
32
Ínicio
>
Clássicos Forense
>
Revista Forense
CLÁSSICOS FORENSE
REVISTA FORENSE
Pretensão à tutela jurídica, pretensão processual e pretensão objeto do litígio, de Pontes de Miranda

Revista Forense
23/05/2025
*Processo, de procedere, ir dali para frente, é fato em seguimento, em que não há, referência necessária a fim, porque há processos químicos, biológicos, em que o fim não aparece. Pode haver apenas alcance ou objetivo. No sentido jurídico, nêle há série de ações humanas, que entre si se prendem, para se atingir determinado fim, que é a. prestação jurisdicional, administrativa ou legislativa. pelo Estado, ou – mais largamente – por, entidade jurídica. Lis, iudicium, iurgium, eram os têrmos usados no direito romano: lis é luta (lucta, luita, luta); iudicium é dição do direito (o iudex diz o ius); iurgium é disputa jurídica (iurgo é ius–igo). A função do Estado, através do pretor, era até a litiscontestatio (procedimento in iure). Sòmente depois aparecia a figura do iudex (procedimento apudiudicem). Percebe-se a transição entre a justiça de mão própria e a justiça estatal, que só veio depois: era o iudiciumprivatum, forma mista, intercalar, dependente da vontade das partes, já manifestada perante a autoridade estatal. No procedimento in iure punha-se em fórmula a controvérsia. A incoação, que fôra só pelas partes, passou a ser pelo magistrado.
A palavra “processo” serve, às vêzes, para se aludir ao procedimento, sem se exigir que somente haja a relação jurídica processual, a que corresponde. Nesse sentido diz-se que a ação e a reconvenção correm no mesmo processo (Código de Proc. Civil, art. 190, 2ª parte: “A reconvenção será formulada com a contestação”).
A cada momento empregam-se as expressões “processo”, “pleito” e “litígio” como sinônimos perfeitos. Advirta-se, porém, em que não há litígio, necessàriamente, em todos processos civis, nem, sequer, controvérsia. Por outro lado, casos há em que, nos processos em que pode haver litígio, a concordância inicial do demandado afasta qualquer disputa. Demais disso, fora, do processo, podem as partes resolver, por ato jurídico declarativo, ou por transação, ou remissão, as controvérsias; que há, ou é possível que surjam entre elas.
Desde que o Estado eliminou e proibiu a justiça de mão própria, monopolizando a distribuição da justiça, salvo pouquíssimas exceções àquela eliminação (e. g., Cód. Civil, art. 502) ou a êsse monopólio (e. g., juízo arbitral), tinha de prometer e assegurar a proteção dos que precisassem de justiça, isto é, prometer e assegurar a pretensão à tutela jurídica. Tôda técnica legislativa, administrativa e judiciária se empenha no cumprimento dêsse propósito. Com isso, o Estado realiza o direito objetivo e pacífico. O Poder Judiciário foi criado para isso e o processo judiciário tem por fim organizar a provocação e a prestação de justiça: Se a incidência das regras jurídicas, criando os direitos, os. deveres, as pretensões, as obrigações, as ações e exceções bastasse à realização da justiça, não se precisaria da justiça privada, nem da justiça estatal. Mas a incidência só se passa no mundo do pensamento, embora impecàvelmente aconteça; e os homens e o próprio Estado nem sempre apreendem, em seus pormenores, em sua inteireza, aquêles direitos, deveres, pretensões, obrigações, ações e exceções, razão por que se tem de proceder à aplicação (ad-plicare, pôr nas dobras, plica, provàvelmente depois de abri-las, de ex–plicare), quando à incidência não corresponde a realidade da vida. Tal aplicação, que foi privada e, depois, iudiciumprivatum, se fêz estatal, ou se conservou justiça de mão própria, ou arbitrai, onde o Estado o permitiu.
Processo civil, no sentido do Código, que é o do art. 5º, XV, a, da Constituição de 1946, verbis: “direito processual”, é o procedimento regulado por lei ou outra fonte de direito para, a realização do direito, mediante declaração, condenação à prestação, constituição, mandamento ou execução ou asseguração de direitos, deveres, pretensões, obrigações e exceções, para que tenham as pessoas pretensão à tutela jurídica perante o Poder Judiciário, ou juízes arbitrais, em matéria de interêsse não-penal.
Ao longo da história, não se podem eliminar as. épocas em que o Estado irão tinha a função de julgar ou em que apenas integrava a forma das escolhas de juízes, ou dos compromissos. Quando monopolizou a justiça, prometeu presta-la a quem ativesse, e também isso não se pode eliminar. Não depende da opinião dos juristas existir, ou não, a pretensão à tutela jurídica. Se não existisse, não teria o Estado o dever de julgar; e tem-no. Tem mais: tem a obrigação de julgar se alguém exerce o direito correspondente àquele dever.
O conteúdo e a finalidade da pretensão à tutela jurídica, que é de direito público, consiste na obtenção da tutela jurídica. Dirige-se contra o Estado, quer a exerça o autor, quer o réu. Se o réu atende ao pedido do autor, extingue-se a pretensão ou a ação de direito material, e apenas fica sem objeto a pretensão à tutela jurídica e, portanto, a pretensão processual, que nasceu do exercício dela. Não se dirige contra o demandado, se dela é titular o autor, nem contra o demandante, se dela é titular o réu; nem contra o demandante e o demandado, se dela é titular, o terceiro (Código de Proc. Civil, arts. 102-105, 707-711 e 995): Só se satisfaz a pretensão à tutela jurídica se e Estado faz a prestação jurisdicional prometida. Por outro lado, a pretensão à tutela jurídica pode existir ainda onde não se trate de, pretensão à sentença de condenação, ou com carga forte, imediata ou mediata, de condenatoriedade. Aqui, graças à classificação das ações pela eficácia preponderante, atendendo-se aos demais elementos da carga eficacial, podemos evitar, por impreciso, dizer o que escapou a LEO ROSENBERQ (“Lehrbuch”, 5ª ed., página 401), quando escreveu que a pretensão serve de base a todo procedimento, ao passo que a pretensão de direito material só às demandas de condenação e assim por diante.
