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Revista Forense
CLÁSSICOS FORENSE
FINANCEIRO E ECONÔMICO
REVISTA FORENSE
Sociedades financeiras, de Filomeno J. da Costa

Revista Forense
26/05/2025
SUMÁRIO: (Conclusão) 6. Intervencionismo estatal na menor escala possível. 7. Proscrição da “dupla imposição” fiscal. 8. Da repressão ao abuso do poder econômico. 9. Fundamentos para o estudo específico dessas emprêsas. 10. Forma anônima, mínimo de capital e regulamentação da emissão de obrigações. 11. Fixação de responsabilidades pela nominatividade parcial das ações. 12. Publicidade das aplicações. 13. Diversificação obrigatória destas. 14. Destino das reservas. 15. Proibição da existência de partes beneficiárias e regime de limitação dos proventos dos diretores. 18. Conclusões.
Intervencionismo estatal na menor escala possível
6. A intromissão do poder público não tem provado bem entre nós como de resto na maioria dos países que admitem a livre iniciativa particular.1 É o quanto basta para justificar a assertiva. O Estado deve aborrecer o mínimo possível.
Êsse mínimo não deverá dispensar a constante verificação do respeito por essas emprêsas das formalidades das leis aplicáveis. Sabemos que a conjuntura econômica vem determinando, além de outros efeitos que não nos interessam registar aqui, uma intervenção governamental no campo das relações particulares – o que, juridicamente, quer dizer intervenção no terreno do direito privado; ela se escalona em grau mais leve ou mais acentuado, segundo o matiz de socialismo menos ou mais avançado que se deseje aceitar. A produção generalizada em série, ou melhor, em massa, da maioria das mercadorias ou das utilidades criou uma aristocracia do poder econômico (mais egoísta do que ilustrada para o descortino próprio das alturas), criou uma aristocracia sôbre um mundo de necessitados (os que não conseguem firmar oportunidade de ascensão e os incapazes – em maioria – que mal disfarçam, a sua congênita imprestabilidade com reivindicações mais ou menos igualitárias em que anelam vantagens indevidas). Na luta entre os poucos poderosos e os muito necessitados econômicos surge o poder estatal como órgão de temperança. Daí o postulado da intervenção governamental sempre que o poder econômico desigualar os antagonistas (ou potencialmente ensejar a desigualdade).
Perguntaríamos abstratamente se as emprêsas financeiras estariam nesse capítulo de ocorrência de desigualdade entre interessados, a formarem dois grupos distintos no seio das mesmas?
A resposta não é difícil. Sendo entidades bancárias, só por isto verificamos que atuam num setor amplo da economia privada, interferindo no mercado igualmente do crédito. Deve-se proteger o grande número de investidores como a parte fraca na relação jurídica contra o empresário que é a alavanca e lacro forte na mesma. Há mais e de maior monta. Entre as emprêsas financeiras, as outras, que chamamos por antítese de financiadas, estabelecem-se relações de subordinação que nascem do que recebe, pede ou toma para com aquêle que empresta, oferece ou dá; ela é franca e até mesmo institucional nas sociedades de contrôle; e estas mal podem disfarçar as coalizões de tôda a espécie, que são como as línguas de Esopo, que tanto podem ser elogiadas como combatidas, são as coalizões benéficas quando sincronizam esforços maiores, harmônicos com idéias de produção abundante, boa, barata é daquilo que seja complexo; são, contràriamente, perniciosas quando prejudicam por qualquer modo o princípio da concorrência imanente entre os empresários, como regra básica do regime capitalista. As sociedades de contrôle, principalmente, oferecem o risco da concentração de poder econômico. Temos que, aceitar a regra da fiscalização governamental como já existe, de resto, entre nós das atividades bancárias vulgarmente entendidas, das atividades assecuratórias, das atividades de capitalização. O princípio informador está na conveniência da defesa da economia popular e contrôle do crédito exercidos em nome de um equilíbrio entre poderosas e fracos.
A fiscalização far-se-á acompanhar de uma tabela ou escala, de sanções, inclusive nelas da proibição do funcionamento, conforme o grau da infração e repetição.
A idoneidade das operações não poderá ser objeto do contrôle do Estado, quer pela deficiência da sua atuação nesse setor, quer pelo respeito à iniciativa privada e quer ainda pela presunção de que o efeito punitivo da lei em caso de prática dolosa exerce também uma ação sedativa no espírito de aventura. É difícil de reto, senão impossível, a fixação de uma norma abstrata que preveja com segurança maciça uma operação de emprêgo de capitais de maus resultados e que preveja outra de bons; a prática revela que muitas se apresentam aconselháveis e que redundam em mau êxito, e vice versa; uma parcela de risco ainda que pequena, é imanente nos negócios e corresponde aos princípios da iniciativa privada.
Podemos dizer que, vista esta questão da não intervenção governamental nas sociedades financeiras sob um ângulo bem generalizado, prevalece entre nós o sistema que entendemos o melhor. Como vimos no nº 3, letra j, o item VIII da portaria nº 88, da Sumoc, estabelece essa fiscalização em consonância com os princípios mais aconselháveis da abstenção do poder público quanto à idoneidade das operações.
Proscrição da “dupla imposição” fiscal.
7. A “dupla imposição” fiscal é a taxação dos rendimentos em poder das empresas financeiras, que já foram taxadas nas financiadas investidas ou subordinadas. Os lucros daquelas, oriundos destas, não devem ser considerados rendimentos de uma segunda pessoa jurídica, independentes dos das primeiras.
A êste respeito tem-se mantido um relativo bom senso na nossa legislação fiscal; entre nós se excluem do lucro real para os efeitos do pagamento do impôsto de renda “os lucros e dividendos que já houverem sofrido a taxação proporcional em poder das sociedades que os distribuíram, desde que se prove o pagamento”.2
O sistema fiscal tem que reconhecer a função econômica essencial desempenhada pelas sociedades financeiras de um modo geral e daí a compreensão pela qual os lucros obtidos por elas não devem sofrer ônus além daqueles normais, ou seja, por outras palavras, não devem ser gravados duplamente; a técnica da atuação das mesmas consiste, como vimos, em trabalhar sempre com duas ou mais empresas; os proventos originários das financiadas não se consideram proventos novos no seio das financiadoras ou financeiras na medida do impôsto de renda que já foi pago. Desde a percepção da renda até sua atribuição final ao investidor não se pagam mais impostos do que qualquer outra operação, digamos comercial. A sociedade financeira, como intermediária de aplicações de capitais, deve ser um instrumento de técnica jurídica que não agrave a tributação genérica de rendimentos.
A portaria nº 88 da Sumoc é omissa a respeito. A nossa legislação deverá ser específica e especial a respeito, fixando o seu intento de não agravar a tributação dos rendimentos percebidos através das sociedades financeiras. Seria um modo de prevenir uma súbita mudança eventual de direção do legislador atencioso apenas para o lado fiscal genérico da situação quando deseje, por exemplo, cobrir deficits orçamentários como pretexte: nem sempre convincente para aumentar impostos. Legislativamente, a nossa situação depende exclusivamente do que o legislador pense e queira em matéria de impôsto de renda, sem existir qualquer referência que entendemos aconselhável, às sociedades financeiras.
Da repressão ao abuso do poder econômico.
8. Há a fixação do regime de repressão no abuso do poder econômico, como o segundo e último elemento de cunho externo na política de regulamentação das emprêsas financeiras.3 Há nessa fixação uma consideração preliminar. Deve êsse regime de repressão ser colocado no campo legislativo regulador dessas emprêsas ou, ao contrário, o grosso do assunto constitui finalidade de uma lei especial que enfrente o abuso do poder econômico, reprimindo-o sob “tôda e qualquer forma”, o que denota que o excesso também pode provir de outros setores, diversos daquele das sociedades financeiras?
