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Evolução do Direito Social brasileiro

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Evolução do Direito Social brasileiro

DIREITO SOCIAL

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REVISTA FORENSE 150

Revista Forense

Revista Forense

09/05/2022

REVISTA FORENSE – VOLUME 150
NOVEMBRO-DEZEMBRO DE 1953
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto,

Abreviaturas e siglas usadas
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CRÔNICARevista Forense 150

Ortotanásia ou eutanásia por omissão – Nélson Hungria

DOUTRINA

PARECERES

  • Impostos estaduais – Excesso de arrecadação nos municípios – Bilac Pinto
  • Instituto do açúcar e do álcool – Fixação de preços – Intervenção do Estado na ordem econômica – Castro Nunes
  • Governador – Incompatibilidade do mandato com o cargo de ministro de Estado – Osvaldo Trigueiro
  • Testamento – Regras de interpretação – Descendentes e filhos – Fideicomisso – Antão de Morais
  • Locação comercial – Retomada para uso próprio – Notificação – Luís Antônio de Andrade
  • Deputado – Perda de mandato – Licença para tratamento de interesses particulares – Antônio Balbino
  • Requisição de bens e serviços – Tabelamento de preços – Comissão federal de abastecimento e preços – Teotônio Monteiro de Barros Filho

NOTAS E COMENTÁRIOS

  • A inconstitucionalidade do prejulgado trabalhista – Alcides de Mendonça Lima
  • Responsabilidade civil por danos causados por aeronaves estrangeiras a terceiros e bens a superfície Convenção de Roma – Euryalo de Lemos Sobral
  • Sôbre o conceito de Estado – Jônatas Milhomens
  • As autarquias estaduais e as concessões de serviços de energias elétrica – José Martins Rodrigues
  • A filiação adulterina no direito brasileiro e no direito francês – Válter Bruno de Carvalho
  • Recurso ordinário em mandado de segurança – João de Oliveira Filho
  • A habitação como acessório salarial – Carmino Longo
  • Operações bancárias – Francisco da Cunha Ribeiro

BIBLIOGRAFIA

JURISPRUDÊNCIA

LEGISLAÇÃO

SUMÁRIO: Definição do Direito Social. Período pré-histórico. Período capitalista. Período socialista. Período social-democrático. Período corporativo. Período inominado ou atual. Aplicação da legislação social. Sindicatos. Instituições de previdência. Justiça do Trabalho. Movimento doutrinário. Conclusão.

Sobre o autor

A. F. Cesarino Júnior, professor das Faculdades de Direito e de Ciências Econômicas da Universidade de São Paulo

DOUTRINA

Evolução do Direito Social brasileiro

* 1. O estudo histórico de um direito nacional é, segundo penso, o meio mais concreto para apreender seus caracteres fundamentais. Era com razão que o grande ORTOLAN dizia: “Todo historiador deveria ser jurisconsulto e todo jurisconsulto deveria ser historiador”.

Com efeito, é sòmente vendo se desenvolverem as instituições jurídicas de um país, mesmo num domínio tão restrito como o nosso, que se poderá distinguir as correntes fundamentais que o animam, as razões de ser de suas disposições mais importantes, suas causas e seus efeitos, assim como os vínculos que o aproximais, seja dos outros ramos de direito nacional, seja à inspiração mesma do Direito Comparado.

Definição do Direito Social

Isto pôsto, apliquemos êste método histórico ao Direito Social brasileiro. Mas, antes de começar, é preciso, de acôrdo com o sábio conselho de um célebre escritor, definir os têrmos. Eis por que vamos já dizer o que entendemos por Direito Social. Para nós, o Direito Social é o “sistema de princípios e normas jurídicas imperativas que, tendo em vista o bem comum, ajudam a satisfazer às necessidades vitais próprias e de suas famílias aos indivíduos para tanto dependentes do produto de seu trabalho”. E como chamamos a êsses indivíduos, econômicamente fracos, de hipossuficientes, poderíamos dizer, em resumo, que o Direito Social é, em síntese, “sistema Jurídico de proteção aos hipossuficientes”. Esta proteção pode ser alcançada, ou pela união dos hipossuficientes, que, dessa forma, se tornam primeiro fisicamente e depois politicamente mais fortes, o que é uma forma de proteção derivada dêles mesmos, isto é, uma autoproteção; ou vela intervenção do Estado, e então se trata de uma proteção vinda de outrem, isto é, de uma heteroproteção. A primeira, que resultada união dos hipossuficientes em seus sindicatos (sindicatos que o regime fascista tinha reunido a seus adversários, os sindicatos patronais, em uma entidade única, a corporação), denominamos, por êste motivo, o objeto do Direito Corporativo.

Quanto à segunda, é necessário distinguir: com efeito, a proteção do Estado pode ser dirigida de maneira tôda particular, verdadeiramente específica, aos trabalhadores subordinados, isto é, aos operários e aos empregados, e teremos o que denominamos Direito do Trabalho; por outra forma, pode ter em vista, genèricamente, todos os hipossuficientes, abstraindo-se de sua condição de trabalhadores ou não, e eis o que denominamos Direito Assistencial. Entretanto, isto não basta. Existem casos, tais os seguros sociais, em certos países, como no Brasil, por exemplo, nos quais intervêm conjuntamente, para realizarem a proteção, o Estado, o patrão e o operário ou o empregado. É evidente que nesses casos existe uma combinação de autoproteção e de heteroproteção, o que nós chamamos de Direito Previdencial.

