDICIONAMENTO E CAUSA INERENTE A PRÓPRIA NATUREZA DA MERCADORIA

11. Tanto o mau acondicionamento como o vício intrínseco da mercadoria ou causa inerente à sua própria natureza provocam inevitáveis perdas por ocasião de transporte. São causas eliminadoras da responsabilidade da via férrea, de acôrdo com o dec. legislativo n.° 2.681, de 1912, art. 1.°, 4.ª.

O café está nesse caso.

Tornou-se pacífica, ao se verificarem as primeiras tendências para variar a jurisprudência reinante,29 a exclusão da responsabilidade do transportador pelas faltas verificadas nos cafés correspondentes às papeletas de repêso das quais constassem as observações “com furos” ou “com pequenos furos”, sem se cogitar do limite de tolerância. Vale dizer: havendo a observação, a irresponsabilidade da transportadora era total.

Considere-se, porém, que na técnica e linguagem ferroviárias as expressões – sacos serzidos – sacos recosturados – sacos remendados – sacos usados, com furos – são sinônimas, porque tôdas são usadas, indistintamente, para significar que o acondicionamento não é perfeito.

Tôdas, por conseguinte, excluem a responsabilidade pela perda.

A outra causa excludente é a causa inerente à própria natureza da mercadoria.

O café está sujeito, por motivos ligados à sua natureza, a perda de pêso desde que verificadas determinadas condições.

Cabe notar que a legislação de diversos países europeus dispõem sôbre a isenção de responsabilidade das estradas de ferro quando a falta observada no destino deriva de causas inerentes à natureza da mercadoria.30

Entre nós deve ser citada a autoridade de JOSÉ DE AGUIAR DIAS, que ensina: “Em matéria de transportes de mercadorias, costuma-se exonerar a responsável em face de deterioração da coisa por vício próprio ou em face de sua natureza peculiar”.31

O Serviço Técnico do Café da Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo emitiu parecer em que informa que, em regra, o café do planalto quebra meio quilo em seis meses, ou um quilo por ano. A quebra poderá ser maior ou menor, podendo também ser, em parte, recuperada no ambiente úmido de Santos.

O café, até chegar ao destino, percorre grandes distâncias, por vêzes 500 quilômetros, em linhas de diversas estradas e está sujeito a reiteradas operações de carga e descarga. Essa circunstância provoca, inevitàvelmente, perdas, não obstante o cuidado das transportadoras.

Não deve ficar sem referência que, por fôrça da política de defesa de preços e valorização do café – a benefício dos que produzem ou negociam com o produto – há normas obrigatórias estabelecidas pelo govêrno para as estradas de ferro.

Dentre elas, a que mais profundamente altera o regime dos contratos de transporte (art. 111 do Regulamento Geral de Transportes) é o armazenamento em armazéns reguladores, onde os cafés demoram meses, conforme a sua época de embarque.

As estradas ficam sujeitas a longa demora na arrecadação de seus fretes, e são agravadas com os ônus decorrentes de carga e descarga, vigilância, fiscalização e conferência nos armazéns reguladores.

A carga e descarga, bem como a demora nos armazéns, concorrem para o vazamento e a perda parcial de café, principalmente nos casos de mau acondicionamento.

O armazenamento ainda produz secagem extraordinária do grão de café, com perda fatal de pêso, e fermentação interna com aumento de volume.

O pêso dos grãos vegetais, que, por sua própria natureza, contêm água em grande proporção na sua estrutura íntima, depende do grau de secagem inicial, anterior ao despacho, e do estado higrométrico do ar durante o transporte, bem como durante o armazenamento, no caso do café.

A perda de água se traduz em perda de pêso fatal e independentemente de ação ou omissão do transportador, pelo que se enquadra no disposto no n.º 2 do art. 1.º do dec. n.º 2.681:

“2. que a perda ou avaria se deu por vício intrínseco da mercadoria ou causa inerente à sua natureza”.

É o que está também previsto no parágrafo único do art. 118 do dec. número 15.673, de 7 de novembro de 1922:

“Parág. único. Em qualquer caso se terá em consideração a diminuição espontânea de pêso, conforme a natureza da mercadoria…”

INTEGRAÇÃO DA CONTESTAÇÃO

12. A necessidade de citação das diversas estradas de ferro que tomam parte no transporte da mercadoria, para integrar a contestação, parece-nos evidente.

