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Da coisa julgada nos processos de jurisdição voluntária de, Antônio Alberto Alves Barbosa

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Da coisa julgada nos processos de jurisdição voluntária de, Antônio Alberto Alves Barbosa

REVISTA FORENSE 165

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30/07/2024

SUMÁRIO: 1. Caso prático. 2. A regra do art. 288 do Cód. de Proc. Civil. 3. A jurisdição voluntária. 4. PAULA BATISTA prefere chamá-la de jurisdição administrativa. 5. Algumas opiniões e conceitos. 6. A forma do processo e a coisa julgada. 7. A jurisdição voluntária tornando-se em contenciosa. 8. A jurisprudência duos nossos tribunais. 9. Conclusão.

1. Caso prático

Um ponto que tem, por vêzes, ocasionado dúvidas na prática é o de se saber se podem ou não produzir coisajulgada as sentenças proferidas em processos de jurisdição voluntária ou graciosa.

2. A regra do art. 288 do Cód. de Proc. Civil.

O nosso Cód. de Proc. Civil, em seu art. 288, estabelece:

“Não terão efeito de coisa julgada os despachos meramente interlocutórios e as sentenças proferidas em processos de jurisdiçãovoluntária e graciosa, preventivos e preparatórios, e de desquite por mútuo consentimento”.

Portanto, a regra geral que dêsse artigo decorre é a de que as decisões proferidas nos processos de natureza administrativa ou de jurisdição voluntária não produzem coisa julgada.

De se notar, aliás, que, tendo as expressões “voluntária” e “graciosa” a mesma significação na técnica processual (v. HEROTIDES DA SILVA LIMA, “Código de Processo Civil Comentado”, Saraiva, São Paulo, 1940, vol. I, pág. 547), parece-nos que teria sido perfeitamente dispensável o uso de ambas, à vista do princípio de que a lei não deve conter palavras inúteis ou desnecessárias. Todavia, se o legislador, por qualquer circunstância, quis usar os dois vocábulos, mais aconselhável teria sido ligá-los pela disjuntiva “ou” do que pela copulativa “e”.

3.  A jurisdição voluntária.

TEIXEIRA DE FREITAS, em nota às “Primeiras Linhas”, de PEREIRA E SOUSA, chama de jurisdição voluntária a que se exerce sôbre objetos, em que não há contestação entre partes (ed. H. Garnier, 1906, pág. 18).

ENRICO ALLORIO declara que a jurisdição voluntária é atividade administrativa, ou seja, desprovida de coisa julgada, porque resultado de um procedimento inidôneo para justificar êsse efeito (“Saggio polemico sulla giurisdizione volontaria”, in “Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile”, ano II, n. 3, Giuffrè, Milão, 1948, pág. 513).

Esta é a regra geral Consagrada pela doutrina e adotada pelo nosso Código no aludido art. 288.

4.  PAULA BATISTA prefere chamá-la de jurisdição administrativa

Cumpre, porém, examinar o que caracteriza a jurisdição voluntária, ou administrativa, como prefere chamá-la PAULA BATISTA (v. “Compêndio de Teoria e Prática do Processo Civil Comparado com o Comercial”, 7ª ed., pág. 55).

5. Algumas opiniões e conceitos

Além das já citadas, é de se Lembrar, desde logo, a opinião do próprio PAULA BATISTA, para quem a jurisdição administrativa é a que versa sôbre objetos estranhos a tôda a idéia de litígio (ob. e loc. cits.).

JOÃO MENDES (“Direito Judiciário Brasileiro”, 2ª ed., Rio, 1918, pág. 34) diz que a jurisdição é contenciosa quando existe litígio ou contestação entre as partes; graciosa quando o juiz intervém apenas para homologar o acôrdo ou a vontade das partes.

MANUEL AURELIANO DE GUSMÃO (“Coisa Julgada no Cível, no Crime e no Direito internacional”, 2ª ed., Saraiva, 1922, pág. 20) entende que o que caracteriza a jurisdição voluntária ou graciosa é a inexistência de litígio ao qual a sentença tenha que pôr têrmo; é a inexistência de litigantes, de autores e de réus; é que ela se exerce tão-sòmente in ou intervolentes.

O mestre GABRIEL DE RESENDE FILHO (“Curso de Direito Processual Civil”, vol. III pág. 58) ensina que a jurisdição voluntáriaougraciosa “protege relações jurídicas não controvertidas: não há partes, autor e réu, mas apenas interessado ou interessados”.

