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Ações possessórias na Justiça do Trabalho, de Rubens de Andrade Filho

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Ações possessórias na Justiça do Trabalho, de Rubens de Andrade Filho

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14/12/2023

Destinada ao conhecimento direto da massa operária, sindicatos, empregados e empregadores das mais variadas atividades e culturas, a Consolidação das Leis do Trabalho foi redigida em termos e vocábulos apropriados ao entendimento comum mais que em terminologia jurídica, como se lêem nos Cód. Civis e Comerciais ou nos de Processo cujo manuseio se destinou, principalmente, aos advogados e juristas.

Se, no juízo cível, a parte só pode agir através de advogado habilitado, e registrado na ordem dos Advogados, no fôro trabalhista a propositura da ação é a mais simplificada possível. Entendidos, curiosos, assistentes sociais de sindicatos, orientam os operários e, assim, raramente, a propositura da ação é subscrita por bacharel. Com tôda sua ignorância, o empregado mais bronco e desfavorecido de quaisquer estudos, sem saber ler ou escrever, pode fazer distribuir e tomar por termo uma reclamação e êsse têrmo, que constitui a “petição inicial”, é redigido nas secretarias das Juntas por escriturários subalternos, sem quaisquer estudos de Direito.

Tudo isso só tem andamento e funciona de modo prático e eficiente porque a tutela da própria lei delega ao juiz trabalhista suprir as deficiências das partes, entender, distinguir, classificar e aplicar os princípios gerais de direito e as regras processuais de estilo, onde apenas a linguagem simples do povo foi usada.

A pobreza de expressão e termos jurídicos na Consolidação visam, assim, de um modo prático colocar ao alcance da inteligência operária o que em linguagem jurídica de outro modo se diria.

Ação é chamada no processo trabalhista de reclamação. Autor é o reclamante. Quem contesta a ação é o reclamado.

Reconvenção é matéria de defesa, e assim por diante. Na linguagem popular escolhida pela lei, vai o legislador deixando ao juiz o entendimento teórico da matéria e citando de modo acessível o que empregados e empregadores podem ou não podem fazer.

Ao dizer, por exemplo, que o contrato de trabalho é o acôrdo do tácito ou expresso correspondente à relação de emprego (art. 442), não define o legislador nem o que seja a relação de emprego nem o que seja contrato de trabalho; não diz que êsses contratos se vinculam à teoria geral das obrigações pela qual alguém, que se chama locador, se obriga a dar a outro, que se chama locatário, o seu trabalho, e que, assim se entendendo, o contrato de trabalho é apenas uma modalidade de contrato de locação – de locação de serviço.

Contrato de trabalho

A definição do contrato de trabalho se resume a simples enunciação de que há um que presta o seu serviço chamado locador e outro que o aceita e que é o locatário, tudo resultante de uma relação de emprêgo”. Mas o juiz e o estudioso têm de ler nas entrelinhas encontrar para a caracterização desse tipo de locação o fim lucrativo do patrão, a subordinação econômica e hierárquica, a dependência, a continuidade ou efetividade do serviço prestado e do pagamento de uma prestação específica que se chama salário, etc. para deduzir que êsse contrato é, em verdade, um contrato de trabalho.

A locação mercantil dispensa definição, visto estar devidamente definida no art. 226 do Cód. Comercial.

A locação de coisas definem-na, prevendo hipóteses, os arts. 1.188 e segs. do Cód. Civil.

A locação de prédios se regula pelo art. 1.200 e segs. da lei civil, modificada em parte pela chamada Lei do Inquilinato, a lei nº 1.300, de 28 de dezembro de 1950 (que tem sido reeditada sucessivamente).

A locação de serviços, da qual se originou o chamado contrato de trabalho, se regula na lei civil pelo capítulo próprio do art. 1.216, e na Consolidação das Leis do Trabalho pelo que em especial nela se contém.

Da lei civil e comercial são os contratos de empreitada; no entanto, a Consolidação reservou aos juízes trabalhistas o conhecimento das ações relativas às pequenas empreitadas, nas quais o empreiteiro seja o próprio operário ou artífice, ut expressa disposição do art. 652, letra a, III e IV, da Consolidação.