Entendem-na desnecessária em virtude dos arts. 14 e 15 do dec. legislativo n.º 2.681, de 1912.32

Mas, justamente em virtude dêsses artigos, seria de tôda a conveniência a integração. Proporcionaria às diversas vias férreas oferecerem, na própria ação, as suas razões de defesa.

Evitar-se-ia perda de tempo e de dinheiro.

Atender-se-ia ao princípio da economia processual, tão almejada pela processualística moderna.

Por que sobrecarregar de ações as Varas, geralmente da Fazenda Pública, sem necessidade? Por que forçar gastos elevados se tudo poderá ficar resolvido numa mesma ação de maneira harmônica e definitiva?

No caso em tela há que considerar mais o seguinte, que é capital:

A mercadoria transita por várias estradas. As vêzes três, quatro, ou mais.

A acionada quase sempre não tem elementos para saber o que ocorreu nas linhas das demais, de forma a poder fazer uma defesa judicial, dentro do prazo da contestação.

Resultado: citada, pede a acionada sejam as demais vias férreas que participaram do contrato de transporte também citadas para integrar a contestação. Indeferido o pedido, prossegue a ação contra uma única ferrovia, sem que dela tomem conhecimento as outras e a demanda prolonga-se por um, dois ou mais anos.

Chegado o momento da liquidação, começa a dificuldade. Não há mais elementos: tudo tornou-se precário pela ação do tempo. Havendo confiança recíproca ou ambiente propício tudo se acerta. Mas, se não houver?

Diz-se: use-se do direito regressivo; movam-se ações com base no art. 15 do dec. legislativo n.° 2.681.

Mas… acionaram-se mutuamente as estradas?

A conseqüência seria a supressão do tráfego mútuo, básico no sistema ferroviário. Que não sofrerá com isso a economia do país!?

Nenhuma estrada mais forneceria informes às demais, sem antes ouvir seu advogado, a fim de se não comprometer.

E, entre nós, em que a maioria das estradas são de propriedade do govêrno, como se agiria?

São perguntas que estão a indicar a necessidade da citação dos co-partícipes do contrato de transporte.

Não é demais lembrar aqui a antiqüíssima lição de VINNIUS, que já dizia: “o contrato de transporte é um contrato bonae fidei e por isso se encara à luz dos princípios da boa-fé e da eqüidade, apreciando os fatos não à letra da lei, mas em consideração à vontade implícita das partes e à realidade dos negócios”.33

Se cada estrada fôsse descarregar tôda a mercadoria nos pontos de contato, examiná-la e averiguar as suas condições, para prosseguir no transporte, seria uma catástrofe para o comércio e para as necessidades públicas.

Imagine-se, no auge das safras de café, de algodão e outros produtos do Estado de São Paulo, adotarem as ferrovias tal medida… Teria conseqüências imprevisíveis.

Lembre-se que o dec. legislativo número 2.681 não é contrário à medida. Nada há nêle que a impeça.

Por sua vez, o Cód. de Proc. Civil, no art. 91, determina que o juiz, quando necessário, ordene a citação de terceiros para integrarem a contestação.

O egrégio Tribunal Federal de Recursos sempre se tem mostrado favorável a que se proceda à citação do co-responsável.

Na hipótese comentada, parece que essa citação não tem sido ordenada pelo Tribunal apenas porque as ações têm sido julgadas de maneira mais favorável às estradas, de forma que a medida tornar-se-ia ociosa.

Os ilustres Srs. ministros CUNHA MELO e ELMANO CRUZ têm tido oportunidade de se manifestar a respeito.

O que é certo, porém, é que a integração da contestação, nesses casos, é um imperativo da nova processualística e das peculiaridades do transporte ferroviário.

