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Prazos nos juizados especiais em dias corridos: não esperávamos por esta do FONAJE

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Prazos nos juizados especiais em dias corridos: não esperávamos por esta do FONAJE

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21/06/2016

O modo de contagem dos prazos processuais é um conhecimento nato? Nós advogados, juízes, promotores, demais servidores públicos, já nascemos sabendo contá-los? Foi nosso professor de processo civil, homem sábio, que nos repassou esse conhecimento, do qual recebeu de seus ancestrais, sucessivamente? A forma pela qual contamos os prazos é assim, uma espécie de direito natural?  É porque sempre foi e sempre será, até o fim dos tempos?

Não, definitivamente, não! Os prazos e sua contagem fazem parte do modo-de-ser do processo, regulado por normas de natureza jurídica (direito processual). A maioria de nós, formados à luz do Código de Processo Civil de 1973, sabíamos contar os prazos porque tivemos uma referência normativa para tanto.

Trata-se do artigo 181 do Código de Processo Civil de 1973, pelo qual “salvo disposição em contrário, computar-se-ão os prazos, excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento”. Este complementado pelo §1º: “Considera-se prorrogado o prazo até o primeiro dia útil se o vencimento cair em feriado ou em dia em que: I – for determinado o fechamento do fórum; II – o expediente forense for encerrado antes da hora normal”.

E nos juizados especiais cíveis? Bem, a lei pertinente (especialmente, Lei n.º 9.099/95, a qual originou o chamado “microssistema dos juizados especiais”) não tinha o condão de regular o processos como um todo, e precisou buscar aplicação subsidiária do Código de Processo Civil.

Isto é, prevendo a Lei dos Juizados Especiais prazo de “X” dias para determinado ato, mas não como será feito o cômputo deste prazo, o Código de Processo Civil passou a ser a referência necessária. Era nele, somente nele, e em nenhum outro lugar, que sabíamos que o prazo seria contado em dias corridos, excluindo-se o primeiro dia da contagem e prorrogando-se prazo até o dia útil subsequente ao dia final (CPC/73, art. 181, § 1º).

O regramento do processo civil, nos juizados especiais, dependia especialmente do artigo 181 do Código de Processo Civil, para que os prazos do processo fossem contados do modo que eram.

Não se o fazia assim por um criacionismo judicial ou mesmo para se atender à exigência de celeridade daquele procedimento (Lei 9.099/95, art. 2º). Era simplesmente a incidência de uma norma jurídica válida, e aplicada subsidiariamente. Uma norma que tinha que existir, sob pena de não termos nenhuma referência para o cômputo dos prazos.

O problema foi que em 18 de março de 2016 esta norma, antes aplicada subsidiariamente, foi revogada. Deixou de existir no mundo jurídico o artigo 181 do Código de Processo Civil de 1973 (o Código quase todo), sendo este substituído claramente pelo artigo 219 do Código de 2015, com norma de sentido diametralmente distinto: “Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis”. 

Bem, a conclusão insofismável: se a legislação dos juizados especiais é omissa quanto ao cômputo de prazos, se o CPC/73 é o diploma que se aplicava, se o CPC/73 foi revogado pelo CPC/2015, a norma do CPC/2015 deve necessariamente passar a dar base normativa para o sistema dos juizados especiais, passando a se contarem os prazos apenas em dias úteis (CPC/2015, art. 219).

O problema é que esta alteração normativa não agradou a todos. Tudo começou com ato administrativo da Corregedoria de Justiça do Conselho Nacional de Justiça, mantido pelo Encontro do Colégio Permanente de Corregedores-Gerais dos Tribunais de Justiça do Brasil (Encoge), conforme carta de Cuiabá.

No “calor” dos acontecimentos, desta “mudança brusca de leis”, era natural que questões dessa natureza pudessem surgir, mas que fossem corrigidas com o tempo. Boas, portanto, eram as expectativas para o encontro do Fórum Nacional dos Juizados Especiais – FONAJE marcado para a bela cidade de Maceió, nos dias 08, 09 e 10 de junho de 2016.

O resultado saiu frustrante, especialmente depois de excelentes trabalhos feitos por outros órgãos compostos de membros do Judiciário, especialmente FONAJEF e ENFAM. Os congressistas de Maceió, ao argumento de buscarem a “celeridade” necessária aos Juizados Especiais, entenderam que os prazos das causas que tramitam perante estes órgãos jurisdicionais devem continuar a seguir o parâmetro do Código revogado, contagem de prazos em dias corridos.

