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Novidade no recurso especial: primeiras reflexões sobre a EC 125 e o requisito da relevância das questões de direito federal infraconstitucional (REsp com RQF)
06/09/2022
Novidade no recurso especial é o tema deste artigo publicado por Andre Vasconcelos Roque, Fernando da Fonseca Gajardoni, Luiz Dellore e Zulmar Duarte de Oliveira Junior. No texto, os autores trazem as primeiras reflexões sobre a EC 125 e o requisito da relevância das questões de direito federal infraconstitucional (REsp com RQF). Leia!
Novidade no recurso especial: primeiras reflexões sobre a EC 125 e o requisito da relevância das questões de direito federal infraconstitucional (REsp com RQF)
É consenso que temos muitos recursos em nosso sistema, com conhecidos reflexos no volume de feitos que aportam nos Tribunais Superiores. E que, em virtude disso, tais Tribunais, em vez de se ocuparem especialmente com a fixação de teses vinculantes em julgamento de casos repetitivos ou de grande repercussão nacional, acabam por julgar milhares e milhares de recursos em causas sem maior relevância, funcionando como verdadeiras 3ª e 4ª instâncias.
Tem sido reconhecida a necessidade, por isso, da criação de filtros que permitam a essas Cortes de Vértice retomarem seu papel central dentro da estrutura do Poder Judiciário brasileiro: a de Tribunais de formação de precedentes.
Nesse sentido, já existe a previsão da repercussão geral para Recurso Extraordinário (RE) no STF (EC 45/2004, regulamentação inicial pela lei 11.418/2006 e, hoje, pelo CPC 2015), bem como a transcendência para o Recurso de Revista no TST (inserida pela MP 2226/2001, mas efetivamente regulamentada apenas com a lei 13.467/2017, que inseriu parágrafos ao art. 896-A da CLT).
Assim, por simetria, faltava a criação de filtro análogo no Recurso Especial (REsp).
Novidades no recurso especial e a EC 125
A tramitação da proposta de emenda constitucional (PEC) foi longa, durou dez anos. Seu início foi com a PEC 209/2012, posteriormente sucedida pela PEC 39/2021, que culminou com a EC 125/2022, promulgada em 14/7/2022 e publicada no Diário Oficial no dia seguinte.
Em linha com o trabalho por nós elaborado na obra Comentários ao CPC (Forense, 2022, 5ª ed.), faremos aqui alguns comentários acerca do requisito da relevância das questões de direito federal infraconstitucional ora introduzida no ordenamento jurídico nacional.
Desde logo destacamos que se trata de uma primeira reflexão, pois para uma análise completa necessário aguardar (i) a manifestação do STJ em julgados (a casuística da Corte), (ii) eventual manifestação institucional do STJ (possivelmente via alteração regimental ou mesmo outro ato normativo interno, como alguma portaria) e, especialmente (iii) a edição de lei infraconstitucional que regulamente a EC 125/2022 (provavelmente via alteração do CPC, o que não será imediato).
E, vale lembrar, que no momento da edição da EC 125/2022 e da publicação desta coluna, o STJ está em seu recesso julino, de modo que não houve ainda qualquer manifestação da Corte a esse respeito1.
Vejamos a seguir algumas das principais questões trazidas pela EC, que cria a relevância das questões de direito federal (RQF) no Recurso Especial.
1) O requisito da relevância já é aplicável ou há necessidade de se aguardar a lei regulamentadora? Ou seja: já precisamos considerar a EC nos próximos recursos especiais a serem elaborados?
A redação da EC suscita dúvidas quanto ao tema, infelizmente. Para traçar um paralelo em relação à repercussão geral, a EC 45/2004 foi clara ao apontar a necessidade de lei regulamentar para que houvesse sua aplicação, de modo que não houve debate a esse respeito na ocasião. Diferentemente do que se tem agora.
