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O Acidente em Brumadinho e Alguns Aspectos da Tarifação do Dano Extrapatrimonial de Seus Empregados, dos Empregados Terceirizados e de Seus Familiares

ACIDENTE BRUMADINHO

ACIDENTE DE TRABALHO

ACIDENTE EM BRUMADINHO

ART. 223-G

ART. 935

ATO ILÍCITO

BARRAGENS BRUMADINHO

BLOQUEIO DE BENS

BRUMADINHO

CASO BRUMADINHO

Francisco Ferreira Jorge Neto
Francisco Ferreira Jorge Neto

04/02/2019

Brumadinho Foto: EFE/Antonio Lacerda, Lucas Landau, Yuri Edmundo e Paulo Fonseca

Além do impacto ambiental, os acontecimentos de Brumadinho acarretam extensa responsabilidade civil, penal, administrativa e trabalhista da empresa VALE e das empresas prestadoras de serviços.

O Ministério Público do Trabalho obteve uma liminar, a qual determinou o bloqueio da quantia de oitocentos milhões de reais, como garantia para os trabalhadores dos danos decorrentes dos acidente (Processo 0010008—15.2019.5.03.0142).

Há notícias que em outras ações ajuizadas pelo Ministério Público Estadual, cujas decisões liminares determinaram o bloqueio da quantia superior a dez bilhões de reais, como mecanismos de cautela paro o pagamento de todas as indenizações decorrentes deste triste evento.

No âmbito do Direito do Trabalho, face aos limites do presente artigo, o destaque está no valor das indenizações trabalhistas a serem pagas aos empregados diretos da VALE, aos empregados das suas empresas contratadas (terceirizados) e seus familiares.

As notícias trazidas pela imprensa apontam o rompimento da barragem da VALE como um dos maiores acidentes do trabalho no Brasil, portanto, a indenização não pode ser fixada com base nos critérios adotados no art. 223-G, CLT.

Modernamente, até por conta das mudanças sociais, desenvolvimento das relações comerciais e humanas, avanços científicos etc., a responsabilidade jurídica é um campo do Direito que tem se destacado, desafiando juristas e estudiosos.

Em linhas gerais, o campo da responsabilidade jurídica pode ser dividido em dois grandes blocos, a responsabilidade civil e a penal. Diz-se responsabilidade civil porque se restringe à esfera civil, regulada pelos institutos do Direito Civil, enquanto a responsabilidade penal é expressa pela violação da norma penal. Tais aspectos não afastam a responsabilidade administrativa dos infratores perante o Estado prevista no sistema de normas do Direito Ambiental e outros microssistemas.

A forma de distinguir as duas espécies de responsabilidades é pela exclusão, uma vez que ambas não podem ser aplicadas conjuntamente ao final da mesma relação processual. Assim, se chegarmos à conclusão de que ao término de uma relação processual não se pretende aplicar normas de cunho material penal, por exclusão estaremos diante da responsabilidade civil. Por outro lado, caso optemos pela aplicação das normas materiais penais, certamente estará em pauta a responsabilidade penal.

Contudo, muitas vezes, a responsabilidade civil e a responsabilidade penal são coincidentes, ensejando as respectivas ações civil e criminal. Assim, a vítima busca a reparação dos danos sofridos, enquanto a sociedade, muitas vezes representada pela vítima, modernamente, pretende recuperar a pessoa delinquente e prevenir outros delitos.

Como o Direito é uma Ciência una, os seus ramos não são estanques nem poderiam ser, existindo divisões apenas para fins didáticos e estudos acadêmicos, as responsabilidades civil e penal também não o são, sendo certo que se comunicam mutuamente, com uma influência da ação penal mais acentuada na relação civil.

A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal (art. 935, CC).

A responsabilidade civil é o instituto jurídico capaz de proporcionar à vítima a reparação dos danos causados, sejam eles com repercussões no âmbito material ou moral, com o restabelecimento da situação anterior ao ato danoso (status quo ante) ou, alternativa ou simultaneamente, por uma compensação pecuniária equivalente à extensão do dano causado.