Ainda que o abuso do poder econômico possa nascer em menor escala de atividades malsãs, estranhas a essas sociedades, ainda que êsse abuso se verifique mais com elas tudo aconselha em nome da lógica legislativa que a repressão se faça num terreno à parte, distinto ou diverso. É que, em primeiro lugar, essa repressão pode tomar um cunho mais institucional, isto é, a matéria de repressão ao abuso do poder econômico pode ser encarada como uma peculiaridade estatal mais definida e desenvolvia, hipótese em que demanda uma congérie de textos legais mais ou menos complicados.4 Formando como que um sistema de ontologia própria, a repressão ao abuso do poder econômico deveria regular-se destacadamente. Mesmo, em segundo lugar, quando se queira regulamentá-la com mais simplicidade, o fundo penal, de que se reveste, indica que a sua, elaboração não deve figurar na disciplina das sociedades financeiras.
A topologia do assunto não deve, todavia, levar a uma sua solução negativa, isto é, à omissão da sua análise.
Assim, antes, entendemos – como já consignamos – que a repressão ao excesso do poder econômico não se deve fazer absolutamente entre nós com a criação de um aparatoso órgão administrativo investido principalmente de qualidades inquisitoriais. Isto consagraria uma intervenção governamental francamente excessiva, intervenção que não se deve criar preventivamente; o órgão não se antecipa à função; a realidade da prática dessas sociedades indicará no futuro as deficiências e necessidades legislativas que porventura ocorram; o exagêro de legiferação incidirá no defeito fatal de atuar no sentido de afugentação de capitais, sem que se tenha assegurada a contrapartida do êxito fiscalizador.
Depois temos a ponderar que a solução que entendemos mais lógica de se regulamentar o abuso do poder econômico em textos de leis distintos, adotando-se um mínimo legislativo, não oferece5 dificuldades. Não a oferece porque as leis penais já existentes bastam pelo seu significado; não entra aqui em linha de conta um seu eventual mau funcionamento humano, porque esta possibilidade seria então mais provável num regime de organismos judicantes administrativos. O funcionário público tem provado mal no setor correção, ao passo que o juiz togado mantém uma lisura infinitamente superior. Só isto fundamenta uma estrutura quanto possível repressiva judicial com a prescrição ao máximo da fiscalização administrativa.
A eliminação da intervenção governamental se entende no seu significado de repressão ao abuso do poder econômico; ela não contradiz a adoção de normas de fiscalização formal relativas à manutenção dos requisitos de cunho interno pelas sociedades para poderem iniciar e continuar com as suas operações como já deixamos consignado.
Há um ponto que convém seja examinado logo depois de se concluir pela recua de adoção do regime do contrôle administrativo governamental e estabelecimento de um regime de repressão criminal; uma condenação imposta depois de um processo regular não deixa dúvida quanto à sua inteireza, quanto ao seu acêrto. Um pronunciamento judicial gera convicção de que muitas vêzes atos de que resultou a condenação penal devam ser anulados, anulados sob o ponto de vista do direito privado. Um exemplo entre muitos esclarece a hipótese: alguém promove um consórcio, constitui uma sociedade de contrôle, por meio da qual obtém lucros desmesurados, impedindo a concorrência em matéria de produção. A condenação criminal do agente necessita significar a nulidade judicial Insanável de tudo quanto serviu de veiculo à prática delitual; o simples afastamento, digamos, desse agente, não deverá bastar.
Reputamos, então, importante nesta matéria do combate ao abuso do poder econômico, sem a adoção do sistema administrativo fiscalizador complexo e de efeitos provavelmente desaconselháveis, entendemos que se complemente a legislação repressiva com a instituição de um preceito que, expressamente, fulmine de nulidade insanável no campo do direito privado todo e qualquer contrato ou ajuste, em decorrência do qual os personagens sofreram irremediável punição criminal.6
Não ignoramos que um preceito de semelhante natureza irá defrontar na prática com situações que difìcilmente acolherão o impacto das conseqüência de uma nulidade pura e simples; elas dar-se-ão, por exemplo, quando houver terceiros de boa-fé, envolvidos inocentemente na trama; podemos figurar um contrato de fornecimento a um mentor de consórcio açambarcador de produtos necessários ao consumo do povo; tais sejam as circunstâncias da condenação criminal dêsse responsável, não poderemos negar que aquêle contrato representava um dos elementos para a prática do delito. Deve ser anulado irremediàvelmente apesar da inteira lisura do fornecedor.
Essa e outras situações serão recompostas pela atuação do preceito da reparação dos danos a cargo dos culpados cuja responsabilidade se agravará pela regra de que o dolo (inegável diante da condenação criminal) acarreta uma exacerbação também na punição civil. O princípio da nulidade reflexa no direito privado necessita ser acrescentada de um modo especial e notadamente ostensivo.
Não se objete que já. existe a lei da inaproveitabilidade dos instrumentos do delito; tudo quanto entra na sua formação – replica-se – considera-se sem valor jurídico.
Em matéria de poder econômico a sua característica consiste no emprêgo de meios rigorosamente legais para a perseguição de um fim ilícito. Impedido êste, os seus elementos nada sofreriam em sua contextura. A referida lei de que os instrumentos do crime não se podem aproveitar, não ultrapassaria, então, os limites de uma singela poesia jurídica; dir-se-ia mesmo que a repressão do ilícito penal não pode manchar o lícito, aquilo que é rigorosamente lícito civil.
Diante de uma possibilidade desta é bem melhor que, por fôrça da configuração especial do delito do abuso do poder econômico, a lei repressiva force um pronunciamento do juiz para cada caso concreto de anulação eXpressa dos elementos “legais” empregados na sua prática. Reputamos isto mais importante do que a criarão de uma Comissão Administrativa da Defesa Econômica (C.A.D.E.). A punição judicial autorizará, sem dúvida a imposição dessa penalidade da anularão dos contratos e ajustes civis. Em tais conjunturas já não se poderá mais falar em afugentamento de capitais; o emprêgo criminoso do poder econômico aniquila qualquer simpatia pela política de atração dos mesmos.
A portaria nº 88 da Sumoc silencia por completo em matéria de repressão ao abuso do poder econômico. Teòricamente está certo. O assunto, como vimos, desenvolve-se em setor diferente. Pelo que existe regulamentado de sociedades financeiras, aplicada uma condenação de âmbito penal, haverá o seu reflexo administrativo no funcionamento da interessada; aquela, cujos diretores tiverem sido punidos, não poderá prosseguir com as suas atividades, mesmo através de recomposições que provàvelmente não esconderão arranjos menos satisfatórios aos olhos da economia privada e do crédito em geral. Neste terreno, a Sumoc tem obrigatòriamente que agir como na proteção de um cristal, em que, mesmo uma leve trinca, não pode consertar mais o objeto.
Fundamentos para o estudo específico dessas emprêsas.
9. Há agora o estudo das denominadas questões de cunho interno para o estabelecimento de um regime entre nós das emprêsas financeiras. Como esclarecemos, elas referem-se a fatôres de segurança de tipo jurídico, cuja adoção se aconselha em virtude do pressuposto de que possam proteger indiretamente todos os interessados nessas atividades. O seu número não é fixo ou rígido. Tanto elas como aquelas de cunho externo têm fundo político; estas últimas são essencialmente econômicas; as de cunho interno canalizam-se para a técnica jurídica de direito privado.