CONCLUSÃO

13. As conclusões a que leva o estudo da matéria são as seguintes:

a) A tolerância de 1% prevista no Regulamento Geral de Transportes é legal, visto como não colide, em absoluto, nem com o dec. legislativo n.º 2.681, de 1912, nem com o dec. n.º 19.473, de 1930. Sendo êste lei, pelas razões expostas, deu expressamente fôrça de lei também a Regulamento Geral de Transportes.

b) O repêso não equivale ao protesto. Considerar de forma diferente é desatender à lei e, portanto, implica agir contra legem.

c) As estradas de ferro são obrigadas a aceitar a mercadoria. O café, produto valorizadíssimo, necessita ser transportado nos meses de safra, que no Estado de São Paulo é de proporções enormes: Para atender, pois, à economia nacional, as estradas de ferro, na maioria propriedade do Estado ou da União, procuram evitar todo e qualquer congestionamento. Assim, quando o estado da sacaria é precário, limitam-se a fazer constar dos conhecimentos – “sacaria usada”, “sacos serzidos”, “sacos recosturados”, “sacos com furos ou com pequenos furos” – expressões sinônimas na linguagem técnico-ferroviária e tôdas significadoras do precário acondicionamento. Constituem, dêsse modo, tais observações, ressalva quanta ao estado do acondicionamento.

d) A citação de tôdas as estradas de ferro partícipes do contrato de transporte é um imperativo da moderna processualística e do transporte ferroviário.

De tudo conclui-se que a orientação atualmente adotada pela jurisprudência é a que mais se coaduna com a lei e com o jus aequum, pelo que a transformação operada atende à lição de JOSSERAND: “os direitos civis são protegidos pela lei, salvo quando sejam exercidos num sentido contrário ao seu fim econômico e social. O juiz deve inclinar-se sôbre o espírito e as necessidades de sua época, apreciar se o ato praticado é aprovado pela opinião, discernir se é útil à comunidade” (“De l’Esprit des Droits”, número 293).

Antônio Alberto Alves Barbosa, advogado em São Paulo.

______________________

Notas:

1 Nestes 23 casos o Tribunal Federal de Recursos deu provimento às apelações da transportadora (Estrada de Ferro Santos a Jundiaí), para julgar improcedentes as ações que lhe foram movidas. Na apelação n.º 4.520, o Tribunal condenou a apelada a pagar custas em décuplo. São os seguintes tais recursos, com discriminação das partes contrárias à ferrovia: apelações cíveis ns. 2.630, Vidigal Prado Com. Exp. S. A.; 3.259, Vidigal Prado Com. Exp. S. A.; 4.498, Nioac & Cia. Ltda.; 4.494, Arm. Gerais Santa Cruz S. A.; 4.592, Gabriel de Paula S. A. Com. Exp.; 4.495, Cia. Cruzeiros Arm. Gerais; 3.203, Raposo & Cia. Ltda.; 4.126, Irmãos Pereira S. A. Com. Exp.; 4.140, Luís Ferreira S. A. Com. e Exp.; 4.767. Barros Camargo & Cia. Ltda.; 4.490, Cia. Jaraguá de Arm. Gerais; 4.465, Cia. Internacional de A. G. e outros; 3.540, Max Wirth S. A. Com. e Mercantil; 2.909, Cunha Bueno & Cia.; 4.435, Arm. Gerais Anchieta S. A.; 4.274, Cia. Arm. Gerais Araraquara; 4.472, Leme Ferreira Com. e Exp.; 4.125, Cia. União de Arm. Gerais; 4.123. A. S. Neuber; 4.176, Este Asiático Com. e Naveg. Ltda.; 4.500, Arm. Gerais Riachuelo S. A.; 4.520, Queirós Ferreira & Cia.; 4.249, Cunha Bueno & Cia.

2 O Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, não tomou conhecimento dos recursos extraordinários a seguir discriminados, ficando dêsse modo mantidas as decisões do Tribunal Federal de Recursos. Recursos extraordinários ns. 24.778, recorrente, Vidigal Prado Comissária e Exportadora S. A., recorrida, Estrada de Ferro Santos a Jundiaí (apelação cível n.º 2.630); 25.870, recorrente, Cunha Bueno & Cia., recorrida, Estrada de Ferro Santos a Jundiaí (apelação cível n.º 1.839); 26.116, recorrente, Armazéns Gerais Santa Cruz S. A., recorrida, Estrada de Ferro Santos a Jundiaí (apelação cível n.º 4.494).