Doutrinariamente, a responsabilidade civil subdivide-se em contratual e extracontratual. Diz-se contratual aquela responsabilidade oriunda do descumprimento de uma obrigação contratual. Já a extracontratual, conhecida como responsabilidade aquiliana, é a que, de modo contrário, não encontra amparo em qualquer relação de contrato entre o agente e a vítima. Tal distinção é adotada pela legislação de inúmeros países, inclusive pela do Brasil.

De forma objetiva, as diferenças entre as duas modalidades de responsabilidade são:

  1. fontes – enquanto a contratual tem a sua origem na convenção, a extracontratual a tem na inobservância do dever genérico de não lesar, de não causar dano a ninguém;
  2. capacidade do agente causador do dano – nas relações contratuais, exige-se a capacidade plena dos contratantes e de não produzir efeitos indenizatórios. Assim, limita-se a responsabilidade aos agentes contratantes, enquanto, na hipótese de obrigação derivada de um ilícito, o ato do incapaz gera o dever de reparação por aqueles que legalmente são responsáveis pela sua guarda. No entanto, não poderá o relativamente incapaz (maior de 16 e menor de 18 anos de idade) invocar a sua idade para se eximir de uma obrigação, se dolosamente a ocultou ou espontaneamente declarou-se plenamente capaz, quando do ato obrigacional (art. 180, CC). Os pais são responsáveis pela reparação civil quanto aos atos praticados pelos filhos menores, que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia (art. 932, I). Contudo, não se pode esquecer que o incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes. A indenização deverá ser equitativa e não terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem (art. 928, parágrafo único);
  3. gradação da culpa – em regra, a responsabilidade, seja extracontratual ou contratual, funda-se na culpa. A obrigação de indenizar, em se tratando de delito, deflui da lei, que vale erga omnes. Consequência disso seria que, na responsabilidade delitual, a falta se apuraria de maneira mais rigorosa, enquanto na responsabilidade contratual ela variaria de intensidade em conformidade com os diferentes casos. O CC/2002 adotou a gradação da culpa na fixação da responsabilidade civil: se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização (art. 944, parágrafo único).
  4. ônus da prova – na responsabilidade contratual, o credor só está obrigado a demonstrar o descumprimento contratual, enquanto, na responsabilidade extracontratual, o autor da ação é que fica com o ônus de provar que o fato se deu por culpa do agente;

Quanto as teorias da responsabilidade civil, a doutrina aponta a subjetiva e a objetiva.

Na teoria subjetiva, o que nos chama mais a atenção é a necessidade da existência de um ato ilícito, o qual, por sua vez, demonstra a culpa ou o dolo do agente causador. O ilícito civil caracteriza-se pela existência de um ato contra o ordenamento jurídico, praticado pela vontade expressa (dolo) ou não (culpa) do agente, causando um dano a terceiro e, via de consequência, gerando ao causador o dever de restabelecer a situação anterior.

Desse modo, para a teoria subjetiva, a responsabilidade civil de alguém só tem razão de ser quando preenchidos os seguintes requisitos: (a) o ato ou omissão violadora do direito de outrem; (b) o dano produzido por esse ato ou omissão; (c) a relação de causalidade entre o ato ou omissão e o dano; (d) a culpa lato sensu.

Além disso, a responsabilidade fundamentada na culpa do agente pode ser direta ou indireta; será direta, quando o agente responder por ato próprio, e indireta, nos casos em que a lei prevê a responsabilidade de alguém por ato praticado por outrem. A título exemplificativo de responsabilidade indireta, temos as hipóteses, previstas no art. 932, CC, quais sejam: (a) os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; (b) o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições; (c) o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; (d) os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos.

Em desconsideramos as regras específicas do Direito Ambiental, convém salientar que as pessoas indicadas no art. 932, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos (art. 933).

O responsável indireto poderá ingressar em juízo contra o agente danoso, a fim de reaver o que pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz (art. 934).