Tudo isto é para nós Direito Social restrito, pois que, na verdade, existe também um Direito Social genérico, que será a adaptação da forma jurídica à realidade social, como quer RADBRUCH. Êste compreende também o Direito Econômico, que não se ocupa das relações entre os hipossuficientes e os econômicamente fortes, que chamamos de autossuficientes, como o Direito Social restrito, mas das relações entre alguns autossuficientes e outros econômicamente mais fortes que êles e que por êsse motivo denominamos hipersuficientes. É, portanto, a luta pelo domínio econômico: os trusts, cartéis, dumpings, etc. Vê-se, portanto, que existe uma hipossuficiência absoluta, isto é, a situação do indivíduo que depende do produto do seu trabalho para viver e manter sua família e uma hipossuficiência relativa, ou seja, a situação de uma pessoa econômicamente forte perante outra econômicamente mais forte do que ela. Cada um dêsses direitos, o Direito Social Restrito, ou o Direito Social, simplesmente, e o Direito Econômico, obteve sua autonomia científica. Neste estudo cogitaremos sòmente do primeiro, cuja autonomia é confirmada pelo fato de que possui numerosas normas próprias, princípios informativos próprios e método próprio, isto é, o método sociológico ou construtivo. Também sustentamos que o Direito Social possui institutos jurídicos verdadeiramente típicos, tais como o contrato coletivo de trabalho e a sentença coletiva de trabalho. Mas, vamos além, pois admitimos ainda que o Direito Social nos traz um novo conceito jurídico de pessoa, seja de pessoa física, seja de pessoa jurídica. Com efeito, quanto à pessoa física, é preciso compreender que a proteção do hipossuficiente, dado o caráter imperativo de suas normas, transforma o trabalhador subordinado a um patrão em uma pessoa juridicamente incapaz, se bem seja uma incapacidade relativa, isto é, restrita a determinados atos (aquêles que se relacionam com o contrato de trabalho) ou à maneira de os realizar. Vê-se, assim, que a capacidade jurídica tem, no Direito Social, sentido mais restrito do que em Direito Civil, se bem que a menoridade neste seja levada mais longe que em Direito Social (no Brasil, 21 anos e 18 anos, respectivamente). Por seu lado, o Direito Social fêz surgir duas novas pessoas jurídicas: a emprêsa e a autarquia. Efetivamente, a emprêsa, mesmo quando pertença a uma pessoa física, dela se distingue sob o ponto de vista contábil, fiscal e, em Direito Social, também do ponto de vista jurídico. O princípio de continuidade do contrato de trabalho, que em casos de modificações substanciais ou formais na propriedade da empresa (sucessão inter vivos ou mortis causa, locação, concordata) assegura aos empregados o poder de fazer valer contra o novo proprietário os direitos adquiridos o dever de cumprir em benefício dêste as obrigações assumidas, com o antigo proprietário, na realidade parte do fato de que o verdadeiro empregador é, não a pessoa física ou jurídica do proprietário da emprêsa, mas justamente esta, à qual doravante, como titular de direitos e obrigações, não se poderá mais, em boa doutrina, negar os caracteres de pessoa jurídica. Da mesma forma, o sindicato, sendo uma sociedade à qual o Estado, para lhe reconhecer personalidade jurídica, faz exigências especiais e ao qual, em troca, cede uma parte de seus atributos, de seu jus imperii, o poder normativo (isto é, o direito de estipular contratos coletivos de trabalho, obrigatórios para tôda a categoria) e o poder tributário (isto é, poder de impor contribuições aos membros da categoria, mesmo quando não pertencentes ao sindicato na qualidade de sócios e que no Brasil se chama impôsto sindical), não é evidentemente mais uma pessoa jurídica de direito privado, como as associações ou fundações ou as sociedades comerciais. Mas não é também, verdadeiramente, uma pessoa jurídica de Direito Público, porquanto não possui originàriamente e sim por delegação o jus imperii, que caracteriza as verdadeiras pessoas de direito público. É, portanto, algo de novo, isto é, uma pessoa jurídica de Direito Social, que nós chamamos de autarquia. Mas é necessário estender essas considerações além, tal sua importância. Existem normas e instituições de Direito Social que uma análise cuidadosa reconhece como diferentes, seja do Direito Privado, seja do Direito Público: é preciso situá-las em um tertium genus: o Direito Social. É, portanto, necessário completar a divisão do Direito dada por ULPIANO: “… hujus studii tres sunt positiones: publicum, privatum et sociale”.

Eis, portanto, o que é para nós o Direito Social, do qual iremos descrever, em largos traços, a evolução no Brasil.

E preciso acentuar ainda que iremos abordar o Direito Social, ou melhor, sua evolução, a partir do momento em que começou a existir pròpriamente um Direito Social, isto é, após a revolução Industrial, da qual podemos sentir os primeiros efeitos no domínio social no início do século XIX.

3. É claro que é preciso estabelecer divisões na longa evolução do Direito Social brasileiro, do século XIX até nossos dias. E para o fazer convém primeiramente fixar um critério.

