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CLÁSSICOS FORENSE
IMOBILIÁRIO
REVISTA FORENSE
Pareceres – Locação – Despejo – Uso Próprio – Demolição E Edificação – Disposição Do Prédio Novo – Ação Renovatória De Herotides Da Silva Lima
Revista Forense
09/01/2024
– A lei nº 1.300, de 1950, separou, inconfundivelmente os casos de despejo para uso próprio dos de despejo para demolição e edificação, pedidos que levam também a diferenciações fatais na técnica processual.
– O proprietário pode livremente edificar o novo prédio em condomínio, alugá-lo ou vendê-lo.
– O prédio novamente edificado passa a ser outro; não mantém liame com o destruído; não pode pois, manter a mesma relação locativa.
– Ao adquirente do prédio locado, mesmo julgada procedente a renovatória contra o anterior proprietário, é lícito mover o despejo para demolição e construção no local.
CONSULTA
1°) Não é exato que a Lei do Inquilinato distingue perfeitamente o pedido para uso próprio do pedido para demolição e edificação com maior capacidade de utilização?
Em caso de resposta afirmativa ao quesito anterior, pergunta-se:
a) Na retomada para demolição e reconstrução, impede a lei que o novo prédio seja vendido pelo proprietário ou nêle se estabeleça um condomínio com terceiros, do qual participe o proprietário?
b) Não é exato que a Lei do Inquilinato, na hipótese de pedido para demolição, e reconstrução, estabelece penalidade sòmente para o proprietário que não use o prédio para o fim pedido, isto é, para demolição e reconstrução, não impedindo, portanto, a venda do novo prédio ou o estabelecimento de um condomínio, do qual participe o proprietário?
c) Não é exato que, no pedido para uso próprio, outras são as penalidades da lei, que não se confundem com as estabelecidas para o caso de demolição e reconstrução?
2º) Havendo sido iniciada ação renovatória, já contestada pelo primitivo proprietário do imóvel, pode o adquirente despejar o inquilino, para efeito de demolição e reconstrução com maior capacidade de utilização, se no contrato cuja renovação foi pedida não figura cláusula de validade em caso de alienação e não se encontra registrado no registro público?
3°) Em caso de resposta afirmativa ao questionário anterior, não é exato que o novo proprietário pode exercitar o seu direito mesmo na hipótese de ter sido julgada procedente a renovatória contra o anterior proprietário, em se tratando de contrato de locação que não contém cláusula de vigência no caso de alienação e que não esteja registrado no registro público?
PARECER
Tendo em vista os têrmos da consulta que é por mim rubricada e é devolvida, respondo ao primeiro quesito:
1. A lei n° 1.300, de 28 de dezembro de 1950, separou, inconfundivelmente, os casos de despejo para uso próprio dos de despejo para demolição e edificação, pedidos que levam também a diferenciações fatais, na técnica processual que exige a sua certeza ou determinação, embora se admita seja o pedido alternativo ou genérico, conforme a natureza da prestação; e, por isto mesmo, o, juiz jamais poderia pronunciar-se, indiferentemente por um e outro, em virtude do art. 153, combinado com os arts. 4º, 158, nº IV, 281, 287 e 891 do Cód. de Proc. Civil.
2. E é natural que assim dispusesse a lei de locação de prédios urbanos, porque os dois casos traduzem duas finalidades e necessidades diversas do proprietário ou promitente-comprador ou do simples locador, os quais são tratados separadamente nos incs. II a VII e IX do art. 15 e no seu inc. VIII. Igualmente, a lei número 1.521, de 26 de dezembro de 1951, distinguiu as duas hipóteses no art. 9°, números 4 e 5; e, semelhantemente, a chamada Lei das Luvas, antes, já discernira entre a necessidade da realização de obras (arts. 8°, § 2°, letra d, e 21, § 3°) e o uso do locador, seu cônjuge, ascendentes e descendentes (cit. artigo, letra e).
No uso próprio, o fundamento é a utilização do prédio pelo dono, ao passo que, na demolição, o fundamento é o não-uso imediato, pois não se usa o que se destrói, ou até mesmo o não-uso futuro, porque pode construir para os fins mais variados, visto como a lei não lhe restringe o poder de fruição, contentando-se apenas com o presumível benefício coletivo que há nas novas construções.