Sòmente com o conhecimento jurídico de que o contrato de trabalho é de origem e de direito um contrato de locação é que podem os advogados e juízes interpretar e decidir várias questões de direito naquilo que caracteriza e diferencia um contrato de trabalho de outro, aparentemente igual, mas que, no entendimento jurídico, se resolveria como simples biscate ou serviço doméstico.

Igualmente só com aprofundado e geral conhecimento do direito pode o juiz do trabalho ter a noção de conjunto necessária à matéria especial que por organização judiciária lhe cabe, especificamente, resolver.

Posse como objeto de direito

Em se tratando da posse como objeto de direito muito já tenho falado e houve até quem me atribuísse a criação do têrmo possessório trabalhista para a citação dos casos possessórios sujeitos à competência do juízo trabalhista. No entanto, é intuitivo e fácil demonstrar-se que há questões possessórias tipicamente ligadas, dependentes e decorrentes do exercício de função ou na execução de contratos de trabalho. O esbulho e a má-fé na aquisição de certas posses decorrentes de contratos de trabalhos, a retenção ou a turbação de posses inerentes a êsses contratos de trabalho, sempre foram da competência do Juízo Trabalhista, como não poderia deixar de ser, decorrente que é essa competência da nossa organização judiciária e do disposto no artigo 652 da Consolidação.

Não se pode negar que o contrato de trabalho só começa a ser exercido quando o empregador dá posse do lugar ao empregado. Antes disso, salvo os casos em que o empregado está aguardando ordens, o contrato de trabalho inexiste.

A demissão do empregado é a perda de posse do emprêgo: o motorista perde a posse do veículo que dirigia; o operário perde a posse da ferramenta e do lugar dentro da oficina; o balconista não pode mais pegar nas mercadorias do patrão para vendê-las; a entrada no estabelecimento do empregado despedido é interdita porque ele perdeu a posse das coisas e do lugar do emprêgo.

O empregado estável, quando reintegrado no emprêgo, está exercitando o que se chama em direito civil reintegração de posse. O patrão que proíbe ao ex-empregado pegar em suas ferramentas ou entrar em sua propriedade está exercendo um direito possessório e sua posse não pode ser turbada nem esbulhada pelo ex-empregado que a teve, porque é legítima, e a do outro era precária.

Aquilo que os leigos, com a expressão literal do art. 468 da Consolidação, chamam de alterações de contrato de trabalho, e pedem em suas reclamações que seja tudo reposto no estado anterior, por ser nula a modificação do contrato prejudicial ao empregado, traduzido em linguagem jurídica, é um pedido de manutenção de posse. Quando o empregado reclama a suspensão da alimentação, habitação, vestuário, máquinas ou ferramentas do seu trabalho, está exercitando direito de posse, mediante ação possessória, embora o título que se lhe dê seja o de simples reclamação. O empregado não pode cometer abusos e esbulhos e ir além dos limites da posse dos objetos e coisas do seu contrato de trabalho. E quando se pretende a recuperação da máquina, da ferramenta, das coisas indispensáveis ao exercício de função ou do comando de trabalho, esbulhada por colega de trabalho, ou pelo próprio empregador ou superior hierárquico, a Justiça do Trabalho é a única competente para resolver esses casos.

Questão possessória é também a do empregado transferido que quer ser mantido na posse do lugar do contrato, ou daquele que não quer dar a invenção ou devolver os objetos de trabalho, finda a relação de emprêgo.

Não é necessário que o leigo cite os institutos de direito. O juiz os deve conhecer e aplicar, ainda que a parte ou o advogado os omitam.