Há um aparente conflito (antinomia) entre o §2º do art. 105, acrescentado à Constituição pela EC 125, e o art. 2º da EC. Vejamos (grifos nossos):
§ 2º No recurso especial, o recorrente deve demonstrar a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que a admissão do recurso seja examinada pelo Tribunal (…).
Art. 2º A relevância de que trata o § 2º do art. 105 da Constituição Federal será exigida nos recursos especiais interpostos após a entrada em vigor desta Emenda Constitucional (…).
Ora, pelo § 2º, necessário aguardar os “termos da lei”, que ainda não existe; porém, pelo art. 2º, a relevância já é exigida desde a entrada em vigor da EC.
Em nosso entender, existe a necessidade de lei infraconstitucional para regulamentar o tema e, somente após essa lei, será possível não se conhecer de um REsp por falta de relevância da questão federal2.
Mesmo porque, há uma série de lacunas (não só procedimentais, mas também de conteúdo) na previsão constitucional, a qual, exatamente por isso, menciona a locução “nos termos da lei” – tal qual ocorreu em relação à repercussão geral no RE. E a forma de compatibilizar esse entendimento com o que consta do art. 2º da EC é interpretar referido dispositivo no sentido de que, independentemente do que disser a lei regulamentadora, não haverá a retroação do filtro para os recursos interpostos antes da emenda constitucional. Vale dizer: em observância à garantia da segurança jurídica, o constituinte reformador buscou, desde logo, garantir a irretroatividade desse filtro de relevância3.
Ou seja, a previsão não retroage, é ex nunc (art. 2º), e somente aplicável aos acórdãos que serão publicados após a edição da lei regulamentadora referida no novel § 2º do art. 105 da CF.
Essa é a posição que nos parece mais técnica e correta. Mas, por certo, não é a única interpretação possível.
Outro entendimento admissível é no sentido de que, ainda que futuramente haja uma lei infraconstitucional para trazer mais detalhes acerca do trâmite (e, inclusive, outras hipóteses de relevância da questão federal), desde logo – com a entrada em vigor da EC (art. 2º) – já existe o requisito da relevância da questão federal (RQF). Ou seja, o STJ poderá desde logo aplicar o filtro da relevância para os recursos interpostos na vigência da EC, mas sem exigir do recorrente, enquanto não editada a lei regulamentadora, a demonstração da relevância.
Por fim, em uma variação ainda mais rígida desse entendimento, mesmo antes da edição da lei regulamentadora, seria necessário que todos os recursos interpostos contra acórdãos publicados após a entrada em vigor da EC já ostentem – e demonstrem, em tópico próprio – a relevância, sob pena de não conhecimento.
Por cautela, para o advogado que atua no foro, a posição mais adequada é pressupor a existência da relevância e a necessidade de sua demonstração e, portanto, nos REsps a serem interpostos, inserir um tópico para demonstrar que o caso concreto apresenta relevância. Isto é, abrir uma preliminar no recurso para apontar a existência da relevância.
Vale destacar que, na perspectiva de direito intertemporal, conforme firme jurisprudência do STJ, isso seria necessário a partir dos acórdãos publicados após a vigência da EC. Assim, se um acórdão foi publicado em 10/07/22, mesmo que o prazo final de interposição do REsp seja após a vigência da EC, não haveria, em tese, a necessidade de se inserir a preliminar de relevância.
De qualquer forma, como já exposto, ao longo dos próximos meses, veremos como o STJ se posicionará em relação ao tema. Porém, se o STJ entender que a EC já é de eficácia plena (com o que não concordamos), é certo que todos os especiais interpostos contra acórdãos publicados após a vigência da EC e que não trouxerem a preliminar de relevância não serão conhecidos. Por isso a sugerida cautela.
2) Há hipóteses de relevância presumida ou relevância por força de lei (ex lege)? Trata-se de presunção absoluta ou relativa?
Nos termos expressos da EC, existem situações nas quais o próprio constituinte derivado já afirmou que há a relevância da questão federal (RQF).