Na teoria objetiva, o que muito se combate é a ideia da culpa como fundamento da responsabilidade civil, porque, para aqueles que defendem a teoria objetiva, o dever de reparar independe da sua existência, sendo suficiente a existência do dano concreto (dano experimentado). É importante esclarecer que, nas hipóteses de responsabilidade objetiva, a atividade exercida é lícita, mas, por expor terceiros a perigo, podendo causar-lhes danos, tem o dever de tomar todas as cautelas para que efetivamente isso não ocorra. Por isso, a responsabilidade objetiva funda-se no princípio da equidade, pois aquele que lucra com a situação (exercício da atividade) deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela resultantes, ubi emolumentum, ibi onus; ubi commoda, ibi incommoda.

Na responsabilidade objetiva não se exige a prova à culpa do agente, sendo que em alguns casos ela é presumida, em outros, é prescindível. Nos casos da responsabilidade objetiva, a vítima só precisa provar a ação ou omissão, o nexo causal e o dano resultante, mas não precisa demonstrar a culpa do agente (ato ilícito), porque a culpa já é presumida. Nesses casos, ocorre a inversão do onus probandi, podendo o ofensor provar a existência de uma excludente de responsabilidade. Exemplo típico de culpa presumida é a responsabilidade do dono do animal que venha causar dano a outrem (art. 936, CC). Nos casos onde se prescinde totalmente da prova da culpa (responsabilidade independente da culpa), basta a caracterização da relação de causalidade entre a ação e o dano (teoria do risco). Temos, como exemplo, a responsabilidade das empresas que exploram atividades de transporte pelos acidentes que possam ocorrer.

No Direito pátrio, os casos mais comuns de responsabilidade objetiva ocorrem: nos casos de acidente de trabalho, de exploração da atividade de transporte (terrestre, marítimo e aéreo), das Pessoas de Direito Público e das de Direito Privado, prestadores de serviços públicos, do dono do animal, do dono do prédio em ruína, do habitante da casa da qual caírem coisas etc.

Assim, diferentemente da teoria subjetiva, a objetiva adota apenas os critérios objetivos da responsabilidade, quais sejam: (a) a existência do ato ou omissão violadora do direito de outrem; (b) o resultado danoso para a vítima; (c) o nexo causal entre o ato ou omissão e o resultado, não se discutindo a existência ou não de culpa do agente provocador.

Como visto, não há responsabilidade civil, seja subjetiva ou objetiva, sem a ocorrência do dano, o qual pode ser de cunho patrimonial (dano material)[1] e não patrimonial (= extrapatrimonial).

O dano moral ou dano extrapatrimonial é aquele que se opõe ao dano material, não afetando os bens patrimoniais propriamente ditos, mas atingindo os bens de ordem moral, como, por exemplo, os de foro íntimo da pessoa (honra, liberdade, intimidade e a imagem). Assim, concluímos que são danos morais aqueles que se qualificam em razão da esfera da subjetividade ou plano valorativo da pessoa na sociedade, havendo, necessariamente, que atingir o foro íntimo da pessoa humana ou o da própria valoração pessoal no meio em que vive, atua ou que possa de alguma forma repercutir. Cumpre ressaltar que os danos morais, de modo semelhante aos danos materiais, somente serão reparados quando ilícitos e após a sua caracterização (dano experimentado).

Os danos morais são divididos em:

  1.  puros (diretos) se exaurem nas lesões, ou seja, esgotam-se em apenas um aspecto, atingindo aos chamados atributos da pessoa, como a honra, a intimidade, a liberdade etc.;
  2. reflexos (indiretos) constituem-se como efeitos de lesão ao patrimônio, isto é, são aqueles surgidos como consequência de um dano material, são reflexos daquele dano;
  3. sucessivos ou simultâneos ao dano material, ou seja, quando este estiver em relação direta e imediata com a ação violentadora ou apresentar-se em via de consequência do dano material;
  4. subjetivos ou objetivos, dependendo da sua extensão, vez que se limitam à esfera íntima ou se projetam no círculo de seu relacionamento familiar ou social. Assim, temos como dano moral subjetivo aquele que atinge o sentimento da própria dignidade moral, nascido da consciência de nossas virtudes ou do nosso valor moral, enquanto o dano objetivo é aquele que afeta a estima que outros fazem de nossas qualidades morais e de nosso valor social, abalando a boa reputação moral ou profissional, afetada pela injúria, calúnia ou difamação, sendo que esta última pode ser dirigida contra a pessoa jurídica.