3. O antigo direito, que não tinha com que preocupar-se, relativamente à demolição e construção de edifícios de maior capacidade de utilização, também diferenciava entre pedido para uso próprio ou de parentes e para obras (Ordenação do Livro IV, tít. 24, pr.; TEIXEIRA DE FREITAS, “Consolidação”, art. 669, §§ 3º e 4º; CARLOS DE CARVALHO, “Consolidação”, art. 1.110, letras c e d; RIBAS, “Consolidação”, art. 778, §§ 3º e 4°; RIBEIRO DE MOURA, “Manual do Edificante”, pág. 297).
Ao primeiro quesito, letra a: 4. Restituído o prédio para demolição e reconstrução, não ordena a lei que o novo edifício seja obrigatòriamente utilizado pelo proprietário; que o alugue sob restrições ou destine-o à volta do inquilino despejado. Pode, pois, o dono instituir um condomínio, a que, às vêzes, o obrigam operações financeiras para a edificação, como pode onerá-lo e vendê-lo, fazendo, pura e simplesmente, um negócio de sua conveniência. Não há vínculo algum a obrigações anteriores do proprietário para com os ex-ocupantes.
5. Se a lei não constrange o proprietário a dar destino certo ao novo prédio, se não o submete, mesmo nas partes anteriormente locadas, é êle livre, como qualquer proprietário, de edificá-lo, em condomínio, alugá-lo, no todo ou em parte, ou vendê-lo. E, se assim não fôsse, estaria ela em contradição com o seu objetivo: permitiria que se edificasse com maior capacidade de utilização, mas amedrontaria os proprietários com estabelecer uma espécie de bloqueio antecipado. Ao inverso, êsse direito harmoniza-se com o art. 1°, que dispõe, sôbre prédios existentes e ainda alugados, e com o art. 3°, parág. único, liberando os aluguéis de prédios novos. Se o proprietário pode locá-los livremente, porque foram desviados do regime da lei especial, não se concebe que não os possa alienar livremente também, o que ocorre até mesmo com os prédios que se vagarem no período da vigência, da lei, seguindo-se aquela necessidade irrelutável de ir passando do regime excepcional para o do direito comum.
Legislação sobre inquilinato
6. A legislação excepcional e temporária sôbre o inquilinato e que, no chistoso dizer do COLIN et CAPITANT, é um temporário que se vai tornando definitivo (“Droit Civil”, vol. 2, pág. 173) teve, entre outras causas, uma fundamental, no Brasil, que foi a carência de habitações. Que se devia fazer? Incrementar as construções, até mediante favores fiscais, amparar as existentes, passar gradativamente do regime das restrições ao regime de livre procura e oferta, propiciar o aprove tomento de áreas altamente valorizadas, nos centros das grandes cidades, concorrendo para o barateamento dos aluguéis, maior comodidade dos locatários, que se desvencilham da gravíssima crise de transporte, paralelamente à melhoria da estética urbana e da arrecadação de taxas e impostos.
7. Há interêsse social na construção e reconstrução de casas, segundo já tive ensejo de julgar (“Rev. dos Tribunais”, volumes 173, pág. 257, 176, pág. 194, e 186, pág. 643). Na apelação nº 38.768, sustentei que o proprietário tem o direito de impedir que, num terreno valorizado, com apenas uma casa velha, prédios em ruínas, uma tapera, um cortiço, levantem-se habitações modernas, mais amplas, arejadas e estéticas. Ao contrário, ao seu interêsse de viver numa habitação obsoleta e perigosa, embora de preço baixo, opõe-se o interêsse social do maior número de casas e segurança das existentes.