3 Vide votos do Sr. ministro AGUIAR DIAS in apelações cíveis ns. 4.520 e 4.500, de São Paulo, acórdãos unânimes, e mais a de n.º 4.592, em que votou vencido o Sr. ministro ELMANO CRUZ.

4 Sôbre jurisprudência, ver interessante comentário in “O Estado de São Pauto”, de 10-5-1953.

5 Dec. legislativo n.º 2.681, de 7 de dezembro de 1912. E’ êle a transformação em lei do substitutivo n.º 39-A, 1896, da Comissão de Justiça da Câmara dos Deputados ao projeto COSTA MACHADO, que recebeu aprovação do Congresso, sem alterações, em 1912. E’, pois, a lei reguladora da matéria, bem mais velha do que aparenta.

6 “Tratado de Direito Comercial Brasileiro”, ed. 1938. vol. V, parte I, n.º 45, pág. 46. O notável tratadista dá notícia de vários entendimentos havidos na praça de Santos, dos quais resulta clara a série de contingências por que passa o transporte de café e a inevitabilidade das perdas ante as peculiaridades existentes.

7 Parecer n.º 4.182 (ata n.º 527 da Comissão de Tarifas e Transportes, São Paulo), emitido a 2 de fevereiro de 1954, quando já eram conhecidos vários arestos do Tribunal Federal de Recursos consolidando a mudança operada, no qual declara ser contrário aos anteprojetos de reforma da lei civil, tendo em vista aquelas censuras cheias de ironia e desencantamento feitas aos legisladores por BENOIST, nas suas “Les Maladies de La Democratie” e que mereceram ser transcritas por RIPERT, no seu “O Regime Democrático e o Direito Civil Moderno”: “Ils modifient, renversent, suppriment, eu un instant, au gré de leur fantasie ignorante, les règles lentement formées par l’experience des générations…”.

8 O entendimento dominante até a mudança verificada era o de que: primeiro, a tolerância não podia ser levada em linha de conta, por isso que, oriunda de disposição de simples portaria, não podia sobrepor-se à lei, que estabelece o princípio da culpa presumida da transportadora; segundo, o repêso equivalia ao protesto previsto em lei. Ainda variavam ligeiramente os julgados quanto ao modo de considerar a transportadora isenta de responsabilidade pelo mau acondicionamento e a maneira de ser feita a prova da qualidade do produto transportado.

9 Sentença de 26 de janeiro de 1949 do juiz FRANCISCO CARDOSO DE CASTRO, contra a qual Cunha Bueno & Cia. interpôs recurso para o Tribunal Federal de Recursos, apelação n.º 1.839, de São Paulo, que não mereceu provimento. Surgiu daí o recurso extraordinário nº 25.870, do qual o Supremo Tribunal Federal, pela sua 2.ª Turma, sendo relator o Sr. ministro OROZIMBO NONATO, deixou, preliminarmente e por unanimidade, de tomar conhecimento (cf. “Diário da Justiça”, da União, de 15-IX-1954, pág. 11.381).

10 Sentença de 21 de fevereiro de 1952 proferida na ação, entre partes, Armazéns Gerais Santa Cruz S. A. e Fazenda do Estado (Estrada de Ferro Sorocabana). Nessa respeitável sentença, o juiz examina a questão com proficiência, sendo seus pontos capitais a questão da prescrição anual, aliás pacifica ante julgados do Supremo, e a tolerância de 1%.

11 A papeleta de repêso é emitida pela estrada de destino, depois do repêso, que é feito em balanças de pesar veículos. Pesa-se o caminhão com os sacos de café e depois, descontando-se o pêso daquele, anota-se a diferença na papeleta, como sendo o resultado do repêso.

12 Posteriormente, no Tribunal de Justiça de São Paulo, o Dr. CANTIDIANO se tornou o precursor da jurisprudência, hoje pacífica, de que é de um ano a prescrição, mesmo para as estradas de ferro do Estado, de que é obrigação do consignatário provar a qualidade do café (“Rev. dos Tribunais”, vols. 212, pág. 140, e 216, pág. 155).

