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Carlos Alberto Lúcio Bittencourt

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Carlos Alberto Lúcio Bittencourt

REVISTA FORENSE 162

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11/03/2024

A linguagem humana orça pelo irrisório, quando pretende expressar o que procuramos agora traçar: o sentimento de dolorosa mágoa ante a morte prematura de um companheiro, um amigo, diríamos um irmão, se CARLOS ALBERTO LÚCIO BITTENCOURT não fôsse o que era, mais do céu do que da terra, irmão dos santos.

Nesta casa, cuja unidade cordial ficou mais de uma vez provada pela divergência política, a mais poderosa fôrça desagregadora entre os homens, êle foi um elemento de notável influência exatamente no sentido da coesão pelo afeto.

Sensível ao extremo, nada lhe merecia mais respeito do que a sensibilidade alheia. Bravo até à temeridade, alma de Quixote emoldurada na mais serena das capacidades de discernir, sabia, como ninguém, avaliar os sentimentos dos demais.

Tinha tudo, êsse homem que um dia desertara de um mundo perfeito: bondade, a faiscar em olhos de iluminado; inteligência, a despejar-se nas mais variadas províncias intelectuais; cultura opulenta afirmativa, sem exibicionismo; capacidade construtora, a desdobrar-se num afã de realizar, como que pressentindo o curteza da sua hospedagem na terra; simpatia irradiante, a completar seus dons de líder autêntico.

Talhado para destino glorioso, mas sacrificado em mesquinha morte, êsse querido companheiro superou a adversidade. Contemplando o seu corpo destroçado, suas virtudes nos apareceram mais nítidas. sua alma de eleição mais pura, seus exemplos mais incisivos. Diante de sua morte, tem-se até vergonha de estar vivo.

*

Transcrevemos, a seguir, os discursos pronunciados nas Casas do Congresso, em sessão especial, em homenagem à memória do senador LÚCIO BITTENCOURT:

O SR. KERGINALDO CAVALCÂNTI: Sr. presidente, não sei de que palavra possa usar para dizer da grande e profunda mágoa de todos nós. Sei apenas que imenso vácuo se formou com o desaparecimento do senador LÚCIO BITTENCOURT.

Era êle, como advogado e parlamentar, figura de relêvo excepcional, de qualidades extraordinárias, pelas belas causas, pondo o espírito adamantino a serviço do bem-estar da coletividade.

Vim conhecê-lo há poucos anos, e rememoro essa passagem inicial das nossas relações com um carinho mais íntimo, porque, nesse contato, LÚCIO BITTENCOURT teve a gentileza inexcedível de recordar um fato talvez acidental da nossa vida mas que perdurará como um traço de ligação indelével. Advogado provinciano, certa vez escrevi um trabalho, cuja cópia foi transmitida para esta Metrópole. Longe estava eu de imaginar que a mesma chegaria às mãos dêsse jurista ilustre, dêsse estudioso da ciência do Direito, e mais, do que isso, que êle guardaria nas dobras memorizadas do seu espírito a recordação do fato. No intróito do nosso conhecimento, com surprêsa e agrado e – por que não dizê-lo? – com satisfação, ouvi dos lábios de LÚCIO BITTENCOURT que o nosso conhecimento não era material mas espiritual, já era antigo, através de um trabalho por êle muitíssimo apreciado. Vá por conta da sua benevolência o advérbio superlativo…

Sr. presidente, ponhamos de parte porém êsse aspecto afetivo, que toca no íntimo do coração, para, nesta ocasião, curvados sôbre o seu túmulo, rendermos homenagem ao espírito pugnaz dos que não, esmorecem na trincheira, pelejando pela boa causa, com o valor indômito dos predestinados. Era assim LÚCIO BITTENCOURT.

De feito, nesta tribuna, por mais de uma vez, sobreexcedendo-se pela dedicação, vimo-lo palmilhando os terrenos áridos do Direito Constitucional, revelando contato diuturno com os direitistas mais notáveis das nações norte-americana e inglêsa, para trazer-nos a cooperação da sua inteligência construtiva e do seu esfôrço abnegado, em prol do melhor lustre desta Casa.

Sem ser realmente um castiço da linguagem, falava e escrevia com o acêrto revelado pelos homens que manuseam constantemente as fontes puras do nosso vernáculo, dando-lhe, na simbiose da vida, as características inexcedíveis dos plasticizadores, dos amoldadores, dos que fazem realmente da língua um padrão de vitalidade e energia.

LÚCIO BITTENCOURT por muito pouco tempo estêve entre nós nesta Casa. Nem por isso, porém, sua passagem foi menos duradoura, porque as jóias do seu espírito ainda se refletem maravilhosamente à nossa.

Na política tomo na advocacia e nos trabalhos jurídicos, em tudo aquilo a que se afeiçoou, LÚCIO BITTENCOURT deu tudo que podia dar – coração e espírito – enfrentando, por vêzes, tempestades, aparentemente estéreis mas fecundas na substância que se derramam, como torrentes fecundentes sôbre a aridez dos destinos políticos do país.

Coração aberto à benevolência e à compreensão, nem por isso era menos combativo contra o que lhe parecia ofensivo à moral ou ao bem dos seus concidadãos. Opunha-se, nas ocasiões necessárias, com o exemplo corajoso, a fim de palmilharmos estradas mais amplas que nos conduzissem, sobretudo, a destino mais benéfico.

Candidato ao govêrno de Minas Gerais com o apoio dos meus correligionários e dos espíritos amantes da liberdade, dava êle magnífico exemplo não só aos homens de hoje, como às gerações porvindouras.

Testemunhava, pela ação, aquilo que era, realmente, o fruto melhor do seu pensamento. Distribuía as facêtas de uma inteligência poliforme, contribuindo, pelo trabalho diuturno, para traçar caminhos largos à nossa existência político-social. Assim demonstrava que, apesar de todos os pesares, de tôdas as desfortúnios, de todos os desfortúnios, ainda há para os homens de bem, de inteligência e de coração, largas perspectivas com que enfeitar clareiras maravilhosas em nossa pátria.

LÚCIO BITTENCOURT era, sobretudo, um homem de coragem e fé. No trato constante com os colegas, ninguém mais compreensivo e, ao mesmo tempo, irredutível. Era um temperamento – fôrça e expressão -; e através dêle reduzia certos fenômenos àquelas proporções indispensáveis que só a síntese apresenta como formação espiritual, para ser distribuída, no seio das populações, como verdadeiro tônico de reabilitação moral e política.

Sr. presidente, há, porém, um aspecto que, para mim, é dos mais angustiantes recordar: perdeu o Senado um nacionalista dos mais intrépidos, um lutador pelo bem-estar do Brasil. Convencido de que é na trincheira cívica que os homens, sem desfalecimentos, deverão combater pela emancipação econômica do Brasil, LÚCIO BITTENCOURT não vacilou, um só momento, em se oferecer como soldado maravilhoso na grande peleja em que, vêzes várias, temos enfrentado tôda a sorte de injúrias e os despotismos com o pensamento unicamente voltado para a felicidade dos nossos concidadãos.

Deve-lhe o país soma imensa de sacrifícios. Êle, que se fez na labuta constante, nas jornadas de um trabalho no qual não esmoreceu um só dia, bem poderia, pela cultura e inteligência, advogado excepcional que era, ter adormecido nos braços tentadores dos trustes poderosos que açambarcam as atividades liberais. Ao contrário, continuou fiel a si mesmo, vivendo ao lado dos humildes, para que não lhes faltasse seu apoio. Enfileirou-se entre os trabalhistas pela doutrina e pelo coração, compreendendo o trabalhismo não exclusivamente em função de interêsse imediato, mas como conquista democrática alevantada.

LÚCIO BITTENCOURT, por vêzes, era um rebelde, na melhor acepção da palavra. A rebelião, em certos instantes, frutifica no seio dos povos suas melhores virtudes. Dizia o grande RUI BARBOSA: só os parvos não mudam. Mudam os homens no cenário dos acontecimentos, orientados, ou galvanizados, pelo sentimento mais nobre de dedicação popular; mudam no bom sentido de dar às mancheias os tesouros imarcescíveis do seu espírito.

Era assim LÚCIO BITTENCOURT, senador hoje desaparecido no cenário do universo.

Sr. presidente, desde sexta-feira não me venho sentindo bem de saúde. Ainda hoje, ao entrar neste recinto, não me encontrava em condições físicas excelentes. Pensei, a princípio, em não ocupar a tribuna, mas o coração, por vêzes, impõe e propicia coragem e energia de que não nos suporíamos capazes.

A lembrança de um colega, bravo lutador das causas democráticas, caído tràgicamente como soldado em holocausto à República, é imagem imperecível, que se ergue diante de nossos olhos, conclamando-nos para as vanguardas cívicas, para a defesa das instituições, hoje tão conspurcadas, exigindo de cada um tudo o que fôr possível, a fim de que não soçobrem as liberdades individuais.

O direito de falar, o direito de reunião em praça pública, o direito de escrever e manifestar livremente o pensamento é uma das mais belas conquistas da Humanidade no seu caminho evolutivo. Entretanto, numa democracia que representa a igualdade; numa República que tem como princípio essencial a virtude, quantas e quantas vêzes, hoje mais hoje e mais hoje, vemos, desesperançados ou desenganados, postos à margem tais liberdades e tais direitos, ameaçados pelas tempestades deflagradas, pelas paixões ou ambições de todos os brasileiros, uma frente única para resguardo e defesa dos princípios estabelecidos na nossa Lei Magna.

Os povos que não falam a linguagem da liberdade são povos suicidas. Mesmo nos regimes monárquicos, em que não existe situação, não direi equivalente, mas idêntica à que se verifica na República, com a implantação dos regimes constitucionais, a liberdade de palavra e de reunião constituem conquistas lídimas impossíveis de olvidar-se um só momento, sob pena de caminharmos para a selvageria e o embrutecimento.

Sr. presidente, era nessa estacada brilhante, ampla e ensolarada que LÚCIO BITTENCOURT se encontrava; e a luz que de distância a distância nos mandava seus raios bruxuleantes era ainda e todavia uma claridade nos céus obumbrados; um rumo nos horizontes da pátria.

Grande cidadão, grande mineiro, dessa Minas de cujos alcantis voaram as águias que se chamaram FELIPE DE OLIVEIRA, TIRADENTES, o protomártir da Independência, imolado pela libertação da pátria, LÚCIO BITTENCOURT não fugiu ao seu destino, nem à sua vocação política. Fascinado pelas alturas, porque delas veio seu berço, das alturas caiu, para ascender muito mais alto.

Sr. presidente, o Senado da República, pela voz de todos nós, nacionalistas, e o Partido Social Progressista, sentindo na profundez do coração a perda que assim fere a Nação, deixa consignada a sua saudade e louvor à obra de um homem que, além de senador foi, sobretudo, um bom brasileiro. (Muito bem! Muito bem!)

O SR. GILBERTO MARINHO: Sr. presidente, senhores senadores, a dor natural que nos causa a morte redobra quando ela vem extinguir uma vida em seu meridiano.

