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Terras devolutas, ação discriminatória e registro de imóveis

CANCELAMENTO

GRILAGEM

LEI 6.383/76

LEI 601/1850

LEI DAS TERRAS

REGISTRO DE IMÓVEIS

REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA

TERRAS DEVOLUTAS

Regina Pedroso

Regina Pedroso

07/02/2017

Definições sobre o tema existem tantas na doutrina porém apenas para contextualizar vou partir de uma importante distinção entre terras públicas e terras devolutas. O motivo? A confusão que estes conceitos geraram num caso concreto que envolvia  alegação de “grilagem”, regularização fundiária, cancelamento de matricula no registro de imóveis e o Poder Público por meio da Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Amazonas e Advocacia Geral da União.

Basicamente o caso concreto estava pautado na existência de grilagem em terras devolutas na região da Amazônia Legal, que motivou o cancelamento de algumas matriculas, sua posterior revalidação e uma nova ação envolvendo AGU e Estado do Amazonas, onde o particular figurava como uma espécie de “ refém“ desta discussão jurídica.

No estudo do caso as autoridades simplesmente deixaram de olhar para dois aspectos importantes e fundamentais quando se trata de terras devolutas e ainda se cita “grilagem” (falsificação de documentos): 1- ação discriminatória e seu procedimento e 2- os aspectos registrais (analise substancial da matricula e princípios registrais tais como continuidade, legalidade, fé pública, responsabilidade civil e criminal do Oficial de Registro de Imóveis e Tabelionato de Notas, entre outros).

Pois bem.

As terras públicas são aquelas que pertencem ao Poder Público em sentido amplo, como bens públicos.

Todavia, terras devolutas são bem público em sentido restrito, com a característica essencial de em nenhum momento terem passado para o domínio particular, foram adquiridas pela União por sucessão a coroa portuguesa e não possuem destinação específica.

Explica o artigo 3 da Lei 601/1850 (Lei das Terras):

“Art. 3º São terras devolutas:

1º As que não se acharem aplicadas a algum uso publico nacional, provincial, ou municipal.

2º As que não se acharem no domínio particular por qualquer titulo legitimo, nem forem havidas por sesmarias e outras concessões do Governo Geral ou Provincial, não incursas em comisso por falta do cumprimento das condições de medição, confirmação e cultura.

3º As que não se acharem dadas por sesmarias, ou outras concessões do Governo, que, apesar de incursas em comisso, forem revalidadas por esta Lei.

4º As que não se acharem ocupadas por posses, que, apesar de não se fundarem em titulo legal, forem legitimadas por esta Lei. 

A questão que emergiu era como identificar as tais terras devolutas x as terras particulares, considerando o tamanho do território nacional, os desafios geográficos, acesso, custo e, sobretudo a organização do Registro de Imóveis. Era necessário demarcar este imóvel “devoluto”.

O particular em paralelo se desgastava na prova e regularização do imóvel rural com o objetivo de produzir economicamente, porém muitos anos depois da sua aquisição com a devida escritura pública e registro foi surpreendido com a alegação de grilagem em terras públicas.

Nos autos a União alegava a necessidade de se cancelar o registro do particular porém se limitava a alegar grilagem e inclusive ser o imóvel localizado em zona de fronteira. Mas nada juntou neste sentido, nem prova de ação criminal e muito menos a localização precisa do imóvel… que até então nem georreferenciado estava perante o INCRA conforme a matricula apresentada.

O ponto relevante para eventual defesa é que não havia menção a discriminação destas terras. Não tem como falar de terras devolutas sem reconstruir seu passado e finalizar com sua demarcação.

Como solução para identificar as propriedades públicas existe o procedimento da Ação Discriminatória, regulado pela Lei 6.383/76  e ai reside algo muito importante que vejo os colegas advogados passarem batido em suas argumentações.

No caso concreto a União alegava propriedade de terra devoluta grilada, porém em nenhum momento apresentou nos autos prova de ação discriminatória referente ao imóvel e prova substancial do crime. Se limitou a citar a problemática social sem apresentar provas materiais do alegado.

Não basta alegar ser devoluta, o Estado deve provar e por fim, dar publicidade através do Registro de Imóveis (vide o procedimento na Lei 6.383/76).

Hoje o proprietário de imóvel rural tem o dever de georreferenciar sua propriedade, manter o CCIR atualizado, o CAR – Cadastro Ambiental Rural , IRT e declaração anual de acordo, entre outras tantas obrigações para manter a propriedade regular.

Por outro lado, a União se limita alegar que  “é por que é “, o que não me parece razoável e me faz crer que falta um olhar politico sobre o tema com maior rigor pois caso se pretende fazer gestão de terras públicas é necessário organizar as informações e procedimentos com a igual responsabilidade exigida do particular.

Superado o primeiro aspecto com relação a necessidade de se observar a existência ou não de ação discriminatória para caracterizar a terra como devoluta, aponto para a falta de atenção das partes com relação a matricula do imóvel objeto de controvérsia.

Em nenhum momento durante a analise dos documentos foi observado: analise da cadeia dominial, existência de títulos validos ou não, existência de ação penal por falsidade de documento, requisitos da matricula do imóvel, a responsabilidade civil do oficial pela qualificação dos atos inscritos na matricula, existência de CCIR junto ao INCRA, declaração de ITR, georreferenciamento para localizar a área, etc., as tais obrigações que todo e qualquer proprietário tem para manter sua propriedade regular e dentro da legalidade.

Não existiu nos autos uma analise jurídica da matricula perante o Registro de Imóveis, entidade habilitada pela Constituição Federal e Lei de Registros Públicos para zelar pela segurança jurídica, publicidade e legalidade dos atos inscritos, que inclusive se comunica com o INCRA através de informações continuas sobre o andamentos dos imóveis rurais e tem fiscalização constante pelo Judiciário e normas claras publicadas pela Corregedoria de Justiça do Estado.

O que pretendo com esta nota é chamar atenção de advogados, procuradores, promotores, juízes, consultores, estudantes e até juízes para a necessidade de uma analise adequada, sistêmica e ampla dos aspectos que envolvem uma propriedade rural e o tema das terras devolutas.

Confunde se muito questões sociais de ordem politica, como a Reforma Agrária, com questões técnicas de direito e neste sentido quem opera o direito tem que diligenciar no sentido de observar a lei e preservar a propriedade titulada, quer seja do particular, quer seja da União.

O que não se pode admitir são situações que envolvem propriedades com potencial produtivo e econômico serem objeto de discussões jurídicas eternas e custosas sem fundamento e sem respaldo técnico. O prejuízo direto e indireto é considerável.

Portanto recomendo atenção a existência ou não de ação discriminatória sempre quando o tema é terras devolutas e sobretudo muito rigor na analise da matricula, lembrando que os Oficiais de Registro de Imóveis devem qualificar os títulos, examinando sua legalidade, quer sejam particulares ou judiciais e tem o dever funcional de afastar de pronto qualquer ato que possa comprometer sua validade, sobretudo quando se fala em grilagem.


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