A sua enumeração é exemplificativa e o denominador comum delas é extrajurídico: concretização em detalhe, em particularidades, da política de poupança e investimentos privados. O legislador se debruça num instrumento de direito privado, qual o da técnica associativa, e nêle faz adaptações que melhor se prestem a semelhante propósito de acúmulo de economias privadas e sua aplicação com mais proveito coletivo. A técnica associativa jurídica deve ser aquela peculiar aos negócios de vulto. Deve-se estabelecer equilibradamente a individualização dás responsabilidades. Deve-se forçar um regime de maior divulgação dos negócios de tais emprêsas com o objetivo de afastamento de surprêsas. Deve-se, em nome do princípio da maior segurança, considerar a diminuição do risco. Em nome do mesmo princípio se deve reforçar a solidez dos empreendimentos. Deve-se, em função de um limite mínimo de ética na remunerarão dos administradores, impedir o exagero de sua recompensa.
Cada uma de tais considerações proporciona o estabelecimento de normas positivas que, no conjunto, planificam a especialidade da legislação privada sôbre as emprêsas financeiras. Veremos logo a seguir a forma jurídica do exercício dessas atividades e a quantidade dos seus fundos. Veremos o anonimato nesses empreendimentos, a sua divulgação ou publicidade. Veremos o seu campo de aplicações, diversificando o risco e prevenindo meios para amortecer os prejuízos eventuais. Veremos, enfim, um sistema ético de remuneração dos administradores. Êstes pontos não representam numerusclausus, não esgotam o assunto, podendo diminuir ou aumentar, segundo as peculiaridades de cada ambiente.
Forma anônima, mínimo de capital e regulamentação da emissão de obrigações.
10. A primeira consideração de ordem específica em relação às atividades financeiras consiste em que elas constituem atos em massa,7 isto é, formam-se pela convergência de muitos Interessados. Esta característica tem grande importância no estudo dessas emprêsas; alicerça a solução “fiscalizadora” do Estado na sistematização legal das mesmas; justifica-a porque, além do intervencionismo governamental em nome dos princípios socializantes das atividades econômicas, há o primado da proteção da massa presumida dos investidores contra os possíveis desvias dos dirigentes ou empresários.
Quando dizemos que as atividades financeiras em estudo são atos praticados em massa, desejamos salientar que são peculiares às grandes emprêsas; o pequeno isoladamente não ultrapassa aí a condição de molécula.
Ora, a existência de atividades que se bitolam pelo enorme ou pelo grande induz a que elas, no campo jurídico, se corporifiquem em entes de direito que lhes selam propícios ou peculiares. Não se compreendem emprêsas individuais explorando atividades financeiras e mesmo sociedades das chamadas de pessoas, cujos patrimônios são distintos dos respectivos sócios, mas que, pela térmica jurídica, se têm mais em consideração os seus componentes e cujo protótipo é a em nome coletivo. As emprêsas financeiras devem ser sociedades de capitais, de que a anônima é o padrão.
a) Devendo as emprêsas financeiras ser sociedades por ações, nelas se intensifica a razão de não deverem possuir um capital social inferior a um mínimo prefixado porque, embora nas segundas em geral se corporifiquem os grandes empreendimentos para evitar o risco ilimitado, podem êles ser de pouca monta; não temos o teto mínimo para o capital das anônimas; portanto podem obrigar-se sob a forma de tais sociedades emprêsas de pequeno vulto. As emprêsas financeiras não devem ter semelhante liberdade; não a devem ter porque são tipicamente atos de massa, é convergência normal de grande’número de poucos fundos; é, pelo menos, atividade em grande escala.
Observamos, então, que a portaria nº 88 da Sumoc, entre nós, não estabelece a forma anônima para as sociedades financeiras (nº 3, letra g); e observamos que o nosso dec.-lei nº 7.583, de 1945, é expresso em dispensar-lhes, pelo seu art. 1º, os mínimos indispensáveis para os bancos.8 Entendemos, pelo que dissemos, que se mostra conveniente a fixação dêsses dois requisitos. Deve haver uma certa soma de respeitabilidade que possa garantir os prejuízos de más operações eventuais, concorrendo para estabelecimento de um teor de segurança nessas atividades de marcante interêsse para o desenvolvimento coletivo econômico.
Afigura-se-nos altamente aconselhável, na mesma ordem de considerações, que se adotem outros dispositivos de segurança respeitantes ao apitar de tais companhias. Não deve bastar a imposição de um capital mínimo. Devem-se prover medidas que tentem garantir a conservação dêsse mínimo. Assim, sempre que, por qualquer prejuízo, o capital se reduza além de um têrço (depois da prévia absorção da reserva legal e da eventual estatutária), será necessário que se realize a imediata redução correspondente às perdas ou que se delibere a sua nova realização, como fôr entendido de maior conveniência pela assembléia geral dos acionistas. Também sempre que o capital se reduza a quantia inferior ao mínimo legal, será promovida a dissolução automática da companhia, se na mesma ocasião em que isto se apurar não fôr deliberada a recomposição do capital pelo menos até o montante mínimo impôsto legalmente.9 Se a companhia não pode mantê-lo, não deve continuar operando; em tal conjuntura necessita prevalecer a presunção de que ela entraria numa fase de riscos maiores sem o coeficiente mínimo de segurança que o limite de capital procura estabelecer.
b) Entendemos que se liga a essa, matéria de um capital mínimo realizado e conservado a questão da emissão de obrigações pelas companhias financeiras, especialmente pelas de investimentos e com que, naturalmente, alargam o seu campo de trabalho.10
Há as companhias de investimentos que, para simples efeitos de distinção, denominamos de rígidas; atuam apenas com o capital próprio e fixo; há as outras que congregam fundos sem terem em conta que os investimentos constituem capitais próprios; seriam as companhias variáveis. A prática registra até três elementos, a saber: a figura do depositário dos títulos representativos dos investimentos (banco, via de regra), a figura do administrador dos fundos, e êstes (a massa dos títulos), de propriedade comum dos investidores. Quando as sociedades sãs rígidas o patrimônio destas se confunde com os títulos, objetos dos investimentos; quando são variáveis, o patrimônio social é distinto da comunhão dos investidores e recìprocamente.
A nossa legislação não permite sociedades de capital variável com exceção das cooperativas; também o nosso direito escrito proíbe expressamente11 a emissão de qualquer papel ou título contendo promessa de pagamento em dinheiro e que seja ao portador; os certificados representativos de investimentos têm que ser nominativos.
Dentro dêste quadro, verificamos que entre nos há sociedades de investimentos de capital rígido, isto é, em que o pequeno investidor atua como seu acionista diretamente, e há aquelas de “capital” variável que adotam a solução inteligente dos denominados fundos em conta de participação;12 o chamado sócio ostensivo ou gerente é a própria companhia de investimentos, organizadora do fundo do montante prefixado; os seus subscritores são os sócios ocultos ou participantes. Ambos os tipos funcionam segundo os padrões clássicos de tais instituições registrados pelo direito comparado. Os investiments–trusts que denominamos de rígidos, constituídos em anônimas, propiciam a conversão em dinheiro das participações pela venda das respectivas ações; aquêles que chamamos de variáveis ensejam a transformação dos investimentos em dinheiro pela faculdade expressa que êles consignam de pedido do reembôlso pelos participantes na base da sua proporção no ativo líquido do fundo.