Os pressupostos da tutela jurídica sòmente podem ser os pressupostos para que o Estado tenha de julgar, não os pressupostos para que tenha de julgar favoràvelmente ao autor ou ao demandado, ou ah terceiro, que foi contra o demandante e o demandado. Porque, se se chega até aí, se misturam pressupostos dar tutela jurídica e pressupostos da pretensão e de direito material, objeto do litígio.
Tem-se pretendido que a pretensão à tutela jurídica é pretensão à sentença favorável.
Se, para argumentar, admitíssemos que a pretensão à tutela jurídica é pretensão à sentença, favorável, o Estado, quando o juiz errou, não teria prestado o que prometera. No entanto, a prestação jurisdicional, com o trâmite em julgado, foi feita. Tanto foi que, se o caso se Inclui naquelas espécies em que não cabe ação rescisória, nem revisão criminal, nada há mais a fazer-se. Foi sou não feita a prestação jurisdicional, que o Estado prometera e o juiz, por êle, entregara? Embora sujeita a sentença, sentença prestou-se, irremediàvelmente. Sòmente para algumas sentenças há a ação rescisória ou a de revisão criminal. A ação rescisória apenas cria aos que tiveram sentença desfavorável, inclusa na classe das sentenças rescindíveis a pretensão (nova pretensão de direito material) à propositura, dentro de prazo produtivo, da ação de rescisão da sentença. Sentença houve, trâmita em julgado; a prestação jurisdicional foi entregue: portanto, fôra isso o que o Estado prometera. Excepcionalmente, a lei, satisfeitos outros pressupostos, permite a rescisão. A própria sentença que se deu na ação rescisória pode vir a ser rescindida, embora em menor número de espécies. Depois, nada mais se pode obter. Como seria provável pensara em ser objeto da prestação devida pelo Estado ao titular da pretensão à tutela jurídica a sentença justa ou a sentença favorável? O que o Estado prometeu foi exercer a tutela jurídica. Para que prometera exercer a tutela jurídica com, prestação de sentença justa ou favorável seria preciso que houvesse prometido a infalibilidade, ou, pelo menos, o reexame da sentença a qualquer tempo e por indeterminado número de vezes. Também seria preciso que titular da pretensão à tutela jurídica sòmente fôsse quem fôsse titular da pretensão de direito material, objeto do litígio. Ora, autor e réu têm pretensão à tutela jurídica, o que de si só bastaria para nortear que não se prometeu a sentença justa mas a sentença, e não puderam ser pretensão à sentença justa as pretensões à tutela jurídica do autor e do réu, na mesma ação. Quando alguém pede, inclusive o réu, que o Estado decida, exerce, com o pedido, a pretensão à tutela jurídica. O funcionário do Estado, que admitiu o processo, obrigou-se (obrigou o Estado) à decisão, isto é, o juiz, a dar sentença, que; ainda se contrária a quem pediu, não nega ter existido a pretensão à tutela jurídica, nega que tivesse razão o autor, e, ainda, se contrária ao réu, não nega que tenha tido pretensão à tutela jurídica. A tutela jurídica ao réu manifesta-se no direito e pretensão a ser ouvido no processo, para que a angularidade se dê a ver-lhe entregue a prestação jurisdicional. Razão por que há de assentar na desistência pelo autor.
*
Quando se acrescenta o adjetivo “favorável” a “sentença”, nas expressões “pretensão à sentença favorável”, “prestação de sentença favorável” falseia-se o conceito de pretensão à tutela jurídica, porque: a) o Estado não prometeu sentença favorável, prometeu sentença, prestação jurisdicional; b) tanto o Estado não prometeu sentença favorável que o autor e réu, ou autor, réu e terceiro têm a pretensão à tutela jurídica; c) quando o Estado decide desfavoràvelmente não nega que se tivesse e se haja exercido a pretensão à tutela jurídica, nem nega que tivesse sido admissível e admitida a pretensão processual. Os inimigos da pretensão à tutela jurídica aproveitam, para as suas criticas, essas confusões.
Não existe pretensão de alguém a que o Estado julgue favoràvelmente; nem a atitude do Estado, em sua tarefa geral de tutela jurídica, há de ser interpretada como indiferente à existência, ou não, da pretensão à tutela jurídica, se bem que haja casos em que o juiz de ofício, ou por provocação do Ministério Público, realiza a tutela jurídica, independentemente do exercício da pretensão à tutela jurídica, por parte do interessado, a máquina judicial de ordinário só se move por ata dos titulares da pretensão A tutela jurídica.
Argumenta-se que o demandado somente poderia ter pretensão à tutela jurídica depois de exercer o autor a sua, de modo que não seria pré-processual, mas processual a pretensão (L. ROSENBERG, “Lehrbuch”, 5ª ed., pág. 401). Mas sem razão. Primeiro, a pretensão à tutela jurídica existe antes de ser exercida, como tôda pretensão. Segundo, a pretensão à tutela jurídica, por parte do demandado, existe ainda que não se exerça, porque Iuranovitcuria. O Estado, pelo órgão judicial, tem o dever e a obrigação de aplicar o direito e, pois, atender ao pedido. A sentença pode ser favorável, ou não. Quer o seja, quer o não seja, com ela cumpre o Estado o dever de entregar a prestação jurisdicional, a que correspondem o direito e a pretensão à tutela jurídica, e a obrigação de entregá-la, que se estabeleceu com o exercício da pretensão à tutela jurídica e, pois, com o nascimento da pretensão processual.
Quando nasce a pretensão processual, o Estado assume a obrigação de decidir sôbre o fundo, o mérito; mas, se falta algum dos pressupostos processuais, o juiz resolve sôbre êsse nascimento, e não sôbre a pretensão à tutela jurídica. Daí poder e dever dizer que a “ação” é inadmissível.