Tal é o sentimento que nos amargura ante o desaparecimento de LÚCIO BITTENCOURT. Não é o cumprimento, doloroso sempre, de uma lei natural, porque esta tem um processo anterior ao desenlace e não aparece assim, quando um raio repentino golpeia e fulmina uma existência em pleno labor de participação útil na vida coletiva.

Se a morte escolhesse atitudes, também poderíamos dizer que em relação a LÚCIO BITTENCOURT porfiara em fixar a que melhor traduzisse uma existência velozmente vivida e inteiramente consagrada ao serviço das instituições democráticas.

A Providência não quis que êle chegasse à senectude para que, como aquêles veneráveis jurisconsultos, que tanto agradava a CÍCERO colocar como interlocutores em seus diálogos, nos brindasse com os frutos sazonados da sua ciência.

Dos 100 caminhos que o mundo põe à frente dos homens quando iniciam a sua escalada, LÚCIO BITTENCOURT escolheu a estrada árdua e solitária da conquista de si mesmo.

Traçou para os dias futuros um programa para ser cumprido em qualquer situação e o executava sem vacilações nem desvios.

Seu caráter tranqüilo, sua sensibilidade refinada, seu juízo sereno, seu instinto de justiça, seu interêsse pelas questões sociais levaram-no a buscar no estudo das ciências jurídicas o campo propício ao desenvolvimento da sua personalidade.

Sobressaiu em sua geração. Laureado entre seus companheiros, triunfou em seis concursos, em um dos quais galardoado com a cátedra universitária.

Dominou com a sua inteligência os mais amplos e variados horizontes. Jurisconsulto, professor e parlamentar, não limitou o seu espírito ao estudo do direito e á controvérsia profissional ou política.

Cultivou com amor as letras e quis beber em suas fontes as inspirações clássicas.

Não fazia, entretanto, alarde de sua cultura humanística, nem ostentação do seu vasto saber, porque tinha a humildade, tantas vêzes assinalada, das almas bem nascidas que desprezam a vaidade e trabalham em silêncio pelo bem da pátria.

Sua fulgurante ascenção não teve os saltos temerários da ambição impaciente; foi contínua, firme e serena, entre o aplauso dos amigos e o respeito dos adversários; foi a trajetória segura de uma vida que cumpre com honra sua missão, transformando a esperança promissora em realidade generosa, porque leva no espírito as fontes inesgotáveis do patriotismo, da cultura e das nobres ambições cívicas.

Os Anais do Parlamento não só registram suas iniciativas de verdadeira transcendência e significação, como também assinalam páginas de eloqüência que destacam LÚCIO BITTENCOURT com rasgos excepcionais.

Seus discursos invàriavelmente continham uma diretiva superior que, ao mesmo tempo, inspiravam aquêle respeito que impõe quem fala com pleno conhecimento e propriedade e arrancavam sempre aplausos conscientes.

Seus colegas, que também fomos seus amigos, pensamos com tristeza na ausência prematura dêste companheiro de vida transparente, espírito sútil e compreensivo, talento vigoroso e afirmativo, que não teve outro descanso desde o labor iniciado na adolescência adversa do que êste que lhe trouxe o desfecho fatal que ora o arrebatou de nosso convívio.

De LÚCIO BITTENCOURT ficará sempre a lembrança de um homem justo que muito amou e serviu ao seu país, trabalhando pela sua cultura e pelo aprimoramento das suas instituições democráticas e que pela sua sinceridade pelo seu desinterêsse e pela sua dedicação profícua ao bem comum, conquistou o afeto de seus companheiros e o respeito dos seus concidadãos. (Muito bem! Muito bem!)

O SR. FREITAS CAVALCANTI: Sr. presidente, recebi, ao chegar a esta Casa, incumbência de meus colegas de bancada a União Democrática Nacional para, em seu nome, associar-me às homenagens que o Senado presta à memória de LÚCIO BITTENCOURT, desaparecido na sexta-feira última.

Apagou-se, realmente, muito cedo, ma grande vida – diria melhor – cedo demais. Uma característica adquire, sem dúvida, Sr. presidente, grande relêvo na vida do ilustre e eminente senador: a pressa com que viveu e com que se realizou. O exemplo de sua vida pública, de sua atividade política, subverte a linha clássica dos políticos de sua terra, da grande e generosa terra das Minas Gerais.

LÚCIO BITTENCOURT, chegou ao Senado aos 44 anos de idade, depois de haver exercido com inexcedível brilho e extraordinária capacidade de luta o mandato de deputado federal.

Conheci-o na outra Casa do Congresso, na última legislatura, e desde logo me impressionou aquela figura aparentemente cética, distante, mas que era a mais presente de tôdas, quando se discutiam os temas da nossa terra e da nossa época. Aquêle ser esguio e suave que procurava quase omitir-se nos lugares mais discretos da Câmara, adquiria desde logo extraordinária ressonância na defesa das teses mais empolgantes da política dos nossos tempos. Exerceu naquela Casa do Congresso a liderança do Partido Trabalhista Brasileiro; e exerceu-a de maneira a mais alta e a mais digna.

Dentro das linhas puras e legítimas da sua ação partidária, LÚCIO BITTENCOURT abria os mais encantadores encontros com as demais organizações políticas. Dirigia êle uma das correntes de vanguarda do Partido Trabalhista Brasileiro.

Tenho para mim – embora ainda seja muito cedo para fixar-se a posição, o destino e o papel que o Partido Trabalhista Brasileiro realiza em nosso país – que LÚCIO BITTENCOURT liderava uma das alas mais pujantes e mais poderosas do seu grêmio. Pretendia exercer um trabalhismo emanado não só das grandes e magníficas leituras e da sua extraordinária cultura, como ainda da experiência que a sua própria vida havia realizado.

LÚCIO BITTENCOURT descendia de família humilde, sentira a vida na infância e na adolescência sob os aspectos mais ásperos; realizara uma extraordinária vida com o próprio esfôrço. O seu amor pelo estudo e preciosa cultura, que conquistou é, mais, o inevitável primeiro lugar que o humanista, o jurista e o professor de Direito sempre adquiriu nesses prélios memoráveis, lhe asseguravam trajetória das mais luminosas.

Foi pena, Sr. presidente que o perdêssemos tão cedo; uma grande pena para o Brasil, para o Partido Trabalhista Brasileiro e para o Senado. Esta Casa, cujas magníficas tradições não cabe exaltar nesta hora, porque estão no próprio espírito da Nação, tinha em LÚCIO BITTENCOURT um dos mais eminentes representantes da atual geração política. Esta Casa que, na atual legislatura, não povoou suas poltronas com juristas, jurisconsultos e professôres, porque necessàriamente teria que exprimir a vontade do povo, harmoniosamente heterogênea, tinha, em LÚCIO BITTENCOURT, uma das mais altas figuras de jurista.

Há pouco tempo, em conversa com eminente colega, lamentávamos a ausência, nesta Casa, de três dos maiores representantes que por aqui passaram e, na condição de grandes juristas e professôres de Direito, formavam uma equipe segura: IVO D’AQUINO, FERREIRA DE SOUSA e ALOÍSIO DE CARVALHO, aquêle ático e admirável baiano.

O desaparecimento de LÚCIO BITTENCOURT constitui, assim, uma grande lacuna no Senado.

Em nossa sistemática, no funcionamento do sistema bicameral, cabendo ao Senado, como Câmara Alta, a função específica de revisora, é necessário que aqui estejam os juristas, com a sua cultura repousada, tranqüila, patrimonial, para proferirem a última palavra em tôrno da legislação trepidante que vem da Câmara dos Deputados.

Tenho para mim que LÚCIO BITTENCOURT, dentro do seu Partido, ou fora dêle, haveria de fixar o mais alto e puro pensamento político do nosso tempo,

como rumo para a nossa geração. Onde quer que estivesse, no Partido Trabalhista ou em qualquer outra organização partidária, seria um líder, um caminho, um itinerário, uma direção, convidando, pela pureza de sua vida e pela alta dignidade dos ideais por que se batia, as gerações suas contemporâneas.

Sr. presidente, muito difìcilmente apagar-se-á, nesta Casa, a lembrança daquele jovem e esguio senador, que se sentava na terceira fila da ala direita.

Aparentemente suave, como se inflamava LÚCIO BITTENCOURT, às vêzes, dando até um certo tom de exagêro apaixonado nos temas políticos e culturais quando, inclusive fazia aquelas eruditas citações em alemão ou inglês! Foi uma grande figura que passou por esta Casa e cuja estrêla que me parecia brilhante demais, muito cedo se apagou!

Sr. presidente, sucumbindo tràgicamente, LÚCIO BITTENCOURT, embora ausente pela morte, continuará presente no Senado, pelo valor de sua inteligência e de sua extraordinária cultura, pelo sentido social de suas idéias que se não apagarão. (Muito bem! Muito bem!)

O SR. DOMINGOS VELASCO: Sr presidente, o que mais me ligava a LÚCIO BITTENCOURT era o calor humano com que contemplava a vida social de nossa pátria. Mais do que a cultura jurídica, que, nêle, era poliforme; mais do que a eloqüência na defesa dos seus pontos de vida, prendia-me a LÚCIO BITTENCOURT o convívio agradável, fácil e humano. Bem poucas inteligências sincronizavam tanto com a minha como a daquele ilustre mineiro, não apenas pela maneira como se portava no Senado e na Câmara dos Deputados, mas também pela visão exata, nítida, que possuía dos problemas humanos.

Era um dos raros homens públicos brasileiros a sentir, a escutar o tropel da ascenção da massa trabalhadora, não sòmente em nosso país, mas em todo o mundo. Não que defendesse o direito dos trabalhadores de valorizar o esfôrço humano econômicamente e ascender na sociedade. Não o impressionava a alegria da ascenção das massas obreiras, a qual, realmente, constituía assunto muito interessante, sobretudo para os discursos de sobremesa. Não! LÚCIO BITTENCOURT identificava o trabalhador no homem da rua, de tamancos e com a barba por fazer. Como êsse, inúmeros foram, hoje, à Câmara dos Deputados, render homenagem ao seu representante.

Quantas vêzes, aqui mesmo no Senado no saguão do andar térreo, víamos fileiras de humildes trabalhadores, que vinham procurá-lo para com êle discutir seus problemas ou, então, apenas, para falar a um amigo!

Sr. presidente, era isto que eu estimava em LÚCIO BITTENCOURT.

O Senado conheceu-lhe a cultura, a coragem com que defendia seus pontos de vista, o poder de identificação com o seu semelhante, a fraternidade humana, a verdadeira caridade cristã, características de LÚCIO BITTENCOURT; e isto é o que ressalto neste instante.

Do ponto de vista político, nós, socialistas, tínhamos grande amizade ao companheiro desaparecido, tanto que foi nosso candidato a senador. Meu Partido foi o primeiro a levantar sua candidatura a esta Casa, como também, a lembrar seu nome para o govêrno do Estado de Minas Gerais. E não era por simples acaso que isso acontecia, mas, sim, porque o considerávamos um dos nossos.

