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Jornais – Incitamento A Subversão Da Ordem Pública – Apreensão Pela Autoridade Policial, de A. Gonçalves de Oliveira

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CLÁSSICOS FORENSE

REVISTA FORENSE

Jornais – Incitamento A Subversão Da Ordem Pública – Apreensão Pela Autoridade Policial, de A. Gonçalves de Oliveira

A. GONÇALVES DE OLIVEIRA

REVISTA FORENSE 169 — ANO DE 1955

Revista Forense

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18/03/2025

– Viola a Constituição a emprêsa jornalística que faz propaganda de processos violentos para a subversão da ordem pública, ou prega a extinção do regime constitucional; e, quando a autoridade competente apreende o material do crime, não pode essa emprêsa invocar proteção de ordem constitucional.

– Interpretação do art. 141, § 5°, da Constituição.

PARECER

I. Na reunião ontem realizada e presidida pelo Exmo. Sr. presidente da República, com a presença de altas autoridades, inclusive do Exmo. Sr. ministro da Justiça, resolveu o govêrno aprovar o ato do chefe de polícia que determinou a apreensão da “Tribuna da Imprensa”, de 24 do corrente, por pregar a revolução, veicular matéria que constitui incitamento à subversão da ordem pública. A minha opinião manifestada, na reunião, foi no sentido de que o ato da autoridade policial, que determinou a apreensão do periódico, encontra apoio na Constituição federal.

Fiquei de redigir, por escrito, o meu parecer que, proferido oralmente, foi considerado pelo govêrno, ao tomar a mencionada deliberação.

Segundo informa o chefe de polícia, as publicações da “Tribuna da Imprensa” se têm caracterizado, não pelo legítimo exercício do direito de informação e de opinião, a saber, da informação exata e da crítica construtiva, ainda que severa, mas, pelo abuso da liberdade de imprensa, por pregar, obdurada e abertamente a subversão da ordem política, pela violência. As publicações nesse sentido se sucedem. E, no dia da apreensão, dia 24 de agôsto, aniversário da deposição e morte do presidente GETÚLIO VARGAS, fazia o jornal o incitamento, de variadas formas, e com tal violência, que entendeu o chefe de polícia que a apreensão tinha o escopo de evitar graves ocorrências, a finalidade de manter a ordem pública.

É certo que dispõe a Lei de Imprensa que nenhuma providência de ordem administrativa poderá tomar a autoridade pública que, direta ou indiretamente, cerceie a livre publicação e circulação de jornais e periódicos (art. 60), e que só é proibida a publicação e circulação de jornais e outros periódicos quando clandestina (art. 1°, § 1°).

Não menos certo é, entretanto, que, segundo preceito de ordem superior, de ordem constitucional, “não será tolerada propaganda de guerra, ou de processos violentos para subverter a ordem política e social” (art. 141, § 5º).

Em tal caso, o preceito da legislação ordinária há de ceder ou há de harmonizar-se com o princípio estabelecido na Lei Maior.

O primeiro dever do Estado é de manter-se. A Constituição, como discursa BARBALHO, garante as liberdades públicas, é exato, “mas, em primeiro lugar e sobretudo, garante-se a si, ao Estado, à sociedade, ao povo brasileiro”. Diante da propaganda de revolução, de motins, de incitamentos reiterados, pergunta o preclaro constitucionalista, qual é o princípio que se poderá opor à ação pronta, enérgica, imediata do poder que tem a incumbência de manter a ordem e por ela é responsável? “Em casos tais, haver-se-á de esperar pelo resultado de processos criminais, de habeas corpus, pronúncia, recursos, etc.?” E conclui o jurista-magistrado: “Será o arremêdo do episódio verdiano, do personagem demorando-se a cantar uma série de copias para anunciar que corria a salvar a madre infelice, em vez de ir logo livrá-la da “fogueira em que ela ia arder” (“A Constituição Federal Brasileira”, 1902, páginas 300-301).

No caso de que se trata, primeiro, viola a emprêsa jornalística a Constituição

fazendo a propaganda de processos violentos para a subversão da ordem política, a extinção do regime constitucional. E, quando a autoridade competente, na defesa da Carta Política, apreende o material do crime, não pode essa mesma emprêsa invocar proteção de ordem constitucional.