8. A carestia das habitações, conforme advertiu o deputado CARLOS MAXIMILIANO, durante a votação da primeira lei do inquilinato, “é uma conseqüência universal da lei da oferta e da procura, que não se ilude a golpes de decretos”. Se há crise é porque há falta, e se há falta é preciso incrementar as construções de casas para alugar, e, se possível, de casas para vender, resolvendo outro problema social relevante, como o das locações urbanas. Se as leis do inquilinato, nas épocas de subversão, de guerra e de crise, justificam-se, trazem elas muito dessa demagogia legislativa, de que fala G. RIPERT, consistindo em agradar certas classes socais, que, pela maioria, mais influem nos pleitos eleitorais. O preço dessas restrições – afirma PLANIOL – foi alto, e o legislador concorreu para agravar a crise, impedindo as construções; o resultado foi desastroso; o conjunto das medidas desencorajou os que desejavam construir, pois os locatários tornaram-se ocupantes inamovíveis, e as medidas equivaleram a proibir as construções, quando, justamente, o que era urgente era facilitá-las (PLANIOL, “Droit Civil”, vol. 2, pág. 571). A crise amainou, mas o sacrifício do proprietário ao inquilino continuou – diz G. RIPERT, certamente porque o inquilino é mais interessante do ponto de vista político, e é êste ponto de vista que o legislador do regime democrático leva mais em consideração.
9. O Poder Legislativo entendeu que já era tempo de não prolongar essas anomalias e injustiças e que também devia cuidar, não apenas dos inquilinos já instalados mas, paralelamente, dos inquilinos futuros que seriam atingidos pela paralisação das construções ou sua redução. Ficou, assim, num justo meio-têrmo: reiterou o congelamento para as locações antigas e voltou ao regime de liberdade para as novas, desligadas da lei especial.
Formulou, por isso, lògicamente, a permissão do despejo para novas construções, atendendo, não ao interêsse do proprietário (pelo qual evidentemente nada o moveria), mas à relevância do interêsse social, aliado ao do titular do domínio. Se o pedido para moradia tem fortes razões legais, socialmente maiores são as que fundamentam o pedido para construção de maior capacidade de utilização, pois esta já é encaminhamento da solução da crise que ditou a legislação de exceção.
10. Mas não é só. Há outras razões de pêso a interferirem na questão suscitada. Com a demolição, deixa de existir a coisa que era objeto da locação; pereceu, por causa as ente na lei, declarando o Código Civil que perece o direito perecendo o seu objeto (art. 17). A perda total do prédio, seja por culpa do inquilino, seja-o pela do proprietário, diz o pranteado mestre CLÓVIS BEVILÁQUA, tem como conseqüência a resilição do contrato, porque êste fica sem objeto (“Código Civil Comentado”, art. 1.190; “Manual do Código Civil”, vol. 14, pág. 212; v., também, LAURENT, “Droit Civil”, vol. 25, pág. 445; CARVALHO DE MENDONÇA, “Contratos”, vol. 2, nº 182). Pode dar-se o perecimento até pela vontade do próprio dono, como na destruição intencional da coisa, embora comumente se dê contra sua vontade. Êsse perecimento tem como efeito normal extinguir a respectiva relação jurídica (ESPÍNOLA, “Manual do Código Civil”, 3, 1, págs. 135 e 136). No mesmo sentido o autorizado COELHO DA ROCHA: “se, depois do arrendamento, a coisa pereceu, “acabou o contrato e o condutor fica desligado da continuação da renda” (“Instituições de Direito Civil Português”, § 835; CORREIA TELES, “Digesto Português”, vol. 3, pág. 763). “Le résiliation” – escreve PLANIOL – “a lieu de plein droit parce que le contrat ne peut plus recevoir effet faut d’objet” (“Droit Civil”, vol. 2, página 584). “L’effete più immediato della perdita totale à quello di resolvere la locazione” (BAUDRY-LACANTINERIE et WAHL, “Diritto Civile”, “Del Contratto de Locazione”, vol. 1, pág. 192). RUGGIERO, acentuando embora o caso de perecimento fortuito e o imputável a um dos contratantes, entende que, nessa hipótese, não se desata o vínculo contratual, mas sofre uma transformação, “subentrando alla prestazione della mercede o del godimento quello del respectivo id quod interest. Di una continuazione della locazione” – adverte – “non puó chi naturalmente parlarsi per mancanza dell’oggetto” (“Instit. di Dirit. Civile Ital.”, vol. 2, pág. 320).