Os argumentos maiores dos que negam a existência da pretensão à tutela jurídica são os que consistem em se procurar apagar a diferença entre os pressupostos processuais e a pretensão à tutela jurídica com a alegação de não se terem de examinar aquêles e essa, no tocante à possibilidade da sentença de fundo. Se falta alguma daqueles, ou essa, não se pode decidir o mérito (cf. ADOLF WACH, “Der Feststellungsanspruch”, página 26; G. SCHÜLER, “Der Urteilsanspruch”, págs. 46 e 73). Mas o valor de tais argumentos é nenhum, porque os pressupostos da tutela jurídica têm de vir, conceptualmente, antes dos pressupostos processuais e são, por isso mesmo, também êles, pressupostos processuais. Não há exigência pré-processual que não seja também processualidade. Daí a indiferença prática, que se alardeia, entre pressupostos da tutela jurídica e pressupostos processuais. Não há processualidade sem se haver admitido a pré-processualidade; pois a própria pretensão processual é efeito do exercício da pretensão à tutela jurídica.
Os que reconhecem o em que contribuiu a concepção da pretensão à tutela jurídica para livrar o direito processual dos liames à privatística e falam do conceito de necessidade da tutela jurídica como indispensável, êsses, ou caem em superada teoria. do direito público, anterior à revelação dos direitos públicos subjetivos e das pretensões de direito público, ou mal encobrem a pretensão à tutela jurídica que êles confundem com o efeito do seu exercício, a pretensão processual. Não se trata de expediente simplesmente construtivo.
São pressupostos da pretensão à tutela jurídica:
I. A capacidade de ser parte, porque a pessoa, que não existe, ou que ainda não existe, não pode ser titular de pretensões, portanto não tem pretensão à tutela jurídica. Só a lei pode cogitar da tutela jurídica excepcional (cuja construção nos tem preocupado muitas vêzes), dos nascituros e das pessoas jurídicas em formação.
II. A admissão da ação de prestação futura, ou de reclamação de prestações periódicas, inclusive em se tratando de ações assecuratórias, porque é a tutela jurídica que está em causa, não é, ainda, o direito material, o pressuposto da favorabilidade da sentença, nem pressuposto processual.
III. A necessidade da tutela jurídica (legítimo interêsse, Cód. de Processo Civil, art. 2º):
A) Quanto à capacidade para ser parte, estão de acôrdo que se considere pressuposto pré-processual, portanto, inerente à pretensão à tutela jurídica (KONRAD HELLWIG (“Klagerecht und Klagemöglichkeit”, 63 s.; JAMES GOLDSCHMIDT, “Materielles Justizrecht”, Festgabe für B. HÜLER, pág. 19, e G. SCHÜLER, “Der Urteilsanspruch”, 33 s.).
B) Quanto à admissão da ação de prestação futura, cumpre que se observe, de inicio, o que se passa nos fatos: a) o conceito mesmo de prestação futura implica que não há, no direito material, pretensão à prestação, pois o que só será futuramente ainda não é, agora; b) não há pensar-se em ação de direito material, porque, ex hypothesi, não há ação, e excepcionalmente se admite “ação” (de direito processual); c) a “ação” (de direito processual) provém do exercício da pretensão à tutela jurídica, portanto é no plano da pretensão à tutela jurídica que se tem de pôr o problema da criação da ação de prestação futura.
A pretensão futura não é dotada de ação (não contém ação), porque ainda não é pretensão e, não sendo pretensão, ação não poderia conter. Em todo caso, há ação de prestação futura, se satisfeitos certos pressupostos. A fortiori, se se trata da pretensão sujeita a têrmo ou condição suspensiva, que, em nosso direito, não é pretensão presente: é futura, como acontece com os direitos (Cód. Civil, art. 118). Naturalmente, não se trata do negócio jurídico: êsse existe. A condição, de que trata, concerne à eficácia (direito, pretensão, ação, etc.). Enquanto pende a condição suspensiva, o efeito querido não se produz; a vinculação é outra coisa, de modo que pode haver direitos ligados a ela e, por definição, os há (e. g., não pode haver revogação). Não se há de confundir o direito futuro, ou pretensão futura, e o direito expectativo (direito a adquirir o direito quando cumprida a condição), a que a lei pode juntar ações. Por outro lado, pode ocorrer a ação de prestação futura, condenatória, alhures estudada nesta obra.
Tem-se dito, em contrário, que o exercício da pretensão como exigível no futuro só é admissível em casos excepcionais e se trata, sempre, de pressuposto processual, que se deve examinar de ofício, tendo o autor (ou reconvinte) o ônus da prova; ou que a existência da ação, de prestação futura é sòmente ligada ao direito material.
A ação de prestação futura pode ser proposta ainda que a prestação dependa de contraprestação, como se dá no caso de alugueres. Não se exige tampouco, que também se peça prestação já vencida (L. ROSENBERCI, “Lehrbuch”, 5ª ed., pág. 365), ou em dinheiro, de modo que o art. 153, § 2º, do Cód. de Processo Civil, não permite interpretação que preexclua a ação de prestação futura: o artigo 153, § 2º, apenas reputa, nas espécies de que trata, incluso o pedido de prestações futuras, pois que periódicas.
A pretensão à omissão dá ensejo a ação de prestação futura (STEIN-JONAS-SCHONKE, “Kommentar”, nota 99 ao § 253; “Tratado de Direito Privado”, V, § 627, 2; A. STEPHAN, “Die Unterlassungsklage”, 63 s.), porque, ainda que não haja discriminação de tempo, a obrigação de prestação de omissão pode vir a ser violada (sem razão, P. STEIN, “Über die Voraussetzungen des Rechtschutzes”, 333 s.: KONRAD HELLWIG, “Anspruch und Klagerecht”, 388 s.; VON FLAD, “Der Unterlassungsklage”, Jherings Jahrbücher, 70, 350; L. ROSENBERG, “Lehrbuch”, 5ª ed., pág. 366).
A ação de prestação futura é “ação” de condenação, que a lei permitiu a despeito de ainda não existir a ação. A tutela confere-se excepcionalmente, por ocorrer ratiolegis que se impôs ao legislador. Está em causa a pretensão à tutela jurídica, de modo que se há de julgar admissível, ou não, a demanda. O exame do fundo levaria, sempre, a se reputar improcedente, se a êle tivesse de tocar a resposta. Quanto ao fundo apenas se há de apreciar se o direito e a pretensão, in casu, lograram compor o suporte fáctico da lex specialis.