Se um empregado que tivesse utilidade-habitação, no valor de Cr$ 200,00, ao voltar de suas férias, fôsse surpreendido com ordem do patrão para não mais dormir no local que lhe era dado até então e sim fora, recebendo a parte do salário-utilidade na importância arbitrada em dinheiro, ou sejam os Cr$ 200,00 da hipótese, êsse empregado poderia não se submeter a isso e pedir a reposição do seu contrato nos termos anteriores, com apoio no art. 468, porque esse modo de pedir é o certo, mas, a medida a lhe ser deferida, embora ele não o soubesse, a reintegração ou manutenção da sua posse do lugar de dormir, enquanto dure o contrato de trabalho, seria ação possessória típica.

As questões de posse na Justiça do Trabalho, ainda que denominadas de volta ao emprêgo, nulidade da alteração ou reposição do contrato, são várias e compelem o juiz trabalhista ao conhecimento e solução dêsses casos tipicamente prossessórios que constituem os dissídios de que fala a Consolidação, genèricamente, no art. 652, letra a, V.

Ações possessórias trabalhistas

Chamamos essas ações de possessórias trabalhistas, porque essa expressão é intuitiva, fixa, desde logo, as questões de posse dirimíveis na Justiça do Trabalho.

Outras questões de posse decorrentes do exercício da função ou do contrato de trabalho podem coexistir com êste, assim como pode coexistir um contrato de locação de jurisdição do juízo cível, donde a confusão dos menos esclarecidos que, tomando, v. g., a utilidade-salário como locação de imóvel, enunciam erradamente como sendo ação de despejo na Justiça do Trabalho, o que não passa de simples reintegração de posse de uma utilidade dada pelo empregador.

No estudo das questões possessórias não se pode, pois, omitir o conhecimento perfeito do que seja um contrato de trabalho, o que é o salário e, muito menos, a subordinação do empregado, facilitando, sobremaneira, o exercício do direito possessório do empregador que na maioria dos casos não precisa da Justiça para executá-los.

O comando do trabalho permite ao dono da emprêsa regular até onde irá a posse do empregado com relação aos objetos a ele confiados ou entregues e quando deve restituí-los.

O empregador determina ao seu empregado fazer isso ou aquilo, deixar a posse de tal ou qual ferramenta ou coisa; é-lhe lícito transferí-lo de um para outro lugar, etc.

Se o empregado obedece, não há esbulho; se não obedece, o incidente é classificado como indisciplina ou insubordinação e o empregado é suspenso ou demitido. Assim compelido a deixar o estabelecimento, perde imediatamente a posse da coisa ou da prestação do serviço, sem necessidade de ação judicial.

As ações possessórias outras, as de efetiva reintegração de posse, ocorrem mais freqüentemente nos casos em que a utilidade dada contra a prestação do serviço ou o próprio local e objeto desse serviço seja a habitação ou utilidade (não contrato de locação), quando o empregado dispensado se recusa a devolver ao patrão a posse do cômodo que lhe serve de moradia e às vêzes de moradia de sua família.

Nesses casos, sem dúvida, o patrão fica esbulhado da posse da habitação dada como utilidade ao empregado, ou da parte do que constitui seu estabelecimento comercial ou industrial indispensável ao exercício do emprêgo pelo novo empregado, ou da moradia destinada ao porteiro do edifício, e só lhe resta o caminho judicial – o pedido de reintegração de posse.

A posse decorrente do contrato de trabalho é sempre uma posse precária, porque depende da condição principal: do contrato de locação de serviços hodiernamente chamado contrato de trabalho, se revestida dos característicos próprios de subordinação, dependência econômica, etc.

A posse do empregado, quanto aos objetos de trabalho ou quanto aos lugares, cargos e funções que ocupa, é uma posse precária, sem amparo legal de se convolar em domínio, como sucede com as posses de coisas ou imóveis que por usucapião, se integram na propriedade do possuidor, que passa a tê-las como sua decorrido certo tempo.

Na mais das vêzes, como diz PIRES CHAVES, ocorre que o empregado está, apenas, guardando a posse do patrão. O vigia de um terreno, vigiando em nome do seu empregador e contra salário dêste, guarda a posse em nome do seu empregador – sua posse momentânea, é só para impedir o esbulho de terceiro contra a posse do patrão.