O Partido Socialista Brasileiro, em todo o país, lamenta profundamente a perda de LÚCIO BITTENCOURT, que feriu não apenas o povo de Minas Gerais e o Senado, mas também a alma de todos os homens generosos que lutam pelos reais direitos dos que vivem do próprio trabalho. (Muito bem!)

O SR. VIVALDO LIMA: Sr. presidente, Srs. senadores, certa feita, deplorando o desaparecimento de homens públicos com assinalados serviços à Nação, não pude deixar de estranhar a presa com que o Destino encerrava a vida terrena, em seqüência alarmante e inexorável, de criaturas predestinadas a altíssimas missões no seio da humanidade.

Bem é de ver que, com tais e irreparáveis perdas, se exauriam as reservas morais de um povo, que já se desorienta e se intranqüiliza com os rumos que lhe acenam nas promessas os seus futuros guieiros.

Em repasse, de fato, aos nomes de que ainda dispõe, poucos que sejam, é de notar, esperanças fundadas havia de que novos alentos, em impulsos sobrenaturais, soerguessem uma pátria combalida, extenuada, desiludida, entredevorando-se inquietantemente, em louca agitação, os próprios sêres que lhe dão existência.

Assim transcorre uma época para êste povo digno de melhor sorte.

Fita, em ânsia atroz, os quadrantes do Brasil, tão vasto e promissor, à cata dos privilegiados que o conduzam ao apogeu merecido.

Desencanta-se, porém, aqui ou ali.

Algures, no entanto, aponta aos deuses os eleitos de sua consciência, a quem entrega, por suas virtudes excelsas, o seu próprio destino. Raros, pois, nesta geração atribulada, os que gozam de tal culminância, na benquerença, no aprêço, na vaidade, no entusiasmo e na confiança tão honrosa de tôda a Nação.

Neste período de agonia, que atravessa, face à incerteza do seu futuro político pelos desajustamentos e ambições incontroláveis, ainda sobra alguma luz a iluminar os espíritos de genuínos patriotas empenhados na redenção e no prestígio de sua amada terra.

Bem perto, numa réstea deslumbrante clareava, por inspiração altíssima, todos os contornos do acidentado torrão mineiro.

Na pregação diuturna, coerente de idéias e de princípios salutares, na programação cheia de objetividade visando a resolver problemas sócio-econômicos do grande Estado montanhês, não repousava o esguio físico de um iluminado andante, na obsessão de atrair e convencer as massas dispersas, em tão imensas áreas, para a justa e nobre causa que abraçara e defenderia até às últimas no pôsto que cobiçava.

Assim ia, de pouso em pouso, pelos ares preferentemente, em condor veloz de concepção humana, na pressa exigida pela angústia do tempo, vencendo distâncias incríveis, a fim de que se não omitisse mesmo com a mais longínqua e modesta povoação do Estado natal.

Em um dêsses lances, uma tragédia sobreveio, dolorosamente funesta em suas conseqüências. Na escuridão de uma noite, nas frias regiões de Itaobim, a ave metálica desorientada não encontra ninho apropriado, espedaçando-se na encosta de um morro traiçoeiro.

Aí está como se finou prematuramente, pelo azar de um vôo temerário, uma das mais lídimas expressões da intelectualidade e de cultura jurídica brasileira.

Assim, inesperadamente, sucumbe entre os destroço de um “Cesna” fatídico, uma figura exponencial de parlamentar e político de idéias sãs, que desempenha, pelos seus altos méritos e probidade inatacável, a função de líder da Bancada do Partido Trabalhista Brasileiro nesta Casa.

O trágico e chocante fim do nobre senador LÚCIO BITTENCOURT, em plena campanha em busca de um objetivo superior, pôsto do qual, se conquistado, de suas honradas e construtivas mãos fluiria soma incalculável de benefícios para o seu Estado e, precìpuamente, de melhoria palpável para as condições de vida do seu ordeiro e abnegado povo.

A morte ceifou, de tão brutal e intempestiva maneira, uma vida preciosa e útil a um lar amantíssimo, a uma causa, servida por uma ideologia humana, e a uma pátria desamparada, que encontrava nêle uma de suas maiores esperanças.

Tombou tão disforme, por obra cruel e hedionda da Fatalidade, a figura moça e futurosa, bem formada, sob todos os ângulos, de um autêntico líder e homem público, que não atinará, por isso mesmo, das insondáveis paragens do Além, com as razões da tremenda e lutuosa desgraça.

Irreconhecível quase, há pouco lhe deixamos os restos mortais na eterna morada dos seus saudosos extremecidos pais, surpresos e compungidos – quem sabe! – pela chegada imprevista do seu glorioso filho! …

Recolhem os céus, dêsse modo, o espírito probo e altruísta de um grande Ser.

Perde a Humanidade, porém, um dos seus maiores valores, dos mais devotados servidores dos seus nobilitantes ideais.

Chora amarguradamente o Brasil, em particular, o desaparecimento de um esperançoso compatriota, razão de um orgulho constante.

Eis, Sr. presidente, as expressões muito sentidas de nossa imorredoura saudade, através das quais deploram o Partido Trabalhista Brasileiro e sua Bancada no Senado da República, a morte do soberbo líder e companheiro CARLOS ALBERTO RIBEIRO LÚCIO BITTENCOURT. (Muito bem! Muito bem!)

O SR. GOMES DE OLIVEIRA: Sr. presidente, desejo associar-me às homenagens que a Casa está prestando a memória de LÚCIO BITTENCOURT.

E não podia ser mais penoso que aqui estivéssemos a registrar o desaparecimento de mais um colega, e dêsse que parece ter sido escolhido, pela fatalidade, pela idade, que era pouca, e pelo nome que era muito já, granjeado não só no seu Partido, mas no mundo político do país.

LÚCIO BITTENCOURT parecia um homem talhado para abrir caminho e vencer.

Soube por êle, mesmo, como conquistara cargos, à fôrça de concursos em que

alcançava invariàvelmente o primeiro lugar.

Assim êle, conquistando posições, acumulava erudição que, ao lado de um caráter adamantino, o haviam de impor cedo ao respeito e à admiração de quantos o conheciam e não só os seus pares na Câmara ontem, e no Senado hoje, mas já todo o mundo intelectual e político do país.

Mas, parecia o espírito que buscava o futuro, que se projetava para a frente, numa inquietação, melhor diria, numa ânsia de acompanhar o mundo que aí está, evoluindo rápido, sob vibrações do rádio, na velocidade do avião, nas mutações vivas da televisão e do cinema.

Moço ainda, para a culminância da política de que êle já se assenhoreava, seria de antever até onde iria êle, na sua atividade pública, e que de benefícios o seu Estado, Minas Gerais, e o país poderiam colhêr ainda da sua capacidade de ação, servida da inteligência e cultura que ornavam a sua personalidade. E morre numa campanha política, em que êle buscava ainda abrir caminho na vida política do seu Estado e do Brasil, rico de ação e de intrepidez de que se prevaleceria o Destino na emboscada em que o vitimou.

Resta-nos guardar a sua memória, reverenciá-la como estamos fazendo, e buscar suprir o enorme claro que êle deixa entre nós. (Muito bem! Muito bem!)

O SR. KERGINALDO CAVALCÂNTI: Sr. presidente, ao deixar a tribuna, quando em meu nome e no do meu Partido prestamos homenagens ao nosso inolvidável colega senador LÚCIO BITTENCOURT, tràgicamente desaparecido, recebi um telegrama do nobre senador ANTÔNIO DE BARROS FILHO, representante do Estado de São Paulo, pedindo-me transmitisse a esta Casa suas condolências.

O telegrama está redigido nos seguintes têrmos:

“Senador KERGINALDO CAVALCÂNTI – Senado Federal – Solicito do eminente amigo, incorporar ao seu discurso de homenagens à memória do pranteado senador LÚCIO BITTENCOURT, a minha profunda consternação. Em plena luta eleitoral, pelos mesmos ideais por que tombou LÚCIO BITTENCOURT, peço escusar-me perante os nobres colegas do Senado pela minha ausência pessoal. Abraços. – Senador Antônio de Barros Filho“.

Sr. presidente, na mesma ocasião, a Bancada da imprensa do Senado, sempre vigilante, também me solicitava pronunciasse, em seu nome, uma palavra de pesar pelo infausto evento.

Nada desejo acrescentar, Sr. presidente. Quanto tinha para dizer já o disse; e meus eminentes colegas, que depois ocuparam a tribuna apresentaram, com realidade e justiça, a personalidade do extinto senador LÚCIO BITTENCOURT. mostrando a lacuna impreenchível que resultou do seu passamento objetivo.

Sr. presidente, integro na minha oração precedente as manifestações de pesar não só do senador ANTÔNIO DE BARROS FILHO, como dos jornalistas que constituem a Bancada da Imprensa do Senado.

Era o que tinha a dizer, sr. presidente. (Muita bem! Muito bem!)

O SR. CAIADO DE CASTRO: Sr. presidente, representante do Partido Trabalhista Brasileiro e nobres senadores de outras agremiações políticas já falaram sôbre a personalidade de LÚCIO BITTENCOURT.

Parece, à primeira vista, não haveria lugar para que eu também ocupasse a tribuna. Não falo, porém, como representante de Partido, mas como político; represento apenas os estudantes de Direito da turma de LÚCIO BITTENCOURT, à qual pertenci.

Hoje, no cemitério, alguns colegas de turma pediram-me dissesse algumas palavras de saudade ao nosso velho companheiro dos bancos acadêmicos.

Conheci LÚCIO BITTENCOURT quando eu ainda moço, porém batido já pelos vendavais da vida, regressava dos sertões brasileiros, onde por mais de dois anos lutara pelo que então se chamava legalidade.

Saindo de São Paulo em julho de 1924, percorri quase todo o sertão brasileiro, retornando, no fim da campanha, em 1926. Depois de ter visto, tão moço ainda, tanta coisa estranha, de haver sofrido e sentido o que representa para um país a guerra civil, depois de avaliar e que há de perigoso ter o homem fôrça em suas mãos sem bem conhecer o poder do direito, decidi ingressar numa Faculdade. Convenci-me de que para bem empregar a fôrça é preciso conhecer o Direito.

Na Faculdade, encontrei, então, Sr. presidente, um adolescente, LÚCIO BITTENCOURT, de extraordinária fibra, lutando e sofrendo; trabalhava todo o dia para à noite estudar. Os próprios livros tinha dificuldade em adquiri-los.

Sr. presidente, quantas vêzes, com LÚCIO BITTENCOURT, eu, moço velho, discutia o futuro do Brasil, os problemas sociais. Pretendíamos encontrar uma solução entre o trabalhismo da “Rerum Novarum” e CARLOS MARX; quantas vêzes procurávamos, naquele anseio da mocidade, uma solução que a nós moços inexperientes parecia possível de ser encontrada.

Sr. presidente, falo em nome dêsse tempo, dêsse período em que mais de perto lhe conheci a sinceridade em todos os seus atos e gestos.