13 Acórdão de 8 de setembro de 1949.

14 Foi o primeiro a acolher a defesa das ferrovias, tendo proferido, em 8 de setembro de 1949, célebre voto na apelação n.º 1.839, em que, depois de invocar vários textos de lei, diz: “O fato constitui até boa propaganda, pra a ré, que transporta grande partida de café acondicionado em sacos furados, rasgados, duma grande distância, com perda inferior a 5% do pêso da carga na estação em que a recebeu”.

15 Foi relator da apelação n.º 2.630, de São Paulo, em que examinou cuidadosamente a questão.

16 Igual orientação manteve no Supremo, como relator do recurso extraordinário n.º 25.809, do Distrito Federal.

17 Foi relator dos embargos n.º 2.630, tendo proferido bem fundamentado voto (v. “Diário da Justiça”, da União, de 9-3-1954, pág. 767).

18 Como revisor dos embargos n.º 2.630, declara o Sr. ministro CUNHA VASCONCELOS: “Rejeito, também os embargos pela só circunstância de estar a percentagem de café extraviada dentro do limite de tolerância previsto em lei. Não há, assim, que se cogitar de indenização” (v. “Diário da Justiça”, da União, de 9-3-1954, pág. 767).

19 Na apelação n.º 2.560, de São Paulo, o Sr. ministro ELMANO CRUZ votou pela manutenção da sentença de primeira instância, que excluíra da condenação as porções correspondentes a várias papeletas de repêso.

20 O Sr. ministro JOÃO JOSÉ DE QUEIRÓS, quando em primeira instância, note-se, decidira que: “A lei, assim, não eliminou, nem por seu espírito e nem por sua letra, a possibilidade de estipulação de cláusulas de irresponsabilidade. Estas têm por sua finalidade exonerar o transportador do dever de reparar, o que difere essencialmente da obrigação de transportar. Tais cláusulas não invalidam, não restringem, não modificam a plenitude de prova que caracteriza o conhecimento e nem dizem respeito ao reconhecimento da mercadoria a obrigação de entregá-la. Pressupõem, apenas, o não-cumprimento, por determinados motivos, dessa obrigação” (cf. “Diário da Justiça”, da União, de 17-9-1948, pág. 7.136).

21 Apelação n.º 4.592, acórdão de 12 de novembro de 1953. Foi o seguinte o voto do Sr. ministro AGUIAR DIAS neste caso: “Em tese, estou em desacôrdo com o relator, quanto à preliminar. Negaria provimento ao agravo no auto do processo, não por fôrça do art. 275 do Cód. de Proc. Civil, mas por entender que o juiz fêz bem em negar o chamamento à autoria, que não tem cabimento. Entretanto, no mérito, estou plenamente de acôrdo com o voto de S. Ex.ª, porque as ações dessa natureza, a meu ver, constituem mera expressão de aventurismo. Ações de quebra de café, sem um protesto contra o recebimento, representam expressão dessa perseguição judicial às estradas de ferro e às demais emprêsas de transporte do Brasil que são verdadeiras cabeças de turco para pagar tudo quanto se estabelece de errado no curso do transporte. Os entendidos chegaram a estabelecer cêrca de 20 causas de perdas de mercadoria, causas que têm sua fonte inclusive no próprio expedidor, que manda uma coisa por outra e só as estradas pagam, porque não há polícia, porque não há meios de se determinar quem causou a perda e as empresas, dado o movimento vertiginoso da vida moderna, não podem fiscalizar o que recebem. Se há presunção de culpa contra a estrada por haver recebido a mercadoria sem protesto, deve haver também, lógica e justamente, presunção de culpa contra o dono da mercadoria que a recebeu sem protesto”.

22 Vide acórdão nos embargos n.º 2.630 que fui relator o Sr. ministro MACEDO LUDOLF, e revisor o Sr. ministro CUNHA VASCONCELOS. Este declara expressamente ser legal o limite de tolerância de 1%.

23 De acôrdo com a redação dada pelo dec. n.º 19.754, de 18 de março de 1931, que consolidou definitivamente o de n.º 19.473.