Se tivéssemos que opinar a respeito no sentido de dizer qual das duas formas parece ser o melhor para o nosso meio, segundo o seu temperamento, temos a impressão de que a “rigidez” da primeira, dos investimentos se formarem através de sociedade por ações, se nos afigura a mais sólida; carecemos ainda de um espírito “bolsista” mais acurado; temos que nos desenvolver, partindo do seguro para alcançarmos o movediço por períodos. Os investimento sob a forma de fundos em conta de participação devem ser regulamentados oficialmente e convém que pelo menos se limite o máximo de obrigações nominativas, do total dos fundos já registraríamos um mau precedente neste setor dos investimentos em conta de participação, com danosas conseqüências para o nosso mercado financeiro, sem que, ao que saibamos, os mentores tenham sido punidos na medida daquilo que a distância das, particularidades do caso, em que nos encontramos, autorizaria a supor.
Fixação de responsabilidades pela nominatividade parcial das ações.
11. As companhias financeiras necessitam ter uma parte do respectivo capital representado por ações nominativas, parte esta nunca inferior à metade de sua totalidade; o regime legal como para as sociedades anônimas é, como sabemos, de inteira liberdade, podendo o seu capital se representar por ações até totalmente ao portador.
A supressão total dos títulos ao portador13 debate-se, na luta que se trava entre os fiscalistas, de um lado, que se penalizam com a evasão dos tributos, e os interessados, de outro, que se afugentam com os seus capitais excessivamente tributados; é decisiva a consideração do êxodo do capital doméstico e a retração do capital alienígena.14
Falando em têrmos abstratos, inclinamo-nos favoràvelmente pela manutenção do regime dos títulos ao portador, sem que isto importe o desconhecimento das irregularidades que êle enseja; a solução, todavia, é a do mal menor. Há, porém peculiaridades que forçam a ruptura de semelhante política. Uma delas diz respeito à sistemática das companhias de empreendimentos, precisamente pelo fato do gênero de suas atividades demandar um mínimo quanto possível de efetivação de responsabilidades. A liberalidade aconselhável não se estende à permissão de fórmulas que inutilizem uma percentagem de concretização de responsabilidade. Daí o meio têrmo, ou se se quiser, o hibridismo, que achamos prudente, forçando que 50% mínimos do capital sejam em ações obrigatòriamente nominativas.
Sabemos que nas contingências difíceis se adotam as soluções heróicas dos presta-nomes; dos “testas-de-ferro”; diriam daí os oponentes ao nosso ponto de vista que a nominatividade não impede a simulação e anulação daquilo que aquela quer impedir. Acontece que a solução não ambiciona prevenir completamente as deturpações legais. Estas existirão como uma imanência dos interêsses menos defensáveis para cuja correção atuarão os princípios repressivos de ordem geral; os passos para contornar a lei serão pelo menos mais dificultados. Êste pouco é recomendável.
Deixamos de nos referir à nacionalidade dos acionistas, pois que aí, de acôrdo com o que já prevê, indiretamente, com acêrto a portaria nº 88 da Sumoc (nº 3, letra e), não deve haver qualquer discriminação; brasileiros ou estrangeiros, sem qualquer limite de percentagem de capital podem ser acionistas.15 Há apenas a particularidade ou cautela de se impor que as anônimas que sejam acionistas tenham igualmente a metade do respectivo capital em ações nominativas, procurando assim impedir que através da pessoa jurídica acionista se alcance a não fixação pessoal dos agentes.
Publicidade das aplicações.
12. Há a matéria da divulgação das aplicações realizadas pelas companhias financeiras. Devem elas ser pormenorizadas nos respectivos balanços. A evolução histórica das sociedades anônimas partiu da fase da constituição das mesmas; mediante autorização individual governativa prévia para o estágio de liberdade quase total de formação; antes, as anônimas surgiam só depois de uma carta, portaria ou decreto do soberano ou govêrno; hoje a regra geral é da sua constituição sem restrições. Essa mudança das coisas se operou em razão da atuação do trinômio liberdade, publicidade e responsabilidade;16 conseguiu-se a primeira com a imposição da segunda a fixação da terceira. Quem constitui uma anônima, não manipula um objeto doméstico; quem promove uma sociedade por ações, não pode imaginar que se apropria de um instrumento da técnica jurídica a seu bel-prazer, Não desconhecemos o fenômeno entre nós (que cuidamos não seja apenas brasileiro), dos interessados, de envolverem os seus atos do mínimo de aparência de legalidade; um verniz apenas basta para êles caminharem mais ou menos tranqüilizados; um parecer de conselho fiscal é um exemplo disto; é quase sempre feito pro forma; não contém substância; não é uma verdade verdadeira. Pouco importa. Se os tribunais solidarizarem os seus componentes com as irregularidades que forem apuradas, haverá a possibilidade de sobrevivência do instituto que os altos princípios de equilíbrio jurídico continuam recomendando.
Existe pràticamente o regime da constituição livre das sociedades por ações a despeito da influência publicista espalhada em muito de sua regulamentação; é, pelo menos, o nosso regime. Ocorrem, todavia, peculiaridades que fazem predominar a exceção, vale dizer, a liberdade é mais ou menos restringida. No tocante às sociedades financeiras, pelo que temos visto, isto acontece; ao lado da sua grande utilidade que as faz incentivar, há risco dos prejuízos não só vultosos, como também interessando setores vitalizantes da coletividade que se devem prevenir e proteger. A fórmula consiste em aguçar, incentivar precisamente os dois últimos elementos do trinômio, a pouco referido, forçando, notadamente, a publicidade. Pensamos que se impõe a necessidade de as companhias especializadas divulgarem as suas inversões.17
Devemos encarar a êste respeito o que já preceitua o art. 135 da nossa lei sôbre sociedades por ações. Dispõe sôbre os seus balanços, ordenando em resumo a adoção do que denominamos de princípio da fidelidade-pessimista, nada de lucros que só provenham de valorizações ou flutuações cambiantes de valores; êstes devem ser tomados, na medida do possível, pelos índices mais baixos. Está certo. Mais, reza o § 2°:
“Se a sociedade participar de uma ou mais sociedades, ou delas possuir ações, do balanço deverão constar, sob rubricas distintas, o valor da participação ou das ações e as importâncias dos créditos concedidos às ditas sociedades. Os diretores, no seu relatório, deverão dar informações precisas sôbre a situação das sociedades “controladas” ou coligadas”.
Para quem conhece contabilidade, apura-se que êsse mandamento legal quis que as operações, que não representam os objetivos ostensivos da sociedade, se destaquem numa conta especial que absorva as suas parcelas; no balanço figurará uma expressão, por exemplo, como esta “Valores em Outras Sociedades” ou “Investimentos Estranhos”, etc. Isto não consubstancia um princípio de publicidade satisfatório, no tocante às sociedades financeiras, porque se continua ignorando a especificação das aplicações, o que é precisamente o ponto a ser esclarecido. Há mais. Se a emprêsa tem por finalidade exatamente a inversão de fundos em títulos de outras, não haverá na nossa atual sistemática legal a necessidade de destaque dos mesmos, porque isto representou o desenvolvimento dos fins sociais.18 Quando o princípio mais se torna necessário, passa êle a ser facultativo. Resulta que o § 2º do art. 135 do dec.-lei nº 2.627, de 26 de setembro de 1940, não poderia ser invocado como regulador da publicidade obrigatória das inversões pelas sociedades financeiras.
A publicidade obrigatória das inversões possibilita a virtude de não se esconder atividades menos seguras ou confessáveis; não deixará também de representar no tabuleiro financeiro uma peça que atua em favor do incentivo das boas emprêsas, cujos títulos se envaidecem com tais divulgações, intercambiando propaganda recíproca.
Diversificação obrigatória destas.