Para nós o melhor critério será aquêle que resulta do exame das modificações sofridas pela orientação política da legislação referente às instituições fundamentais. Com efeito, cada direito nacional ostenta, em seu conjunto, a impressão do regime político-social do qual emana, o que levou um nosso compatriota, o ilustre professor ALÍPIO SILVEIRA, a sustentar a tese da interpretação jurídica variável com o regime político-social. Para o demonstrar, basta encarar, como exemplo, o sindicato: nos países onde o regime-político-social segue uma orientação mais liberal, existe a mais ampla liberdade sindical, sobretudo sob os aspectos da pluralidade e da autonomia. Pelo contrário, onde se afirma o caráter autoritário do poder, ou o sindicato desaparece completamente, ou se apresenta revestido dos característicos da unidade sindical e de seu contrôle pelo Estado. Assim como o sindicato, outra instituição do qual é derivado, o contrato coletivo de trabalho, sofre a influência do sistema político. Onde existem sindicatos livres e poderosos, os contratos coletivos desempenham um papel tão importante que as leis sociais não têm necessidade de descer a minúcias, tal como faz a atual legislação brasileira. Outra instituição de Direito Social poderia nos auxiliar na demonstração de nossa tese: é o contrato Individual de trabalho. Assim, no regime nazista, a Gesetz zur Ordnung der Nationalen Arbeit, isto é, a lei nacional alemã sôbre o trabalho, considerava o empregador como o chefe (der Fuhrer) da comunidade de emprêsa (Betriebsgemeinschaft), e os operários e empregados como sua escolta (Gefolgschaft), o que levou certos autores a considerar o contrato de trabalho como um simples contrato de inserção na emprêsa (Betriebseingliederung), deixando o pessoal em um verdadeiro status subjectionis, que sòmente terminava com a despedida (Betriebsáusgliederug), o que negava, claramente, todo caráter contratual à relação de trabalho.

O testemunho mais chocante desta oposição nos foi dado por nosso caro colega MÁRIO DEVEALI, antigo professor da Universidade de Roma e atualmente em La Plata, Argentina. Êle, que em seu livro “Il Rapporto di Lavoro”, sustentou face ao Direito italiano a tese estatutária, ou, por outras palavras, anticontratualista, aderiu alguns anos mais tarde à tese contratualista, que reconhece, em artigo publicado em sua revista “Derecho del Trabajo”, como a única doutrina compatível com um regime de liberdade.

Acreditamos que esta ligeira incursão no domínio do Direito Comparado seja suficiente para nos autorizar a delinear a evolução do Direito Social brasileiro por meio das modificações sobrevindas especialmente no Direito Sindical, no curso das numerosas vicissitudes da vida política do Brasil. É assim que, após algumas palavras sôbre o período que podemos com justiça chamar de pré-histórico (1500 – 1888), descrevemos brevemente o período capitalista (1888 – 1930), em que pràticamente não existem sindicatos no Brasil; o período socialista (1930 – 1934), no qual, ao contrário, êles se desenvolvem de maneira verdadeiramente notável, mas com característica de unidade e contrôle pelo Estado; o período social-democrático (1934 – 19371, durante o qual o desenvolvimento continua, mas sob um regime de pluralidade e autonomia sindical; o período corporativo (1937 – 1946), que nos conduz de volta à unidade sindical e ao contrôle pelo Estado erigidos em princípios constitucionais, e, finalmente, o período… inominado (1946 – 1952), que é o atual, em que persiste, a título precário, a organização sindical, sôbre a base da unidade sindical e do contrôle pelo Estado, mas a Constituição em vigor permite a adoção, pela lei, de princípios inteiramente opostos àqueles e dai a denominação.

4. Antes de têrmos o direito de falar sôbre a história do Direito Social pròpriamente dito, é necessário, para sermos completos, abordar o estudo sumariíssimo do período pré-histórico, desde a descoberta do Brasil, em 1500, até o aparecimento do movimento abolicionista, que encerrou em nosso país o regime da escravidão.

Com relação a êste período, poucas coisas interessantes existem para ser relatadas, não sòmente por causa da ausência quase completa do trabalho livre, mas ainda porque nessa ocasião a História do Brasil nada mais é do que um episódio da História de Portugal, o que escapa ao assunto dêste estudo. E preciso acentuar que os escravos, não sendo pessoas e sim coisas, òbviamente não podiam possuir direitos, e que o trabalho livre, quase inexistente, era regulamentado pelas leis portuguêsas, notadamente pelas conhecidas Ordenações do Reino. Quanto aos sindicatos, a bem dizer, não existiam, porquanto o trabalho ainda se encontrava organizado em corporações de artes e ofícios, sistema que sòmente foi abolido pela Constituição imperial de 1824. Portanto, não insistiremos sôbre o assunto.

Período pré-histórico

5. Denominamos de pré-histórico o período da evolução da Direito Social brasileiro compreendido entre a descoberta do Brasil, em 1500, e as últimas medidas tomadas para a emancipação dos escravos. Delas as primeiras se iniciaram em 1871 pela Lei do Ventre Livre, segundo a qual os filhos de mãe escrava eram emancipados desde o nascimento. Este movimento continuou com a supressão do tráfico de negros, a emancipação dos escravos sexagenários e se concluiu com a Lei Aurea, de 1888, que concedeu liberdade a todos os cativos. Paralelamente se iniciava a introdução de imigrantes no Brasil e, em conseqüência, foram promulgadas as primeiras leis sôbre o trabalho livre, especialmente sôbre o trabalho agrícola. Este fato, que é característico do Brasil e que chamamos a primeira inversão do Direito Social brasileiro, apresenta uma diferença notável com o Direito Social europeu, motivada pela diversidade das condições econômicas do Brasil e da Europa. Ao passo que na Europa, em virtude de seu desenvolvimento industrial, bem como em virtude da. própria revolução industrial, que é o ponto de partida do verdadeiro Direito Social, êste domínio da ciência do Direito se ocupa primeiro dos operários, dos trabalhadores na indústria, ou seja, das cidades, donde seu urbanismo, no Brasil, que na ocasião era predominantemente agrícola, as leis, evidentemente, só poderiam proteger o trabalho rural, o principal existente. Portanto, na Europa, a proteção das leis sociais se desloca das cidades para o campo, ao passo que no Brasil o que ocorreu foi precisamente o inverso. E isto é de tal forma verdadeiro que os primeiros sindicatos de que se ocupou a lei brasileira foram os sindicatos rurais e a primeira manifestação legal dos tribunais do trabalho se encontra numa lei do Estado de São Paulo sôbre os tribunais rurais. Também a carteira de trabalho foi estabelecida, em primeiro lugar, para o trabalho agrícola.