GOLDSCHMIDT (“Derecho Procesal Civil”. Editorial Labor, 1936, pág. 126) acentua que, para existir jurisdição contenciosa, ou litígio, basta que se dê um conflito ou disputa entre duas esferas individuais, uma das quais exige algo da outra.

Cumpre lembrar a possibilidade de o processo ser de natureza contenciosa não obstante a inexistência de lide, assim como de haver juízo contencioso sem contestação.

Em seus valiosos “Comentários ao Código, de Processo Civil” (vol. III, n. 275, pág. 354), declara PEDRO BATISTA MARTINS que não se limitando a função do juiz “ao contrôle da legalidade do ato, à integração da capacidade civil ou homologação de negócio jurídico formado pela convergência de vontades, o processo é de natureza contenciosa, a despeito da possível inexistência de lide”.

Por sua vez, GABRIEL DE RESENDE FILHO (ob. cit., vol. I, 2ª ed., 1948, página 100) realça que pode haver juízo contencioso sem contestação.

De qualquer maneira, o que se conclui é que desde que haja litígio; desde que haja uma relação jurídica controvertida; desde que haja a intervenção de partes, uma das quais pretenda algo à custa da outra, não há como falar-se em jurisdição voluntária.

6. A forma do processo e a coisa julgada

Mas, isso estabelecido, há que verificar se a forma da processo pode influir na formação da coisa julgada, ou, em outras palavras, se é ou não possível verificar-se coisa julgada em processo de natureza administrativa como, por exemplo, em um inventário.

Ora, segundo tem sido reiteradamente decidido pelos nossos tribunais, é a relação jurídica controvertida e julgada que firma a coisa julgada e não a forma da ação.

Comentando o art. 288 do Cód. de Proc. Civil, diz CARVALHO SANTOS: “Parece-nos incontestável que, mesmo em processo administrativo, será possível haver a coisa julgada, bastando, para tanto, que no seu decurso tenha surgido controvérsia, sôbre a qual a sentença, se pronunciou” (“Código de Processo Civil Interpretado”, vol. IV, pág. 163).

7. A jurisdição voluntária tornando-se em contenciosa

Sabido é que a jurisdição voluntária pode transformar-se em contenciosa.

São de JOÃO MONTEIRO estas palavras; “Se no curso de um processo de jurisdição voluntária sobrevém adversário, que levanta controvérsia, cessa aquela para dar lugar à jurisdição contenciosa” (“Teoria do Processo Civil e Comercial”, 4ª ed., 1925, vol. I, pág. 130).

Ê a velha regra de D’ARGENTRÉE: “voluntaria jurisdictio transit in contentiosam, interventu justi adversarii“.

CARNELUTTI, em suas “Lezioni”, escreve: “qualche volta invece lo stesso effetto giuridico si ottiene con l’esercizio della giurisdizione volontaria e con l’esercizio delia giurisdizione contenziosa proprio in ragione del difettoe della esistenza dellalite ed é statuita una conversione del procedimento volontario in procedimento contenzioso appunto quando si accenda la lite; cosi la efficaciadel concordado nel fallimento si consegue mediante un procedimentodiomologazione se non visono creditori dissenzienti e invece mediante un processodiaccertamentoconstitutivo sevisonoopposizioni” (“Lezioni di Diritto Processuale Civile”, Cedam, Pádua, 1983, vol. II, págs. 146-147).

8. A jurisprudência duos nossos tribunais

Como dissemos, há vários julgados fixando que é a relação controvertida e julgada e não a forma da ação que firma a coisa julgada.

Dentre os acórdãos do Supremo Tribunal Federal, pode-se citar o proferido no recurso extraordinário n. 9.876, da Pernambuco, unânime, em que o Sr. ministro OROZIMBO NONATO proferiu o seguinte voto preliminar:

“Os praxistas antigos, às vêzes, discutiam a questão de saber se a diferença de forma da ação impedia, ou não, a exceptioreiiudicata. Mas, já o insigne JOÃO MONTEIRO mostrou o êrro em que êles labutavam. O que importa não é a forma da ação, senão a relação jurídica, a relação controvertida e julgada” (in “Jurisprudência” do “Diário da Justiça” da União de 15.6.1949, pág. 1.485).