13. Existe a questão da distribuição das inversões efetuadas pelas companhias financeiras. Elas não devem aplicar mais do que uma certa percentagem do respectivo capital19 numa emprêsa só; pode-se mesmo cogitar da conveniência de uma regulamentação a respeito, estabelecer limites de segundo grau isto é fixar máximos de investimentos para gêneros de atividades, como sejam, exemplificativamente, transportes, eletricidades, bancos, mineração, etc. O princípio determinador de tal regra baseia-se, sabidamente, na diversificação do risco.20 Devemos seguir os ensinamentos do direito comparado.21 É a macroscopia do adágio popular que aconselha não se colocar todos os ovos no mesmo saco. O pequeno e o médio investidores não conseguem efetivar a repartição dos riscos pelo fato de não poderem ter pràticamente conhecimento do mercado de aplicação e disporem de pequenas parcelas, cuja divisão acanha ainda mais a respeitabilidade da transação, ao passo que as companhias de Investimentos detêm meios técnicos com os quais sentem onde pareça mais conveniente a colocação de fundos, que por serem grandes, importantes ou enormes, não se unificam no perigo de uma única atividade. “O problema do risco dos valores mobiliários apresenta aspectos cuja importância escapa às pessoas que não estão habituadas à análise econômica aprofundada. Não é sòmente a questão do risco inerente a um titulo qualquer, considerado isoladamente, que também é um problema suficientemente complicado. Os valores mobiliários sofrem também os efeitos dos movimentos cíclicos. Portanto, ao primeiro risco especial do valor mobiliário, acrescenta-se ainda um segundo, que é o das condições de conjunto do mercado de títulos. Finalmente, a política social do país também pode determinar modificações no mercado nacional de títulos, e, por esta razão, a perspectiva nacional do risco dos investimentos se evidencia como incompleta”.22
A portaria nº 88 da Sumoc é inteiramente omissa a respeito. É, no entanto, aconselhável a obrigatoriedade dessa diversificação para as companhias de financiamento e para as de investimentos. Com relação às companhias de contrôle, o problema muda de aspecto porque estas objetivam exatamente o predomínio sôbre as emprêsas controladas; as aplicações aparecem como maciças.23
Destino das reservas.
14. Haveria uma facêta das companhias financeiras que também condiz com um regime de sua segurança. Vivendo elas da economia privada, movimentando-se com capitais vultosos e explorando a crédito público, têm necessàriamente alguns dos seus passos limitados com regras de garantias. Não se compreende o mau êxito de alguma delas com a mesma indiferença com que se toma conhecimento da falência de uma emprêsa comum qualquer. No jôgo de medidas de segurança inscreve-se a existência de um fundo de reserva legal, destinado à manutenção da integridade do capital. E de 20% para as sociedades anônimas em geral.24
A aplicação de novo dos montantes representativos dessa reserva legal nas operações normais das companhias é a consagração da manutenção do mesmo teor de risco que, em nome de um princípio de segurança, se desejaria evitar, pelo menos. no que diz respeito a essa reserva. Se enfim esta não é destacada das operações rotineiras da sociedade, não há nesta uma porção de seus bens que se mantenha especificamente de guarda. Daí a possibilidade de ser a reserva congelada em valores, à prova de quaisquer riscos.
Êsse congelamento não é visto com simpatia, via de regra, pelas companhias, notadamente quando tal prática se deva fazer com valores oficiais. O desenvolvimento econômico faz-se também à custa do aumento do meio circulante fiduciário, sem aludirmos à ocorrência dêste em razão dos erros grosseiros de enganosa cobertura de deficits orçamentários com papel-moeda. A moeda fiduciária cai. As reservas, se são obrigatòriamente secionadas do movimento normal da sociedade, procuram então abrigo em aplicações que as cubram do risco da diminuição do poder aquisitivo monetário; os valores oficiais não se enquadram nesse propósito. Em tese, pois, não podemos insinuar que as reservas se congelem nêles.
Cria-se uma situação contraditória. Temos de um lado a respeitabilidade do princípio que recolhe compulsòriamente do poder privado meios para estimular o progresso coletivo, extração ou sucção esta que também se realiza a título de guarda ou depósito pelo Estado. Temos de outro lado a diminuição prática de valores expressos em dinheiro. O recolhimento aos cofres públicos da reserva legal poderá representar uma diminuirão efetiva do seu poder aquisitivo. A dispensa dêsse recolhimento pura e simples poderá significar a privação de meios para uma política sã governamental de incentivo ao desenvolvimento econômico coletivo, através da utilização de meios financeiros em depósito.
Êste antagonismo faz-nos pender para uma solução híbrida, tal como entendemos a propósito da nominatividade por metade das ações das companhias financeiras. Poder-se-á adotar lima fórmula de obrigatoriedade do recolhimento a entidades parestatais de amparo ao desenvolvimento econômico de uma parte substancial da reserva legal social.
Nada existe de definitivo a respeito. Não passando a matéria de simples sugestão complementar ao que já acontece com as companhias de seguros e de capitalização.
Proibição da existência de partes beneficiárias e regime de limitação dos proventos dos diretores
15. Restam dois outros pontos;25 têm algo entre si de comum; podem ser examinados conjuntamente. Referem-se a questões de distribuição de lucros. Um diz respeito ao seu possível “desvio” legal através da instituição das partes beneficiárias; outro se refere ao mesmo “desvio” por meio de elevadas percentagens atribuídas aos membros das diretorias. Deve-se proibir a criação das primeiras nas sociedades financeiras e deve-se limitar as segundas a uma taxa razoável.
a) O nosso direito estendeu às Primitivas partes de fundador remuneração sabida aos incorporadores das companhias; elas, agora, de acôrdo com o que preceitua o art. 31 do dec.-lei nº 2.627, são “títulos negociáveis, sem valor nominal e estranhos ao capital social”; conferem “aos seus proprietários direito de crédito eventual contra a sociedade, consistente em participação nos lucros líquidos anuais, que, segundo a lei e os estatutos, devam ser distribuídos pelos acionistas”. As partes beneficiárias, cuja regulamentação “se separou, em pontos importantes, radicalmente, da legislação originária”, a francesa,26 representariam, segundo a sua natureza jurídica, um direito de crédito eventual contra a sociedade, a ser pago com lucros, segundo as circunstâncias, e criado para remuneração de alguma contribuição especial que o seu titular trouxe para a mesma.
Verificamos pela sua fórmula que se podem instituir muitos meios dessa remuneração que mal disfarcem uma diversificação de lucros. É verdade que os §§ 1º e 2º do citado art. 31 limitam a percentagem atribuída às partes beneficiárias a um décimo dos lucros líquidos e proíbem a emissão de mais de uma série ou categoria dêsses títulos. Ainda assim, parece-nos decaconselhável a sua admissão nas sociedades de que cuidamos. A inconveniência apura-se pelo fato de dever reinar uma simetria ou rigidez de funcionamento numa atividade que concentra em poucas mãos uma soma elevada de poder econômico; estas últimas não perdem oportunidade para se beneficiarem sempre que puderem. É justo que, porém, o possam sem folga ou liberalidade. O inconveniente de maior monta, quanto à permissão das partes beneficiárias nas sociedades financeiras, encontra-se na ampla liberdade dos fundadores e dos acionistas de regularem as condições de seu resgate, consagrada pelo art. 33 da lei; pode-se antes prever um valor unitário para êsse resgate que, normalmente, se operaria, pelo fundo especial criado para tanto e alimentado pela percentagem especial tirada dos proventos líquidos sociais. Já aí se tem mais uma fórmula de distração de lucros. Pode-se, em seguida, fixar condições para a antecipação do resgate, canalizando-se mais lucros para essa operação, que aparentará a justificativa de representar um ato de “saneamento” social; mesmo que não haja disponibilidades para o pagamento, êste pode efetivar-se pela conversão das partes beneficiárias em ações, segundo aquêle valor unitário prévio; cria-se, de um modo pior, um capital, marginal.