Isso pode ser denominado de “relevância por força de lei”, “relevância automática”, “relevância presumida” ou mesmo alguma outra nomenclatura.
De qualquer forma, caso se adote a nomenclatura “relevância presumida”, isso não pode dar margem ao debate se essa presunção é absoluta ou relativa (a qual, nesse caso, poderia ser afastada4). Ou seja, nesses casos expressos previstos na EC (mais precisamente no novo § 3º do art. 105), dúvida não há, estaremos diante da existência de relevância – e, portanto, presunção absoluta (iuris et de iure).
E quais são as hipóteses de relevância já expressamente reconhecidas pelo constituinte? São aquelas previstas no art. 105, § 3º (“Haverá a relevância de que trata o § 2º deste artigo nos seguintes casos”), que podem ser divididas em três blocos: a) pela natureza da discussão (matéria), b) pela expressão econômica (valor da causa) e c) pelo teor da decisão recorrida (discrepante da jurisprudência dominante). Vejamos
a) relevância presumida pela matéria5:
I – ações penais;
II – ações de improbidade administrativa;
IV – ações que possam gerar inelegibilidade;
Percebe-se, aqui, claramente, uma preocupação do constituinte com causas que podem ter reflexos nos direitos políticos dos cidadãos (e, especialmente, em candidatos a cargos eletivos). Para causas cujo julgamento possa implicar suspensão de direitos políticos o legislador reconheceu que sempre haverá relevância. Essas causas são julgadas no STJ pelas turmas de Direito Público (1ª e 2ª Turmas), que, portanto, nesses assuntos, não serão impactadas pela nova normativa.
Interessante pontuar que também têm presunção de relevância as ações penais (as quais também, em caso de procedência, geram suspensão de direitos políticos, nos termos do art. 15, III, CF). E, aqui, como não há nenhuma restrição na EC, falamos de relevância presumida em qualquer ação penal – seja relativa a crimes de “colarinho branco”, seja a crimes famélicos. Logo, é de se concluir que as turmas de Direito Penal do STJ (5ª e 6ª Turmas) não terão qualquer benefício no que se refere à filtragem de causas pela relevância.
Lamentável, por outro lado, que não tenha o constituinte trazido a relevância ex lege das ações coletivas em geral (ação civil pública, ação popular, mandado de segurança coletivo etc.). Sem dúvida nenhuma a regra é que estas causas, as quais tutelam direitos da coletividade, têm muito maior importância social, econômica, política e jurídica do que as ações eleitas pelo legislador como de relevância presumida. O mesmo se diga quanto aos casos de incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) e incidente de assunção de competência (IAC), situações em que, evidentemente, os debates ultrapassam o mero interesse subjetivo das partes.
b) relevância presumida pelo valor da causa:
III – ações cujo valor da causa ultrapasse 500 (quinhentos) salários-mínimos;
Sem que, neste momento, se avance na crítica sobre a (in)conveniência de existir um critério de valor para existir relevância – o que prejudica, sobremaneira, o acesso às Cortes Superiores das classes menos favorecidas e que, como regra, não demandam por valores tão elevados -, pode-se já afirmar que o mais adequado teria sido o constituinte traçar um paralelo com os critérios para fixação de honorários sucumbenciais previstos no CPC (art. 85), em que se consideraria, para firmar a relevância, (i) o valor da condenação, (ii) o valor do proveito econômico obtido ou (iii) o valor atualizado da causa.
É bastante provável que a jurisprudência (ou mesmo a lei regulamentadora) avance no sentido de não considerar, isoladamente, o valor da causa, mas também esses outros critérios. Porém, o efeito imediato desse inciso III é que veremos um aumento (muitas vezes, artificial) no valor da causa nas demandas ajuizadas a partir da EC. Afinal, sempre que possível, especialmente nas causas com conteúdo econômico indeterminado, os autores das ações (especialmente se forem beneficiários da justiça gratuita – CPC, art. 95), indicarão valor da causa acima de 500 salários, para já se inserirem em situação de relevância decorrente da lei e, com isso, terem acesso ao STJ.