Já anteriormente decidira o pretório excelso que a decisão do juiz do inventário pode produzir coisa julgada, no acórdão unânime proferido no recurso extraordinário n. 11.741, do Distrito Federal, de que foi relator o Sr. ministro BARROS BARRETO, de cujo voto destacamos o seguinte:

“… verificada a hipótese do art. 466 do Cód. de Proc. Civil, pela existência da provas inequívocas, a decisão do juiz do inventário faz coisa julgada e não há que se reservar a qualquer interessado a via ordinária…

“É inegável, porém, que a sentença do Dr. juiz da 3ª Vara de Órfãos e Sucessões, de natureza contenciosa, embora proferida em incidente do próprio Juízo de inventário, ateve-se à prova instrumental inequívoca” (in “Jurisprudência” do “Diário da Justiça” da União de 28.10.1948, pág. 2.841).

Igualmente pode-se citar do mesmo Supremo Tribunal, o acórdão unânime proferido a 17 de setembro de 1951, no recurso extraordinário n. 17.360, de São Paulo, cuja, ementa transcrevemos no final deste item, também firmando que a regra do art. 288 do Cód. de Processo não e aplica a processo que tomara caráter nitidamente contencioso.

Do Tribunal de Justiça do Distrito Federal é o pronunciamento que a seguir e transcreve:

“Diz-se, porém, que na jurisdição voluntária, os despachos e decisões nela proferidos não fazem coisa julgada, nos precisos têrmos do art. 288 do Cód. de Processo. Não procede o argumento extraído dessa norma genética, sem as distinções devidas. Coar efeito, na jurisdição administrativa decisões há que resolvem questões controvertidas, como no caso em que se decidiu sôbre a venda impugnada do prédio inventariado e negou-se a adjudicação por já ter havido arrematação consumada. Assim, em tendo havido relação de direito controvertida, decidida pelos despachos ora reclamados, é claro que estes despachos fizeram coisa julgada. Não é a jurisdição que impede a coisa julgada mas a relação de direito controvertida que imprime essa feição, o que ocorre quer na jurisdição contenciosa, quer na voluntária” (in “Jurisprudência” da “Diário da Justiça” da União de 8.12.1948, pág. 3.295).

E temos ainda:

“A intervenção de adversário, ainda quesòmenteem grau de recurso, transforma a jurisdição voluntária em contenciosa, O que caracteriza a jurisdição contenciosa é a existência de partes, uma das quais pretende algo à custa da outra. Pouco importa a forma do processo, e sim a pretensão em si.

“Na dúvida, ter-se-á como contenciosa, e não como voluntária, a jurisdição” (“Arq. Judiciário”, vol. 90, pág. 225).

Os dois julgados que a seguir se citam são do Tribunal do Rio Grande do Sul:

“O processo gracioso, desde que nele intervém com oposição, a parte contraria, toma forma contenciosa e a sentença nele proferida produz coisa julga-lo”, “REVISTA FORENSE”, vol. III, pág. 174).

“A coisa julgada pode resultar de processo administrativo, desde que a sentença decida controvérsia nêle surgida” (“REVISTA FORENSE”, vol. 110, pág. 202).

O Tribunal de Justiça de São Paulo, através do acórdão unânime proferido a 16 de agôsto de 1949, no agravo de petição n. 42.695, confirmou, por seus fundamentos, sentença do então juiz e hoje eminente desembargador CANTIDIANO GARCIA DE ALMEIDA, que acolhera exceção de coisa julgada baseada em decisões proferidas no Juízo do inventário.

Houve, neste caso, recurso extraordinário, que recebeu o n. 17.360, do qual o Supremo, por unanimidade, não tomou conhecimento, porque “embora em regra não tenham efeito de coisa julgada as sentenças proferidas em processo de jurisdição voluntária ou graciosa (art. 288 do Cód. de Processo), não se aplica essa regra se foi proferido acórdão em feito que tomara caráter nitidamente contencioso, versando sôbre os mesmos bens, entre as mesmas pessoas e sendo a mesma a razão de pedir, donde existir coisa julgada”.

9. Dessa forma, a conclusão a que se chega é a de que as sentença proferidas em processos de natureza administrativa podem produzir coisa julgada, uma vez que haja disputa entre partes que se coloquem em posição de autor e de réu.

Em tal hipótese a jurisdição de voluntária transforma-se em contenciosa, produzindo então os seus efeitos e conseqüências.

E, como a coisa julgada decorre não da forma do processo, mas da relação de direito controvertida, segue-se que poderá ter efeito de coisa julgada a sentença proferida em processo que embora de natureza administrativa, veio a tornar-se contencioso.

Autor: Antônio Alberto Alves Barbosa, Advogado em São Paulo

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