De outra feita, na Faculdade de Direito, procuramos socorrer um colega mais pobre que nós, um colega na eminência de encerrar o curso por não poder pagar a mensalidade. Coube a mim, um dos mais velhos da turma, promover a arrecadação dos meios para mantê-lo no estudo. Ao falar a êsse respeito com LÚCIO BITTENCOURT, também muito pobre, lutando com imensas dificuldades, disse-me êle: ajudemos ao nosso companheiro, mas não com listas, com subscrições; irá humilhá-lo; façamos como vocês na velha Escola Militar; no fim de cada mês entreguemos o dinheiro ao secretário da Escola, a fim de que salde a mensalidade.

Sr. presidente, essa solidariedade cristã, LÚCIO BITTENCOURT manteve durante tôda a vida.

Terminado o curso, prosseguiu em seus estudos, galgando as alturas: eu fiquei na planície, porque outra era minha profissão. Encontrei posteriormente LÚCIO BITTENCOURT em outras funções e, por último, aqui no Senado.

Sr. presidente, em meu nome e no de seus colegas de turma da Faculdade de Direito, expresso a nossa saudade e associo-me às palavras dos senadores que tão bem falaram sôbre a personalidade de LÚCIO BITTENCOURT.

Antes de finalizar, desejo dar conhecimento ao Senado Federal de um telegrama do presidente do Diretório do Partido Trabalhista Brasileiro, em Três Pontas, Minas Gerais, nos seguintes têrmos:

“Por intermédio de V. Ex.ª, o Partido Trabalhista de Três Pontas tem a honra de apresentar ao Senado sinceros pêsames pelo trágico desaparecimento do eminente senador LÚCIO BITTENCOURT. Atenciosas saudações dos Trabalhistas. – Dimas de Carvalho, presidente do Diretório”.

Era o que tinha que dizer, Sr. presidente. (Muito bem! Muito bem!)

O SR. COIMBRA BUENO: Sr. presidente, Srs. senadores, acabo de receber a honrosa incumbência de render aqui as homenagens dos funcionários desta Casa ao nobre senador LÚCIO BITTENCOURT.

A amizade foi, sem dúvida, uma das qualidades marcantes do caráter do ilustre colega ontem falecido em tão trágicas condições. O modo por que tratava a todos, não distinguindo entre colegas e funcionários, a atenção com que recebia os que o procuravam, em poucos meses granjeou-lhe a estima geral.

Perdemos um grande amigo!

Em poucos meses de convivência com êste grande brasileiro aprendemos a comungar os mesmos ideais, a defender os interêsses do país num clima em que os assuntos fundamentais de nossa pátria estavam sempre colocados em plano elevado. A simplicidade com que tratava a todos, a naturalidade com que abordava os assuntos primordiais, a inteligência que revelava no exercício dos mais difíceis encargos, tudo isso nos deixa a saudade e recordação de um grande companheiro. Poucos meses de convivência deixam-nos a dolorosa impressão da perda de um velho amigo, de muitos anos de luta.

LÚCIO BITTENCOURT continuará, para sempre, na lembrança de todos nós. E os funcionários, por meu intermédio, prestam-lhe simples e sincera homenagem, numa despedida final daquele que deixou em todos os nossos corações um amigo dedicado. (Muito bem! Muito bem!)

O SR. LIMA TEIXEIRA: Sr. presidente, o Partido Trabalhista Brasileiro já se manifestou, nesta Casa, através da palavra do nobre senador VIVALDO LIMA. Estaria eu, portanto, dispensado de falar, não fôra a circunstância de ter recebido de Minas Gerais, o Estado do ilustre senador LÚCIO BITTENCOURT, dois telegramas de diretórios do P. T. B., que peço licença para lêr, a fim de que figurem nos Anais do Senado.

O primeiro é de Passa Quatro, e diz:

“O Diretório do P. T. B. de Passa Quatro formula sinceros votos de pêsames pela morte do grande líder LÚCIO BITTENCOURT. – João Mota, presidente”.

O outro despacho do Diretório de São Gonçalo do Supucaí, está concebido nos seguintes têrmos:

“A Comissão Executiva do P. T. B. local envia sinceros pêsames pelo trágico desaparecimento do líder trabalhista LÚCIO BITTENCOURT. Nosso Partido

sente-se profundamente desfalecido por aquela perda. Saudações. – Jarbas Medeiros, secretário; Vasco Lemos, presidente; José Fonseca Azevedo, secretário”.

Sr. presidente, são telegramas procedentes de Minas Gerais, que o eminente senador LÚCIO BITTENCOURT representava no Senado, com tanta dignidade, sobretudo defendendo os interêsses do trabalhismo, o que, tantas vêzes revelou nos debates aqui travados. São manifestações de reconhecimento pelos serviços que prestou ao Partido Trabalhista Brasileiro, em diversas ocasiões demonstrando, sem dúvida, seu inexcedível espírito, de tendências nitidamente de amparo aos humildes, aos pobres e desafortunados, e que eram, sem dúvida, seu roteiro, nesta luta sem tréguas pelas reivindicações sociais em favor do trabalhismo.

Deixo registrados, por conseguinte, êstes telegramas do Partido Trabalhista Brasileiro de Minas Gerais, onde LÚCIO BITTENCOURT, nesta hora, disputava o pôsto de candidato ao govêrno das Alterosas, e onde era, sem dúvida, das figuras mais consideradas pelo povo brasileiro.

Era o que desejava dizer. (Muito bem! Muito bem!)

O SR. PRESIDENTE: Antes de levantar a sessão associo-me, em nome da Mesa e em meu próprio nome, às homenagens que acabam de ser prestadas ao nosso pranteado colega, o eminente senador LÚCIO BITTENCOURT.

Era S. Ex.ª uma das grandes figuras desta Casa, como fôra membro ilustre da Câmara dos Deputados, na legislatura passada. Cultor do Direito, penetrado de sadio idealismo, o senador. LÚCIO BITTENCOURT esmerou-se no estudo de assuntos constitucionais e das questões sociais, que o levaram a inscrever-se no Partido Trabalhista Brasileiro.

Pessoalmente, rendo-lhe a homenagem do meu reconhecimento, pela assistência com que me prestigiou, na Câmara dos Deputados, durante o tempo em que tive a honra de presidi-la. Presidente da Comissão de Constituição e Justiça daquele órgão do Poder Legislativo, sempre se mostrou à altura dos maiores juristas que êsse pôsto exerceram.

Sua morte não é apenas sensível perda para o Senado da República; consterna tôda a Nação, que nêle via o homem público, digno de tôda a admiração e de todo o respeito, a quem o destino reservaria os mais proeminentes papéis.

A LÚCIO BITTENCOURT, portanto, as homenagens da Mesa e o meu preito pessoal, que aqui vim hoje, exclusivamente, com o intuito de prestá-lo, como seu amigo dedicado e admirador sincero.

O SR. AFONSO ARINOS: Sr. presidente e Srs. deputados, a bancada da União Democrática Nacional, na Câmara, presta, nesta oportunidade, a sua homenagem profundamente comovida à memória de LÚCIO BITTENCOURT.

Não é apenas – e aqui falo especialmente em nome dos nossos patrícios de Minas Gerais – o amigo devotado, o companheiro leal, o aliado em muitas vicissitudes e lutas que hoje reverenciamos. É, sobretudo, e principalmente, o homem público, a figura singular e até mesmo excepcional de homem público da moderna geração que o nosso país e o regime democrático acabam de perder num golpe imprevisto e brutal da fatalidade.

LÚCIO BITTENCOURT representava, na sua formação política e cultural, na sua atitude humana, nos seus processos, figura exponencial do seu tempo. Pode-se mesmo dizer que LÚCIO BITTENCOURT era possìvelmente a mais característica e a mais marcante das figuras da nova geração política, que traduz uma fase de transição na evolução histórica da República.

Comecemos pela sua formação cultural. LÚCIO BITTENCOURT era grande estudioso, era grande sabedor; mas a sua formação cultural se tinha desvinculado daquele aparato filosófico e literário que, sem dúvida alguma, representa certo encanto, certo luxo e certa graça na cultura humana, que não deixa também de configurar, por outro lado, a expressão de vagares, de lazeres e de facilidades de tempo que são mais compatíveis com as épocas de estabilidade econômica e de tranqüilidade pública.

LÚCIO BITTENCOURT formou a sua cultura ao embate e ao entrechoque de diversas correntes ideológicas e diante de um mundo, de um continente e de um país atormentados pelas mais desencontradas indagações. Por isso mesmo, na minha opinião, êle não se esmerou, na elaboração de sua cultura, em acumular tôda aquela parte que chamaríamos a parte desinteressada ou, para me servir de uma expressão que foi muito em voga na época de minha mocidade, a parte clerical da cultura. Lembro-me aqui, principalmente, de dois ensaios famosos de JULIEN RENDA, “A Traição dos Clérigos” e o “Fim do Eterno”, em que êsse grande pensador francês mostrava precisamente o início de uma nova fase cultural, através da qual a cultura desinteressada iria declinar, enquanto que os homens marcados pelo sêlo do novo destino iriam emergir com uma expressa e intrìnsicamente utilitária, utilitária no bom sentido, no alto sentido e não no sentido do interêsse individual do estudioso. LÚCIO BITTENCOURT, dizia eu, formou, portanto, a sua cultura nessa fase de choques utilitários e assim tornou-se um homem de cultura geral, mas de cultura técnica.

Recordo-me aqui, certa vez, de que, em conversa com o Sr. deputado GUSTAVO CAPANEMA, meu companheiro de geração, meu colega de colégio e viandante comigo nesses atormentados caminhos da República brasileira – é verdade que sempre em vias paralelas, GUSTAVO CAPANEMA sempre dominando, ao lado do poder, e eu, quase sempre dominado, na trilha das oposições – dizia-me êsse ilustre brasileiro que lhe parecia ter LÚCIO o hábito de ler livros grossos demais. Para CAPANEMA, como para mim, existe a fascinação e o encanto dos livros breves, dos ensaios, dos poemas, das divagações filosóficas, dos passeios desinteressados da cultura; enquanto que para LÚCIO BITTENCOURT, bem mais moço que nós, estudioso severo, aplicado, sempre tendo em mira um objetivo público e geral, em tudo aquilo que trabalhava e em tudo aquilo que lia, a sua atração, o seu esfôrço, o seu encanto era precisamente o de debulhar, quase que podemos dizer, o de devassar os longos tomos técnicos de centenas e, talvez, de milhares de páginas. Mas essa formação predominantemente técnica, se, por um lado, não lhe facilitou, nem lhe concedeu aquela parte hedonista da cultura, aquêle sabor egoísta e voluptário da vida intelectual, que é exatamente o convívio com a beleza, abriu-lhe, entretanto, as portas de uma outra verdade e desvendou-lhe os caminhos de outros roteiros, que eram os da compassividade e os da solidariedade humanas.