Estudemos agora o período que, iniciado em 1888, termina em 1930, compreendendo assim mais um século. Ele se desenvolve sob duas formas de govêrno dessemelhantes, a Monarquia e a República, mas que, do ponto de vista que nos interessa, não trouxeram mudanças de vulto à situação jurídica dos trabalhadores brasileiros.

Com efeito, a primeira, que se manifesta pela Constituição imperial de 25 de março de 1824 revista em 1834, não cogita das questões de trabalho, salvo para declarar dissolvidas as corporações de artes e ofícios, com seus chefes, juízes è escrivães. Durante todo o período em que estêve em vigor, ou seja, até 1891, apenas encontramos as já citadas leis sôbre os contratos de trabalho na agricultura e abolição da escravatura, definitivamente concedida em 1888. Êste fato, da mais alta importância na história brasileira, produziu a queda da Monarquia e o exílio do grande imperador D. PEDRO II, que a França acolheu tão bem até a sua morte.

Período capitalista

A República do regime da Constituição de 24 de fevereiro de 1891 pouco fêz para a melhoria das condições dos trabalhadores brasileiros. Seu texto consagra apenas a liberdade de trabalho; e, quanto à sua interpretação, é bastante lembrar que se discutia sôbre a constitucionalidade de algumas leis sociais promulgadas no primeiro quarto do século XX. Foi necessário, por ocasião da reforma constitucional de 7 de setembro de 1926, tornar explícita a competência da União Federal para legislar sôbre trabalho. Isto não impediu que tivéssemos algumas leis sôbre sindicatos, os quais, aliás, não se desenvolveram sob êste regime; uma lei sôbre os acidentes do trabalho, embora primitiva, não abrangendo todos os trabalhadores e não prevendo a possibilidade da insolvência do empregador; uma lei sôbre previdência social dos ferroviários; uma outra sôbre a proteção do trabalho dos menores, regulada num código especial, etc. Mas, entretanto, chamo êste período de período capitalista ou individualista, porque, apesar de o Brasil, em 1919, ter aderido à Organização Internacional do Trabalho, assinando e ratificando várias de suas convenções, não havia em nosso pais uma mentalidade social bem definida. E bastante, para disto ficarmos convencidos, ler a conferência sôbre a questão social, pronunciada em 1919 pelo maior dos brasileiro, RUI BARBOSA. Falava-se mesmo em 1930 haver um presidente da República dito que a questão social era um caso de polícia…. Verídica, ou não, a divulgação desta expressão permite bem compreender o espírito da época, no entanto tão próxima da nossa.

Foi sòmente em 1930 que a questão social se impôs ao espírito dos homens públicos. É verdade que a industrialização dopais, surgida com a primeira grande guerra, tomou desenvolvimento considerável. GETÚLIO VARGAS, então candidato de um partido que, entretanto, se chamava Aliança Liberal, apresentou um programa verdadeiramente socialista. Vencido nas urnas, mas vencedor na revolução que se seguiu, sob sua ditadura cumpriu como, chefe do govêrno provisório o que havia prometido como Candidato. Podemos dizer que foi nesse momento que o Direito Social começou realmente a existir no Brasil.

Aplicação da legislação social

8. O govêrno provisório, instituído pelo movimento revolucionário de 1930, sistematizou a elaboração de nossa legislação social. Inicialmente criou o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Seu primeiro ministro, LINDOLFO CÓLOR, obteve a colaboração de técnicos de valor em nossa disciplina, tais como o Prof. OLIVEIRA VIANA, a que se seguiram mais tarde BANDEIRA DE MELO, HÉLIO LÔBO, OSCAR SARAIVA, RÊGO MONTEIRO, COSTA MIRANDA e vários outros. Assim se iniciou a redação de numerosos projetos, em boa hora convertidos em leis pelo govêrno revestido de poder ditatorial. Desta maneira se delineou o monumento, hoje importantíssimo, do Direito Social brasileiro.

Hoje possuímos leis, quase tôdas bem elaboradas, sôbre todos os assuntos, feitas: após um estudo consciencioso dai leis estrangeiras, especialmente as dos países latinos. Os sindicatos são estruturados por uma lei de 1931, com os caracteres da unidade sindical, neutralidade sindical e seu, contrôle pelo Estado.

Com essa consagração legal se Incrementa o interêsse pela sindicalização e o número de sindicatos se eleva ràpidamente a dois mil. A lei sôbre acidentes do trabalho é consideràvelmente aperfeiçoada pela adoção de medidas para efetivar, em todos os casos, a indenização assegurada ao trabalhador. Tôda vida operária é regulamentada com introdução da carteira profissional, da jornada máxima de trabalho, da proteção ao trabalho feminino e dos menores, do repouso semanal obrigatório, da proteção ao desemprêgo, aliás raro no Brasil, de dispensas indenizadas, de regulamentação das profissões, da extensão do seguro social a todos os trabalhadores das emprêsas de serviços públicos e do comércio, do contrato coletivo de trabalho baseado na lei francesa de 1919, da organização de tribunais administrativos paritários para dirimir ou conciliar os dissídios individuais e coletivos de trabalho, etc.