A Lei 13.467/2017 incluiu o Título II-A, com a denominação de “Dano Extrapatrimonial”, ao texto da CLT, regulando-o nos arts. 223-A a 223-G.

O art. 223-A indica que são aplicáveis à reparação de danos de natureza extrapatrimonial decorrentes da relação de trabalho apenas os dispositivos previstos no Título II-A.

Incabível o arcabouço normativo pretendido pelo legislador. A responsabilidade civil exige uma visão multidisciplinar, em que o operador do direito, de forma sistemática, faça o entrelaçamento entre as diversas áreas da Ciência Jurídica (Direito Constitucional, Direito Civil, Direito Previdenciário, Direito do Trabalho).

Não se pode esquecer que o magistrado não pode se eximir de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico (art. 140, caput, CPC), devendo, assim, decidir o caso com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito (art. 4º, LINDB; art. 8º, caput, CLT).

Por sua vez, o art. 223-B declina que dano de natureza extrapatrimonial é a ação ou omissão, a qual ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são as titulares exclusivas do direito à reparação.

O dano moral da pessoa jurídica já tem previsão na Súmula 227, STJ, inclusive, já sendo aplicável na jurisprudência trabalhista, limitado a questões objetivas (por exemplo: repercussão negativa no âmbito comercial). É verdade que a pessoa jurídica não pode ser atingida na sua honra subjetiva (as pessoas jurídicas não têm direitos personalíssimos, pois estes são próprios do ser humano; as pessoas jurídicas, por não terem espírito, jamais sofrerão detrimento anímico).

Contudo, a pessoa jurídica detém o que vem a ser honra objetiva, ou seja, sempre que o seu bom nome, reputação ou imagem (no sentido lato da expressão) forem violados em decorrência da ilicitude cometida por alguém, o direito deve estar presente para sujeitar o agressor à indenização por dano moral.

Também há previsão legal quanto ao dano existencial, ou seja, quando a conduta patronal impossibilita ao empregado o relacionamento e o convívio em sociedade, através de atividades recreativas, afetivas, espirituais, esportivas, culturais e de descanso, prejudicando, assim, o bem-estar físico e psíquico.

Quanto ao que vem a ser dano moral, é importante que se dê uma visão ampliativa ao vocábulo, como forma de contemplar todo e qualquer dano extrapatrimonial, como por exemplo, o dano moral coletivo,[2] o dano social,[3] o dano psíquico,[4] o dano estético[5] etc.

Por fim, as principais críticas ao art. 223-B repousam na limitação que se faz ao titular, visto que, pelo prisma literal, o dispositivo legal não contempla: (a) o dano moral em ricochete (a perda de um querido, quando o trabalhador vem a falecer em um acidente de trabalho); (b) a transmissão do dano moral da vítima para os seus sucessores (art. 943, CC).

São tutelados juridicamente os seguintes bens para a pessoa natural: a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa natural (art. 223-C, CLT). Lamentável a atuação legislativa quanto a limitação dos bens, os quais possam ser, em tese, objeto de violação para a pessoa natural. Por excelência, dano extrapatrimonial é o que lesa o direito de personalidade do ser humano, o qual, por essência, não pode ser limitada a tais hipóteses, especialmente, quando a personalidade humana é por demais ampla. Por exemplo, a previsão contém não contempla a morte ou a liberdade religiosa. Não se pode esquecer que o art. 5º, V, CF, não limita, de forma taxativa, as hipóteses de indenização por dano moral. Logo, o magistrado trabalhista, diante do caso concreto, deverá apreciar toda e qualquer hipótese ofensiva à personalidade do trabalhador, como possível de plena reparação em nível de dano moral, como também o material.

Quanto a pessoa jurídica, a imagem, a marca, o nome, o segredo empresarial e o sigilo da correspondência são bens juridicamente tutelados (art. 224-D, CLT).

No tocante ao nexo causal, o art. 223-E acentua que são responsáveis pelo dano extrapatrimonial todos os que tenham colaborado para a ofensa ao bem jurídico tutelado, na proporção da ação ou da omissão.