C) Quanto à necessidade da tutela jurídica, isto é, quanto ao interesse nela, todos os sustentadores da existência de pretensão à tutela jurídica estão de acôrdo. Os que combatem o conceito discordam quanto à classificação da necessidade da tutela jurídica; uns a têm como pressuposto processual; outros, como pressuposto do fundamento da demanda (=mérito).
O interêsse só existente quanto a um dos pontos do pedido, ou só existente quanto a determinada eficácia; ou determinadas eficácias, basta a que se admita, quanto a êsse ponto, ou quanto à eficácia, ou eficácias, de que se trata, o exercício da pretensão à tutela jurídica.
Os pressupostos da pretensão à tutela jurídica são a capacidade de ser parte, a admissão da ação de prestação futura e a necessidade da tutela jurídica (Cód. de Proc. Civil, art. 2°: “legítimo interêsse”). O interêsse legítimo, a necessidade da tutela jurídica, é pressuposto pré-processual. Se o havia e deixou de haver, tem-se por cerrada a necessidade de tutela jurídica, o que, se só houve reconhecimento do direito do autor, dá enseja á julgamento de inadmissibilidade da demanda. Se há tal reconhecimento, as conseqüências processuais são as que teria o julgado favorável ao autor, embora haja o juiz de se abster de julgar o mérito.
O autor da ação declaratória há de ter interêsse legítimo. (econômico ou, moral) na declaração. Êsse interêsse, tratando-se de ação declaratória incidental, como a de incidente de falsidade (artigos 717-719), já está revelado na situação processual da ação, que é “incidente”. Por isso, quando o juiz ou tribunal tem de apreciar o interêsse legítimo na ação declaratória, há de verificar, antes de negar que exista, se a ação é admissível como declaração incidental (L. ROSENBERG, “Lehrbuch”, 5ª ed., pág. 371). Se o não é, falta, totalmente, a necessidade da pretenso à tutela jurídica.
Se a necessidade da pretensão à tutela jurídica desaparece durante a lide, a decisão declara que tal acontece, deixando-se de entrar no mérito, mas há tôdas as conseqüências processuais, inclusive a de custas, se existia a necessidade da tutela jurídica e ato que a afastou foi ato de reconhecimento dos fundamentos dó pedido:
Quanto à admissibilidade da via judicial e quanto à jurisdição nacional sôbre o demandado, consideram-nas pressupostos de tutela jurídica (KONRAD BELLWIG, “Klage und Klagemöglichkeit”, 63 s.; JAMES GOLDSCHMIDT, “Materielles Justizrechtr”, Festgabefur B. HÜBLER, pág. 19, e G. SCHÜLER, “Der Urteilsanspruch”, 33 s.).
A admissibilidade da via judicial não é pressuposto pré-processual. Trata-se de requisito processual, porque o Estado promete a tutela jurídica, mas é outro ramo do direito que distribui a competência dos órgãos estatais, em regras de sobre, direito. Se a tutela jurídica há de ser assegurada judicial, administrativa, ou legislativamente (Constituição de 1948, arts. 62, 64 e 141, 9 37), a regra jurídica é sôbre competência, e não sôbre existência, ou inexistência, da pretensão à tutela jurídica.
*
Quando o autor exerce a pretensão à tutela jurídica e lhe nasce a pretensão processual, tem o juiz de sentenciar: se o exercício foi irregular, ou se se tornou irregular, a sentença não é sôbre o fundo, sôbre o mérito, se bem que seja terminativa do fito. A sentença que decreta a invalidade desde o início é sentença de reexame, que não admite, ex tunc, a demanda. A pretensão à sentença é a pretensão processual; a pretensão à sentença sôbre o mérito é a pretensão processual que não foi julgada inadmissível.
Os juízes e tribunais estão no dever de administrar justiça e são obrigados a isso desde que os interessados, com pretensão à tutela jurídica, a exerçam. A pretensão processual, que nasce dêsse exercício, corresponde a obrigação de prestar a justiça (= entregar a prestação jurisdicional). Antes, apenas o Estado era vinculado pelo que prometera, fazendo nascer a pretensão à tutela jurídica. Se o interessado não tem pretensão à tutela jurídica, não se obriga à decisão o Estado; o juiz ou tribunal declara que não há tal pretensão, e a decisão, que dá, preexclui o procedimento. Pràticamente, tudo se passa como se fôsse processual o pressuposto, porque vem antes a exigência, e a falta do pressuposto pré-processual necessàriamente é falta de pressuposto processual. Os juízes e tribunais têm de examinar o pré-processual e o processual, para, depois, examinar o fundo da causa.
A relação jurídica processual é una e unitária; vai do comêço ao fim do processo, salvo se o procedimento é julgado inexistente, porque, aí, a decisão do juiz ou do tribunal tem função de autodefesa. Juiz ou tribunal diz um “não é”, que implica ter afastado, declaratòriamente, qualquer eficácia do procedimento.
A relação jurídica processual é uma só até que se profira a sentença terminativa e transite em julgado. Por isso mesmo, é de repetir-se qualquer proposição sem que apareça o conceito de relação jurídica que leva até a execução, se a sentença mesma não teve carga de executividade que predomine ou seja a de eficácia imediata.
Bem assim o, pressuposto da jurisdição nacional sôbre o demandado (sem razão, G. SCHULER, “Der Urteilsanspruch”, 33 s.). É a distribuição da competência estatal que está em causa.
Pela mesma razão, não é pressuposto pré-processual a inexistência de compromisso arbitral (sem razão, G. SCHULER, “Der Urteilsanspruch”, 33 s.): trata-se de requisito de competência; nem no é o não-haver litispendência, ou coisa julgada. Todos êsses requisitos são pressupostos processuais.
Tôdas as regras sôbre poderes e tôdas as regras de sobredireito do direito processual são regras de direito processual lato sensu, e não regras sôbre pressupostos pré-processuais. Ser de sobredireito não é ser de direito anterior ao direito sôbre que versa a regra de sobredireito, é ser por cima dêsse direito para o determinar, no espaço, no tempo ou em sua interpretação. As regras de competência judiciária, administrativa ou legislativa são o primeiro requisito da própria competência processual de que se cogita. Quando o juiz se diz competente rationeloci, ou rationemateriae, implìcitamente, já se disse competente como juiz.