É indiferente que o perecimento seja oriundo de caso fortuito ou de culpa de uma das partes, diz PACIFICI-MAZZONI. Não se pode conceber a subsistência de um contrato cujo objeto foi destruído: “perció in verum caso ne il locatore può pretendere di dare, ne il conduttore di avere un altra cosa, identica alla distrutta” (“Istit. di Dir. Civile”, vol. 5, parte 2, pág. 63). No mesmo rumo, a lição de JOSSERAND: “ce n’est pas seulement la perte par cas de force majeure que met ainsi un point final à l’operation, c’est une perte quelconque, mais imputable au fait du a la faute de l’une des parties” (“Droit Civil Positif”, vol. 2, pág. 593). No silêncio do Cód. Civil português a respeito, sustenta CUNHA GONÇALVES que a “perda total do prédio arrendado é causa forçosa da rescisão do arrendamento, ainda quando ela tenha sido provocada” por culpa do locador ou do próprio locatário” (“Tratado de Direito Civil Português”, vol. 9, pág. 16). Entrando no regime comum as novas edificações, ressurgem para o dono todos os direitos normalmente ligados à propriedade.
11. O prédio novamente edificado passa a ser outro; não mantém liame com o destruído; não pode, pois, manter a mesma relação locativa; “e una cosa è distrutta, e col materialle di essa se ne construisce un’altra al posto di quella” diz o notável FERRARA – “è cosa nuova, non la ripristinazione del’antica” (“Diritto Civile”, vol. 1, pág. 750). Quanto à matéria de indenização, é estranha às indagações da consulta.
Ao primeiro quesito, letra b: 12. A penalidade prevista para o caso de não se demolir o prédio solicitado ou não se iniciar a construção planejada é restrita a tais hipóteses e inampliável à venda do novo prédio, erguido em lugar do antigo. A Lei do Inquilinato resultante das perturbações variadas, causadas pela guerra, e assim também pela penúria das casas e pela depreciação da moeda, como explicam COLIN et CAPITANT, é de exceção, bastando atentar para a situação que a originou. É incluída mesmo por VASSALI e RICCA BARBERIS na legislação de guerra, considerando o primeiro que essa legislação é uma crise do direito. Devem-se, pois; submeter os seus dispositivos a interpretações restritas. “A tali norme” escreve SERAFINISIAMO – “in materia de eccezione e che perció quando viene meno la ragione partiqulare di essa torna a valere il principio generale” (“Diritto Romano”, vol. 1, pág. 103).
O direito exorbitante, as leis formadas contra a razão do direito são, um mal, concebendo-se que não devem estender-se, porque um mal, embora necessário, deve conter-se nos limites mais estreitos (LAURENT, “Príncipes de Droit Civil”, volume 1, pág. 351).
O direito, por motivos especiais, contradiz os princípios assentes do direito geral. Não deve ser levada a alteração além do entendimento que soa da sua disposição (WINDSCHEID, “Pandette”, § 29). Na dúvida, deve-se interpretar pelo menor desvio do direito existente.
13. Ademais disto, tratando-se de penalidade, também é de aplicar-se o mesmo princípio interpretativo: Penalis non sunt extendenda. Proclama DOMAT que “as leis que estabelecem as penas de delitos e dos crimes ou as penas em matéria civil, interpretam-se, de sorte que não se aplicam além de suas disposições, nem se tirem conseqüências para casos aos quais elas não se estendem” (“Teoria da Interpretação das Leis”; trad. por CORREIA TELES).
As disposições de caráter primitivo, não referentes a delitos, porém, cominam multa, indenização, constituem norma excepcional e interpretam-se restritivamente (CARLOS MAXIMILIANO, “Hermenêutica”, ns. 272 e 275).
14. Com o destino legal dado efetivamente ao prédio, o proprietário, ex-locador; cumpriu a lei; exauriu-se o dever que sôbre êle pesava; não há mais falar em penalidades que não se estendem além dos casos que a lei configura. Lògicamente, não se poderá impedir a venda do prédio nem a instituição de condomínio de que participe o antigo locador, porque as penalidades nem teriam efeito impeditivo, mas finalidade punitiva ou efeito compensatório. O beneficiário, se fôsse o caso, receberia o seu valor sem o direito de criar uma espécie de inibição ao proprietário. Isto, porém, ad argumentandum, porque a hipótese de penalidade não é prevista, nem poderia sê-lo para o locador que levou a cabo a construção planejada.