Como já previsto na Súmula 37, STJ, a reparação por danos extrapatrimoniais pode ser pedida cumulativamente com a indenização por danos materiais decorrentes do mesmo ato lesivo (art. 223-F, caput, CLT), sendo que se houver cumulação de pedidos, o juízo, ao proferir a decisão, discriminará os valores das indenizações a título de danos patrimoniais e das reparações por danos de natureza extrapatrimonial (art. 223-F, § 1º).

A composição das perdas e danos, a qual compreende os lucros cessantes e os danos emergentes, não interfere na avaliação dos danos extrapatrimoniais (art. 223-F, § 2º).

Para fins de fixação da indenização por dano extrapatrimonial, o magistrado deverá considerar: (a) a natureza do bem jurídico tutelado; (b) a intensidade do sofrimento ou da humilhação; (c) a possibilidade de superação física ou psicológica; (d) os reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão; (e) a extensão e a duração dos efeitos da ofensa; (f) as condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral; (g) o grau de dolo ou culpa; (h) a ocorrência de retratação espontânea; (i) o esforço efetivo para minimizar a ofensa;  (j) o perdão, tácito ou expresso; (l) a situação social e econômica das partes envolvidas; (m) o grau de publicidade da ofensa (art. 223-G, caput, I a XII, CLT).

A base de cálculo da indenização é o último salário contratual do empregado, seja ela fixada em favor do trabalhador ou do empregador, sendo que o valor da indenização varia de acordo com o grau da ofensa, que pode ser: (a) leve – até 3 vezes o limite; (b) média – até 5 vezes o limite; (c) grave – até 20 vezes o limite; (d) gravíssima – até 50 vezes o limite (art. 223-G, § 1º, I a IV). Além disso, em caso de reincidência entre as partes idênticas, o juízo poderá elevar ao dobro o valor da indenização.

Seguramente, não se pode admitir o “tabelamento” (“tarifação”)[6] dos danos morais pela lei, cabe ao magistrado fixar a indenização considerando o caso concreto.

Os limites impostos pela tarifação (Lei 13.467) deixam de lado o aspecto da sanção na reparação do dano extrapatrimonial.

A reparação do dano extrapatrimonial é uma questão complexa, na medida em que não há como transformá-los simplesmente em pecúnia, devendo a sua mensuração ser efetuada por critérios indiretos.

Do ponto de vista doutrinário, a reparação pecuniária, além de ser uma pena ao ofensor (sanção), também implica um verdadeiro ressarcimento.[7]

O STF, ao julgar a “tarifação” dos danos morais fixada na Lei de Imprensa (Lei 5.250/67, art. 52), entendeu que a regra legal é incompatível com a CF (art. 5º, V e X) (2ª T – RE 396386 / SP – Rel. Min. Carlos Velloso – j. 29/6/2004).

Em especial, a tarifação trazida pela Lei 13.467 (art. 223-G, CLT) ofende, de forma simultânea, não só a proibição de discriminação, como o princípio. Em outras palavras, vítimas de um mesmo acidente (empregados da empresa Vale; trabalhadores terceirizados, como empregados decorrentes da contratada junto a Vale; outros cidadãos, trabalhadores ou não, os quais foram atingidos pelos dejetos decorrentes do rompimento da barragem de contenção), como é o caso de Brumadinho, terão regramentos distintos para fins de reparação dos danos extrapatrimoniais.

Nesse aspecto, leciona Ana Claudia Schwenck dos Santos: “Ademais, a fixação originariamente prevista pela Lei n. 13.467/2017, utilizando-se o valor do salário do trabalhador como base de cálculo da indenização por dano extrapatrimonial, tem como consequência a apuração de valores diferentes para reparação de danos idênticos. Por hipótese, caso uma pessoa sofra um dano de natureza grave, e receba 1 salário mínimo (R$ 954,00) como salário, terá direito a uma indenização de até R$ 19.080,00, enquanto um trabalhador que receba R$ 5.000,00 a título de salário pode auferir até R$ 100.000,00, em idênticas condições nos termos do inciso III, § 1º, do art. 223-G da CLT.