A admissibilidade do procedimento depende de pressupostos positivos (pressupostos da existência de algo) ou negativos (pressupostos de não-existência de algo). A competência, a capacidade para ser parte e a capacidade processual são pressupostos processuais positivos. A coisa julgada é pressuposto processual negativo: se existe, o processo, que sobrevém, é inadmissível, porque o pressuposto processual negativo falhou. Tem-se chamado impedimentos processuais, às exigências negativas, que dependem de reclamação do demandado, tais como: a) a exceção de compromisso, que derivou de negócio jurídico bilateral, ou unilateral, ou por lei, êsse inafastável por acôrdo posterior; b) a exceção de caução às custas (art. 87), e c) a exceção de falta de pagamento das custas, inclusive nas espécies do Cód. de Proc. Civil, arts. 201, nº IV, 203 e 205.
Se não falta algum dos pressupostos processuais e se não ocorre algum Impedimento processual tem o juiz de julgara ação, quanto ao mérito. No direito brasileiro (note-se: no direito brasileiro), devido a não se poder pronunciar nulidade não cominada (art. 273) se não a argüiu o interessado na observância da formalidade ou na repetição do ato (artigo 273, nº III), há fatos positivos ou negativos, que seriam pressupostos processuais, mas tiveram, de lege lata, o trata dos impedimentos. Também atinge a categoria dos pressupostos processuais reduzindo-os a impedimentos, o art. 275, que veda ao juiz pronunciar a nulidade ou ordenar suprimento ou repetição do ato se pode decidir do mérito a favor da parte a quem a decretação da nulidade aproveitaria (art. 275). O próprio artigo 278 destoa, embora acertadamente, do que se entenda ser nulidade por impropriedade de “ação”, isto é, do remédio processual.
A demanda é inadmissível se há falta de pressuposto processual, ou se há impedimento processual. Todavia, se falta só existe para uma das pretensões processuais ou para um dos fundamentos da demanda, sòmente para aquela, ou para êsse ponto, é que se há de julgar inadmissível. Seria confusão irritante se o juiz, tendo de admitir a demanda, a repele porque infundada; ou se a julga improcedente, se a espécie seria de inadmissibilidade; ou se, tendo de considerá-la inadmissível, julga procedente a ação. Tampouco, se tem dúvidas sôbre ser, ou não, admissível; pode manifestar essa dúvida: só se entra no mérito quando se tem por certa a admissibilidade.
Julgada inadmissível a demanda, o juiz tem-se de abster de permitir qualquer discussão ou produção de prova sôbre o mérito, isso não quer dizer que, prosseguindo, não possa deferir ou admitir a discussão em separado da questão de admissibilidade.
O juiz tem de apreciar, de ofício, os pressupostos processuais. Para isso, pode suscitar discussão, inclusive quanto ao valor da causa. Nos casos em que o juiz, que era incompetente, se faz competente, tem-se de pensar em que se criou o pressuposto processual que faltava.
Tem-se pretendido que a pessoa não tem direito à tutela jurídica, mas apenas possibilidade de demandar. Não ter direito é, aí, não ter direito, pretensão, ação ou exceção de direito material. Em vez de se examinarem os fatos antes da demanda, que é exercício de pretensão à tutela jurídica, pula-se, no tempo, até a sentença, que é a prestação obtida em virtude da pretensão processual, nascida do exercício da pretensão à tutela jurídica.
*
A ação exercida só é procedente (fundada, begründet) se o autor tem direito, pretensão, ação, ou exceção (de direito material). Antes disso, teve-se de verificar se os pressupostos processuais foram satisfeitos e, antes ainda, se foi exercida e se existe pretensão à tutela jurídica.
As partes podem renunciar à alegação e prova doa impedimentos processuais. Se não alega, a existência de qualquer dêles, dentro do tempo, preclui a alegabilidade: o impedimento desaparece.
Encerrado o debate (Cód. de Processo Civil, art. 271), não mais se pode argüir a falta de pressuposto processual, ou a existência, de impedimento processual. Até então se pode tornar competente o juiz ou tribunal inclusive rationemateriae, ou ratificar a procuração a parte, ou apresentar-se o assentimento marital ou uxório. Mas, na instância superior, até se encerrarem os debates, pode ser preenchida a falta do pressuposto processual ou desaparecer ou afastar-se o impedimento processual.
A preclusão das exceções, segundo o art. 182, sòmente concerne às partes e mais interessados. Ao juiz permite-se dar-se por incompetente ou suspeito, depois da contestação.
Examinada a petição (arts. 158-160), o primeiro julgamento do juiz ou tribunal há de ser o da própria competência. Ou é competente, ou não no é. Só o juiz ou tribunal competente pode decidir sôbre as outras matérias. Razão por que, se exame superficial da petição mostra que não lhe cabe a cognição, deve o juiz abster-se de qualquer julgamento, inclusive sôbre, inépcia ou impropriedade da “ação”. O juiz suspeito ou impedido é juiz incompetente.
Depois, tem o juiz de resolver sôbre a admissibilidade da via judicial e do rito processual, sôbre a litispendência ou a autoridade da coisa julgada, sobre a existência das partes, sôbre a capacidade de ser parte e sôbre a capacidade processual, sôbre a representação legal ou voluntária, sôbre a capacidade do procurador.
Sòmente após lhe cabe decidir sôbre os impedimentos processuais. Alguns entendem que apenas nesse momento é que se teria de dizer admissível, ou não, o rito processual (admissibilidade do procedimento escolhido, e. g., reconvenção, ação de modificação, modificação da demanda, processo executivo, processo cominatório, processo provocatório). Em verdade, há de vir antes do próprio exame da litispendência ou da coisa julgada.
A necessidade da tutela jurídica (interesse de agir) pode ser apreciada logo após a leitura da petição, se não há dúvida quanto a competência; mas não importa a ordem em que se resolve sôbre ela, pois que a falta do interêsse pode só se revelar mais tarde, ou só ocorrer mais tarde. Erram os que a têm como matéria de mérito.
A representação legal é pressuposto processual. A representação voluntária, não. Os atos de falsusprocurator são ineficazes (art. 106); não nulos.