Estas práticas não se recomendam nas sociedades por ações que recorrem à subscrição pública e muito menos nas companhias financeiras, tanto mais que o encerramento de um ciclo das partes beneficiárias não impede que outros, sucessivamente, se renovem; a metade do capital com direito a voto (o que pode excluir outro tanto representado por ações preferenciais) tem o arbítrio, através de assembléia geral extraordinária, de criar partes beneficiárias (art. 105, letra b, do dec.-lei nº 2.627), sem que os acionistas dissidentes se possam mesmo prevalecer do direito semi-utópico de recesso ou de retirada da sociedade com o recebimento do valor das respectivas ações acrescido das mais-valias… contabilizadas; o artigo 107 seguinte não consagra êsse direito insurrecional para a hipótese em aprêço. Pensamos ter justificado a interdição de partes beneficiárias nas sociedades financeiras.
b) A limitação da percentagem para os diretores sôbre os lucros no fim de exercício encontra no nosso direito a única limitação consagrada pelo art. 134 do der.-lei nº 2.627; é vedada essa remuneração apenas quando não fôr distribuído a todos os acionistas um dividendo à razão de 6% ao ano no mínimo; alcançado êste, não há teto para aquêle. Os abusos são legais.
Recordamos mais uma vez que na legislatura passada o deputado HERBERT LEVY apresentou o seu projeto, fixando a responsabilidade dos incorporadores e limitando as reservas nas anônimas, que tomou na Câmara o nº 2.338-52, em cujo texto se fixou o máximo de 15% sôbre os lucros líquidos para a percentagem à diretoria.
Êsse máximo – que de resto parece elevado – não deve servir de paradigma para as companhias financeiras. Pensamos que a regulamentação deverá obedecer a uma escala móvel, na razão direta da percentagem dos dividendos; quando houver taxas diferentes em razão de ações de classes diversas, dever-se-á tomar como base aquela que fôr menor. Entendemos que uma fórmula ideal consistirá no estabelecimento de percentagem para a diretoria, que não ultrapasse um tanto em relação ao menor dividendo pago, e que êste não seja inferior aos 6% mínimos já da lei; a aludida percentagem não será maior do que metade, no máximo, do menor dividendo. Os diretores ficarão assim vinculados ao propósito de conseguirem maiores lucros, com o que aumentarão a sua remuneração especial. Evitar-se-ão abusos.
16. Pensamos poder resumir o nosso escrito com a enumeração das seguintes conclusões:
I. As emprêsas financeiras são instituições bancárias, por assemelhação, que desempenham a função relevante de colete da poupança privada para empregá-la em atividades econômicas de teor progressista.
II. O desenvolvimento econômico do Brasil aconselha a adoção de uma política de incentivo às emprêsas dessa natureza.
III. O regime legal brasileiro das emprêsas financeiras segue direção liberal, cujo defeito maior reside talvez no seu cunho incipiente.
IV. O estímulo à concentração de capitais, como função das emprêsas financeiras, pode operar-se pelo mínimo de intervencionismo estatal no seio das mesmas e pela proscrição de taxação dupla das rendas.
V. A repressão ao abuso do poder econômico, de que as emprêsas financeiras são o veículo mais comum, não se deve fazer pela instituição de um órgão administrativo, pelo menos por ora, com poderes intervencionistas, bastando uma rigorosa legislação penal repressiva.
VI. As emprêsas financeiras devem constituir-se como sociedades por acôrdo com um capital mínimo de vulto, regulamentando-se a extensão quantitativa do campo operacional, através da sua emissão de obrigações.
VII. Convém que as companhias financeiras não possuam menos da metade do respectivo capital deliberante em ações nominativas, que declarem publicamente as suas aplicações e que estas sejam obrigatòriamente diversificadas.
VIII. Poderá parte da reserva legal das companhias financeiras ser aplicada obrigatòriamente em entes parestatais de desenvolvimento econômico, proibindo-se que elas emitam partes beneficiárias e limitando-se o regime de remuneração dos seus diretores.
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Notas:
1 A respeito daqueles que não a admitem podemos fazer um juízo isento de dúvidas porquanto nêles o primado, ou melhor, o monopólio estatal funciona como uma imanência ou fatalidade; os resultados ali conseguidos se medem em algarismos frios com desrespeito à quantidade de esforços empregados; ali, enfim, se proscreve a medida comparativa com o regime de liberdade particular ou de liberdade tout court.
A afirmativa que reconhece os maus resultados da intervenção estatal nos negócios particulares não traduz o extremo de que não devam existir empreendimentos de cunho privado alimentados com dinheiros públicos. Isto seria uma outra questão diversa. “A planificação discricionária e desumana, que rege os investimentos da economia socialista, é substituída em nosso mundo econômico por um sistema, que corresponde melhor aos desejos e aos interesses individuais, porque é determinado apenas pelo jôgo social de todos êsses interêsses. Assim, o financiamento dos investimentos capitalistas não afasta de sua dinâmica os recursos públicos” (PAJISTE, “Dig. Econ.”, cit., nº 113 (abril de 1954), pág. 129, in fine, e depois em “Investimentos”, cit., pág. 20).
2 É o que atualmente preceitua o art. 43, § 2º, letra c, do Regulamento baixado com o decreto nº 36.773, de 13 de janeiro de 1955, que dispõe sôbre a cobrança e fiscalização dêsse importantíssimo tributo.
A êsse respeito não é demais salientarmos que, segundo nos diz RIPERT no seu “Traité Elémentaire de Droit Commercial”, Paris, 1948, nº 1.485, pág. 551, a razão da inexistência de sociedades de investimentos durante muito tempo na França – país, não obstante, onde a poupança é mais do que uma virtude para constituir um vício – que a razão da inexistência delas se deveu à dupla imposição. Percebemos bem o efeito maléfico que teria a adoção de semelhante medida entre nós que necessitamos de captais e não inscrevemos entre as nossas qualidades a de saber economizar.
3 O art. 148 da Constituição dispõe dogmàticamente:
“A lei reprimirá tôda e qualquer forma de abuso do poder econômico, inclusive as uniões ou agrupamentos de emprêsas individuais ou sociais, seja qual fôr a sua natureza, que tenham por fim dominar os mercados nacionais, eliminar a concorrência e aumentar arbitràriamente os lucros”.
A legislação ordinária deverá, assim, prover a respeito.
4 O finado deputado AGAMEMNON MAGALHÃES apresentou em 15 e abril de 1948, à Casa Baixa do nosso Parlamento, o seu último projeto que tomou o nº 122-1948, regulando a repressão a êsse abuso de poder e que se exauriu com a extinção da respectiva legislatura; êsse representante do povo se destacou pela sua pertinácia em ver tal matéria com vestes legislativas, tanto assim que seu nome está ligado a outras tentativas anteriores da sua regulamentação; haja vista o projeto mais antigo igualmente da sua autoria epitetado pelos exageros do seu combate como “lei malaia”; em 22 de junho de 1945, com o Poder Legislativo paralisado, conseguiu êle, exercendo o Ministério da Justiça, ver baixado o dec.-lei nº 7.666, dispondo sôbre os atos contrários à ordem moral e econômica, revogado pelo presidente JOSÉ LINHARES.