Período socialista

Há então um acúmulo de leis sociais, tão opostas ao individualismo do período anterior, que não temos dúvida em designar esta fase como período socialista, tanta mais que as leis são aplicadas com empenho pelo Ministério do Trabalho e pelo Conselho Nacional do Trabalho, e a própria doutrina do Direito Social, ao mesmo tempo que a jurisprudência sôbre o assunto, fazem sua aparição no cenário jurídico brasileiro. Na mesma ocasião são criadas as cadeiras de Direito do Trabalho ou Legislação Social nas universidades brasileiras.

7. O período discricionário do govêrno não podia, entretanto, perpetuar-se. Depois da revolução paulista de 1932, denominada revolução constitucionalista, realizou-se a eleição da Assembléia Nacional, que promulgou a Constituição de 16 de julho de 1934. Essa Constituição se inspira integralmente na Constituição alemã de Weimar e organiza um regime social-democrático, conservando, com algumas restrições, as leis sociais do período discricionário, cujos princípios figuram em um capítulo sôbre a ordem econômica e social.

Período social-democrático

2 fácil de se compreender que, após a instalação do Parlamento, a atividade legislativa deveria restringir-se, ao passo que, com a reaparição das idéias liberais, se tendia a restabelecer um regime de sindicatos plúrimos e autônomos. Durante o período social-democrático encontramos raras leis: sôbre as comissões de salário mínimo, nova lei de indenizações por despedida, lei sôbre os seguros sociais para os operários, etc. A mais importante é a que criou uma instituição jurídica única no mundo, isto é, a instituição da estabilidade. Por essa lei de 1935, nenhum trabalhador da indústria ou comércio que tenha trabalhado 10 anos ou mais na mesma emprêsa pode ser despedido, a não ser que se prove ter êle cometido falta grave, o que será constatado por um processo regular. Esta instituição, que existe ainda hoje no Brasil, priva o empregador do direito de rescisão unilateral do contrato de trabalho mesmo que se prontifique a pagar perdas e danos, pois que é sòmente com a autorização da Justiça do Trabalho que êle pode despedir seu empregado ou operário.

8. Em 10 de novembro de 1937, um golpe de Estado, perpetrado pelo próprio presidente da República, lançou por terra o regime da Constituição de 1934 e erigiu, em seu lugar, um Estado do tipo autoritário, de estrutura teòricamente corporativista. Voltamos, então, ao regime da unidade sindical e do contrôle do sindicato Prelo Estado. O sindicato foi organizado de maneira fascista, dotado de poder normativo e de poder tributário, mediante a contribuição obrigatória de todos os membros da categoria ao respectivo sindicato, o que se denomina, impôsto sindical. É preciso acentuar a tentativa, inoperante na prática, de conciliar dois sistemas tão opostos, como os da pluralidade e da unidade sindical. No Brasil esta anomalia perdura até hoje. Não se pode fundar imediatamente um sindicato. É preciso primeiro fundar o que se chama uma associação profissional, que pleiteará, mais tarde, ao ministro do Trabalho, seu reconhecimento como sindicato. Só então receberá o direito de representar sua categoria.

Evidentemente, logo que o criador de nossa legislação social retomou o poder discricionário, êste deveria-retomar o seu desenvolvimento. Agora, os seguros sociais são estendidos a todos os trabalhadores, abstração feita dos trabalhadores rurais, que, por um fenômeno que chamamos de segunda inversão da legislação social brasileira, depois de serem os primeiros protegidos pela lei até, 1930, são depois dessa data quase que inteiramente deixados de lado. A Justiça do Trabalho se organiza completamente de forma judiciária e paritária, isto é, com juízes, empregados, empregadores e representantes do govêrno, tomando o caráter de permanência, com plenos poderes decisórios e de execução compulsória. Os sindicatos se desenvolvem, o que prepara a organização corporativa do país, que apenas está delineada.

Período inominado ou atual

Visto o número já acabrunhante de leis trabalhistas, foram elas sistemàticamente reunidas em um código, denominado Consolidação das Leis do Trabalho. Essa Consolidação, sob o ponto de vista da técnica legislativa, não é perfeita, nem completa, pois que não contém leis Importantes, como as referentes aos acidentes do trabalho. Foi feita outra tentativa de codificação, dessa vez com relação às leis de assistência e de seguro social, cujos diversos institutos foram reunidos no Instituto dos Serviços Sociais do Brasil (I.S.S.B.). Infelizmente, esta unificação que viria corrigir os numerosos inconvenientes do sistema atual de multiplicidade das instituições de previdência social, cada uma delas com seus associados privativos, sua administração, seu regime e de contribuições e de benefícios e seus numerosos funcionários, não foi posta em prática em virtude de novo golpe de Estada, o de 29 de outubro de 1945, que afastou do poder o presidente GETÚLIO VARGAS e que, em grande parte, foi uma conseqüência da vitória das Nações Unidas.