A capacidade de postulação, no direito brasileiro, também é pressuposto processual. O ato do incapaz de postulação apenas é eivado de nulidade não-cominada. Mas o juiz tem de apreciá-la de ofício.
É de grande relevância saber-se que o dizer o juiz que não cabe o procedimento ordinário, ou Q especial, inclusive o executivo de títulos e o de sentença, apenas concerne à admissibilidade da demanda (pressuposto processual). Se o juiz entende que a ação que se havia de intentar seria para declarar, e não para constituir, ou condenar, ou mandar, ou executar, ou para condenar, e não para qualquer dos outros fins, ou para constituir, e não para qualquer dos outros fins, ou para mandar, e não para qualquer dos outros fins, ou para executar, e não para qualquer dos outros fins, houve impropriedade de “ação”, no sentido do artigo 276. Se, examinando o caso, o juiz decide que não tem a autor o direito, a pretensão ou a ação de direito material, entrou no exame do mérito, porque não se restringiu à apreciação do pressuposto processual.
Problema delicado, mas para o qual não tem havido precisão nos argumentos para se chegar a conclusões seguras, é o que concerne às regras jurídicas de direito constitucional. ou de direito público ordinário, que distribuem as competências dos órgãos estatais conforme os poderes (Poder Judiciário, Poder Executivo, Poder Legislativo). Não é nas leis de processo que se sói inserir o que delimite a função da Justiça e a dos outros poderes, e dai ter-se pensado na pré-processualidade de tais regras jurídicas. A questão apresenta-se com diferentes formas e em diferentes têrmos: a) A regra jurídica que diz caber à autoridade administrativa a cognição de determinada questão (e não, ou ainda não, ao Poder Judiciário) é pré-processual? b) A admissibilidade da via judicial e a jurisdição nacional são elementos da pretensão à tutela jurídica ou pressupostos processuais?
São tentados os juristas a ver nas regras jurídicas que estão acima das regras jurídicas processuais regras que se referem a pressupostos pré-processuais. Mas o engano fàcilmente se desfaz. A regra jurídica sôbre, competência dos poderes públicos (Judiciário, Executivo, Legislativo) são regras que vêm antes das regras jurídicas que após elas, determinam a competência intrajudiciária, intra-executiva, ou intralegislativa dos órgãos estatais; mas isso de modo nenhum estabelece a situação de pré-processualidade e de processualidade. Tais regras jurídicas são prévias em relação às outras regras jurídicas que distribuem a competência recebida, porém, não pré-processuais. Não são antes do processo; são antes das regras jurídicas de competência, formando todo. O processo, tendo por fim aplicação do direito, tem de atendê-las, como regras de competência. As regras de direito processual internacional e as regras de direito intertemporal do direito processual são regras de sobredireito do direito processual, porém, de modo nenhum regras de direito pré-processual. Dá-se o mesmo com as regras de interpretação e fontes do direito processual. São regras de sobredireito, porém, regras de pré-direito processual, ou regras jurídicas pré-processuais. Quando se atende a regra de direito processual já se atendeu ao seu sobredireito, mas simultâneamente. Não é o mesmo o que se passa, com a pretensão à tutela jurídica: a verificação da existência da pessoa física ou jurídica, ou da excepcional pretensão à tutela jurídica antes do nascimento daquela ou dessa, é pré-processual, e não processual; bem assim a verificação da tutelabilidade da pretensão ou da `ação de prestação futura ou da necessidade da tutela jurídica.
Se o fim que teria a “ação” do autor, ou o pedido do réu, em defesa ou em reconvenção, tem de ser satisfeito pelas autoridades administrativas, das quais depende (e. g., se o Estado chamou a si pagar os salários do trabalhador despedido, ou entregar casa ou alojamento aos locatários que vão ser despejados), a via judicial está condicionalmente preexcluída ou excluída (cf. A. SCHONKE, “Das Rechtcschutzbedürfnis”, 25 s.); isto é, salvo se as autoridades administrativas se negam a atuar, ou se não mais seria oportuna a sua atuação.
Algumas vêzes as leis só abrem a via judicial se já houve resolução na via administrativa. (e. g., lei nº 1.533, de 31 de dezembro de 1951, art. 5°, nº I, sôbre mandado de segurança). O art. 141, § 4°, da Constituição de 1948, impede que, tratando-se de direitos individuais, se remeta, exaustivamente, à via administrativa.
As regras jurídicas sôbre admissibilidade da via judicial são cogentes. Não pode haver acôrdo entre os interessados, que valha, se aumentam ou restringem a via judicial.
A verificação tem de ser para cada pretensão processual e para cada ponto do mérito (fundo da causa). A exceção de não caber a via judicial é irrenunciável; e o juiz a todo tempo pode decidir pela inadmissibilidade da demanda. Basta que a via judicial seja admissível no momento em que se ultima o debate, quer a satisfação do requisito haja ocorrido em virtude de lei nova, quer por ter sobrevindo a resolução (prévia) administrativa, que era necessária à obtenção da via judicial.
É preciso não se confundir o pedido, o petitum, com o direito, a pretensão, a ação ou a exceção cuja declaração, ou sanção condenatória, ou constitutiva ou mandamental, ou executiva, se pede. Não se pede a ação; pois que a ação se tem: pede-se que se declare, se condene, se constitua, se mande, ou se execute. A pretensão processual é pretensão a sentença, por se ter exercido a pretensão à tutela jurídica. Se chamamos “demanda” ao pedido de outorga da tutela jurídica mediante sentença, cumulação de ações é cumulação de demandas, e não de ações de direito material, se bem que, de ordinário, a cada ação de direito material corresponda, “ação” de direito processual, pretensão processual. Quando se exerce a pretensão à tutela jurídica, exerce-se pedindo que se cumpra a promessa estatal de tutela jurídica. Tal exercício dá ensejo a que nasçam pretensões sentença, pretensões processuais. O que se exerceu, pré-processualmente, foi a pretensão à tutela jurídica. Quem a tem ainda não tem pretensão processual: a pretensão processual depende (= nasce) do pedido. Quem tem pretensão à tutela jurídica tem-na ainda que não a exerça. Quem a exerceu não a perde e faz-se titular da pretensão processual, pretensão ao remédio jurídico processual.