De qualquer forma, o que se tem hoje, decorrente da EC, é exclusivamente a menção a valor da causa, apenas existindo a previsão de possibilidade de sua atualização monetária. É o que está previsto no art. 2º da EC, parte final (grifos nossos):
Art. 2º A relevância de que trata o § 2º do art. 105 da Constituição Federal será exigida nos recursos especiais interpostos após a entrada em vigor desta Emenda Constitucional, ocasião em que a parte poderá atualizar o valor da causa para os fins de que trata o inciso III do § 3º do referido artigo.
Ainda que a redação não seja das mais claras, deve-se interpretar o dispositivo no sentido de que se atualize o valor da causa no momento da interposição do REsp. Não no momento da vigência da EC. Até porque, com a inflação e aumento do salário-mínimo, esse valor só diminuiria ao longo do tempo.
c) relevância presumida considerando a jurisprudência do STJ:
V – hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante o Superior Tribunal de Justiça;
Essa, seguramente, será a hipótese mais frequente suscitada em preliminar de relevância no REsp, especialmente nas causas de direito privado (julgadas pelas 3ª e 4ª Turmas do STJ), para as quais não existe, por ora, qualquer previsão de presunção de relevância pela matéria.
Mas o conceito de “jurisprudência dominante” é dúbio. Existia no CPC 1973, mas foi deixado em segundo plano pelo CPC 2015, que prefere fazer menção a precedentes qualificados6. De qualquer forma, o STJ segue entendendo ser possível o julgamento monocrático com base em “jurisprudência dominante”, mesmo após a edição do atual Código7.
A grande dúvida é saber o que significa essa expressão. Seria um critério quantitativo (um elevado número de julgados no mesmo sentido) ou qualitativo (uma decisão da Corte Especial, por exemplo)? A resposta é variada, mas passa pela análise desses dois critérios.
Por exemplo, se há muitas decisões em um sentido na 3ª Turma, mas igualmente diversas decisões em sentido distinto na 4ª Turma, não se trata de jurisprudência dominante. Da mesma forma, se é uma decisão proferida pela Corte Especial, mas o tema foi apreciado apenas lateralmente (o chamado obter dictum), igualmente não se trata de jurisprudência dominante.
Mas, de seu turno, se há decisões no mesmo sentido na 3ª e 4ª Turma, ainda que até o momento não haja decisão da Seção ou da Corte Especial, estamos diante de jurisprudência dominante. Por sua vez, se há apenas uma decisão da Corte Especial, em recurso repetitivo, já se está diante de jurisprudência dominante.
Cabe ao advogado demonstrar muito bem – a partir de julgados e análise macro da jurisprudência acerca do tema no STJ – que se está diante de jurisprudência dominante, para fins deste inciso.
Portanto, nessas 5 situações, a relevância não pode ser afastada pelo órgão julgador. Mas, ainda assim, independentemente do que vier a dizer a jurisprudência do STJ e a lei regulamentadora, é recomendável que se abra a preliminar no REsp para indicar que não é necessária a comprovação da relevância da questão de direito federal debatida por ela, visto que já é legalmente presumida / decorre do texto constitucional.
3) Podem existir outras hipóteses de relevância da questão federal (RQF)? E eventuais outras hipóteses já poderiam ser aplicadas hoje?
Além das 5 hipóteses acima indicadas, seria possível se cogitar de outras situações de relevância – por exemplo, em casos envolvendo criança e adolescente, direito de família, ações coletivas ou IRDR?
A resposta é positiva, nos termos da própria EC, que prevê, no art. 105, § 3º, VI a possibilidade de repercussão geral em “outras hipóteses previstas em lei.” (grifos nossos).