9. A Assembléia Nacional, então eleita, manteve a Constituição ditatorial de 10 de novembro de 1937 até a promulgação de nova. O presidente da República, também eleito nessa ocasião, conservou, no período transitório, o poder de expedir decretos-leis. Aproveitou-se êle para decretar, de acôrdo com as tendências Internacionais dominantes, o reconhecimento do direito de greve, que a Constituição de 1937 havia proscrito. Esta lei, o decreto-lei n. 9.070, bateu todos os recordes de inconstitucionalidade; era inconstitucional tendo-se em vista a Constituição de 1937, de que falamos e que estava em vigor no momento de sua publicação, pois que permite a greve, que a Constituição de 1937 denominava um recurso anti-social; é ainda inconstitucional perante a nova Constituição, promulgada, em 18 de setembro de 1946, pois que esta reconhece expressamente o direito de greve, que a lei sòmente regulamentará e, entretanto, o dec.-lei n. 9.070 proíbe a greve nas atividades que ela considera “fundamentais” e que são quase tôdas as principais formas de trabalho. Antes de interromper o trabalho, é preciso que, às trabalhadores nas atividades consideradas como “acessórias” procurem chegar, com os empregadores, a um acôrdo obtido pelas próprias partes; em sua falta, pela mediação dos representantes do Ministério do Trabalho e, em sua falta, ainda, por intermédio do presidente do Tribunal Superior ou Regional do Trabalho, conforme a extensão do conflito. Se não se chegar a um acôrdo, sòmente então a greve será lícita. Doutra forma os trabalhadores terão rescindidos os seus contratos de trabalho, sem nenhum direito às indenizações de antiguidade e pré-aviso.

10. A nova Constituição federal, de 18 de setembro de 1946, manteve a legislação social brasileira quase que com os mesmos característicos que tinha nas anteriores. Inovou sòmente, sem falar na organização sindical, que já examinamos, e na supressão dos aspectos corporativos, criando novos benefícios para o trabalhador brasileiro, a saber: salário mínimo para êle e para sua família, ao passo que anteriormente o salário mínimo era apenas individual: a participação dos trabalhadores nos lucros da emprêsa e o pagamento do salário nos dias de repouso (domingos e feriados civis e religiosos). Esta última regalia é a única que já está regulamentada pela lei ordinária e conseqüentemente concedida aos trabalhadores. O salário mínimo familiar é ainda objeto de estudos do Ministério do Trabalho. Com referência à participação nos lucros existem em curso no Parlamento vários projetos de lei, mas a reação patronal é grande e não se pode esperar vê-la aprovada em curto prazo, pois que se fala mesmo de uma reforma constitucional para suprimi-la. Lamentamos o que se passa, pois estamos inteiramente convencidos de que a participação dos trabalhadores nos lucros da emprêsa é o único meio exeqüível de terminar com a luta de classes. Procura-se também, através de numerosos projetos em estudos no Parlamento brasileiro, aperfeiçoar a Justiça do Trabalho e codificar as várias. leis sôbre seguros sociais por meio de uma lei orgânica sôbre a previdência social.

Sindicatos

Até agora falamos apenas sôbre a legislação social brasileira, isto é, examinamos exclusivamente sua anatomia. E atareis certamente curiosos de saber como ela funciona, ou, por outras palavras, desejareis conhecer também sua fisiologia. Procuraremos satisfazer-vos sôbre êste assunto.

No que se refere aos sindicatos, dos quais tanto falamos em virtude da importância que lhes atribuímos no domínio de nossa matéria, infelizmente devemos apresentar uma Impressão pessimista. Já dissemos que no Brasil não temos autonomia sindical. O contrôle do govêrno sôbre os sindicatos é grande. Não sòmente são subordinados ao ministro do Trabalho, que lhes atribui a representação legal da categoria, mas também suas diretorias e suas contas devem ser aprovadas por êste Ministério, o qual, além disso, tem o direito de intervir à sua vontade em sua administração. Se se acrescentar a isto a constatação de que sendo tão numerosas e minuciosas as leis sociais brasileiras, pouco há a fazer para os contratos coletivos de trabalho, se compreenderá fàcilmente que os sindicatos e os contratos coletivos no Brasil estão longe de ter a importância que desfrutam nos Estados Unidos da América, por exemplo. As greves, sôbre as fluais já esboçamos a situação legal, são, conseqüentemente, pouco numerosas, se bem que recentemente tenha havido um surto relativo. A Justiça do Trabalho realiza grande serviço, seja procurando disciplinar os dissídios coletivos, seja decidindo numerosas questões entre empregadores e empregados (êste têrmo no Brasil compete tanto ao que se chama empregado, como operário), principalmente com relação às rescisões unilaterais do contrato de trabalho. Ela é prejudicada, todavia, por sua constituição paritária, que permite a leigos decidir questões de direito, e também pelos reliquats no processo, de sua antiga organização administrativa, se bem que hoje seja uma instituição integralmente judiciária.

Em matéria de direito do trabalho, o que primeiramente chama a atenção, segundo os juristas estrangeiros, é o instituto da estabilidade, isto é, a proibição, sòmente para o empregador, de rescindir unilateralmente o contrato de trabalho do dependente com mais de 10 anos de serviço à emprêsa. O empregado não pode ser despedido a não ser que a Justiça do Trabalho o declare culpado de uma das faltas estritamente previstas na lei. E o empregado estável também não pode deixar seu emprêgo, pelo menos de maneira válida para seu empregador, se não fizer ratificar sua demissão pelo sindicato, ou, na sua falta, por um agente do Ministério do Trabalho ou da Justiça do Trabalho. Este sistema é extraordinàriamente constrangedor para a emprêsa porque, além do absurdo da perpetuidade da relação jurídica (o contrato de trabalho não podendo ser rescindido unilateralmente pelo empregador sem justa causa, mesmo se estiver êle disposto a pagar as perdas e danos), há o fato, várias vêzes constatado, do empregado não cumprir devidamente os seus deveres, sem que o empregador possa forçá-lo a isso em virtude de sua estabilidade.