Foi através dessa formação predominantemente técnica que LÚCIO BITTENCOURT pressentiu e descobriu o mar largo, o mar imenso dos sofrimentos humanos, e a êle se atirou como nauta prudente e, entretanto, audaz.

Aos homens de cultura literária, filosófica e desinteressada cabe, habitualmente, o papel, a incumbência e a função de definirem, de denunciarem e às vêzes – quem sabe? – de lastimarem os males e as injustiças humanas. Aos homens, entretanto, de formação técnica, de espírito político, de combatividade construtiva, como era o caso de LÚCIO BITTENCOURT, resta outro caminho que não o de descrever, definir e protestar, mas o de procurar, de agir e de corrigir. É o político na sua missão específica de reformador. Não é o pensador, com o seu destino e o seu mister de traçar os panoramas, mas é, exatamente, o reformador político, com a sua indefinível e misteriosa capacidade de encontrar o caminho que liga o coração individual do homem às esperanças coletivas da massa.

Êste era, exatamente, o segrêdo, como é o segrêdo do construtor político, desde que êle se situa naquela atitude e naquela posição de reformador social em que se tinha colocado LÚCIO BITTENCOURT.

Sr. presidente, não falarei do seu Partido. Falarei do seu movimento. Não desejo referir-me ao Partido Trabalhista Brasileiro, nem devem os nossos companheiros desta organização partidário supor que a ela eu estou dirigindo os reparos que vou fazer, como também não estarei visando a nenhuma outra agremiação dentre aquelas em que se divide o Congresso Nacional. Falarei em movimento trabalhista, e não em Partido Trabalhista.

No Brasil de hoje, LÚCIO BITTENCOURT representava uma das mais salutares, vigorosas e consoladoras esperanças do movimento trabalhista brasileiro. É que, Sr. presidente, o nosso movimento trabalhista padece de uma contradição intrínseca, de um conflito de correntes internas, que não apenas o debilitam nas suas bases, como podem, eventualmente, colocar em choque os instrumentos democráticos da realização socialista no nosso país.

O movimento trabalhista brasileiro, no que êle tem de mais expressivamente partidário, se divide em três correntes. Temos a ideologia tìpicamente sectária do marxismo soviético, de que não preciso aqui fazer a análise nem a biografia, porque essa biografia analítica ou essa análise biográfica se situa de maneira mais ou menos idêntica em qualquer dos países onde hoje se difunde e se amplia o comunismo internacional.

Outra corrente é a do trabalhismo caudilhista, personalista e carismático. Êste trabalhismo não deixa de corresponder a uma constante da nossa psicologia social, que é a aspiração de grandes massas trabalhadoras no sentido da realização de um meio, ou de um estilo de vida mais justo, mas também com o desprêzo ou o desinterêsse por certas fórmulas políticas e por certos princípios de natureza ética e intelectual. É uma transposição, para o século XX, daquela confiança ingênua, generosa, vital, fecunda, mas primária, das grandes massas latino-americanas, nas possibilidades individuais, que eu chamei carismáticas, de certas figuras representativas em cada geração. Esta é uma das fôrças, mas, também, uma das fraquezas do movimento trabalhista brasileiro. Grandes massas, aquelas que oferecem a base eleitoral mais sólida e mais fecunda à superestrutura política do país, se movem, se deslocam e se atiram, impetuosamente, não na procura de soluções objetivas, científicas ou gerais, que venham corresponder a determinadas premissas, a determinados programas ou planos, mas que se atiram cegamente no rastro, na linha e no caminho de certas personalidades marcantes que, por êsse conjunto misterioso de dados psicológicos de que se faz misteriosamente a chefia e não a liderança – e insisto aqui num tema em que mais de uma vez me tenho demorado, isto é, na diferença entre o chefe e o líder, que é a mesma diferença entre a ditadura e a democracia, – que seguem, dizia eu, essas poderosas personalidades que contem ou que contam com êsse dom misterioso de chefia. Êste é outro aspecto do trabalhismo nacional.

E, finalmente, há um movimento trabalhista expresso e representado então, por uma elite generosa de intelectuais presos a determinados compromissos programáticos, se não de natureza internacional, pelo menos de natureza grupal brasileira, uma teoria elaborada com muitos visos de acuidade, de perfeição substancial e formal que, talvez por isso mesmo, tenha conseguido ainda transpor os limites em que os partidos se podem conter mesmo dentro do plano das amplas associações culturais.

Entre o trabalhismo intelectual, o trabalhismo carismático e o trabalhismo sectàriamente marxista é que o poderíamos colocar como fiel da balança, como homem fronteiriço, como figura que absorvia o que qualquer dêsses movimentos tem de intrìsecamente construtivo, como figura que assimilava o que qualquer dessas posições tem de realmente progressista, mas, ao mesmo tempo, como homem que repelia, desdenhava e não aceitava aquilo que nessas posições se contém de indiscutivelmente dificultoso ou incapaz de ser transformado em corrente progressista da História.

LÚCIO tinha o sentido da imantação, o feitiço, a capacidade de despertar o entusiasmo da massa, mas não se vinculava a chefias e lideranças cuja presença corresponde à despersonalização dos adeptos. LÚCIO procurava nortear-se de acôrdo com programas e idéias, mas não se academizava na prática de idéias e de programas nesse mandarinato intelectual que isola o socialista utópico ou demasiadamente requintado e faz com que êle se transforme num professor de verdades não escutadas. LÚCIO, ao mesmo tempo, não fugia das imposições da dialética histórica, do materialismo dialético; não recuava diante das exigências do nacionalismo econômico, bandeiras que são nossas, ou que deveriam ser nossas, mas andam hoje empunhadas por outras mãos; bandeiras que costumam tingir com certas tonalidades avermelhadas. LÚCIO, que aceitava essas imposições da Economia e da Sociologia modernas, entretanto, não se acorrentava, não se atrelava, não se entregava de punhos atados ao carro soviético. Era, portanto, uma figura realmente importantíssima do movimento trabalhista brasileiro; êle se situava absorvendo, recebendo, crescendo, ampliando-se, alimentando-se, enriquecendo-se com o que tôdas essas correntes possuem de fundamentalmente construtivo e correspondente aos interêsses nacionais, mas abandonava, desprezava se me posso servir desta palavra, sem intuito contumelioso – tôdas aquelas ficções, aparências excessivas ou erros inerentes, respectivamente, a cada uma dessas três espécies do trabalhismo brasileiro, que não servem senão para confundir, agitar e implantar a injustiça e desfigurar a verdade democrática.

Sr. presidente, no desalinhavo dessas expressões, no improviso sincero destas palavras – a minha intenção era fazer com que falasse, em nome de nosso partido, o ilustre e nobre deputado BILAC PINTO, que, por motivos pessoais de íntima amizade com o ilustre senador desaparecido, tinha a precedência nesta tribuna – procuro realmente exprimir à Câmara aquilo que é o fundo do meu pensamento e o fundo do meu coração, na maneira de julgar esta grande e jovem figura de mineiro desaparecido há poucos dias para luto e tristeza de todos nós.

Animado de um sincero e profundo pesar, eu, que fui seu amigo, eu, que continuo a ser um admirador da sua obra política, trago a esta Tribuna a palavra do meu partido e a segurança de que tudo faremos para aproveitar a lição de LÚCIO BITTENCOURT. (Muito bem, muito bem. Palmas. O orador é abraçado.)

O SR. CARMELO D’AGOSTINO: Sr. presidente, senhores deputados, o prematuro desaparecimento de LÚCIO BITTENCOURT é uma das ciladas que a fatalidade prepara à vida humana. É, por todos os motivos, deplorável, porque a tragédia levou consigo um homem ilustre pleno vigor da idade. LÚCIO estava no fastígio da sua personalidade, estava na luta, em contato com o povo, para dizer-lhe das suas peregrinas promessas. Era lidador da palavra sincera, a sua proposição nunca levara o estígma da demagogia ou do sofisma. Nos seus empreendimentos, víamo-lo sempre só. Não cogitava de grupos do ou de partidos para atirar-se à luta, tal a responsabilidade e a segurança com que forjava a sua personalidade. Era meditativo quando falava das suas pretensões. Para executar seu programa de ação não pedia auxílios, conduzia-o direto às massas e perante o povo firmava a sua convicção. Assim foi no último pleito, quando, sòzinho, lutou por uma cadeira de senador. A expressividade da votação que obteve foi o melhor atestado de reconhecimento à sua incontestável capacidade de homem público. Ia à luta com as suas próprias armas e uma inabalável fé. Os partidos o acolhiam, porque nêle vislumbravam o candidato forte, digno, honrado, capaz de polarizar o eleitorado, e, sobretudo, porque êle estava sempre equidistante de qualquer mácula. Havia em LÚCIO algo que o atraía à simpatia do povo. Simples e cativo, embora portentoso na cultura de jurista, tinha gestos humildes quando era contrariado. Mas sempre estivera à vontade para entregar-se à luta e dela sair com os louros da vitória.

Era férreo na sua lisura, não declarava o que não fôsse verdade. No exame dos homens públicos, cuidava antes de indagar de seus atos, para depois analisá-los nas suas inclinações pessoais, respondendo, com a sabedoria e prudência que lhe eram peculiares. A sua opinião era sempre externada, para o aplauso ou para a censura.

Quantas vêzes, Sr. presidente, neste recinto, LÚCIO BITTENCOURT confessara seus deveres de gratidão para com Getúlio Vargas, mas que nem por isso poderia estar acorde com atos avessos à sua consciência? Quantas vêzes, Sr. presidente, não era a seu próprio partido que contrariava? Todavia, o comportamento de LÚCIO não evidenciava uma vontade deliberada de oposição, pelo contrário, era sempre construtivo nas suas críticas, procurava, pelo equilíbrio, pela reflexão, dar na análise dos fatos político-partidários ou administrativos o melhor sentido de sua colaboração. Não buscava no gesto notoriedade à sua pessoa, mas o esclarecimento à justa causa. Pouco a pouco, LÚCIO crescia em seu prestígio, fortalecendo, a cada vitória, a sua inata vocação para liderar. Mas, de que forma liderar, Sr. presidente? Na direção de partidos, na persuasão de cabos eleitorais? Não; para êle a liderança tinha outro sentido muito mais elevado, destituído de interêsses pessoais. Estava na ponderação dos fatos políticos, no discernimento aos melhores resultados de qualquer decisão, no tirocínio da experiência que granjeara nos contatos com o povo, nos legítimos anseios de um homem cuja conduta se pautava pula dignidade, firmeza e fé num ideal social. Aí está a razão da sua vertiginosa carreira. LÚCIO tinha o condão de aglutinar todos os homens que acreditavam estar no exercício de uma política sã e sincera, no caminho certo, onde a nossa gente encontrasse os seus melhores desígnios.