Quando a Constituição de 1946, artigo 141, §§ 23 e 24, prometeram habeascorpus e mandado de segurança nas espécies que definiu, criou pretensão à tutela jurídica por meio de mandamentos, porém, somente quem impetre aquêle ou êsse mandado tem pretensão processual. No texto constitucional, não só se prometeu tutela jurídica; prometeu-se tutela jurídica mandamental. A qualificação da tutela jurídica não a desnatura. A pretensão processual, ainda quando haja qualificação, somente nasce com o exercício daquela. Quando a pretensão à tutela jurídica, se qualifica diminui a margem de liberdade que tem o legislador do direito processual. Essa diminuição pode ser obra do direito constitucional, como aconteceu com o art. 141, §§ 23 e 24, da Constituição de 1946.
A petição é que determina o conteúdo e a extensão do procedimento, faz nascer, com o despacho, a relação jurídica processual, induz, com a citação, litispendência e determina, se não sobrevém restrição, o conteúdo e a extensão da sentença.
Quando se diz que a petição determina a classe e a medida da tutela jurídica, hão de ressalvar-se as espécies em que a pretensão à tutela jurídica já estava qualificada. Êsse é um dos pontos em que os juristas não têm prestado a devida atenção.
Apenas enunciou que a demanda determina a classe e a medida da tutela jurídica. Se a pretensão à tutela jurídica foi qualificada, a demanda é exercício dela; não determina classe, nem medida da pretensão à tutela jurídica.
A propositura da ação, com a petição, não é negócio jurídico. Trata-se de ato jurídico stricto sensu, composto de manifestação de vontade e declaração de conhecimento. (A propósito observou-se que L. ROSENBERG, “Lehrbuch”, 5ª ed., pág. 258, identifica, de um lado, declarações de vontade e negócios jurídicos e, do outro lado, reduz a manifestações de vontade, sem “declaração”, os atos jurídicos strictosensu, o que é de repelir-se, enèrgicamente: há, negócios jurídicos que provêm de manifestações de vontade; e atos jurídicos strictosensu que se originam de declarações de vontade. A declaração de vontade é a manifestação de vontade que se declara, isto é, que se manifesta claramente.)
A sentença há de corresponder à petição que lhe determina a classe e a medida. Não se trata de resposta a pergunta do autor ou do reconvinte; porque o autor não interroga, o autor exerce a pretensão à tutela jurídica e a pretensão processual, nascida com a petição. Devemos evitar tais comparações que conturbam a inteireza lógica da exposição científica. Quando a sentença, em vez de dar a razão por que julga procedente, ou improcedente, a ação, põe têrmo ao feito, sem lhe julgar o fundo, apenas desfaz a relação jurídica processual, por entender que não foi regular o exercício da pretensão à tutela jurídica, ou o exercício da pretensão processual. Então, a demanda mesma é inadmissível.
Seria absurdo tentar-se fundir a pretensão que nasce do direito civil ou de outro ramo do direito material e a pretensão à tutela jurídica, se bem que o Estado enuncie que o todo titular daquela corresponda à titularidade dessa. Tem pretensão à tutela jurídica quem foi ofendido pelo passante da rua embora venha êsse a provar, em suas alegações, que exercia, regularmente, direito seu (Cód. Civil, art. 160, nº I, 2ª parte).
No direito processual civil e no direito processual penal há regras jurídicas de direito material, porém, não devemos exagerar-lhes a significação. Destinam-se a compor ou a assegurar forma, procedimento, de modo que a sua materialidade é interna, secundária. Por outro lado, a supra-ordenação que há no direito público, colore a tôdas de inconfundível destinação política (realização do direito objetivo, pacificação).
Todo processo judicial – civil ou penal – revela que a incidência da lei, que é automática e fatal, não bastou, ou não basta, ou não bastará. Supõe a imperfeição dos homens para a captação do quer se passa no mundo do pensamento, tal como êles mesmos conceberam. Dessa imperfeição é que deveria não se realizar integralmente o direito objetivo e haver controvérsias e dúvidas entre os homens.
No processo há o procedimento, que é a série dos atos processuais, tempo e espaço (e. g., exigência de imediatidade ou de presença), quer das partes, quer dos juízes e outras pessoas que sirvam à justiça; e há a relação jurídica processual, uma ou totalizada (= totalidade das relações jurídicas processuais que ocorram). A todo processo corresponde relaçãojurídicaprocessual ou totalidade de relações jurídicas processuais, salvo se tal processo só tinha aparência de processo (= era inexistente) ou se é nulo.
É preciso que não se confundam as situações jurídicas que são estados particulares, durante o processo, e a relação jurídica processual, que apanha todo o processo e independe de subsistirem algumas daquelas situações. O êrro de JAMES GOLDSCHMIDT, na luta contra a concepção da relação jurídica processual, resultou, principalmente, dessa confusão.
