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PROCESSO PENAL
Alterar número da placa para fugir do rodízio? Tipicidade?
Marcelo Mendroni
25/10/2016
É sabido que na cidade de São Paulo foi implantado pela Prefeitura Municipal, há muito, o rodízio de placas (ou de veículos). Foi medida administrativa criada com o objetivo de diminuir a quantidade de veículos circulando em horários reconhecidamente de pico. Então, nas segundas-feiras não podem circular na região do centro expandido os veículos com placas de finais “1” e “2”. Na terça-feira não se permite a circulação de veículos com placas de finais “3” e “4”, e assim por diante.
Muito bem: Não raras vezes nos deparamos, no trabalho forense, com a seguinte situação: Alguém coloca um pedaço de fita isolante sobre um ou alguns algarismos da placa do veículo, com o intuito de “alterar” aquele algarismo, de forma a “fugir da multa de trânsito”, para que não seja percebido pelos radares ou mesmo pelos agentes municipais. Então, só para exemplificar, com apenas um pedacinho de fita isolante o número “9” pode se transformar em “8”; ou o número “6” pode se transformar em “8”.
Quando estes casos são constatados, a polícia costuma autuar em flagrante delito o condutor do veículo, encaminhando-o à Delegacia de Polícia para lavratura do auto de prisão em flagrante. Aliás, a se considerar típica esta conduta, o policial não poderia deixar de fazê-lo, sob pena de ele, agente, incorrer nas penas do crime de prevaricação.
A situação deve ser submetida à perícia, e os experts concluem, normalmente, pela alteração. O inquérito policial toma rumo, e, não raras vezes, o condutor é denunciado e responde pela prática do crime previsto no artigo 311 do Código Penal, que prevê: “Adulterar ou remarcar número de chassis ou qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento”. Pena. Reclusão de três a seis anos e multa.
Mas a conduta, s.m.j., conforme entendemos, é atípica.
Em primeiro lugar, cumpre referir que a colocação, diga-se, mera colocação de um pedaço de fita isolante na placa do veículo não pode se enquadrar em qualquer dos núcleos do tipo – “adulterar” ou “remarcar”. Qualquer deles implica, parece ser claro, a transformação definitiva ou com caráter definitivo, do sinal identificador. Mas a colocação de fita isolante nestas circunstâncias é precária e provisória, não definitiva. Não pode ser, portanto, adulteração e menos ainda remarcação.
O tipo foi criado, também me parece claro, para os casos de adulteração de chassis e peças numeradas dos veículos, para coibir transações após subtrações, por roubos e furtos. Esse foi o espírito da Lei, e não punir meras “alterações” para fuga de rodízio, para a cidade de São Paulo. Seria, além disso, aplicar remédio além da reprimenda necessária suficiente, até pelo simples processamento. Aliás, falando em punição, não se pode supor que uma pessoa que assim tenha agido seja submetida a pena mínima de 3 (três) anos de reclusão, equivalente àquela situação do agente que adultera a numeração do chassis para revender o veículo. Se na segunda situação a punição é merecida, no primeiro caso, ao contrário, parece muito exagerada.
Assim, aberto ao debate, parece-me correto que alterar o número da placa do veículo com fita isolante ou outro artefato que o valha, afigura-se conduta atípica, s.m.j., a ser dirimida somente na esfera administrativa.
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