Parece, entretanto, difícil modificar esta situação, porquanto a estabilidade é assegurada pela Constituição e os empregados se esforçam em mantê-la. Sòmente o empregado com menos de 10 anos de serviço pode ser despedido mediante o pagamento do prévio aviso de um mês de salário e uma indenização de antiguidade de um mês de salário por ano de serviço ou fração igual ou superior a seis meses. Em matéria de salários, temos também o salário mínimo geral para tôdas as atividades profissionais, e não por emprêsas, salvo raras exceções estabelecendo salários mínimos profissionais para médicos, jornalistas, radialistas, etc.

Já dissemos que existem no Brasil numerosas instituições de previdência social. Na verdade, o seguro social no Brasil é mantido por um sistema de instituições, umas interprofissionais, outras intraprofissionais ou por emprêsas. Assim, temos os Institutos de Aposentadoria e Pensões para os trabalhadores do comércio, da indústria, dos bancos, dos transportes, do trabalho marítimo e as Caixas de Aposentadoria e Pensões para os empregados dos serviços públicos, ferroviários, etc., estas organizadas também por grupos de emprêsas semelhantes.

Em virtude dos interesses criados, têm sido inúteis as tentativas de unificação de tôdas as Instituições, que evidentemente tornam mais difícil e mais cara a previdência social no Brasil. Acrescente-se a essas dificuldades que o govêrno não paga pontualmente a essas instituições, como deveria, as contribuições especiais que, todavia, cobra dos cidadãos: os Institutos de Previdência Social são assim obrigados a elevar o preço da contribuição patronal e operária, o que atualmente representa cêrca de 6% sôbre o salário mensal. Todavia, êsses institutos asseguram a aposentadoria, salvo para os ferroviários, sòmente por invalidez, pensões e auxílios em caso de doença ou enfermidade. Os acidentes do trabalho são objeto de seguro especial, a cargo do empregador.

No que se refere à assistência, o Estado, além de manter numerosas organizações de proteção à saúde, à educação, etc., concede subvenções a instituições particulares de beneficência, especialmente à Legião Brasileira de Assistência, dedicada á proteção da maternidade e da infância, bem como à Fundação da Casa Popular, destinada à construção de habitações para os trabalhadores. Entre estas últimas seria justo citar as organizações criadas pelos patrões e por êles sustentadas e que são, para a indústria, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (S.E.NA.I) e o Serviço Social da Indústria (S.E.S.I.) e, para o comércio, o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (S.E.N.A.C.) e o Serviço Social do Comércio (S.E.S.C.), que mantém, ás expensas dos empregadores, escolas profissionais e primárias, hospitais e serviços médicos, serviços de abastecimento, de recreio, etc. Apesar disto, ainda há muito afazer no Brasil neste setor, por quanto a pobreza é grande; sobretudo no norte do país.

12. Em Direito Social, a jurisprudência desempenhou, malgrado a juventude de nossa disciplina, papel importante em seu aperfeiçoamento. Por deficiência de tempo não a iremos analisar com pormenores. Cremos que será bastante lembrar que ela, no Brasil, já firmou orientações que mais tarde passaram à legislação, como, por exemplo, com referência à aplicação do Direito comum pela Justiça do Trabalho; sôbre a retroatividade de certas leis sociais, como as referentes à estabilidade; à aquisição antecipada da estabilidade, no caso de despedida com o fito único de obstá-la; também ao que se denomina “despedida indireta” ou à coação patronal para forçar o empregado a apresentar demissão; à soma de períodos de trabalho não contínuos, etc. òbviamente, esta jurisprudência é a do Tribunal Superior do Trabalho, de jurisdição nacional, do qual dependem, nas regiões formadas de dois ou mais Estados (províncias), em número de oito no total, os Tribunais Regionais do Trabalho, por sua vez superiores aos Tribunais (Juntas) de Conciliação e Julgamento, nas capitais ou grandes cidades e aos juízes do Trabalho (que são os juízes dos próprios tribunais comuns), nas outras. Nos tribunais existem representantes dos empregadores e dos empregados, indicados por seus sindicatos de primeiro ou segundo grau.