Essas tentativas têm a virtude de revelar a complexidade da questão, tanto mais complexa quanto atentarmos para a peculiaridade de ainda não possuirmos uma tradição antimonopolística bem marcada, formada no campo das agruras da luta econômica; pensou-se entre nós na centralização de enormes poderes, inclusive fiscalizadores, com a criação de uma Comissão Administrativa de Defesa Econômica (C.A.D.E.). No campo do que chamaríamos, sem o menor intuito depreciativo, de “juridicidade” é mais fácil a gente imaginar uma “Federal Trade Commission Act” do modêlo americano, traduzi-la com mais ou menos acréscimos, e concluir pela existência de um “edifício” muito junto da perfeição..: enganosamente. A fôrça de uma lei não deve correr o risco de ser apreciada pelos malefícios ainda que não desejados, oriundos da outorga de poderes respeitáveis de chamada fiscalização, a quem em suma não ultrapassa a condição de funcionário público com maior dose de importância. Referimo-nos a essa junta, comissão – ou que outro nome tenha – que autônomamente deva centralizar a repressão e munida de poderes ditatoriais de investigação (diríamos bisbilhotice) junto às emprêsas. Estas não são nenhumas cândidas; mas o risco de devassa serve para afugentar mais do que reprimir.
É preferível que a política legislativa comece ai pelo rigor marcado na repressão penal e poder judicial de nulidade insanável de violação de proibições de natureza econômica. Não devemos amedrontar o infante com a adoção de um sistema repressivo adequado para o adulto. Urge antes incentivar as sociedades financeiras, coibindo-se o abuso pelo rigor de uma justiça repressiva e não constituir uma junta de defesa econômica com poderes de investigação sob o fundamento teórico de prevenção do abuso. As peculiaridades norte-americanas não se importam sòmente em tradução de leis; lá o regime quase confederativo dos seus Estados germinou, em 1887, a primitiva “Interstate Commerce Commission”, que, só em 26 de setembro de 1914, evoluiu para a lei da citada “Federal Trade Commission”, sob os influxos dó clima inconstante de grandes progressos e grandes depressões, como nos mostra WASSERMAN, na parte histórica da sua obra já várias vêzes mencionada.
Julgamos por conseguinte desaconselhável a aprovação do projeto nº 3, de 1955, do deputado PAULO MAGALHÃES, renovando o projeto número 122-1948 referido no início desta nota; sôbre êle, recentemente, a Comissão Especial da Câmara ensejou sugestões, conforme divulgação dos trabalhos havidos anteriormente na Seção I do “Diário do Congresso Nacional”, de 4 de fevereiro de 1956, págs 833-853.
5 A lei nº 1.521, de 26 de dezembro de 1951, reprimindo os crimes contra a economia popular, configura exatamente as hipóteses de abuso do poder econômico mais comuns. Existe também a lei nº 1.522, da mesma data da anterior, que autoriza o govêrno federal a intervir no domínio econômico para assegurar a livre distribuição de produtos necessários ao consumo do povo; criou a Comissão Federal de Abastecimento e Preços e outras nos Estados é até nos Municípios. As criticas a essa lei seriam de outra natureza e fora de fundamento neste escrito.
6 Interviemos profissionalmente na defesa de um banco envolvido em operações ilícitas de câmbio praticadas por uma organização internacional; elas eram decompostas de tal modo que cada um dos participantes passivos (muitos inocentes sem dúvida) não vislumbrava a respectiva contribuição para a prática de um crime autêntico. O importante para as nossas considerações agora consiste em que o agente criminoso no País não ultrapassava a situação de um empregado mais ou menos categorizado da quadrilha com a incumbência de sofrer os riscos de uma punição criminal: os agentes, os braintraste agiam na penumbra, inclusive por uma questão que chamamos de “humanidade” no terreno da defesa do “preposto” nos corredores administrativos e nas ante-salas das Delegacias de Polícia. Interessava-lhes a validade das operações. Isto acontece nos círculos da alta finança ou dos grandes negócios. A condenação penal, assim, imposta pelo juiz togado, deve revestir-se declaradamente de um alto teor dissolvente dos arranjos no setor civil ou privado.
7 Os atos em massa, os atos praticados em enorme quantidade (empresas) podem proporcionar situações de fato que êles não ocasionariam Isoladamente. O Direito, reconhecendo semelhantes situações de fato, passa a admitir princípios que seriam inadmissíveis se não houvesse a concorrência de uma mesma espécie de atos em grande número… em massa. Mestre ASCARELLl (“Saggi Giuridici”, Milão, 1949, pág. 137, “Riv. Ital. Sc. Giur.”, 1952-1953, pág. 56, etc.) não perde oportunidade, simpàticamente, de, a êste respeito, citar mestre VIVANTE como precursor do Direito Comercial vir a ser o direito das empresas, quando êste, em 1888, enunciou no seu “Contratto delle Assicurazioni”, premiado então em Roma, o princípio de que muitos poucos podem fazer face aos poucos muitos (cf. VIVANTE, “Del Contr. di Assicuraz.”, Turim, 1936, nº 4, pág. 11 e nota).
Os atos em massa geram princípios que inexistiriam considerados isoladamente. Seguros, bancos, capitalização, são exemplos de resultados novos da prática de atos sob o regime de empresa, praticados em massa.
8 Êsses mínimos de capital realizado, são.ás seguintes: menos de Cr$ 5.000.000,00 – para os estabelecimentos que só poderão operar nos municípios em que estiverem instalados; de Cr$ 5.000.000,00 até menos de Cr$ 20.000.000,00 – para aquêles que só poderão agir num Estado da federação e dentro das áreas municipais indicadas; de Cr$ 20.000.000,00, até menos de Cr$ 50.000.000,00 – para aquêles que, atuando em mais de um Estado, só abrirem filiais ou agências nas regiões que tenham indicado no pedido de autorização e atendidos; de Cr$ 50.000.000,00 – ou mais – para os estabelecimentos bancários que possam abrir filiais ou agências em todo o território nacional. E o que decorre do disposto pelo dec.-lei nº 6.541, de 20 de maio de 1944, art. 1º e seus parágrafos, e dec.-lei nº 8.495, de 28 de dezembro de 1948, art. 1º J. BERNARD ALVES JR. consolidou-os dispositivos a respeito no seu cit. “Cód. Com. Banc.”, art. 27 e parágrafos.
Não é demais aludir a outros dispositivos legais que prefixam capital mínimo para as sociedades anônimas de certos fins: o dec.-lei número 2.063, de 7 de março de 1940, art. 8º, estabelece para as companhias de seguros dos ramos elementares (acidentes; roubos, incêndios, danos, etc. terrestres ou marítimos) o mínimo de Cr$ 1.500.000,00, e para aqueles que operarem em seguros de vida o mínimo de Cr$ 3.000.000,00; se operarem nos dois ramos, Cr$ 4.500.000,00 dec. nº 24.503, de 2 de junho de 1934, artigo 3º, parág. único, prevê um capital mínimo de Cr$ 500.000,00 para as companhias de Economia coletiva. E o dec. nº 22.456 de 10 de fevereiro de 1933, art. 14, fixa em Cr$ 1.000.000.00 o mínimo para as companhias de capitalização (cf. ALOÍSIO PONTES, “Sociedades Anônimas”, 3ª ed., 1954, Rio de Janeiro, nº 48, pág. 71, 1º vol.).
9 Inspiramo-nos nos textos dos arts. 2.327, 2.448 e 2.447 do Cód. Civil italiano, embora sejam algum tanto mais benignos: êles regulam tôdas as sociedades por ações e não apenas as companhias financeiras. Daí poderem ser mais benignos.