Se êle, por sua vez, perdida a condição de empregado, permanece no terreno ou casa alheia, está cometendo esbulho e o remédio jurídico adequado é a reintegração da posse concedida pelo juiz capaz de conhecer da relação de emprego o juiz do trabalho.

A companhia locadora de imóveis que mantém nos prédios ou apartamentos vazios o vigia, dando-lhe como utilidade parte do salário habitação nesse apartamento, se esse vigia é transferido para outro prédio ou é dispensado, nulo lhe é licito reter a posse dêle, e o empregador pode compeli-lo pela Justiça do Trabalho a cumprir o seu contrato e sair do apartamento para um outro, ou entregá-lo, se houver dispensa do emprêgo.

Os que combatem a competência do juiz trabalhista conceder reintegração de posse da utilidade-moradia, não vêm atentando que estão admitindo verdadeiras ações possessórias idênticas, quando é o empregado quem pede a reintegração na moradia, condição do seu contrato de trabalho. Dão como certa a competência do juiz trabalhista quando se trata de impedir uma alteração unilateral do contrato imposta pelo empregador que retirou a utilidade, e não vêem a mesma competência quando é o empregador que quer essa mesma coisa.

O direito violado foi o mesmo; o contrato oferecido foi o mesmo contrato de trabalho; e as conseqüências da violência são igualmente danosas, apenas se inverteram os papéis dos autores: o reclamante é o patrão e o reclamado é o empregado.

Mas a lei não proíbe que o patrão seja autor ou reclamante nas questões trabalhistas. Forçosamente êle o é nos inquéritos, nas consignações em pagamento, em numerosas ações declaratórias e pode sê-lo, também, nas ações de esbulho, quando o esbulhador seja o empregado, e se êsse esbulho se deu em exercício do contrato de trabalho, a competência para saná-lo é da Justiça do Trabalho.

Por isso dizemos que a primeira condição, para que o empregado ou o empregador exercite no fôro trabalhista sua ação possessória, é que o esbulho que se anseia sanar seja decorrência do exercício da relação de emprêgo ou contrato de trabalho, e essa decorrência pode ser durante o emprêgo ou em seguida à demissão do empregado.

Das hipóteses de ações possessórias na Justiça do Trabalho, a que tem causado mais pronunciamentos divergentes é a da reintegração do empregador na da utilidade que serviu de habitação ao empregado como parte do seu salário impròpriamente chamada de despejo na Justiça do Trabalho, porque a conseqüência da execução é a restituição da habitação ao empregador.

Opiniões há que, desprezando a conceituação do contrato de trabalho como uma modalidade do contrato de locação de serviço confundem a posse de utilidade-habitação com locação de prédios, ou comodato, mas são assim levadas em retrocesso nesta hermenêutica porque não cuidam distinguir que contrato de locação de imóvel é uma coisa e a utilidade-habitação outra muito diferente.

A confusão advém da Lei do Inquilinato haver disposto que, quando o contrato de locação é feito com o fim de colocar o empregado próximo ao emprêgo e, em decorrência ou condição a latere dêsse contrato de trabalho, ser lícito ao proprietário pedir o imóvel locado, do mesmo modo e com a mesma notificação prevista de 90 dias necessários ao pedido do imóvel locado para uso próprio ou de pessoa de sua família, se fôr êsse o caso.

Diz o ilustrado mestre BENTO DE FARIA que, como na compra e venda, a locação é um contrato consensual, visto que a sua formação depende do consentimento das partes; e sinalagmático, porque gera obrigações recíprocas para os que contratam; e é comutativo, porque cada uma da partes se propõe a receber tanto quanto entendem valer o que é dado em contraprestação.

Do mesmo modo nos contratos de locação, de coisas e de móveis, três são os requisitos seus componentes: o objeto, aquilo que é alvejado; o preço ou aluguel e o consentimento.

No contrato de prestação ou locação de serviço o preço ou aluguel é substituído pelo salário ou ordenado, e o objeto por serviços ou trabalho.

No antigo Cód. Comercial, a locação mercantil também se refere a coisa ou a serviço, mas, sempre, se distinguindo essa modalidade locação da locação de prédios.