23-A Acórdão de 27 de outubro de 1954, que está assim fundamentado: “Conforme demonstrou A. GONÇALVES DE OLIVEIRA, em lição encampada em parecer da Procuradoria Geral da República (“Diário da Justiça”, da União, de 9-VIII-1954, pág. 8.048), os invocados dispositivos do Regulamento dos Transportes se fortaleceram posteriormente com a natureza de lei, ao publicar-se o dec. federal n.º 19.473, baixado pelo Govêrno Provisório, em 10 de dezembro de 1930, seguido logo após do de nº 19.754, de 18 de março de 1931, que o consolidou, definitivamente. Aí, no art. 9.º, se faz referência aos dispositivos regulamentares mantidos em vigor no art. 10 “mesmo no concernente a cargos”, não se conseguindo, outrossim, tê-los como infringentes do dec. legislativo n.º 2.681, de 7 de dezembro de 1912, onde sòmente se prevê esclarecimentos à regra geral contida no derradeiro diploma. De notar-se que, se algum transportador tivesse de arcar com os danos, de ocorrências parelhas, não seria o Estado de São Paulo, na verdade, acoberto pela tolerância regulamentar, pelo dec. nº 10.932, de 10 de fevereiro de 1940″.

24 Êste estudo foi considerado por CARLOS MEDEIROS SILVA (“O Poder Regulamentar sua extensão”, in ‘°Rev. de Direito Administrativo”, vol. 20, pág. 1) como o trabalho mais completo sôbre o assunto, embora escrito sob a vigência da Constituição de 1937.

25 Acórdão citado na nota n.º 23.

26 Acórdãos unânimes, in recursos extraordinários ns. 24.778 e 26.116, dos quais foi relator o eminente ministro MÁRIO GUIMARÃES.

27 Tais artigos rezam:

“Art. 274. Respecto de las cosas que por su naturaleza se hallan sujetas a una disminución de peso o de medida, la empresa podrá limitar su responsabilidad hasta la concurrencia de un tanto por ciento, previamente determinado, que se establecerá por cada hulto, si la carga estuviera dividida em bultos”.

“Art. 276. La disminución máxima de peso o medida se establecerá, en general, en base de la seguiente tabla”.

28 Vide “Rev. dos Tribunais”, vol. 216. pág. 156.

29 Vide n.º 4 dêste comentário.

30 Sôbre o assunto veja-se: VIVANTE (“Tratado de Direito Comercial”, 3.ª ed., vol. 4.º, pág. 2.175); GASCA (“L’Esercizio delle Strade Ferrate”, vol. II. ed. 1910, 446, pág. 1.312); PIPIA (“Diritto Ferroviario”, ed. 1912, n.º 664, pág. 566).

31 “Da Responsabilidade Civil”, vol. 11, pág. 264.

32 Êsses artigos dizem:

“Art. 14. Quando mais de uma estrada de ferro tiver concorrido para o transporte de uma mercadoria, a ação de indenização por perda, furto ou avaria terá lugar contra a estrada que aceitou a expedição, ou contra a que entregou a mercadoria avariada, ou contra qualquer das estradas intermediárias em cuja linha se provar que teve lugar a perda. furto ou avaria”.

“Art. 15. No caso do artigo anterior, o direito reversivo das estradas de ferro, uma em relação às outras, será regulado pelas seguintes condições: § 1.º Será responsável da perda, furto ou avaria da mercadoria a estrada em cuja linha se der o fato. § 2.º Se, porém, provar que foi culpa da outra, esta responderá pelas suas conseqüências jurídicas. § 3.º Se concorrer a culpa de mais de uma, a responsabilidade será dividida proporcionalmente ao grau da culpa, atentas as circunstâncias que acompanharam o fato. § 4.º Se não se puder provar qual a estrada em cuja linha deu-se a perda ou avaria, responderão tôdas, proporcionalmente, ao preço do transporte que cada uma percebeu ou teria o direito de perceber, dada a execução regular do contrato. § 5.º No caso de insolvabilidade de algumas estradas, o prejuízo que dêsse fato possa resultar para a que pagou a indenização será repartido por tôdas as que tiverem cooperado no transporte, guardada a mesma proporção do parágrafo anterior”.

