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Revista Forense
CLÁSSICOS FORENSE
PROCESSO CIVIL
REVISTA FORENSE
Essencialidade da forma, de Epaminondas José Pontes
Revista Forense
18/12/2023
Não existe direito processual: o “como fazer” no direito judiciário está contido implicitamente na norma do direito material e é apenas um desdobramento dela. A separação só se faz por amor ao método. Regras de forma estão integradas nas regras de fundo. O instituto de direito compreende a essência e a forma. Não há direito sem forma. A norma de direto material sem forma seria uma simples abstração. É por isso que o Cód. Civil diz que “a todo o direito corresponde uma ação que o assegura” (art. 75).
A significação disto é que todo o direito atua (ação no sentido chamado material) corporificando-se em fórmulas (ação no sentido chamado formal). Ora, a forma está, portanto, no próprio direito. A forma é da essência do direito. O direito processual tem o sentido de uma separação de ordem didática e metodológica, nada mais. Não é só a ação significando forma em potência que pertence ao direito material: tôda forma é de direito material. O litisconsórcio não é uma figura de direito processual. Êle está contido em cada situação jurídica delineada pelo direito civil (compreendendo o comercial) e pelo direito penal. A forma reflete o direito material. A regulamentação feita no Código de Proc. Civil apenas visa a sistematizar e esclarecer de modo geral a forma que tomará cada hipótese de litisconsórcio. A própria obrigatoriedade do litisconsórcio é de direito material.
As hipóteses já existem, preconstituídas, em suas linhas gerais como em seus efeitos quanto aos interessados.
Sobre o direito processual
O processo é o “como” do “porque”, que é a substância. Mas o processo é manifestação da substância, é sua realização, seu desdobramento, sua aparência.
O processo em tese, a lei processual vigente, é que recebe o contato do fato social que emerge do caos da discussão privada, particular, pessoal, para a ordem jurídica pré-ordenada, onde o fato vai ter um tratamento impessoal, imparcial, eqüitativo, judicial, pelo Estado. O Cód. de Processo se encontra estendido como uma teia de aranha gigantesca sôbre todo o país. Nesse sentido, figuradamente, é que se diz, usualmente, viver o povo debaixo das leis, sob o império das leis. A qualquer anormalidade social, conforme os catálogos, que são os Códigos de direito chamado substantivo ou material, recorre o lesado à lei processual e seu apêlo sacode a rêde estendida. A teia, no setor delimitado pela organização judiciária, reage e se entumece com a função semelhante à de um útero animal. Recebe a semente da pretensão do autor e começa a crescer, acumulando atos esclarecedores, que são a citação, a defesa, as provas. E, ao fim da gestação do problema pôsto, há o parto, que é a audiência de julgamento. O juiz parteja a solução estatal que dirige a questão privada, tirando a sentença do ventre dos autos com sua apreciação lógica e jurídica de julgador. Nasce então a sentença, que situa o fato social questionado e estabelece seus efeitos. Os fatos sociais importantes do ponto de vista jurídico estão catalogados nos Códigos de direito material, mas êles só operam quando, ocorrendo na realidade, o impulso dos interessados os faz atingir a rêde das normas processuais, invocadas a decisão e a proteção do Estado. Êsse contato é que torna o direito – dir-se-ia – uma coisa viva: é a fecundação do direito adjetivo feminino pelo direito substantivo masculino. Donde se vê que o direito material encarado isoladamente é incompleto como entidade do mundo social. Ele se completa, quando encontra sua forma: e então é a entidade nascitura já viva: nascerá como sentença. Êsse contato vital se faz por intermédio do juiz. E aí está o papel do juiz: age representando o Estado, efetiva aquêle contato, como se deflagrasse um lume sacerdotalmente, para acender o fogo sagrado da Justiça. E a abstração se encontra com a realidade. No momento em que o juiz determina “cite-se”, êle fêz sair a centelha, êle promoveu aquêle contato efetivo: e a, pretensão do autor, que está corporificada em palavras escritas no papel do pedido inicial, vai gerar, dentro das fórmulas concretas, escritas, do processo, a declaração do direito questionado, em sua existência e efeitos, ou não. O direito à sentença é um direito essencial, material, natural, preexistente, tendo fôrça de prerrogativa constitucional. Esse direito é que dá ao interessado o poder de iniciar qualquer processo, por intermédio do juiz, para obter uma declaração final, ainda que o condenando. Por onde se vê que a forma é a corporificação do direito, o meio pelo qual o pensamento geral do Estado, exposto na lei material, passa a atuar como sistema concreto, palpável, de dirimir controvérsias em tôrno de fatos sociais.
Forma
Não poderia, pois, a forma, ser considerada como matéria de outra natureza em relação ao chamado direito substantivo. A regulamentação deforma não pode ser considerada um direito diferente, senão cara facilitação de seu estudo e aplicação. Não há direito adjetivo, a não ser didàticamente, porque, se olhado pelo outro lado, dada a igual importância do direito formal, tomando-se êste como ponto de referência, o direito material também poderia ser considerado como adjeto ao direito formal, pois, em relação à forma, o direito essencial não é mais do que um meio-direito, um direito pela metade, porque não há direito sem ação que o assegure, mesmo que a ação seja a fôrça bruta do selvagem. A dívida de jôgo, por exemplo, não tem ação que a assegure: logo, não é direito tutelado pelo Estado. Seria um direito privado – diga-se. Mas, paga a dívida, reconheceu quem pagou o meio-direito de quem recebeu: era um meio-direito, ilícito, precário, que se completou com o reconhecimento voluntário de quem pagou. Passou a integrar o patrimônio de quem recebeu, como um direito, porque o que pagou não tem ação para reaver o pagamento (art. 1.477 do Cód. Civil). A ação para cobrança de dívida de jôgo não se desenvolve, porque seu objeto é ilícito. Não há ação porque não há direito. Não há ação sem direito, embora haja meio-direito sem ação.