Há disposições especiais regulando a locação dos prédios rústicos e das urbanos, das coisas móveis e imóveis mas tão é possível se confundir a locação de prédio, do simples quarto ou vagas em habitação; com a utilidade, parte do salário ajustado no contrato de trabalho.

Isso não confunde contrato de trabalho, onde a moradia é salário, com contrato de locação, em que a moradia é o objetivo.

O legislador admitiu que o dono do negócio ou da indústria subordinasse certos imóveis residenciais aos interêsses do seu negócio e os destinasse a locação de certas e determinadas pessoas: aos empregados, com a condição de, rompido o vínculo empregatício, ser lícita a retomada para o uso próprio do negócio ou indústria ou emprêsa proprietária daquela residência.

Estendeu-se, assim, o conceito do uso próprio para si ou pessoa de sua família, nas locações comuns, para o uso próprio pela indústria ou negócio, quando o proprietário do imóvel residencial é a emprêsa.

Sempre é necessário para o uso dessa ação específica de despejo que tenha havido um contrato de locação do imóvel-residência; que nesse contrato se consigne a condição de ser a locação daquelas de propriedade do negócio e que o contrato de locação poderá ser rescindido se cumprida a condição principal da rescisão do contrato de trabalho que se estipulou a latere.

Não há, em verdade, nenhuma dificuldade em se distinguir onde há contrato de locação da residência e onde há utilidade-moradia, dada como parte de pagamento de salário.

Dessa distinção necessária é que se deduz onde está a competência do juízo trabalhista e onde está a do juízo cível.

Confundir contrato de locação ou sublocação de prédio com salário ou ordenado, é confundir direitos de há muito separados, diferentes e divergentes.

Quando o empregador contrata com o empregado que, em virtude do seu contrato de trabalho ou de locação de serviços, lhe alugará também um prédio, uma residência ou lhe sublocará um cômodo em sua própria residência, faz dois contratos, o contrato de trabalho e o de locação de imóveis. Se escritos êsses contratos, nêles se conterão as cláusulas explicativas e discernentes. Se verbais, ao interessado no despejo caberá a prova de que era condição ou cláusula da locação a vigência do contrato de trabalho e que, rescindido êste, a locação seguiria o destino dado, sendo êsses contratos “se o empregador pedir o prédio locado a empregado, quando houver rescisão do contrato de trabalho e o imóvel se destinar à moradia do empregado” (lei número 1.300).

Quando é dado ao empregado simples habitação como parte de seu salário, e isso é lançado no contrato de trabalho, na carteira profissional, nas fôlhas de pagamento, não há contrato de locação. Nem se confunde com a locação de prédio o contrato de trabalho, porque impossível essa conjunção. A locação de prédio não se confunde jamais com a locação de serviço ou contrato de trabalho, porque os elementos dêsses contratos se distinguem um do outro pela lei e pela hermenêutica.

A dação da utilidade como parte do salário só se entende nos contratos de prestação de serviços e no contrato de trabalho pròpriamente dito, onde está prevista essa dação como modalidade de salário, ut art. 458 da Consolidação:

“além do pagamento em dinheiro, compreendem-se no salário, para todos efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário e outras prestações in natura que o empregador, por fôrça do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado”.

Já o aluguel, no caso de contrato de locação de prédio, existe exclusivamente para o pagamento do uso e gôzo do imóvel com tôdas as garantias que se dá ao domicílio (e é relevante notar que o domicílio do empregado é a sua residência, ainda que êle venha pelo seu contrato de trabalho a habitar no local do trabalho).

A locação do prédio pressupõe em seus princípios gerais o direito de habitá-lo e sublocá-lo, e é um direito previsto no Cód. Civil e por êle regulado.

Durante a locação do prédio, o senhorio não pode mudar a forma nem o destino do prédio alugado; e o inquilino pode ter abatimento no aluguel se os reparos durarem mais de 15 dias.