Mas, neste momento, como já exposto, ainda não há essa lei. Assim, com isso, reforça-se a tese de necessidade de lei regulamentadora para que haja a aplicação do filtro da relevância.
De qualquer forma, o ponto em análise torna a situação ainda mais complicada se o STJ entender pela imediata aplicação da EC.
Isso porque, se se entender pela aplicação da EC desde já, sem outras hipóteses previstas em lei, se nós estivermos diante de uma causa envolvendo infância ou família, com valor da causa abaixo de 500 salários (inciso III) e que seja um tema inédito ou pouco debatido, portanto ainda sem jurisprudência no STJ (inciso V), a rigor não haveria como se garantir que a relevância fosse reconhecida, considerando que ela pode ser afastada pela manifestação de 2/3 dos componentes do colegiado. Isso se agrava ainda mais nas questões de família, em que não existe ampla divulgação dos precedentes, por força do segredo de justiça.
Sendo assim, caso o STJ entenda que a aplicação da EC é imediata, é certo que deve haver ainda uma flexibilização nos requisitos, para além dos casos previstos no art. 105, § 3º, de modo que outras hipóteses sejam consideradas relevantes, sob pena de se impedir que questão absolutamente necessária seja apreciada pelo STJ, com violação à principiologia existente na CF e no CPC.
Um bom critério para resolver o problema seria o STJ aplicar analogicamente8, para deliminar a existência de relevância do especial, as hipóteses estabelecidas para configuração da repercussão geral do extraordinário (CPC, art. 1.035, § 1º9)10.
4) De quem é a competência para análise da existência de relevância da questão federal (RQF)?
Qual órgão será o responsável para apreciar a existência – na verdade, especialmente a inexistência – de relevância? Quem dirá que um especial tem relevância das questões de direito federal infraconstitucional; ou seja, que se trata de um REsp com RQF?
Podemos cogitar de (a) turma julgadora no STJ (composta por 5 ministros), (b) presidência do STJ, que hoje já é responsável pela primeira análise da admissibilidade dos recursos e (c) presidência (ou vice-presidência) do tribunal de origem, que hoje já é responsável por admitir o REsp.
Com base na EC, a resposta é apenas a opção (a), a turma julgadora – e de forma colegiada, via acórdão, e não monocrática pelo relator.
Isso porque o art. 105, § 2º é expresso ao apontar que “somente pode dele não conhecer com base nesse motivo pela manifestação de 2/3 (dois terços) dos membros do órgão competente para o julgamento” (grifos nossos).
Ora, quem em regra julga o REsp é a turma, composta por 5 ministros. Sendo assim, quem apreciará se há ou não relevância é esse órgão fracionário, sendo que somente se 4 dos 5 ministros (o 2/3, arredondado para cima) afirmarem não existir a relevância é que o REsp não será conhecido. Sendo assim, não compete ao relator (monocraticamente), ao presidente do STJ (monocraticamente) ou ao tribunal de origem apontar a ausência de relevância. E, pelo comando constitucional, isso não poderia ser alterado sequer pela previsão infraconstitucional11.
De qualquer forma, vejamos o que a regulamentação do STJ e a lei infraconstitucional apontam.
5) Existindo a relevância da questão federal (RQF), seguem sendo necessários os demais requisitos de admissibilidade do REsp?
Esse um dos pontos que sempre se deve ter em mente: a existência da relevância não afasta a necessidade da observância dos demais requisitos de admissibilidade do Recurso Especial.
Assim, de nada adianta existir relevância da questão federal, e o REsp ser interposto de forma intempestiva, ou se pretender rediscutir matéria fática (Súmula 7/STJ).
Nesse sentido, ao menos em um momento inicial, a jurisprudência do STJ tende a seguir sendo rígida na análise dos requisitos de admissibilidade, inclusive com entendimentos que podem ser classificados como de jurisprudência defensiva12.