Esta tarifação fere diretamente o princípio da isonomia e da proibição de discriminação, estabelecidos no caput do art. 5º e no inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, respectivamente. Como se não bastasse, o princípio da reparação integral também não é observado, porquanto a necessidade de obedecer ao limite estipulado na lei pode geral um valor inferior ao devido.

A apuração de valores diferentes para indenizar danos idênticos causados a pessoas distintas, decorrentes da base de cálculo utilizada (salário contratual do ofendido), acaba por gerar uma nova lesão ao direito da personalidade já violado, pois o quantum destinado à reparação configurará novo dano por discriminar o ofendido em razão de uma condição pessoal da parte que não guarda nenhuma relação com os fatos controvertidos.”[8]

Como forma de compatibilizar as regras previstas na Carta Política de 1988 e a visão protetora do Direito do Trabalho, a ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho) ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6050 perante o STF, sob o argumento de que a delimitação do quantum indenizatório para dano extrapatrimonial (art. 223-G, CLT) fere o princípio da isonomia, sendo este de natureza constitucional.

O Judiciário Trabalhista não deve aplicar, literalmente, à tarifação prevista no art. 223-G, CLT, como forma da efetiva reparação dos danos causados aos trabalhadores, os quais sejam vítimas de acidente de trabalho.

Face à dinâmica das relações trabalhistas, bem como diante do caso concreto, o magistrado deve buscar a justa reparação do dano extrapatrimonial, valorizando-se não só a Carta Política de 1988, como o dialogo das fontes entre os diversos campos da Ciência do Direito (constitucional; previdenciário; trabalhista; civil, ambiental etc.).

Devem ser valorizados: (a) o respeito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF, o não retrocesso trabalhista (art. 7º, caput, CF) e o respeito aos princípios da não discriminação (art. 3º, CF) e da igualdade de tratamento (art. 5º, CF); (b) a reparação dos danos extrapatrimoniais, pautando-se, pelo equilíbrio entre a intensidade do dano e o valor da indenização (art. 5º, V e X, CF); (c) o direito à indenização por acidente de trabalho, como um dos direitos sociais dos trabalhadores (art. 7º, XXVIII, CF); (d) o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225, CF); (e) os tratados internacionais e as Convenções da OIT pertinentes à medicina e segurança do trabalho; (f) as demais normas infraconstitucionais pertinentes ao campo da responsabilidade civil do empregador por acidente de trabalho.

Como já dito, as notícias trazidas pela imprensa apontam o rompimento da barragem da VALE como um dos maiores acidentes do trabalho no Brasil, portanto, a indenização dos danos extrapatrimonial dos trabalhadores, empregados terceirizados e seus familiares não pode ser fixada com base nos critérios adotados no art. 223-G, CLT.


[1] O dano patrimonial atinge os bens integrantes do patrimônio, isto é, o conjunto de relações jurídicas de uma pessoa apreciáveis economicamente. Tem-se a perda, deterioração ou diminuição do valor do patrimônio. A diferença existente entre o patrimônio anterior ao ato danoso e o atual (dano emergente), somada à diferença entre o patrimônio existente e o que possivelmente existiria (lucro cessante), caso não ocorresse o evento danoso, forma o dano material. O dano emergente é a efetiva diminuição do patrimônio já existente, enquanto o lucro cessante é aquilo que se deixou de auferir, ganhar. O dano material pode ser direto ou indireto. Na busca da diferenciação entre o dano material direto e o indireto, a doutrina aponta três critérios: (a) direto é o dano ao patrimônio da vítima (destruição de uma estátua); indireto é o que abrange os interesses jurídicos extrapatrimoniais do lesado, tais como os direitos de personalidade, causando, assim, perdas patrimoniais (por exemplo: despesas com o tratamento de lesões corporais); (b) direto é o que atinge a própria vítima do fato lesivo; indireto é o causado a terceiros em função desse mesmo evento danoso; (c) direto representa a consequência imediata da lesão, enquanto o indireto é o resultante da interação do evento lesivo com outro acontecimento distinto. Esse critério interliga-se mais com o nexo causal entre o dano e a ação ou omissão que o ocasionou.
[2] Dano moral coletivo é a lesão que atinge os direitos da personalidade da comunidade. Vale dizer, é a transgressão aos direitos e interesses transinvidivuais da personalidade da coletividade, como a dignidade humana, os direitos dos cidadãos, a saúde pública, o meio ambiente natural e o cultural, a paz, a segurança, o bem-estar etc. Os elementos do dano moral coletivo são: (a) sujeito ativo, isto é, a comunidade ou a coletividade que foi atingida nos seus direitos de personalidade e que assim tem o direito à reparação do dano; (b) sujeito passivo, a pessoa humana ou jurídica ou qualquer outro ente despersonalizado que tem o dever de proceder à reparação do dano causado, visto que a sua ação ou omissão foi a responsável pela violação de um direito transindividual dos direitos da personalidade; (c) objeto, a reparação que pode ser pecuniária ou não pecuniária. Como exemplos de violação de direitos transindividuais, temos: (a) anúncios prejudiciais aos consumidores; (b) veiculação de publicidade enganosa prejudicial aos consumidores; (c) divulgação ou exposição de fatos ou de informações ofensivas à honra, à imagem, à liberdade de categorias ou grupos de pessoas; (d) produção e comercialização fraudulenta de produtos que exponham à população à ocorrência de riscos à saúde de uma maneira em geral; (e) o não fornecimento de medicamentos à população visando à majoração de preços, como forma de obtenção de lucros; (f) destruição do meio ambiente com prejuízos à comunidade; (g) dilapidação do erário público como a prática de atos de improbidade pelos responsáveis pela gestão da Administração Pública; (h) ofensa ao patrimônio cultural da comunidade; (i) prática de qualquer forma de degradação do trabalho humano (trabalho escravo); (j) a não observância das normas de medicina e segurança do trabalho que exponham um grupo de trabalhadores a uma série de riscos; (k) prática da terceirização fraudulenta; (l) exploração do trabalho da mulher e do menor com violação das normas mínimas de proteção; (m) atos fraudulentos contra grupo ou categorias de trabalhadores. Há condenações do TST em ações civis públicas, objetivando, assim, a recomposição do dano moral coletivo na seara trabalhista (2a T. – RR 110700-17.2003.5.03.0103 – Rel. Min. Renato de Lacerda Paiva – DEJT 19/11/2010; 7a T. – RR 54340-93.2004.5.08.0004 – Rel. Min. Guilherme A. Caputo Bastos – DEJT 19/2/2010). É de se ressaltar que existem decisões do STJ que consideram incompatível a existência do dano moral com direitos transindividuais, vez que o dano moral, segundo esse entendimento, exige vinculação à noção de dor ou de sofrimento individual (1a T. – REsp 598281-MG – Rel. Min. Desig. Teori Albino Zavascki – DJ 1/6/2006 – p. 147; 1a T. – REsp 821891-RS – Rel. Min. Luiz Fux – DJE 12/5/2008).
[3] Os danos sociais “são lesões à sociedade, no seu nível de vida, tanto por rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a respeito da segurança – quanto por diminuição na qualidade de vida” (AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Por uma nova categoria de dano na responsabilidade civil: o dano social. In: O Código Civil e sua interdisciplinaridade, p. 370-377). O dano social envolve uma ou várias “condutas socialmente reprováveis” (= comportamento exemplar negativo) não podendo ser confundido com o dano moral coletivo, como bem acentua Flavio Tartuce, visto que: (a) o coletivo, atinge vários direitos da personalidade, enquanto o social causa um rebaixamento no nível de vida da coletividade; (b) o coletivo atinge direitos individuais homogêneos em sentido estrito, sendo que a indenização é destinada para as próprias vítimas. No social, os direitos violados são difusos, logo, toda a sociedade é vítima da conduta, devendo, assim, a indenização ser direcionada para um fundo de proteção ou instituição de caridade (Manual de direito civil, p. 439).
[4] O dano psíquico, também conhecido como dano psicológico, é aquele que se projeta na esfera emocional da vítima, resultando em um trauma (doença psíquica) e provocando alterações de comportamento. Via de regra, está relacionado à violação do patrimônio imaterial (extrapatrimonial), como uma ameaça, agressões físicas etc., violação essa que acaba por desencadear uma doença psíquica, a qual exige um tratamento médico/psíquico diferenciado. Não raras vezes, incurável. Exemplo disso. Em uma viagem de avião, poucos minutos depois de sua decolagem, a porta do avião, por não ter sido travada de forma adequada, é arrancada pela pressão atmosférica, ocasionando uma situação de desespero entre os passageiros e tripulação. Minutos depois, a aeronave consegue retornar ao aeroporto. A situação caótica a que foram submetidos esses passageiros e tripulantes, ainda que por poucos minutos, pode desencadear vários traumas, entre eles, um medo em andar de avião (aerofobia).
[5] O dano estético é representado pela alteração morfológica, como também deformidades, marcas, cicatrizes, as quais causam à vítima desgosto ou complexo de inferioridade. A doutrina e a jurisprudência divergem sobre o dano estético ser ou não uma terceira espécie de dano ou ser simplesmente apenas um aspecto do dano moral. No IX Encontro Nacional dos Tribunais de Alçada (agosto/1997), firmou-se o posicionamento de que: “O dano moral e o dano estético não se cumulam, porque ou o dano estético importa em dano material ou está compreendido no dano moral (por unanimidade)”. Posteriormente, o STJ passou a considerar lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral (Súm. 387).
[6] “A indenização em pecúnia dos danos extrapatrimoniais conta com dois sistemas diversos possíveis na esfera judicial: o sistema tarifário e o sistema aberto. O sistema tarifário consiste na pré-estipulação, por parte da lei ou da jurisprudência, dos limites do valor indenizatório a ser fixado pelo juiz. Neste sistema, o juiz aplica a regra existente ao caso subjudice com observância dos limites do valor previamente fixados, o que retira do magistrado parcela do seu poder discricionário para estabelecer o valor correto para a indenização do caso concreto, conforme suas especificidades. Por outro lado, o sistema aberto de ressarcimento confere ao juiz a atribuição de determinar o valor hábil a reparar o dano sofrido pela vítima, com base nos fatos narrados e nas provas produzidas nos autos” (SANTOS, Ana Claudia Schwenck dos. Dano Extrapatrimonial. In. MANNRICH, Nelson (Coord.). Reforma trabalhista: reflexões e críticas. São Paulo, 2ª edição, 2018, p. 147).
[7] “A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e de satisfação compensatória. Não se pode negar sua função: a) penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor, visando à diminuição de seu patrimônio, pela indenização paga ao ofendido, visto que o bem jurídico da pessoa – integridade física, moral e intelectual, não poderá ser violado impunemente, subtraindo-se o seu ofensor às consequências de seu ato por não serem reparáveis; e b) satisfatória ou compensatória, eis como dano moral constitui um menoscabo a interesses jurídicos extrapatrimoniais, provocando sentimentos que não têm preço, a reparação pecuniária visa proporcionar ao prejudicado uma satisfação que atenue a ofensa causada. Não se trata, como vimos, de uma indenização de sua dor, da perda de sua tranquilidade ou prazer de viver, mas de uma compensação pelo dano e injustiça que sofreu, suscetível de proporcionar uma vantagem ao ofendido, pois ele poderá, com a soma de dinheiro recebida, procurar atender às satisfações materiais ou ideais que repute convenientes, atenuando assim, em parte, seu sofrimento. Fácil é denotar que o dinheiro não terá na reparação do dano moral uma função de equivalência própria do ressarcimento do dano patrimonial, mas um caráter concomitantemente satisfatório para a vítima e lesados e punitivo para o lesante, sob uma perspectiva funcional. A reparação do dano moral cumpre, portanto, uma função de justiça corretiva ou sinalagmática, por conjugar, de uma só vez, a natureza satisfatória da indenização do dano moral para o lesado, tendo em vista o bem jurídico danificado, sua posição social, a repercussão do agravo em sua vida privada e social e a natureza penal da reparação para o causador do dano, atendendo a sua situação econômica, a sua intenção de lesar (dolo ou culpa), a sua imputabilidade etc.” (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 7, p. 94).
[8] SANTOS, Ana Claudia Schwenck dos. Ob. cit., p. 198.

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