Parece mesmo um triunfo da vontade, intenção, sobre a lei. O direito é aquilo que eu acho que ele deveria ser, e não o que ele é!

Ressalto: não há direito vigente que permita a contagem de prazos em dias corridos, o artigo 181 do CPC foi revogado.  Seria, portanto, possível fazer represtinar lei revogada, apenas para que seja aplicada subsidiariamente aos juizados especiais, pelo motivo de que a nova lei aplicável tornaria o processo menos célere? Podem então os tribunais entenderem que simplesmente não querem aplicar a lei que temos?

A hermenêutica é talvez a maior vítima deste chamado período de intitulada “pós modernidade jurídica”, mas ainda acho que não vale tudo. Para afastar a aplicação de uma lei vigente caberia ao intérprete – na melhor das hipóteses – uma declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto, para falar que a contagem em dias úteis seria aplicável aos processos, mas não aos processos dos juizados especiais. Já que nestes ofenderia supostamente a razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII).

O problema é que, ainda que fosse inconstitucional o dispositivo, depois de declará-lo, não poderia o tribunal substituí-lo no sistema com norma revogada. Tirar o artigo 219 do CPC/2015 do sistema dos Juizados Especiais seria deixar um vazio, sem que existisse mecanismo de interpretação que permitisse represtinar, apenas para esse fim, o artigo 181 do CPC/73 e a contagem em dias úteis.

Esta solução seria sim “sedutora”, especialmente se pudéssemos nos convencer pelo argumento da “perda de celeridade”, mas o direito parece limitar a possibilidade. Não há como trazer a vida lei morta, se não por meio de outra lei!

A verdade, no entanto, é que esse problema hermenêutico não existe. A aplicação do artigo 219 do CPC/2015 aos Juizados Especiais não é inconstitucional e não ofende a garantia da razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII), ou a celeridade como supostamente vislumbrariam os congressistas de Maceió.

Todos os estudos realizados pelo Conselho Nacional de Justiça mostram que o tempo morto do processo, o qual não é medido em dias, mas em meses e comumente em anos, está no tempo parado nos escaninhos da Justiça.

E mais. A Lei 9.099/95 tem pouquíssimos prazos, como também as leis do Juizado Especial Federal e da Fazenda Pública (Lei 10.259/2001 e 12.153/2009). Ao contrário do procedimento comum, não tem prazo para contestar, para réplica, para indicar provas ou mesmo para alegações finais. A preclusão temporal se estabelece em fase, e não prazo!

São basicamente 3 prazos na fase cognitiva/recursal. Fala-se apenas em prazo de (i) 10 (dez) dias para recorrer e contrarrazoar recurso (Lei 9.099/95, art. 42, caput e § 2º), (ii) 5 (cinco) dias para embargos de declaração (Lei 9.099/95, art. 49); e (iii) 30 (trinta) dias para habilitação do sucessor do falecido (Lei 9.099/95, art. 51, V e VI).

A terceira hipótese é rara e não merece preocupação para o tratamento geral do sistema, de modo que o impacto no tempo do processo deve ser aferido quando há recurso inominado ou embargos de declaração.

Em prazo de 10 (dez) dias, a diferença entre dias corridos e dias úteis, implica normalmente o aumento de 3 (três) a 5 (cinco) dias, em prazo de 5 (cinco) dias, o aumento deve ser de 0 (zero) a 2 (dois) dias. Daí temos um aumento, nos casos em que há embargos de declaração e recurso inominado, de no máximo 7 (sete) dias na tramitação total do processo. Esta adição de tempo justificaria a ginástica hermenêutica represtinatória do FONAJE?

Não. Entendemos que não. E humildemente desconhecemos os motivos – jurídicos ou não – que poderiam levar a este entendimento, o qual tem o condão de gerar constrangimento ao aplicador do direito, especialmente ao juiz mais apegado à técnica jurídica e a necessidade de aplicação sistemática do ordenamento jurídico. Seguir esta recomendação para inadmitir o ato da parte por intempestividade, indo contrariamente ao direito positivo, parece medida que enunciado nenhum de FONAJE pode legitimar.


VEJA AQUI OUTROS TEXTOS DA SÉRIE CPC 2015

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