Se a propriedade é rural e o prazo da locação indeterminado, se presume a locação por uma safra e “o locatário que sai franquiará ao que entra o uso das acomodações necessárias a êste para começar o trabalho, e, reciprocamente, o locatário que entra facilitará ao que sai o uso do que lhe fôr mister para a colheita, segundo o costume do lugar.

No contrato de trabalho, a moradia ou habitação dada como utilidade-parte de salário, salário é; pressupõe a contraprestação de serviço, e o que recebe pagamento é o empregado.

A parte-utilidade pode ser a fixada percentualmente em lei ou pode ser arbitrada até um limite. Alterado o salário, o valor da habitação também se altera automática e proporcionalmente. Não deixa de ser salário. O aluguel não pode ser alterado.

Por ser salário, a habitação concedida ou contratada como utilidade, na forma do art. 458, é apenas uma posse, e se ressente da precariedade da condição principal, ou seja, do contrato de trabalho, do qual é simples conseqüência.

O consentimento, parte indispensável à conceituação de qualquer contrato, já vem viciado no contrato de trabalho com a subordinação, com a adesão ao regulamento da emprêsa, etc. Na locação de imóvel, o consentimento é igual para locador e locatário.

Em sua magnífica monografia transcrita no “Jornal do Comércio”, o juiz PIRES CHAVES sustenta que o empregado serve à posse do titular, isto é, do patrão, sem tê-la própria ou sua, razão por que, findo o contrato de trabalho, não lhe é lícito invocar nenhum remédio jurídico para retenção dêsse direito que não é seu.

Não hesitou, por isso, em orientar sua Junta a decretar a medida possessória in limine, nem mesmo ouvir o esbulhador, dada a violência do esbulho praticado pelo ex-empregado que com sua atitude impedia a colocação do novo porteiro no lugar mesmo da prestação do serviço e do pagamento da habitação-parte do salário, fundado, exatamente, na competência ex causa e ex persona, que desloca para a Justiça do Trabalho tôdas as questões tipicamente trabalhistas que determinam dissídios entre empregados e patrões, ut art. 652, IV, da Consolidação, que diz competir, às Juntas de Conciliação, conciliar e julgar “os demais dissídios concernentes ao contrato individual de trabalho”.

No processo 716-55 da mesma 1ª Junta, é do mesmo juiz a seguinte sentença liminar:

“Ementa: “É da Justiça do Trabalho a competência para decidir das ações possessórias oriundas da relação entre empregado e empregador, por motivo de contrato de trabalho, quando a ocupação do imóvel, inexistindo locação predial, se dá como modalidade do salário” (Consolidação, art. 458). Rescindido o contrato, mediante cumprimento do aviso-prévio, pratica abuso de confiança o empregado que se recusa a restituir o apartamento por êle habitado como contraprestação do trabalho.

“O condomínio do Edifício “Pirajá” pede restituição de posse do apartamento cedido a Daniel Ferreira de Sousa, provando sua resilição mediante cumprimento do aviso-prévio de 30 dias, vencido a 26 de março último. Não obstante, o empregado, ao invés de desocupar o imóvel, cuja utilização decorria do exercício de funções subordinadas, dêle permanece com grave risco para a guarda do edifício e também para a execução de serviços de limpeza e conservação, obstando, outrotanto, a contratação de novo empregado.

“Tudo bem visto e examinado:

“A competência da Justiça do Trabalho, no caso, resulta da inexistência de contrato de locação predial. Entre as partes foi concluído um contrato de trabalho, obrigando-se o requerido a servir na qualidade de gerente-porteiro, mediante Cr$ 3.000,00, dos quais… Cr$ 750,00 em utilidade-habitação. Tal entendimento, embora não recolha sufrágios gerais, é o que mais se ajusta à solução da espécie, por se tratar de nítido dissídio resultante do contrato de trabalho, em que na condição salarial existia parte em dinheiro e parte em habitação (Consolidação, art. 458).