Movimento doutrinário

O movimento doutrinário do Direito Social brasileiro, no momento, é intensíssimo. Começou ainda no período capitalista com a obra de EVARISTO DE MORAIS “Apontamentos de Direito Operário”, seguida de outras sôbre a questão social, como as de VIVEIROS DE CASTRO e SAMPAIO DóRIA, e comentários às leis sociais da época. Depois de 1930 numerosos trabalhos foram publicados. ou pelos técnicos do Ministério do Trabalho, sobretudo OLIVEIRA VIANA, VALDIR NIEMEYER, BYS DE BARROS, DORVAL LACERDA, EVARISTO DE MORAIS FILHO, SEGADAS VIANA, atual ministro do Trabalho, ARNALDO SUSSEKIND, OSCAR SARAIVA, ou pelos estudiosos do Instituto de Direito Social, que fundamos em São Paulo em 1939. Êste Instituto realizou no Brasil grande obra no domínio do Direito Social, estudado por êle, seja em livros ou revistas, seja em congressos nacionais, reunidos com a colaboração dos governos do Brasil e do Estado de São Paulo e dos quais os “anais” foram publicados em vários volumes. Ao Instituto pertencem nomes hoje muito conhecidos no Brasil, como RUI DE AZEVEDO SODRÉ, AGUINALDO MIRANDA SIMÕES, EGÓN FÉLIX GOTTSCHALK, FREITAS MARCONDES, LUÍS MESQUITA, etc. Nós mesmos tivemos a honra de escrever no Brasil a primeira síntese de nossa disciplina em nosso “Direito Social Brasileiro”, hoje em sua 3ª, edição. A êste livro seguiram-se: nosso “Direito Processual do Trabalho”, “Direito Brasileiro do Trabalho”, de SEGADAS, SUSSEKIND e LACERDA, e “Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho”, de MOZAR VÍTOR RUSSOMANO. No Brasil são publicadas várias revistas de Direito Social, como nossa “Revista de Direito Social”, “Trabalho e Seguro Social” “Revista do Tribunal Superior do Trabalho”, “Boletim do Ministério do Trabalho”, “Legislação do Trabalho” e “Revista do Trabalho”. Também fundamos em São Paulo a Sociedade Internacional de Direito Social, que foi elogiada recentemente no 1° Congresso Internacional de Direito do Trabalho, reunido em Trieste em 1951.

14. Isto pôsto, convém, à guisa de conclusão desta síntese do Direito Social brasileiro, tentar esboçar-lhe as características. Como se viu, o Direito Social brasileiro é de recente formação, sendo uma conseqüência do nosso desenvolvimento industrial concomitante e posterior à primeira grande guerra. É paternalista, pois, inicialmente, surgiu mais da outorga do Estado que da luta da classe proletária em favor do melhoramento de suas condições, estando as greves no Brasil muito longe de haverem tido a importância por elas apresentada noutros países europeus ou norte-americanos. É quase exclusivamente urbano, pois os trabalhadores rurais nem mesmo na letra da lei gozam ainda das regalias do seguro social ou da indenização de antiguidade, sòmente se lhes aplicando, no mais das vêzes teòricamente, as normas sôbre salário mínimo, férias e acidentes do trabalho e estando completamente sem atuação a lei de sindicalização rural, pelo menos quanto aos trabalhadores. A formação do Direito Social brasileiro, malgrado as mudanças de orientação do legislador já referidas, encontrou seu modêlo principalmente na legislação social fascista, sem, porém, têrmos tido, ao mesmo tempo, equivalente utilização dos contratos coletivos de trabalho. Significa isto que o nosso Direito Social é predominantemente, ou, melhor, quase exclusivamente estatal. Isto não obstante é êle dos filais completos do mundo, como é fácil verificar através dos trabalhos comparativos da Organização Internacional do Trabalho. Se dêstes característicos gerais passarmos ao exame dos aspectos parciais, devemos repetir que o nosso Direito Sindical se baseia na unidade e neutralidade sindicais e no contrôle dos sindicatos pelo Estado; que as greves são permitidas, embora regulamentadas, e admitidos os contratos coletivos de trabalho e instituída a Justiça do Trabalho para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos de trabalho, tendo quanto a êstes, poder normativo. No Direito Previdencial encontramos a organização pluralística e autárquica dos institutos de seguro social, que, mantidos pela tríplice contribuição do Estado, do empregador e do empregado, concedem aos empregados todos os benefícios de seguro por morte, seguro-invalidez, seguro-doença, seguro-acidente do trabalho, seguro-maternidade e, para os ferroviários, seguro-velhice. No Direito do Trabalho encontramos a relação individual de trabalho regulada detidamente, com a garantia de um salário mínimo e de indenização de aviso prévio e de antiguidade e o original instituto da estabilidade. Finalmente, no Direito Assistencial encontramos a assistência aos desajustados, realizada ou subvencionada pelo Estado e largamente praticada pelos empregadores da indústria e do comércio.

Vemos assim que ao Direito Social brasileiro, já dotado de uma legislação assaz completa, de uma jurisprudência frutífera e bem orientada e de uma doutrina que se esforça (embora ainda esteja longe de consegui-lo) por acompanhar-lhe o desenvolvimento legislativo e aplicado por uma administração infelizmente ainda reduzida aos quadros urbanos, falta apenas um esfôrço no sentido de tornar efetiva esta aplicação, não sòmente nas cidades, mas também nos campos, para ser o que deve ser, isto é, eficiente instrumento de paz social, vale dizer, igualmente valiosa contribuição para a paz universal, que em grande proporção naquela se alicerça.

15. Tivemos, assim, um ligeiro esbôço da evolução do Direito Social brasileiro.

Como se deve ter notado, esforçamo-nos por apresentar uma exposição honesta, procurando mostrar tudo o que temos de bom ou de mau, não excluindo mesmo, levado por um falso patriotismo, êste último aspecto. Não teríamos agora, para concluir, senão que falar da repercussão econômica das leis sociais no Brasil. Isto seria, por si só, assunto para um outro estudo que, òbviamente, não nos propomos fazer neste momento. Diremos sòmente, em resumo, que as leis sociais brasileiras oneram a produção, do ponto de vista do custo da mão-de-obra, em cêrca de 49%, conforme as últimas estimativas de nossos economistas.

_________________________

Notas:

* Tradução de conferência pronunciada em alemão, na Universidade de Heidelberg em 1953.

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