33 § 5.º das “Inst. de locatione”: “Est enim hic contractus bonae fidei, in quo multa quáe nec dieta nec cogitata forte sunt, praestare acquum est“, apud Prof. SPENCER VAMPRE “O Caso Fortuito (nos acidentes pessoais e de transportes)”, ed. de 1914, pág. 25.

I) Normas técnicas para apresentação do trabalho:

  1. Os originais devem ser digitados em Word (Windows). A fonte deverá ser Times New Roman, corpo 12, espaço 1,5 cm entre linhas, em formato A4, com margens de 2,0 cm;
  2. Os trabalhos podem ser submetidos em português, inglês, francês, italiano e espanhol;
  3. Devem apresentar o título, o resumo e as palavras-chave, obrigatoriamente em português (ou inglês, francês, italiano e espanhol) e inglês, com o objetivo de permitir a divulgação dos trabalhos em indexadores e base de dados estrangeiros;
  4. A folha de rosto do arquivo deve conter o título do trabalho (em português – ou inglês, francês, italiano e espanhol) e os dados do(s) autor(es): nome completo, formação acadêmica, vínculo institucional, telefone e endereço eletrônico;
  5. O(s) nome(s) do(s) autor(es) e sua qualificação devem estar no arquivo do texto, abaixo do título;
  6. As notas de rodapé devem ser colocadas no corpo do texto.

II) Normas Editoriais

Todas as colaborações devem ser enviadas, exclusivamente por meio eletrônico, para o endereço: revista.forense@grupogen.com.br

Os artigos devem ser inéditos (os artigos submetidos não podem ter sido publicados em nenhum outro lugar). Não devem ser submetidos, simultaneamente, a mais do que uma publicação.

Devem ser originais (qualquer trabalho ou palavras provenientes de outros autores ou fontes devem ter sido devidamente acreditados e referenciados).

Serão aceitos artigos em português, inglês, francês, italiano e espanhol.

Os textos serão avaliados previamente pela Comissão Editorial da Revista Forense, que verificará a compatibilidade do conteúdo com a proposta da publicação, bem como a adequação quanto às normas técnicas para a formatação do trabalho. Os artigos que não estiverem de acordo com o regulamento serão devolvidos, com possibilidade de reapresentação nas próximas edições.

Os artigos aprovados na primeira etapa serão apreciados pelos membros da Equipe Editorial da Revista Forense, com sistema de avaliação Double Blind Peer Review, preservando a identidade de autores e avaliadores e garantindo a impessoalidade e o rigor científico necessários para a avaliação de um artigo.

Os membros da Equipe Editorial opinarão pela aceitação, com ou sem ressalvas, ou rejeição do artigo e observarão os seguintes critérios:

  1. adequação à linha editorial;
  2. contribuição do trabalho para o conhecimento científico;
  3. qualidade da abordagem;
  4. qualidade do texto;
  5. qualidade da pesquisa;
  6. consistência dos resultados e conclusões apresentadas no artigo;
  7. caráter inovador do artigo científico apresentado.

Observações gerais:

  1. A Revista Forense se reserva o direito de efetuar, nos originais, alterações de ordem normativa, ortográfica e gramatical, com vistas a manter o padrão culto da língua, respeitando, porém, o estilo dos autores.
  2. Os autores assumem a responsabilidade das informações e dos dados apresentados nos manuscritos.
  3. As opiniões emitidas pelos autores dos artigos são de sua exclusiva responsabilidade.
  4. Uma vez aprovados os artigos, a Revista Forense fica autorizada a proceder à publicação. Para tanto, os autores cedem, a título gratuito e em caráter definitivo, os direitos autorais patrimoniais decorrentes da publicação.
  5. Em caso de negativa de publicação, a Revista Forense enviará uma carta aos autores, explicando os motivos da rejeição.
  6. A Comissão Editorial da Revista Forense não se compromete a devolver as colaborações recebidas.

III) Política de Privacidade

Os nomes e endereços informados nesta revista serão usados exclusivamente para os serviços prestados por esta publicação, não sendo disponibilizados para outras finalidades ou a terceiros.


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