Eis como se agigantou êsse ilustre filho de Minas. Não há dúvida Sr. presidente, reservara-se para êle o papel de condottiere popular. A sua pessoa alteava a figura do líder. Foi brilhante em todos os momentos da sua carreira como jurista. As primeiras classificações nos concursos a que se submeteu são a mostra mais clara da sua prodigiosa inteligência. No trato diuturno com o Direito, assimilou vastíssimo cabedal, galgando sucessivamente postos de destaque na vida pública do país. Professor universitário, jurisconsulto acatado sobretudo na sua especialização, como tratadista do Direito Constitucional, LÚCIO pontificou como jurista e como político de qualidades excepcionais. A êle muito se deve pela remodelação dos métodos administrativos do organismo público. Laureado com viagens de estudos à América do Norte, de lá nos trouxe a divulgação comparada de outros ordenamentos jurídicos, enriquecendo de maneira notória o acervo da cultura nacional.

Tribuno de palavra emoldurada, eloqüente e fácil, portador de robusto saber, LÚCIO jamais se pronunciou vaziamente. A sua cultura eclética e inédita dava a qualquer ato ou obra sua um colorido invulgar. Muitos dos que aqui estão tiveram oportunidade de ouvi-lo. A atenção que se lhe dispensava só era devida a um mestre.

LÚCIO BITTENCOURT era emotivo. Deus o fizera extremamente sentimental. Condoia-se dos sofredores, aos quais sempre tinha amenas palavras de confôrto e de estímulo. Pai amantíssimo, referia-se a seus filhos tomado de cândida doçura. Esposo de sublimadas afeições. Filho e irmão dedicado. Ouvi-lo falar de seu afetuoso pai era observar a saudade que vincara o seu coração. Falecido o genitor, assume o escritório de advocacia, na faína de suprir a família dos recursos de vida. Proviera de berço pobre e no cadinho das privações forjou o seu bravo espírito de lutador. Sentira o sofrimento dos humildes, decidindo, na sua cruzada política, defendê-los intransigentemente.

Era amigo incondicional. Várias vezes aquilatamos êste seu incomum predicado. Certa feita, alguém tentou abalar as nossas sinceras relações de amizade. O intrigante recebeu formal refutação do amigo LÚCIO, que lhe adiantara conhecer-nos, não aceitando qualquer referência menos leal naquele sentido. Em nenhuma circunstância abdicava dos nobres princípios que entrelaçam uma amizade sincera. Acolhida por vários partidos a sua candidatura à governança de Minas, tivera, por fim, proposta de agremiação cujo chefe havíamos hostilizado. Perguntara-nos, então, se haveria inconveniência em aceitar aquela proposta, ao que, espantados pela sua lisura, pela sua lealdade de amigo, lhe respondêramos que o gesto da sua parte era invulgar, revelara a pureza dos nossos laços de amizade. Nada haveria de inconveniente, dissemos-lhe, pois a adesão era mais uma prova evidente da confiança que os partidos depositavam na sua pessoa.

E que dizer da sua excelsa companheira, essa virtuosa senhora, estímulo e anjo da guarda de suas alevantadas aspirações? Para ela, LÚCIO sempre tinha palavras de enternecido carinho. Quantas vezes não o ouvimos dizer da ajuda moral, e material que lhe dava a querida Aidéia! As minhas cogitações públicas, dizia-nos, são como preces a Deus, agradecendo a espôsa que tenho, pois o seu estímulo é o melhor amparo à continuação da luta em prol dos meus ideais políticos.

Em São Paulo, em nosso último encontro, falou-nos do trabalho da sua dileta espôsa, contando o elevado número de cartas feitas e enviadas para sua campanha. Arrematou dizendo-nos que a santa espôsa era a luz dos seus empreendimentos, a fôrça ideal dos seus anseios.

Permita-nos, Sr. presidente, que desta tribuna compartilhemos com a Exm.ª Sra. D. Aidéia do Lago Bittencourt e diletos filhos a tristeza pelo infausto acontecimento. A dor da fatalidade é das mais pungentes, por vêzes até inconformável, porém, a lembrança de uma vida inteiramente devotada à causa pública, pontilhada de feitos notáveis, será o marco indestrutível que a história guardará nas suas páginas. Pois bem, o prematuro desaparecimento de LÚCIO BITTENCOURT é um golpe irreparável à pátria. A trágica ocorrência tirou ao país, talvez, a oportunidade de um seu ilustre filho pontificar na sua plenitude, os mais altos postulados da doutrina política.

Em verdade, LÚCIO BITTENCOURT foi exemplo como político e homem público em tôda a sua profícua existência. Em nenhum momento falseou nos seus ideais, na sua dignidade, na sua fé, na sua nobreza de espírito e fortaleza de caráter.

Falam que a morte aponta o ilustre e o imortaliza.

LÚCIO BITTENCOURT, em vida, já era ilustre, já tinha reservado o seu lugar na história política e jurídica da Nação. O exemplo da sua vida útil e proficiente é o maior legado a todos quantos tiveram a felicidade de conhecê-lo na sua atuação simples, mas de uma nobreza sem par.

Êle estará sempre presente, porque a sua vida e a sua obra serão inapagáveis na exaltação dos que o conheceram. (Muito bem; muito bem. O orador é cumprimentado.)

O SR. CASTILHO CABRAL: Sr. presidente, era do meu desejo prestar homenagem ao nosso colega LÚCIO BITTENCOURT.

Verifico, no entanto, que o art. 104 da Lei Interna, ao tratar de manifestações dessa natureza, só admite seja o requerimento encaminhado por dois deputados. Creio que o art. 66, distinguindo entre falecimentos de congressistas da presente legislatura e de outras, admitirá, interpretação através da qual V. Ex a poderá conceder a palavra a outros oradores que, como eu, desejem homenagear o parlamentar desaparecido. (Muito bem.)

O SR. PRESIDENTE: De fato, o artigo 104 diz que “dependerá de deliberação do plenário, será escrito, encaminhado por dois deputados e votado por, pelo menos, 50 deputados” o requerimento de manifestação por motivo de luto nacional, oficialmente declarado, ou de pesar pelo falecimento de congressistas de qualquer legislatura, etc., portanto, congressistas de qualquer legislatura, inclusive da atual, V. Ex.ª, no entanto, diz muito bem que o art. 66 faz distinção especial para o congressista da legislatura em curso, porque só para esses se abre a exceção do levantamento dos nossos trabalhos.

O artigo em apreço diz:

“A sessão da Câmara só poderá ser levantada, antes de finda a hora a ela destinada nestes casos:

“I) tumulto grave;

“II) falecimento de congressista da legislatura corrente, ou de chefe de um dos poderes da República”.

Mas quando, no art. 104, se refere ao encaminhamento da votação, é para tôda e qualquer manifestação de pesar, isto é, no seu sentido amplo. No caso, porém, do falecimento de congressista da atual legislatura, essa manifestação de pesar poderá estender-se até o levantamento da sessão.

Tenho, entretanto, de considerar o seguinte: o saudoso senador LÚCIO BITTENCOURT foi um dos nossos mais caros companheiros, ainda há pouco tempo, e exerceu inclusive a presidência de uma das maiores Comissões da Casa, com grande autoridade: a Comissão de Constituição e Justiça.

Assim, consulto à Casa sôbre se consente que, neste caso, falem além dos dois oradores que o Regimento limita e que já solicitaram a palavra, outros, até o máximo de 10.

Os senhores que aprovam a extensão do direito de falar até 10 deputados queiram ficar como se encontram. (Pausa.)

Aprovado.

Tem a palavra o Sr. deputado CASTILHO CABRAL.

O SR. CASTILHO CABRAL: Sr. presidente, o senador CARLOS ALBERTO LÚCIO BITTENCOURT morreu em plena campanha. É mais um da série de políticos de grande expressão, em nossa pátria, que desaparece no decurso de uma campanha eleitoral.

Nós nos recordamos de SALGADO FILHO, vitimado, no Rio Grande do Sul, quando percorria aquêle Estado na difusão dos seus ideais e na captação dos votos que haveriam de decidir, no pleito democrático, da escolha do dirigente daquela Unidade da Federação; nós nos recordamos de LAURO FARÂNI DE FREITAS, desaparecido também em desastre de avião, no interior da Bahia, quando levantava a gente daquela terra para a disputa do Govêrno do Estado; nós nos recordamos do DIX-SEP ROSADO, já terminada a campanha, vitimado também quando viajava de avião.

Vários outros políticos têm perdido a vida, nas campanhas, mostrando que, na verdade, a carreira política é a mais perigosa de tôdas quantas existem, principalmente na nossa terra. Vê-se, na generalidade, que o político, ou sucumbe de uma infarto do miocárdio, ou sucumbe de um desastre de avião.

Nesta carreira perigosa, temos agora a lamentar a perda de um dos florões daquela geração sacrificada que o nobre deputado NESTOR DUARTE não sabe bem situar no tempo, mas que poderíamos dá-la como sendo aquela dos homens que nasceram no último decênio da era vitoriana e que, assim, no melhor da sua vida, sofreram o impacto de duas guerras e, mais do que isso, de dois após-guerra, e, no Brasil, mais do que tudo isso ainda, o de uma ditadura que nos roubou a nós o direito de, de cabeça erguida, procurar, nos prélios democráticos, o caminho que satisfizesse a vocação à causa pública de cada um de nós.

LÚCIO BITTENCOURT pertenceu a uma das mais moças destas gerações sacrificadas e daí o haver sido obrigado a iniciar, como tantos outros da nossa geração, a sua vida política pela Câmara dos Deputados Federais.

Trazia, no entanto, LÚCIO BITTENCOURT para os embates parlamentares grande cultura, grande coração, a verdadeira vocação do homem que, vindo de jornaleiro na sua infância, se achava, agora, em plena campanha, com o bastão de marechal na política em suas mãos, pois exercia o cargo de senador da República.

Recordo-me bem do espanto produzido pela primeira demonstração de LÚCIO BITTENCOURT nesta Câmara, em 1951, quando, logo nos primeiros dias de abril, assustava os tubarões e assustava o govêrno com as suas duas proposições iniciais: a primeira, o projeto de extinção das ações ao portador; a outra, o do congelamento dos preços das utilidades.

Lembro-me, Sr. presidente, e com saudade, daquele tempo em que juntos vivíamos os momentos melhores da Comissão de Constituição e Justiça, no princípio da legislatura, moços de cabelos brancos que ali vínhamos, cheios de entusiasmo, lutar pelos ideais de tôda a sua vida.

Formávamos, na Comissão de Constituição e Justiça, um grande grupo, em que se destacavam, sem dúvida, as figuras de LÚCIO BITTENCOURT e AFONSO ARINOS, e em que era moda e resolução não deixar passar qualquer parecer sem a censura de um outro colega, desde que no parecer se encontrasse, pelo menos, uma vírgula mal colocada.

Recordo-me, de início, daquela discussão tão interessante sob o aspecto constitucional, relativa à duração da legislatura, em que minha indicação foi relatada por LÚCIO BITTENCOURT, que então escreveu uma das mais belas páginas do Direito Parlamentar, na qual demonstrava sua grande cultura jurídica e seu alto espírito político.