Ao primeiro quesito, letra c: 15. A resposta a êste quesito já está contida no item 1º, quando se fixou a nítida distinção entre o pedido para uso próprio e o para demolição e reconstrução. O art. 20, nº IV, da lei trata do não-uso para si ou para demolição; o nº V, do não-início da construção, após a entrega. Nos dois casos há fraude aparente, podendo o proprietário defender-se, mas as circunstâncias variam. No uso próprio, por exemplo, o proprietário deve usar o prédio e nêle permanecer durante um ano. A multa é a mesma para os dois casos: o proprietário deve dar início à demolição com 60 dias e deve iniciar a edificação ou reforma, também em 60 dias, contados da entrega, ressalvada, em ambos, qualquer defesa relevante de direito. Mas a diferença de situações conduz a diferenças de pressupostos, justificadores da expedição da penalidade. Não há confundi-las nos seus extremos e nas suas conseqüências.
Ao segundo quesito: 16. As perguntas passam a outra ordem de questões reguladas pela Lei de Luvas.
A venda do prédio locado rompe a locação, se não houver cláusula contratual de sua vigência em caso de alienação e constar de registro público da circunscrição do imóvel locado. Sem registro, a aquisição entende-se feita livremente. Não importa a ação renovatória contra o antigo dono, que apenas poderá responder por perdas e danos comportáveis. Não há, quer no Cód. Civil, quer na Lei de Luvas, dispositivo impedindo o dono de vender. A ação terá efeito contra o adquirente, mas nos têrmos da lei civil, isto é, se o contrato a êle se impuser por fôrça do art. 1.197 do Cód. Civil. O processo não cria relações contratuais; apenas declara as que encontra formadas, expressa ou virtualmente. Se não existem, não cabe á sentença inventá-las.
Resolvido o contrato para o proprietário-vendedor, pela alienação (esta, como se sabe, caso de perda da coisa, na forma do art. 589, I, do Cód. Civil), evidentemente, não poderá ressuscitar para o comprador; ser-lhe oposto como ato jurídico pleno; o direito, se desaparecer, não mais poderia ser transferido ou formar sub-rogação.
17. Como proprietário, livre de obrigações ligadas ao imóvel, tem o direito de construir, como lhe aprouver, nos têrmos dos arts. 524 e 572 do Cód. Civil, sob imediata tutela do art. 141, §§ 2º e 16, da Constituição federal, existindo até mesmo no Cód. Penal uma proteção penal da propriedade imobiliária. Qualquer prejuízo do inquilino há de ser discutido entre êle e seu contratante. Entre o novo dono e o antigo ocupante não há relações contratuais, porque quem comprou sem registro de locação, comprou livremente. Sem a cláusula de vigência inscrita em registro público, o locador, apesar da ação renovatória, pode alienar o prédio ficando o adquirente desobrigado de respeitar a locação (“Arq. Judiciário”, vol. 62, página 437; “Rev. dos Tribunais”, vol. 52, pág. 162; ac. do Supremo Tribunal Federal, na “REVISTA FORENSE”, vol. 87, pág. 717).
Não há nenhum direito real, não há um ônus impôsto ao imóvel locado; e essa espécie de direito, em se tratando de contrato de locação, que é direito pessoal, repugnaria à natureza das coisas, como se expressa o preclaro jurisconsulto CARVALHO DE MENDONÇA (“Contratos no Direito Civil Brasileiro”, vol. 2, pág. 55). Conforme acentuou o ilustre ministro BENTO DE FARIA, acompanhado pelos seus eminentes colegas ministros OROZIMBO NONATO, VALDEMAR FALCÃO e LAUDO DE CAMARGO, “se o imóvel passa a pertencer a outrem, o novo proprietário não está obrigado a respeitar o contrato, se no ato da transferência não assumir essa obrigação. Assim também não poder ser compelido a renová-lo” (“Rev. dos Tribunais”, vol. 147, pág. 318). O dec. nº 24.150, diz um acórdão do prestigioso Tribunal de São Paulo, relatado pelo douto desembargador LEME DA SILVA, outorga ao proprietário o direito de alegar na contestação ao pedido de renovação a defesa do direito que lhe possa caber. Entre os direitos cabentes ao proprietário, incluem-se os de alienar a coisa. E, desde que no contrato de arrendamento não se inseriu a cláusula de sua vigência, no caso de alienação, forçoso é concluir que o direito do proprietário deverá ser respeitado pela Justiça para o efeito de ser recusada a renovação pedida (“REVISTA FORENSE”, vol. 87, pág. 717).