Ainda recentemente, em carta dirigida ao presidente da Associação Brasileira de Imprensa, o ministro NEREU RAMOS, por ocasião da apreensão de exemplares da revista “Problemas”, acentuava a eloqüência dêsses fatos:

“A democracia não é suicida e deve defender-se dentro dos preceitos constitucionais e das normas legais, contra aquêles que não se limitam a disseminar doutrinas contrárias, mas façam propaganda de processos violentos de subversão da ordem política ou social, cometendo crime contra a segurança do Estado.”

“É evidente que permitir continue a propagar livro ou periódico a pregação de guerra, de processos violentos para subverter a ordem política ou social, ou de preconceitos de raça ou de classe seria tolerar propaganda que a Constituição imperativamente declara: não será tolerada“.

Nos Estados Unidos a Côrte Suprema tem interpretado dêste modo os preceitos liberais da sua Constituição. Em livro recente, “La liberté d’opinion et d’information”, informa ROGER PINTO que aquela Côrte julgou lícita a prisão de um orador, em um comício público, realizado em favor de Wallace, sob fundamento de excitação pública; “La Cour avait admis que la police arrête pour violation de la paix públic un orateur qui prononçait un discours en faveur de Wallace, sous prétexte que le public s’était ter et qu’un auditeur menaçait de monter a l’assaut de la tribune” (ob. citada, pág. 72, nota 196).

Se se permite a detenção de um cidadão, em tais circunstâncias, por que não permitir a apreensão da edição de um jornal que prega a violação da Constituição, a imediata subversão da ordem pública?

Foi proferindo o seu voto, harmonizando êsses princípios, o da liberdade de manifestação do pensamento e o da inviolabilidade da Constituição, que o juiz JACKSON exclamou, segundo o depoimento do citado publicista, que, não houvesse essa sábia harmonização, o capítulo da declaração dos direitos se transformaria em um pacto de suicídio. “Nous courons le danger, se la Cour ne tempère pas sa, logique doutrinaire avec un peu de sagesse pratique, de la voir transformer la déclaration, constitutionelle des droits en pacte de suicide” (“La Crise de l’Etat aux Etats-Unis”, 1951, pág. 216).

Na verdade, as leis americanas em caso de instigação de oficiais ao motim, proíbem a circulação de qualquer publicação que faça propaganda de insubordinação ou desobediência, embora evitem o emprêgo do têrmo “incitamento”, segundo informam FERNAND TERROU e LUCIEN SOLAL, em publicação da Unesco: “The American Federal law of 1940 carefully avoids the term “incitment”; it penalizes the distribution of any written or printed matter which advises, counsels or urges insubordination, disloyalty, muting or refusal of duty by member of the military or naval forces of the United States” (“Legislation for Press, Film and Radio”, pág. 309).

Na França, no que concerne à apreensão de periódicos, o comissário do govêrno LETOURNEUR, considera que o jornal, quando viola a regra de segurança do Estado, “permet une action immédiate” (ROGER PINTO, “La liberté d’opinion et d’information”, pág. 200). A propósito, emite o citado professor sua opinião: Contra tais abusos, as leis penais prescrevem sanções próprias, que legislador reputa suficientes. Não cabe às autoridades policiais agravar o regime repressivo, salvo se as necessidades de ordem pública o exigirem “amoins que les nécessités de l’ordre public ne l’exigent” (obra e loc. cits.). E explica que a apreensão é uma medida extremamente grave, mas se justifica quando indispensável para assegurar a manutenção ou o restabelecimento da ordem pública. “Elle ne serait dons lustifiée qu’au cas oú elle serait indispensable pour assurer le maintien ou le rétablissernent de l’ordre public“.