Recordo-me da ira sagrada de LÚCIO BITTENCOURT ao discutir o famoso projeto de extinção das ações ao portador, proposição que conseguiu o milagre de unir, na Comissão de Constituição e Justiça, todos os líderes do partido para sofrer combate duro no plenário, e, afinal, apesar da defesa extraordinária feita pelos que o haviam aprovado naquele órgão técnico, ser aqui derrotada.

Recordo-me da dedicação de LÚCIO BITTENCOURT, quando, renovando o projeto que tivera a honra de propor à Câmara sôbre a extinção da cláusula da assiduidade integral, não se contentava com a luta no plenário e ia, de sindicato em sindicato, de associação de classe em associação de classe, mostrar que a extinção dessa cláusula não era apenas o reconhecimento da injustiça clamorosa de uma providência insensata, porque, longe de combater o absenteísmo, vinha, na verdade, trazer estado de intranqüilidade e de luta entre o operário e o patrão, que muito mais prejudicava a economia nacional do que uma ou outra falta do trabalhador.

Recordo-me de LÚCIO BITTENCOURT, como um espírito tímido, no contato diário, que se agigantava quando uma proposição lhe tocava aquêles ideais que, com tanto brilho, o Sr. AFONSO ARINOS enumerou da Tribuna.

O Sr. Afonso Arinos: Obrigado ao nobre deputado.

O SR. CASTILHO CABRAL: LÚCIO BITTENCOURT, com 44 anos, deputado federal numa legislatura, senador federal no comêço de outra, passou na política nacional deixando, sem dúvida, um rastro de luz – luzeiro que era, evidentemente, na Câmara e no Senado – um rastro de luz de sua cultura humanística e jurídica. Jurista completo, porque era tão autoridade em Direito Administrativo quanto em Direito Constitucional, ou em Direito Civil, LÚCIO BITTENCOURT deixou-nos, sem dúvida, a nós, os seus colegas, e ao Brasil, uma grande obra, que os seus amigos e, mais do que os seus amigos, todos os juristas do país hão de conservar, hão de resguardar como um legado precioso às gerações futuras. (Muito bem; muito bem. O orador é abraçado.)

O SR. NESTOR DUARTE: Sr. presidente, em nome do Partido Libertador, aqui estamos de alma triste e coração pesado para prestar a homenagem que a Câmara e os Partidos devem ao senador LÚCIO BITTENCOURT, ao ex-deputado LÚCIO BITTENCOURT, ao jurista LÚCIO BITTENCOURT, a êsse homem que, com tais títulos que o êxito da carreira política pôde oferecer, possui um outro menos transitório, mais real e mais autêntico, sobretudo mais perene – o de homem de inteligência, o de homem de cultura, que está a exigir de nós homenagem mais demorada.

Como bem significou o nobre deputado AFONSO ARINOS, LÚCIO BITTENCOURT, pelo que fêz e demonstrou, tem o direito de ser julgado como homem de inteligência e de cultura.

Dêle, como de tantos outros com tais dotes, podemos dizer que valem ser julgados, menos pelos dotes que o, acaso e a sorte conferem do que pelo emprêgo que souberam dar a essas qualidades.

LÚCIO BITTENCOURT, por sua inteligência, pela sua cultura, pelas convicções que adquiriu com essa inteligência e essa cultura, merece de todos nós a reverência que um homem dêsse porte, através da tenacidade e do esfôrço silencioso pôde alcançar e conquistar, donde ser hoje – no instante em que choramos – um jurista de escol que perdemos e, por isso, lamentamos profunda e sinceramente. (Muito bem; muito bem. O orador é abraçado.)

O SR. GUSTAVO CAPANEMA: Sr. presidente, perde o país, com a morte do senador LÚCIO BITTENCOURT, um dos maiores homens públicos da nossa geração.

Poderíamos indicar, na sua personalidade, uma série de notáveis qualidades, próprias a compor a fisionomia do grande homem.

Apraz-me, nesta oportunidade, quando oradores tão brilhantes acabam de pincelar a figura do querido morto, apraz-me dizer o que eram nêle o idealismo e a paixão. Difìcilmente poderão reunir-se, de maneira tão viva numa alma humana, como em LÚCIO BITTENCOURT, estas duas flamas, estas duas fôrças, estas duas armas: o idealismo e a paixão. Diante de todos os problemas, em face de todos os compromissos e vicissitudes, o que, acima de tudo, vibrava, em LÚCIO BITTENCOURT era o forte e inelutável apêlo do ideal. E não era o seu idealismo um modo de ser frio e calculado. Não era um idealismo sujeito aos condicionamentos do mundo. Era um idealismo cheio de paixão. Não conheci homem capaz de tanta paixão como LÚCIO BITTENCOURT. Nas circunstâncias da vida parlamentar ou da vida partidária, na sua alma tumultuava sempre uma grande paixão. Que admirável espetáculo êste de um homem público dominado pelo idealismo e pela paixão, numa época espiritualmente tão reduzida como a nossa; numa época em que a gratuidade própria a êste sentimento é tão rara; numa época de tanta materialidade, tão dominada pelas razões profanas, tão cheia de imediatismo e de oportunismo; numa época de tão grande decadência dos valores espirituais, que sustentam o sacrifício e o heroísmo! Creio serem êsses os traços dominantes da personalidade de LÚCIO BITTENCOURT. Certo estou, por admirável que tenha sido o seu esfôrço construtivo na vida parlamentar e partidária, por esplêndida e profícua que seja a obra intelectual por êle deixada, certo estou de que, da sua passagem tão rápida pelo mundo, o que vai ficar de mais edificante é êste resumo, é êste exemplo, é esta mensagem, a saber, que o homem, seja o simples cidadão, seja o líder político, só será verdadeiramente grande se trouxer, no coração, em meio a tôdas as circunstâncias tranqüilas ou adversas, em face dos amigos e dos adversários, as claridades do idealismo e o fogo da paixão! (Muito bem; muito bem. O orador é abraçado.)

O SR. ROGÊ FERREIRA: Sr. presidente, poucas palavras e apenas para trazer a solidariedade do Partido Socialista Brasileiro.

Não conhecia LÚCIO BITTENCOURT mas o admirava. E sabiam os socialistas de Minas Gerais, quando o fizeram seu candidato a governador do Estado das Alterosas, do seu grande valor, hoje mais uma vez aqui exaltado por quantas figuras eminentes se manifestaram.

Nós, moços, que entendemos que LÚCIO BITTENCOURT realmente representa um exemplo para os idealistas, trazemos a nossa solidariedade a todos aquêles ligados ao eminente homem público, quer partidàriamente, quer pelos laços de amizade. Estas as palavras dos socialistas, neste instante doloroso. (O orador é abraçado.)

O SR. ARNALDO CERDEIRA: Sr. presidente e Srs. deputados, é sob a mais sentida das emoções que me desempenho da incumbência de líder do meu Partido para associar-me às manifestações de pesar pelo passamento do senador LÚCIO BITTENCOURT.

Dizer da sua personalidade, Sr. presidente, seria repetir, com menos brilho, os conceitos já expendidos nesta Casa com sentimento de realismo e justiça.

Quero tão-sòmente, nesta hora, olhar LÚCIO BITTENCOURT através da sua personalidade de homem simples, de homem que decide com oportunidade e sobretudo com precisão, e cujo principal mérito consiste no próprio valor.

LÚCIO BITTENCOURT, realmente, pela cultura e talento, pelo caráter e bondade, conquistou destacado lugar na atual geração. Eu, que com êle convivi, posso dar testemunho de que a paixão, o ardor, o idealismo de LÚCIO BITTENCOURT tinham sobretudo a consolidá-los, a lhes dar maior expressão, a grandeza da sua alma e do seu coração.

O Partido Social Progressista traz, nesta hora de luto para a Nação, o seu sentimento de pesar pela perda irreparável que acaba de sofrer e se associa a tôdas as homenagens que esta Casa e o país ora prestam a LÚCIO BITTENCOURT. (Muito bem; muito bem. O orador é cumprimentado.)

O SR. RAIMUNDO BRITO: Sr. presidente e Srs. deputados: O Partido Republicano, por meu intermédio, associa-se as homenagens de profundo e sincero pesar com que a Câmara registra o falecimento de LÚCIO BITTENCOURT.

Dizia o grande pensador alemão KEYSERLING, autor do “Diário de Viagem de um Filósofo”, que o conhecimento de um povo se podia fazer através de breve contato com êsse povo, sem necessidade de acurada observação e estudos dos seus costumes, das suas tendências, da sua história, da sua tradição, do seu modo de ser.

Há homens, cujo breve contato revela aos nossos olhos, imediatamente, a sua alma diáfana; há homens que nos proporcionam um conhecimento completo do seu espírito e de sua alma através de um simples contato. Convivi com LÚCIO BITTENCOURT durante alguns meses apenas, conquanto já fôsse seu íntimo intelectual, porque no silêncio, na quietude de minha província, muitas e muitas vêzes, nas páginas lapidares que êle escreveu, bebi ensinamentos e aprendi lições que jamais poderei esquecer. E aqui, na Capital Federal, em contato pessoal com aquela figura singular de homem público e de jurista, capacitei-me das suas qualidades extraordinárias de cidadão, de intelectual e de político.

O Sr. Ulísses Guimarães: Pediria a V. Ex.ª, aliás, um dos membros mais ilustres da Comissão de Constituição e Justiça, que trouxesse a homenagem daquele órgão desta Casa, que o então deputado LÚCIO BITTENCOURT, por tôda a legislatura passada, durante quatro anos, enriqueceu com o seu talento, através de pareceres primorosos e honrou ocupando a sua presidência. Peço a V. Ex.ª que, em nome da Comissão da Constituição e Justiça, exteriorize os nossos sentimentos pelo infausto passamento do grande jurista LÚCIO BITTENCOURT.

O SR. RAIMUNDO BRITO: Perfeitamente.

Sábio, sem ser orgulhoso, talentoso sem ser presumido, LÚCIO BITTENCOURT, incontestàvelmente, um exemplo de homem que construiu sua própria vida a golpes de inteligência e de trabalho era, no trato social, na vida com seus pares, com seus alunos, com seus colegas, de grande afabilidade e correção.

Era êle antes de tudo um gentleman, no verdadeiro significado da palavra. Construiu, disse eu, sua vida, porque foi curvado sôbre os livros, empenhando tôdas as suas energias na aquisição daqueles conhecimentos que haviam de preparar sua estrada magnífica na vida pública e na cátedra, que LÚCIO BITTENCOURT se elevou às alturas a que chegou, alvo da nossa admiração, do nosso respeito, e, sobretudo, da nossa amizade.

Situemo-lo como quisermos, estudemos a sua personalidade de qualquer ângulo, que ela ressairá engrandecida aos nossos olhos, pelas qualidades excepcionais que a exornavam.

Como jurista, não sei bem em que mais se distinguiu: se como professor de Direito penal, disciplina que êle dominava, com plenos conhecimentos; se como constitucionalista, se como cultor do direito administrativo. Em todos os ramos da ciência jurídica, seu espírito vivaz, vigilante, dúctil, compreensivo e capaz de envolver, de uma só visada, os múltiplos aspectos dos problemas da Ciência do Direito, em todos êles sua personalidade sobressaiu, marcando traços indeléveis na história da nossa cultura jurídica.