“Na forma do parág. único do artigo 8° da Consolidação, é facultado ao juiz trabalhista valer-se do direito comum. A ação possessória é instituto de direito civil que pode ser aplicada sempre que se tenha presente um dissídio oriundo da relação de emprêgo, em que a competência é de fôro (Consolidação, art. 123). Aliás, constitui verdadeiro ius receptum o julgamento pelos tribunais do trabalho das ações ou embargos de terceiro, quando se discute o direito de posse e de domínio, matéria estritamente cível.

“Determina-se a competência pela condição das pessoas (empregado e empregador); em razão da matéria (contrato de trabalho); pela posição do juiz (dissídios oriundos da relação de emprêgo).

“No mais, rescindido o contrato de trabalho por fôrça do qual o empregado ocupava o imóvel como modalidade de salário, a sua permanência nele, inexistindo relação ex locato, importa abuso de confiança. Não se argumenta com o inc. VI da lei nº 1.300, de 28 de dezembro de 1950, uma vez que, no seu art. 15, se alude a prédio locado, pressupondo a existência do contrato de locação predial a latere do de trabalho.

“É evidente que, em face do contrato de trabalho, o empregado torna-se titular do direito de habitação. Tal direito, em sentido jurídico, é posse. Posse, porém, oriunda de justo título, que é o contrato de trabalho. “Têm posse jurídica e, portanto, podem intentar as ações possessórias: os que detêm ou gozam a coisa, por fôrça de uma obrigação ou direito, e tais são segundo ASTOLFO RESENDE (“Da Posse”, nº 175): a) o locatário e o arrendatário” (acórdão no “Arq. Judiciário”, vol. 60, pág. 176). E acrescente-se, no caso do contrato de trabalho: o empregado e o empregador, nas relações decorrentes do mesmo título.

Prestando serviços, o empregado tem o direito de exigir do empregador a contraprestação: o salário-dinheiro mais a utilidade-habitação. Rescindido o contrato de trabalho, e deixando de existir prestação, o empregado não pode exibir justo título de posse, porque a obrigação de contraprestar é nenhuma.

“Diz-se, então, que tal posse, ao término do contrato, é precária, porque se origina do abuso de confiança. “Alguém recebe uma coisa por um título que o obriga à restituição, em prazo certo ou incerto, como por empréstimo ou aluguel, e recusa injustamente fazer a entrega” (JOÃO LUÍS ALVES, “Da posse e das Ações Possessórias”, 1922, n° 34, pág. 34).

“Procede, pois, a medida liminar requerida, por se tratar de ato de puro arbítrio e convicção do juiz, a qual, por isso mesmo, poderá ser revogada em qualquer momento.

“Por tais fundamentos:

“Julga a 1ª Junta de Conciliação e Julgamento do Distrito Federal, por votação unânime, procedente o pedido, para ordenar a imediata expedição de mandado de reintegração de posse, nos têrmos requeridos, sem prejuízo da audiência já designada para o próximo dia 19 do corrente, às 9,30 horas”.

Decisões de igual efeito têm sido dadas pela 4ª Junta de Conciliação e Julgamento e até hoje não houve recurso do empregado visando sustar a execução de tais sentenças, o que bem evidencia serem elas justas.

Afinal, pode-se resumir que, sempre que o contrato de trabalho determinar a moradia como parte de salário e não aluguel de imóvel, a competência para apreciar as questões decorrentes dêsse contrato é da Justiça do Trabalho.

O simples fato de ter sido o empregado dispensado não tem o dom de alterar a natureza do contrato, não deixa o patrão de ser o empregador visado no contrato de trabalho, nem o reclamante deixou de ser o empregado ali consignado.

O contrato de trabalho não se convola em contrato de locação; e, do mesmo modo por que sòmente após a dispensa é que o empregado pode pedir a indenização decorrente do contrato de trabalho rompido, pode o empregador pedir a devolução de utilidade dada como habitação.

Para iguais direitos, e iguais fatos, não se pode dividir a competência dos juízes; e o que decorre do contrato de trabalho, ou faz parte dêle, só se resolve na Justiça do Trabalho.

Rubens de Andrade Filho, juiz do trabalho no Distrito Federal.

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