Ao terceiro quesito: 18. Ao adquirente do prédio locado, mesmo julgada procedente a renovatória contra o anterior proprietário, é lícito mover o despejo para demolição e construção no local de prédio que julgar de seu interêsse, sem quaisquer restrições e isto porque é estranho ao contrato desfeito; é terceiro ao qual, como já se disse, não pode ser oposto nenhum vínculo contratual, nenhuma abstenção legal, salvo o caso de conluio tendente a lesar os interêsses do inquilino, coisa que a êste caberá demonstar, mas de conseqüências diversas.
19. A renovatória, como em geral as ações pessoais, não cria óbices à disponibilidade dos bens ou direitos alienáveis. A própria ação é transmissível, se não repugnar à natureza do direito é à condição das pessoas de seus titulares.
20. Há, como se sabe, controvérsia sôbre a alienação da coisa litigiosa, disputando-se de sua nulidade ou anulabilidade. O Cód. Civil não a proibiu e o de Processo limitou-se a tornar a coisa litigiosa pela citação (art. 166, nº III), sem lhe assinar efeitos inibitórios, salvo os artigos 888, nº V, e 895, nº I, do Cód. de Processo. É, porém, questão fora do alcance da matéria ora em discussão, porque a ação renovatória é pessoal e o Código processual, só torna litigiosa a coisa, isto é, objeto da demanda, não o direito ou a ação.
21. Dá-se, é certo, com a alienação da coisa litigiosa, o fenômeno da substituição ou sub-rogação processual (SCHOENKE, “Dr. Proces.”, pág. 171); mas é mister que a demanda verse sôbre a coisa transferida; que seja ela o próprio objeto da disputa e deva afinal ser o da execução, formulando, por isto mesmo, o grande processualista alemão KISCH a hipótese de venda da coisa por cuja propriedade se disputa (“Dr. Proces.”, página 328). E GUSMÃO alude também às ações de domínio (“Processo Civil”, volume 1, pág. 398).
Na ação renovatória, de natureza pessoal, embora exista um direito ad rem, não há um direito precípuo à própria causa, senão um direito envolvendo relações contratuais.
O vício litigiosi não acompanha senão aquelas ações pelas quais se demanda alguma coisa e não se estende além dos casos expressos, conforme já advertia LOBÃO, citado por JOÃO MONTEIRO (“Processo Civil”, § 116 e nota 3). O direito veio atenuando o rigor antigo, de modo a poder afirmar o exímio jurisconsulto CÂNDIDO MENDES, em anotação à Ordenação do Livro 4º, tít. 10, que “hoje, em razão da “facilidade que se procura dar às transações, o rigor do antigo direito se tem “modificado e em alguns países acabou”.
Sòmente. em casos restritos e indicados será inalienável a coisa objeto da ação. Só será tirada das mãos do possuidor quando transferida ilegalmente com fins de iludir a lei ou a sentença. O locatário vencedor na ação renovatória não pode executar a sentença sôbre bens de terceiro, desvinculados de qualquer contrato ou relação jurídica, não alienados fraudulentamente, tanto mais que seu direito resolver-se-á em perdas e danos.
22. De resto, a lei processual tem de conformar-se com a lei civil, pois aquela existe para dar expressão, a esta: se a lei civil autoriza o dono a vender e entende que o comprador comprou livremente, por falta da cláusula expressa e registrada de alienação, não pode a lei processual tolher, direta ou indiretamente, que a alienação surta todo o seu efeito, criando limitações ou obrigações onde a lei civil estabelecera a liberdade.
Tenho assim como respondidas tôdas as questões, pro veritate.
Herotides da Silva Lima, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo.
LEIA TAMBÉM O PRIMEIRO VOLUME DA REVISTA FORENSE
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 1
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 2
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 3
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 4
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 5
- Revista Forense – Volume 1 | Fascículo 6
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