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PROCESSO PENAL
A Ciência, o Direito e o Processo Penais, Entre Ciscos e Traves
Eugenio Pacelli
05/06/2018
[…]não julgues para não ser julgado
Ao menos o título do breve texto que se segue haverá de ter despertado o interesse. Afinal, onde entram os ciscos e as traves na ciência do Direito Penal e do Processo Penal?
Esclareça-se, por primeiro, que o
Evidentemente, não pretendemos nos valer do
Mas onde estão, então, o cisco e a trave?
O Direito brasileiro experimenta
De um lado, na perspectiva mais crítica do Direito Penal, insiste-se cada dia mais nas variadas possibilidades de sua
Na outra ponta, e talvez se concretize aqui um inegável ponto de contato entre a prática judiciária e as críticas antes mencionadas, ainda encontramos nos Tribunais certa resistência às novas perspectivas do Direito Penal, no que ele tem de efetivamente novo no campo de sua moderna dogmática, para muito além do horizonte abolicionista que se vai consolidando nas academias. Conceitos importantíssimos como o princípio da
E o cisco e a trave, e a Ciência?
Bem, são perfeitamente compreensíveis as críticas desferidas ao sistema penal, na perspectiva das misérias de nossos cárceres, fonte inesgotável da produção e da reprodução da violência. Não há como não aderir a elas: as desigualdades sociais produzem miséria; com elas, produzem também violência. E levadas ao sistema penitenciário, há nova reprodução da violência, em prejuízo evidente e ainda omitido (pela mídia) ao nível da segurança pública.
No entanto, quando se quiser falar em Ciência, ou quando a pretensão do discurso for epistemológica, a referência à luta de classes e à criminalização da classe operária e da pobreza, por si só, parece insuficiente. Porque ela não vem acompanhada de estudos sobre a responsabilização política, administrativa, civil e também penal da produção de miséria e da violência? E porque não se enfrentam também a fundamentação constitucional, que, à evidência, legitima a intervenção penal na tutela dos direitos fundamentais?
É como dizer que o que falta à Suprema Corte seria a percepção de não poder haver Direito Penal em um país de tamanha desigualdade social
Nesse passo, há sempre uma crítica – sobretudo acadêmica – sobre o viés ideológico e teórico (velha dogmática) dos Tribunais, sem a necessária percepção que muito da justificação de tais críticas se escoram no mesmo horizonte (ideológico e teórico)
E mesmo que, de nossa parte, acompanhássemos o referido ponto de vista, ainda assim ele padeceria, como padece, de uma perspectiva essencialmente democrática, na medida em que se quer recusar validade à determinações constitucionais. Ou, quando nada, à leitura ou interpretação mais frequente da Constituição, como a que ocorre em todos os Tribunais nacionais.
E sobre Ciência?
Fico com BOBBIO, em Carta ao seu amigo Alessandro BARATA, o autor mais seguido na Criminologia nacional, quando convidado por este a integrar um Instituto de Pesquisas na área:
“Que toda sociedade tenha seus crimes específicos é obvio, e não há necessidade de ser marxista para admitir isso. Basta um pouco de senso histórico. Dito isso, é preciso evitar o erro oposto, qual seja, o de pensar que os ‘fenômenos do desvio e da repressão’ devam ser interpretados como ‘aspectos específicos da formação socioeconômica do capitalismo avançado’. Uma tese
Creio, ao contrário, que a tarefa de uma Revista de direito e de política criminal que deseja ser, como a sua, ao mesmo tempo inovadora e científica (e aqui entendo por ‘científica’ o oposto de ‘ideológica’) é a de estudar os fenômenos de desvio da forma capitalista tanto quanto os de outras formações econômico-sociais (por exemplo, dos Estados Socialistas), de conduzir análises comparadas as mais amplas possíveis, as mais isentas de preconceitos, as mais livres de orientações ideológicas pré-constituídas, ao longo de todo o curso da história e nos diversos países e regimes.”[1]
[1]BOBBIO, Norberto, Nem com Marx, nem contra Marx, Org. Carlo Violi, Trad. Marco Aurélio Nogueira.São Paulo: Editora UNESP, 2006, p. 267.)
Veja também:
- Juizado Especial Criminal: Uma Nova Proposta para a Transação Penal
- As medidas cautelares pessoais no processo penal: introdução à instrumentalidade
- Unidade de julgamento, igualdade de tratamento e o juiz natural: entre ponderações, acomodações e adequações constitucionais
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