E indica o ilustre publicista precedente que se ajusta a hipótese em aprêço: Em certas circunstâncias, circunstâncias excepcionais, sem dúvida, a apreensão de um jornal contendo apelos à violência ou à desordem, senão à revolução, é ela um meio de assegurar a ordem. A autoridade policial não apreende por apreender, pode-se dizer, mas, para impedir convulsões mais graves. “Dans certaines circonstances – circonstances excepcionelles sans doute – la saisie préventive d’un journal contenant les appels à la violence et au désordre – sinon à l’emeute est un moiren d’assurer l’ordre. Le préf et ne saisit pas pour saisir, peut on dire, mais pour empêcher des troubles plus graves de se développer sur la voie públic” (ROGER PINTO, ob. cit., pág. 201, nota 624).

Na Itália, após a derrubada do regime fascista, a Constituição vigente permite o seqüestro de jornais por oficial da polícia judiciária, que deve, contudo, no prazo de 24 horas, dar conhecimento da medida ao juiz competente, que, se não confirmar o seqüestro, fica êste automàticamente sem efeito.

In tali casi, quando vi sia assoluta urgenza e non sia possibile il tempestivo intervento dell’autorità giudiziaria, il sequestro della stampa periodica può essere eseguito da úfficiali di polizia giudiziaria, che devone immediatamente e non oltre le 24 ore, fare denunzia all’autorità giudiziaria. Se questa non lo convalida nelle 24 ore sucessive, il sequestro s’intende revocato e privo de ogni effetto” (Constituição italiana, artigo 21).

Segundo registram TERROU e SOLAZ em muitos países, nos poderes conferidos à autoridade encarregada de manter a ordem se inclui o de recolher publicações que pregam a desordem “may include the right to seize publications” (ob. cit., pág. 335).

E, em alguns países, como nos Estados Unidos, a autoridade postal tem o poder de proibir não sòmente as publicações obscenas como as publicações que pregam desordens e sedições. “Here it may be noted that in certains countries (United States) the vostal authorities are empowered to prohibit only obscene but also seditious publications” (ob. cit., página 336).

É que, na América do Norte, as fronteiras da liberdade de expressão, em matéria política e social, são hoje determinadas pela aplicação do critério do perigo claro e atual – “clair and present danger“, enunciado, em 1919 na Côrte Suprema pelo justice HOLMES, à sombra do qual agem as autoridades encarregadas da manutenção da ordem pública (BERNARD SCHWATZ “American Constitutional Law”, 1955, pág. 247).

Em nosso país – e o exemplo é de ontem – não se pode condenar a autoridade que se mostra enérgica na defesa da Constituição, porque então ela seria impotente para assegurar a nós mesmos e aos nossos filhos os benefícios da democracia.

A medida que se tomou é inegàvelmente grave e excepcional. Mas, vale como uma demonstração de que o governo está atento e não teremos, como ontem, na frase de ilustre cronista, “un desastre dans l’histoire de la democratie“.

A Constituição não é, com efeito, repositório de doutrinas, é instrumento de governo, que assegura a liberdade e o direito, sem prejuízo do progresso e da ordem (CARLOS MAXIMILIANO, “Comentários”, 2ª ed., pág. 98), ou, na frase de ARARIPE JÚNIOR, o primeiro titular da Consultoria-Geral da República, as Constituições são instrumentos de vida e não de morte (“Pareceres”, t. 2°, pág. 383). A sua sombra, sob sua proteção, não se pode permitir que se pregue a sua extinção ou aniquilamento do regime por ela estabelecido.

Ainda que, na hipótese, a medida que se tomou não se enquadrasse, como efetivamente se enquadra, em expresso preceito constitucional, na determinação de que a propaganda de processos violentos para a subversão da ordem pública não ser tolerada, poderíamos invocar o presidente LINCOLN, nesse lance de sua mensagem de 4 de julho de 1861, dirigida ao Congresso, embora a outro propósito: “Essas medidas, sejam ou não rigorosamente legais foram tomadas para a sobrevivência do ideal pelo qual lutamos, pela sobrevivência da liberdade em nossa pátria” (RICHARDSON, “Messages and Paper of the President”, vol. IV, página 24).

É o meu parecer, salvo melhor juízo.

Rio de Janeiro, 27 de agôsto de 1956. – A. Gonçalves de Oliveira, consultor-geral da República.

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