Homem público, empolgou-se pelo movimento trabalhista e representou, na verdade, o expoente daquela fase do processo de evolução do trabalhismo no Brasil, o processo cultural de estruturação ideológica dêsse movimento a que êle emprestou o brilho da sua cultura e o encanto do seu talento e, mais do que isso, a fôrça da sua convicção.

A tudo isto, porém, sobressaía sempre a meus olhos, no amável contato que tivemos nestes últimos meses de vida intelectual em comum – eu que o admirava de há muito, na quietude silenciosa da minha província – aquêle conceito que dêle eu fizera, e que vi aqui reafirmado, porque tive a felicidade de, em sua intimidade, aprender o verdadeiro sentido da sua vida e os traços característicos da sua personalidade de escol.

Chegado a esta Casa, e ingressando na Comissão de Justiça, tenda de trabalho, a cujo grêmio me honro de pertencer, encontrei firmada uma tradição de cultura e de brilho, pois LÚCIO BITTENCOURT deixou ali um traço indelével e um rumo, uma diretriz que até hoje seus humildes continuadores, que somos, procuramos seguir aprendendo as lições que êle deixou.

A Comissão de Justiça, Sr. presidente, em nome da qual tenho a honra de falar neste instante, sente-se parte nos sentimentos que hoje enuviam a nossa inteligência, emocionam a nossa palavra, conturbam o nosso espírito, empolgam a nossa alma impedindo que o fluir das palavras desta homenagem se faça de maneira serena e harmônica. E é no desalinhavado dêste improviso, tocado da mais profunda, da mais sincera emoção, que, em meu nome pessoal, em nome do Partido Republicano e da Comissão de Constituição e Justiça, que êle tanto honrou, trago a minha palavra de amigo saudoso, sôbre a tumba do homem que a fatalidade roubou à nossa Pátria, ao convívio dos seus pares, dos seus amigos e de sua família. (Muito bem; muito bem. O orador é abraçado.)

O SR. GERALDO MASCARENHAS. Sr. presidente, uma realidade que não podemos contestar é a de que precisamos. em todos os setores, de homens capazes. O grande esfôrço que o Brasil necessita realizar, esfôrço que deve efetuar em todos os sentidos, envolvendo todos os problemas, desde os mais simples até aos de maior relevância, reclama, de forma imperiosa, a presença de espíritos lúcidos, temperamentos dinâmicos e de inteligências criadoras. Por isso mesmo é que se multiplica a intensidade do golpe que a Nação e, com ela, o Congresso Nacional, acabam de sofrer com o desaparecimento trágico de uma das mais destacadas figuras da nova geração com que o povo mineiro se representava no Legislativo – o senador LÚCIO BITTENCOURT. Comove-nos profundamente êsse desaparecimento. Longe de qualquer alusão às conseqüências que tão doloroso acontecimento poderá trazer, ao panorama político estadual ou nacional, o que temos em mente é que perdemos uma das mais puras expressões do pensamento político brasileiro. Porque, nêle, havia, em alto grau, a altivez, a determinação, a paixão que o faziam um dirigente político perfeitamente definido. Não se comprazia em surpreender, em enredar, em negacear. Certo ou errado, manifestava-se. Era um homem cujas atividades correspondiam aos pensamentos que as animavam. E vai, nessa afirmação, sincero elogio que se pode fazer a um político. Essa coerência, que provinha da integridade de seu caráter, torna-se ainda mais admirável quando sabemos das dificuldades com que LÚCIO BITTENCOURT empreendeu a sua luta pela vida, uma vida trabalhosa, sobremaneira árdua desde seus primeiro anos, quando se viu na orfandade.

Menino ainda, trabalhou para estudar. Entrou pela adolescência fiel a êsse tenaz espírito de trabalho e estudo. Enveredou pela imprensa. Foi revisor. Estudou direito. Prestou 10 concursos e tirou 10 primeiros lugares, inclusive a cátedra de Direito Penal da Universidade de Minas Gerais. Tornou-se técnico do D.A.S.P.

Uma vez formado, milita no Fôro e consegue ser consultor jurídico do D.A.S.P. e da L. B. A. Conquista uma bôlsa de estudos e realiza um curso de administração nos Estados Unidos. Mas não se projetara ainda. Amplia seus conhecimentos jurídicos e, quando, em 1950, se vê eleito deputado federal pelo povo mineiro, na legenda do Partido Trabalhista Brasileiro, LÚCIO BITTENCOURT tem a sua grande oportunidade para demonstrar a amplitude de sua cultura, a elevação de seu pensamento, enriquecendo os Anais desta Casa com discursos e pareceres que o nivelam, sem a menor sombra de dúvida, aos nossos grandes mestres, e como dos mais ilustres membros da Comissão de Justiça.

No Senado Federal não teve, talvez, o tempo necessário para dar uma contribuição maciça de seus conhecimentos. Problemas de ordem política levaram-no a candidatar-se ao govêrno do Estado de Minas Gerais.

Estava em plena campanha quando o imprevisto colheu-o de forma dolorosa. Na qualidade de representante do P.T.B., e em nome da bancada, rendo minha homenagem à memória dêsse ilustre companheiro que sempre foi um grande batalhador, que não conheceu o repouso e que, sem contestação, faz imensa falta ao povo de Minas Gerais e ao Brasil. Também agradeço as confortadoras palavras de todos os colegas tendo à frente os vários ilustres líderes de Partido, nessa hora tão dolorosa para todos nós, em que tomba na linha de frente um chefe de família exemplar, um intelectual, um jurista e um político que se projetou em tôda a nação.

O Sr. João Machado: Sr. deputado, eu queria pedir permissão a V. Ex.ª para incluir no brilhante discurso que está proferindo os agradecimentos do povo do Distrito Federal ao pranteado senador LÚCIO BITTENCOURT. Representante do povo desta cidade, reconheço que o Distrito Federal tem uma dívida de gratidão para com políticos de outros Estados, principalmente o deputado e líder da União Democrática Nacional, Sr. AFONSO ARINOS, os senadores KERGINALDO CAVALCÂNTI e ATÍLIO VIVÁQUA e também LÚCIO BITTENCOURT, cuja morte envolveu de luto a família petebista, bem como a totalidade do povo brasileiro.

Nessa figura exponencial de LÚCIO BITTENCOURT, autêntico democrata que era, nós, cariocas, tivemos sempre um amigo, um sincero defensor da nossa autonomia.

O SR. GERALDO MASCARENHAS: Agradeço a V. Ex.ª, Sr. deputado JOÃO MACHADO, a valiosa colaboração que dá ao meu discurso, em homenagem ao eminente colega LÚCIO BITTENCOURT.

O. Sr. Celso Peçanha: Eu gostaria, também, de trazer a palavra dos fluminenses, neste momento. LÚCIO BITTENCOURT, uma das mais altas expressões da inteligência e da cultura do nosso país, freqüentou e concluiu seu curso de ciências jurídicas na Faculdade de Direito de Niterói. Foi uma glória daquela Casa de cultura. Nós, do Estado do Rio, que privávamos da amizade de LÚCIO BITTENCOURT, pois êle era proprietário em Nova Friburgo, sentimos muito a sua morte e estamos calculando o imenso vácuo que deixa no pensamento político brasileiro, porque foi um dos mais altos, um dos mais expressivos lideres do trabalhismo.

O SR. GERALDO MASCARENHAS: Muito agradeço a V. Ex.ª, Sr. deputado CELSO PEÇANHA, as palavras que veio aduzir ao meu discurso, em homenagem à memória do ilustre e sempre pranteado senador LÚCIO BITTENCOURT, que honrou a geração de homens públicos brasileiros, pela sua capacidade criadora, pela sua paixão e pelo seu ideal, como muito bem disse o ilustre líder da maioria, Sr. GUSTAVO CAPANEMA.

Era o que tinha a dizer. (Muito bem; muito bem. O orador é abraçado.)

O SR. QUEIRÓS FILHO: Sr. presidente e Srs. deputados, na ausência eventual do líder da minha Bancada, o Partido Democrata Cristão, por meu intermédio, neste momento, se associa às homenagens que a Câmara dos Deputados está prestando à memória do senador LÚCIO BITTENCOURT.

Os oradores que me precederam traçaram com segurança o admirável perfil do jurista e do homem público, cuja morte a nação hoje pranteia.

Desejaria apenas lembrar que LÚCIO BITTENCOURT morre em plena campanha eleitoral, vale dizer, cumprindo para o povo seus deveres de democrata. A morte o colheu em pleno vôo e êle legou a nós e ao Brasil admirável lição e grande exemplo.

Fundado nestas razões, o Partido Democrata Cristão associa-se, comovidamente, às homenagens póstumas que se prestam à memória dêste grande brasileiro.

O Sr. Wagner Estelita: Como ex-colega de LÚCIO BITTENCOURT no D.A.S.P., não posso deixar de registrar aqui, também, sobretudo, a emoção com que recebi o infausto acontecimento. Não sòmente o Parlamento, não sòmente a política, não sòmente a ciência jurídica, mas também a ciência da administração perde hoje um grande elemento. LÚCIO BITTENCOURT foi o principal responsável pelo primeiro Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União. Além disso, assumindo, em certa época de sua vida, a direção da Divisão de orientação e Fiscalização de Pessoal, assim então denominada, LÚCIO BITTENCOURT na sua oração de posse teve palavras que ainda hoje significam normas das mais positivas de uma sadia política de pessoal. Disse êle, então, que assumia aquela pasta no intuito de emprestar à sua atuação 90% de orientação e apenas 10% de fiscalização. Além disso, LÚCIO BITTENCOURT não foi, apenas, um preconizador do sistema do mérito. Foi êle próprio, pela sua vida, um magnífico exemplo de obediência ao sistema do mérito. Assim, como seu ex-colega, como eu modesto companheiro nos estudos da ciência administrativa, quero deixar registrada a minha sentida e comovida homenagem.

O SR. QUEIRÓS FILHO: Agradecido a V. Ex.ª.

O Sr. Anísio Rocha: Permita-me, Sr. deputado. Trago, também, minha palavra de homenagem a LÚCIO BITTENCOURT, em meu nome, em nome da bancada do Estado de Goiás e, ainda, da bancada da Imprensa desta Casa, à qual tenho a honra de pertencer.

O SR. QUEIRÓS FILHO: Dizia eu, Sr. presidente, quando fui honrado pelos apartes dos nobres deputados, que LÚCIO BITTENCOURT, ao morrer, nos legou admirável lição de devotamento à causa da democracia. Realmente, democrata, êle realizava sua missão de esclarecimento à consciência popular e de pregação dos ideais que o animaram na vida pública.

Assim sendo, êle é merecedor das homenagens que as duas Casas do Parlamento da República lhe prestam no dia de hoje. (Muito bem; muito bem. O orador é abraçado.)

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