Arraigou-se na linguagem técnica, portuguêsa e brasileira o emprêgo das palavras “procedente” e “procedência” como sinônimos de “fundado” e “ter fundamento”, isto é, como juízos sôbre o mérito. Noutras línguas, fala-se de procedente e de improcedente como se significassem admissível ou inadmissível a demanda. À primeira vista pode parecer que não devíamos usar têrmo que tem étimo em procedere, processus, para aludirmos ao fundo da demanda. Mais lá está em PAULO, na L. 32, D., de hereditatis petitione, 5, 3: “Per servum adquisitae res heredi restituendae sunt: quod procedit in hereditati liberti et cura de inofficioso agitur, cum interim in bonis esset heredis”. As coisas adquiridas por intermédio de escravo ao herdeiro se hão de restituir: o alie procede na herança do liberto e quando se age por inoficiosidade, como quer que estivesse, no ínterim, entre os bens do herdeiro. Já aí procedere se refere ao mérito e viu-o B. R. VICAT, (“Vocabularium iuris utriusque”, II, 33). Também é de PAULO (L. 24, D., de donationibus inter virum est uxorem, 24, I) o fragmento em que se diz: “Se entre estranhos houver sido feita doação e, antes do têrmo de se ter adquirido o domínio legítimo, se casaram, ou ao contrário, se a doação foi feita entre marido e mulher e, antes de implir-se o tempo acima dito, se dissolve o matrimônio, a despeito disso consta que procede o beneficio do tempo, porque, num caso, foi entregue sem, vício a posse e no outro foi afastado o vício” (“… nihilo minus procedere temporis suffragium constat, quia altero modo sine vitio tradita est possessio, altero quod fuerit vitium, amotum sit”). Na L. 21, § 5, D., de receptis: qui arbitrium receperint ut sententiam dicant, 4, 8, ULPIANO põe o verbo procedit no sentido de ser certo quanto ao fundo, se bem que a questão versasse sôbre negócio jurídico de compromisso e a questão sôbre prorrogação ou não prorrogação. Na L. 7, § 4; D., ad legem Aquiliam, 9, 2, ULPIANO, referindo-se a luta entre pugilistas, em que houve morte, disse que se preexclui a incidência da lei Aquília, porque se entende que se causou o dano gloriae causa et virtutis, não iniuria causa. Para dizer que isso se não estendia ao escravo, mas sim, quanto ao filho-família, inseriu ULPIANO, respectivamente, non procedit e procedit. Na L. 2; § 20, pro emptore, 41, 4, PAULO, para exprimir que o tempo do vendedor favorece, para usucapião, ao comprador, escreveu: “Emptori tempus venditoris ad usucapionem procedit”. Logo adiante, JULIANO (L. 7, pr.). ainda a respeito do tempo para usucapião se os escravos deixaram a terra comprada, falecendo o comprador, serviu-se, duas vêzes, do têrmo procedere. Como se vê e atendendo-se a que processus, no sentido de processo (judicial, ou administrativo), só exsurgiu na Idade Média, acertado é o sentido que lhe dá a praxe portuguêsa. Todavia, o censo largo, independente da distinção entre pressupostos processuais e impedimentos processuais, de um lado, e mérito do outro, tem tôda pertinência; e. g., precede a (alegação da) exceção de incompetência. O sentido que o reduziria à apreciação daqueles pressupostos e impedimentos, como soem fazer escrito-es espanhóis, é que não devemos acolher. Julgar procedente a ação é, para nós, julgar o mérito, e não declarar que é admissível.
LEIA TAMBÉM O PRIMEIRO VOLUME DA REVISTA FORENSE
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 1
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 2
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 3
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 4
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 5
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 6
NORMAS DE SUBMISSÃO DE ARTIGOS

I) Normas técnicas para apresentação do trabalho:
- Os originais devem ser digitados em Word (Windows). A fonte deverá ser Times New Roman, corpo 12, espaço 1,5 cm entre linhas, em formato A4, com margens de 2,0 cm;
- Os trabalhos podem ser submetidos em português, inglês, francês, italiano e espanhol;
- Devem apresentar o título, o resumo e as palavras-chave, obrigatoriamente em português (ou inglês, francês, italiano e espanhol) e inglês, com o objetivo de permitir a divulgação dos trabalhos em indexadores e base de dados estrangeiros;
- A folha de rosto do arquivo deve conter o título do trabalho (em português – ou inglês, francês, italiano e espanhol) e os dados do(s) autor(es): nome completo, formação acadêmica, vínculo institucional, telefone e endereço eletrônico;
- O(s) nome(s) do(s) autor(es) e sua qualificação devem estar no arquivo do texto, abaixo do título;
- As notas de rodapé devem ser colocadas no corpo do texto.
II) Normas Editoriais
Todas as colaborações devem ser enviadas, exclusivamente por meio eletrônico, para o endereço: revista.forense@grupogen.com.br
Os artigos devem ser inéditos (os artigos submetidos não podem ter sido publicados em nenhum outro lugar). Não devem ser submetidos, simultaneamente, a mais do que uma publicação.
Devem ser originais (qualquer trabalho ou palavras provenientes de outros autores ou fontes devem ter sido devidamente acreditados e referenciados).
Serão aceitos artigos em português, inglês, francês, italiano e espanhol.
Os textos serão avaliados previamente pela Comissão Editorial da Revista Forense, que verificará a compatibilidade do conteúdo com a proposta da publicação, bem como a adequação quanto às normas técnicas para a formatação do trabalho. Os artigos que não estiverem de acordo com o regulamento serão devolvidos, com possibilidade de reapresentação nas próximas edições.
Os artigos aprovados na primeira etapa serão apreciados pelos membros da Equipe Editorial da Revista Forense, com sistema de avaliação Double Blind Peer Review, preservando a identidade de autores e avaliadores e garantindo a impessoalidade e o rigor científico necessários para a avaliação de um artigo.
Os membros da Equipe Editorial opinarão pela aceitação, com ou sem ressalvas, ou rejeição do artigo e observarão os seguintes critérios:
- adequação à linha editorial;
- contribuição do trabalho para o conhecimento científico;
- qualidade da abordagem;
- qualidade do texto;
- qualidade da pesquisa;
- consistência dos resultados e conclusões apresentadas no artigo;
- caráter inovador do artigo científico apresentado.
Observações gerais:
- A Revista Forense se reserva o direito de efetuar, nos originais, alterações de ordem normativa, ortográfica e gramatical, com vistas a manter o padrão culto da língua, respeitando, porém, o estilo dos autores.
- Os autores assumem a responsabilidade das informações e dos dados apresentados nos manuscritos.
- As opiniões emitidas pelos autores dos artigos são de sua exclusiva responsabilidade.
- Uma vez aprovados os artigos, a Revista Forense fica autorizada a proceder à publicação. Para tanto, os autores cedem, a título gratuito e em caráter definitivo, os direitos autorais patrimoniais decorrentes da publicação.
- Em caso de negativa de publicação, a Revista Forense enviará uma carta aos autores, explicando os motivos da rejeição.
- A Comissão Editorial da Revista Forense não se compromete a devolver as colaborações recebidas.
III) Política de Privacidade
Os nomes e endereços informados nesta revista serão usados exclusivamente para os serviços prestados por esta publicação, não sendo disponibilizados para outras finalidades ou a terceiros.
LEIA TAMBÉM: