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PROCESSO PENAL
Prisão pós-júri: mais uma panaceia?!!
Luiz Regis Prado
08/01/2020
Depois de decidir o efusivo caso da execução provisória da pena, também chamada de prisão em segunda instância, o STF deve lidar com outro tema polêmico: a prisão automática logo após condenação pelo tribunal do júri, criada em um de seus julgamentos, e proposta no famigerado Pacote Anticrime, do atual ministro da Justiça.
Tal modalidade de aprisionamento – assim como a execução antecipada de pena – foi desenvolvida pela jurisprudência, em um descompasso com a Constituição Federal e a tripartição de Poderes. Prender imediatamente após condenação pelos sete jurados é fruto do Habeas Corpus 118.770/SP, enquanto prender depois da condenação em segundo grau resulta do Habeas Corpus 126.292/SP. Ambas formas de encarceramento surgiram em 2016.
O instituto novidadeiro da prisão automática após a condenação pelo tribunal do júri significa prisão, em seguida à decisão de primeiro grau, e não de segundo. Nesse sentido, é até mais grave que a execução da pena depois de condenação em segundo grau, haja vista que sequer segundo grau há!
Sua criação se deu em um debate extremamente sucinto, e sem grande publicidade, no HC 118.770/SP. Não se trata de uma execução antecipada, e sim de execução da pena propriamente dita. Também, sua gênese ocorreu em poucos parágrafos e teve como argumentos principais a ideia de que o tribunal do júri é soberano em suas decisões e que, por isso, mesmo em segundo grau, ou seja, em recurso, sua decisão não pode ser alterada. Impõe-se mesmo diante da presunção de inocência.
Na Constituição Federal, consta a soberania dos veredictos dos jurados no art. 5º, inciso XXXVIII, alínea “d”, mas isso não quer dizer que a decisão do júri é imutável, como se transitada em julgado estivesse. Tal soberania não é absoluta nem definitiva, blindada, e pode ser objeto de revisão pelos tribunais. Pode ser alvo de recurso. Aliás, o art. 593 do Código de Processo Penal regulamenta os recursos do tribunal do júri em quatro hipóteses, dotadas do chamado “efeito suspensivo”: nulidade processual; decisão redigida pelo juiz contrária ao julgado pelos jurados; pena exagerada ou deficiente; e, como última hipótese, caso julgado absolutamente contra às provas dos autos.
Pelo fato de a decisão dos jurados ser recorrível, pode-se concluir que a decisão soberana não é absoluta, mas sim relativa. E, pelas hipóteses recursais, nota-se que pode haver reanálise da causa – como ocorre comumente na prática forense. Portanto, os argumentos mais relevantes da prisão automática depois da condenação pelo júri são equivocados, e disso já se sabe desde sua criação jurisprudencial, célere e surpreendente, em 2016.
Com base nessa realidade, há dois movimentos diferentes: enquanto o STF se prepara para julgar a questão, a proposta de tornar lei a prisão em primeira instância do Pacote Anticrime termina aprovada, com modificações, pelo Congresso. Tal aprovação pelo Legislativo (Projeto de Lei 6.341/2019) dita que aquele que for condenado com pena igual ou superior a 15 anos de reclusão não terá em sua apelação efeito suspensivo, podendo automaticamente ser preso. Tal postura ofende o texto constitucional e busca criar direito absoluto (soberania dos veredictos) quando se sabe às escâncaras que recursos modificam as decisões do tribunal do júri.
A intenção da mudança tem como pretexto diminuir a criminalidade como se fosse a lei apta a resolver a questão de forma isolada. A ciência penal já superou esse “fetiche” há muitos anos, de ser a lei a “panaceia” da criminalidade. Trata-se, portanto, de modalidade que se ancora no sentimento de alguém, mas não na ciência jurídica, no compromisso com a realidade, a Constituição Federal e a lei. Aliás, o tema é bem mais complexo, e não lastreia postura simplista e “mágica”.
Ademais, convém recordar, que constitui mais uma tentativa de reviver tortamente as formas de prisão automática, como as que foram rechaçadas em 1967 e 1973. De modo claro, quer-se curar um paciente em 2019 com métodos que sabidamente não deram certo no passado.
Pode-se, então, pensar: Ora, é o país da impunidade! Mas prende-se antes do trânsito em julgado? Sim. Antes da sentença de segundo grau? Sim. Prende-se antes da sentença de primeiro grau? Sim (prisão preventiva). Pode-se aprisionar durante o inquérito? Sim (prisão temporária; prisão preventiva). E antes do inquérito? Prende-se também, caro leitor, é a chamada prisão em flagrante.
Como se vê, leis não faltam, na verdade, sobram. O problema é de outro ruar – ainda vamos falar sobre isso…
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