Prescrição
Também se considera que, na hipótese da prescrição, não pode alguém cobrar aquilo que está prescrito, desde que o réu alegue a prescrição. Mas o titular do direito prescrito poderá argüi-lo, se fôr acionado. Seu direito permanece, embora sem ação que o assegure. É assegurado pela figura da defesa. É assegurado no caso de reação. Em defesa, poderá, como réu, alegar vitoriosamente seu direito prescrito. Embora a defesa seja uma reação, que sob certo sentido se equipara à ação, falta-lhe contudo a marca de atividade autônoma, que caracteriza a ação. Ao contrário, a defesa é função do ataque: é reação à ação, da qual depende para se manifestar, embora assuma um papel importante depois, porque o autor, normalmente, não poderá desistir da ação unilateralmente, não podendo, portanto, matar a reação que provocou e a qual poderá levá-lo à condenação.
No caso da alegação do direito prescrito como defesa, a reação não tem características necessárias para se manifestar por si mesma, independentemente da provocação consistente na ação a que se contrapõe.
Mas, na forma de defesa, o direito prescrito é considerado. É um milagre da forma. É a fôrça da forma, no seu poder de ressuscitar um direito. E a essencialidade da forma comunicada ao direito imprestável, dando-lhe o toque de vitalidade. O direito é um só, na sua existência e na sua realização. O direito tem dinamismo próprio, que lhe vem dos impulsos humanos profundos e como o mercúrio, que toma e procura a forma de seu continente para se estabilizar, o direito tende a realizar-se, desdobrando-se em fórmulas segundo os modelos pré-estabelecidos ou criando padrões de efetivação, de um ou de outro modo. Mas a forma que se distende do direito é o próprio direito, é o próprio ato humano completando-se, desdobrando-se, realizando como liberdade do homem, como imperativo da natureza do homem. O próprio homem é forma, dentro dos desenhos palpitantes da universalidade, forma que se impulsiona desfechando direitos.
A forma, como possibilidade de direção da substância num certo sentido de utilidade, é também substancial. Assim, quanto à substância argila de que se faz uma estátua, a forma é a substância da estátua, atuando sôbre a substância argila. A argila não é a substância da estátua. A argila é acidental em relação à substância da estátua (em si), porque a essência da estátua (a arte) poderia ter atuado em outra matéria que não a argila, como num metal qualquer.
A primeira substância é a argila: a substância forma artística e uma substância superposta, secundária, sôbre a substância primária, inerte. Teríamos, então, a substância argila como substância estática, como um impacto parado, que depende da forma ou continente para atuar. A forma é a substância dinâmica, dinamizada, essencial, quanto ao impulso que só ela pode dar. A substância pura sem a forma, não atua. É apenas uma potencialidade que se faz poder quando em contato com a forma, misturando-se a ela, entrosando-se, enfim, com os acontecimentos entrelaçados da vida prática. As substâncias fósforo, cálcio, ferro, água, etc., tomam a forma de um homem quando ordenadas devidamente, em composições químicas, sob uma forma física geral. É o supremo segrêdo. Assim, a norma de direito existe mas só atua utilmente quando toma a forma que lhe dá, o direito processual. Ou quando há uma ameaça disto. Dizer um Código que matar é crime sujeito a pena, é nada dizer se outro Código referente a processo não disser como fazer para executar aquêle mandamento legal. A prisão em flagrante ou por mandado, o contraditório, as garantias processuais que aparecem na Constituição são direito processual constitucionalizado, isto é, que a Constituição impõe como substrato mínimo das leis processuais. Assim, sob êste aspecto, o direito processual seria também um direito substancial. Um direito material superstante. A forma em si não pode atuar. Só os dois elementos reunidos compõem a célula inicial, o ôvo do qual o direito vivo, atuante, se desenvolve. Um elemento depende do outro e discutir qual o mais importante é querer resolver quem surgiu primeiro, se a galinha ou o ôvo, conforme o espírito dêsse dilema pôsto secularmente. Quando o Cód. Penal diz que é proibido matar, sob tal pena, está dizendo também que o matador estará sujeito a ser interrogado e a ver serem ouvidas as testemunhas e serem apreciadas tôdas as provas no julgamento. Assim, a norma do Cód. Penal pressupõe e arrasta como material indispensável as normas de direito processual que regulam o procedimento indispensável. A ação penal é o toque, o comando, que providencia o desenvolvimento da incidência, das normas sôbre o réu. Mas o desencadeamento é geral, compreendendo a norma nua do Código Penal com seus consectários artísticos constantes do Cód. de Proc. Penal.
Epaminondas José Pontes, juiz no Distrito Federal.
LEIA TAMBÉM O PRIMEIRO VOLUME DA REVISTA FORENSE
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 1
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 2
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 3
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 4
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 5
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