Portanto, além da preliminar de existência de relevância, deve seguir sendo demonstrado, na peça do REsp, que estão presentes todos os demais requisitos de admissibilidade.
De qualquer forma, é de esperar que, com a criação do filtro de relevância, o art. 1.029, § 3º do CPC13 passe a ser mais aplicado, já que, até o momento, sua aplicação infelizmente tem sido bastante tímida14. Logo, no momento da elaboração do REsp, vale também mencionar esse dispositivo, no que se refere aos demais requisitos de admissibilidade.
Essas são algumas das questões enfrentadas na perspectiva de uma primeira análise da relevância da questão federal (RQF), no âmbito da EC 125. Faz-se votos sinceros no sentido de que a arguição da RQF possa efetivamente converter o STJ em uma Corte de precedentes. Mas que ela não seja utilizada de modo desarrazoado, a ponto de desviar o Tribunal de sua missão constitucional de pacificar e dar a interpretação final sobre as questões de direito federal relevantes para a nação.
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NOTAS
1 Salvo a publicação de uma reportagem pela assessoria de imprensa no site do Tribunal, sem qualquer indicativo mais concreto quanto à aplicação do filtro.
2 Trata-se, na clássica lição de José Afonso da Silva (Aplicabilidade das normas constitucionais. 7. Ed. São Paulo: Malheiros, 2007. P. 82/83), de norma de eficácia limitada pois o próprio texto constitucional represa sua eficácia até a edição de lei ordinária.
3 De qualquer forma, vale lembrar que o STF, quando da entrada em vigor da repercussão geral, aplicou-a de forma retroativa, a fim de analisar a existência de tal tema em recursos pendentes de apreciação, embora tenha dispensando a existência de argumentação em tal sentido por parte do recorrente: “(…) Reconhecida, pelo Supremo Tribunal Federal, a relevância de determinada controvérsia constitucional, aplicam-se igualmente aos recursos extraordinários anteriores à adoção da sistemática da repercussão geral os mecanismos previstos nos parágrafos 1º e 3º do art. 543-B, do CPC. […]” (STF, AI 715423 QO, Relator(a): ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 11/06/2008, DJe-167 DIVULG 04-09-2008).
4 A ressalva foi bem realizada por José Miguel Garcia Medina, em vídeo.
5 Abaixo reproduzimos os números dos incisos do §3º.
6 A referência, aqui, é especialmente em relação ao dispositivo que permite o julgamento monocrático pelos relatores (CPC, art. 932, IV e V), em que houve a substituição do termo “jurisprudência dominante” (que segue existindo em alguns artigos) por menção a precedentes vinculantes (súmula, repetitivos, IRDR e IAC).
7 É o que está sedimentado na Súmula 586/STJ: O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema.
9 § 1º Para efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou não de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo.
10 Aliás, os conceitos jurídicos indeterminados utilizados como critérios para definição da repercussão geral (social, jurídico, político e econômico), ao que parecem foram considerados como vetores na delimitação das hipóteses em que a relevância é atestada desde já. O aspecto político nos incisos I, II e IV do § 3º do artigo 105, o aspecto econômico no inciso III do § 3º do artigo 105, enquanto a contrariedade a jurisprudência dominante (inciso V) é uma das perspectivas consideradas para fins de repercussão jurídica do caso.
11 Problema imediato que surge é a possibilidade de as turmas divergirem sobre a existência do RQF em determinada situação. Mas isso é assunto para debate em outro momento – contudo, uma vez mais reforça a necessidade de RQF apenas após a lei regulamentadora.
12 Acerca do tema, conferir nossos Comentários ao CPC, especialmente art. 1.029 e ss.
13 § 3º O (…) Superior Tribunal de Justiça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o repute grave.
14 Como destaque positivo, o entendimento da Corte Especial de que não há necessidade de se indicar a alínea do REsp, se for possível compreender a controvérsia (vide EAREsp 1672966).