10 É expressamente proibida a sua emissão em França, conforme a legislação sôbre as sociedades de investimentos consubstanciada na Ordenança de 2 de novembro de 1945 e, segundo nos dia PAJISTE (“Dig. Econ.”, nº 108, novembro de 1953, pág. 130 ou “Invest.”, pág. 39), “fato que constitui quase a regra geral para as sociedades dêste gênero, que funcionam em outros países”.
ASCARELLI entende, entretanto, que as características essenciais do êxito dos investiments–trusts“nelle sue piã elaborate strutture” (Estados Unidos, Suíça, etc.) são: a) distinção (destaque) entre o patrimônio do “fiduciário” que detém os títulos, fruto dos investimentos, daquele do investment-trust (administrador ou gestor), cujo patrimônio funciona destarte como uma garantia, e enfim os títulos, que constituem investimento doa clientes, e que são de propriedade dêstes em comum; a distinção não deve ser tanto entre fiduciário e gestor como entre o patrimônio do investiment–trust – gestor e os fundos dos clientes (investidores); b) existência de obrigações (certificados) transferíveis (circuláveis), correspondentes aos investimentos realizados (“Banca, Borsa e Tit. di Credito”, 1954, parte I, pág. 178). O objetivo do mestre de Roma foi mesmo de divulgar o regulamento de um dêsses fundos suíços (“Fonds de Placement pour Valeurs Américaines” – Ussec) (ibid., páginas 182-186).
11 Art. 3º do dec. nº 177-A, de 15 de setembro de 1893, regulador da emissão de empréstimos em obrigação ao portador (debêntures) pelas sociedades por ações.
12 Exemplos da primeira classe temos a Valéria Primeira S.A. – Participações Industriais, a Valéria Segunda S.A. – Participações Industriais e certamente a Valéria Terceira S.A. – Participações Industriais, podendo imaginar-se que a continuação do êxito ensejará a formação de outras do mesmo grupo incentivador congregado pela Deltec S.A. – Investimentos e Administração, emprêsa adquirente de títulos novos para colocá-los depois em mãos normalmente definitivas. Exemplos da segunda classe temos o Fundo Brasil de Participação de Valores da Comp. Brasil de Investimentos Gerais, o Fundo de Participação e Renda da Comp. Piratininga de Empreendimentos Financeiros e Participações.
13 Está ela outra vez na ordem do dia entre nós com o projeto nº 360-1955, do deputado CARLOS LACERDA (“Diário do Congresso Nacional”, de 14 de junho de 1955, págs. 3.190-3.191). Êsse combativo parlamentar voltou a pedir essa supressão só nas ações das sociedades anônimas, já repelida após viva discussão na legislatura anterior; invocou na respectiva justificativa a necessidade de o Estado conhecer os verdadeiros administradores ou controladores dessas emprêsas de vulto; aludiu também ã evasão fiscal que tais títulos ensejam no tocante ao impôsto de renda e sobretudo ao impôsto de transmissão causamortis; as virtudes da maior circulabilidade das ações ao portador não seria decisiva para sua manutenção, concluiu o ilustre representante do povo.
Êle – pensamos – superestima os efeitos de uma lei êrro êste universal dos teóricos; “gente que vive um pouco no abstrato, que fala, de boa vontade, sobre coisas, no detalhe das quais ela não entra e cuja dificuldade lhe escapa” (H. BAUDOT, ob. cit., pág. 1). Por outro lado não nos devemos comover com os mantenedores dos títulos ao portador, via de regra pessoas que não se preocupam sempre com o papel de sua profissão no conjunto nacional com a melhoria desejável sob êste último ponto de vista” (ibidem, pág. 2).
14 H. BAUDOT, ob. cit., págs. 127-131. Crédito ou fiscalidade? Pergunta êle. Nós, jocoasamente, perguntamos se interessa mais a parte do leite que não se aproveite ou o estimulante para a sua maior produção? Ainda ùltimamente o eminente prof. RODOLFO MEZZERA ÁLVARES, catedrático de Direito Comercial da Universidade da capital uruguaia, teve ensejo de se pronunciar a respeito da reforma da legislação no seu país sôbre as sociedades anônimas (“Soc. Anons.”, in “Ver. Der. Com.”, Montevidéu, 1955, págs. 483-496); acentuou no nº 6 que o Direito Fiscal segue o Comercial como sua sombra; disse: “Creo firmemente, sin embargo, que seria um grave error de técnica si se complicara la organización jurídica de la sociedad em base a preocupaciones puramente fiscalistas”.
Com estas referências queremos insinuar que uma solução menos defeituosa nessa matéria da supressão dos títulos do portador, principalmente no capítulo das sociedades por ações, encontra-se muito distante do simples anseio de satisfação das necessidades fiscais, que são infinitas. Embora respeitáveis, evidentemente, necessitam ceder passo sempre que se revelarem prejudiciais.
15 Os diretores terão a sua residência pelo menos no Brasil, ex vi do que genèricamente estipula: o art. 118 da nossa lei das sociedades por ações.
16 VISCONDE DE OURO PRETO, no Parlamento Brasileiro, em 24 de abril de 1882, apud CARVALHO DE MENDONÇA, “Trat.”, vol. I, 2ª ed., 1930, nº 42, pág. 110.
17 PAJISTE (“Dig. Econ.”, nº III, janeiro de 1954, pág. 143, in fine, e mais tarde em “Invests.”, pág. 173, referindo-se ao sistema inglês, ensina-nos que uma das suas peculiaridades está na circunstância de as companhias nunca publicarem a lista de suas participações; representando isto uma diferença essencial com o sistema americano, que é exatamente o oposto.
As condições do meio inglês não podem ser transportadas por frações; o retraimento ou reserva britânicos são-tolerados, porquanto sabemos que os investiments–trusts seguem de fato, por hábito, por tradição ou por espírito de cautela já generalizado, outras prescrições que lhes ensejam uma possível vantagem da discrição, escondedura ou ocultação. As condições do mercado financeiro inglês não são as mesmas das do brasileiro.
18 Consulte-se MIRANDA VALVERDE, “Sociedades por Ações”, cit., ns. 702-703, vol. II, páginas 403-408.
19 Dizemos “capital” e não “haveres” ou “disponibilidades” com o propósito marcante de prevenir deturpações que resultariam da modalidade objetiva decorrente do conceito das duas últimas expressões. Podemos imaginar suprimentos por acionistas que não se inscrevem tècnicamente como capital; podem representar inversões de vulto. Há mesmo a emissão de obrigações ou certificados, como vimos no nº 10, letra b, com que multiplicam os respectivos capitais.
20 Podemos destacar as palavras com que se inicia a Fundo de Investimentos em Valores Americanos, designado pela sigla Ussec, e objeto do escrito de ASCARELLI, já citado na nota nº 10; criado na Suíça, em 2 de abril de 1951, entre a Sociedade Internacional de Investimentos; de Basiléia, como administradora, e o Crédito Suíço, Zurique, e a Sociedade de Banco Suíça, de Basiléia, como depositários principais, o seu regulamento começa assim: “Os signatários dêste contrato de gestão convencionaram emitir obrigações (certificados) ao portador que representam participações (condomínio ou co-propriedade) em depósito de títulos (valores) americanos a fim de permitir que o público realize um investimento nos Estados Unidos com uma larga repartição dos riscos” (“Banca, Borsa e Tit. Cred.”, cit., pág. 182).
21 Podemo-nos referir ao disposto pelo artigo 3º, nº VI, da lei espanhola de 15 de julho de 1952, que limita a 10% do ativo social o máximo de investimentos numa única emprêsa, quaisquer que sejam as diferentes espécies de seus títulos e nem poderão ter mas de 10% do capital da emprêsa onde se fêz o investimento (“Soes. Anons.”, cit., 1953-1955).
O Fundo de Investimentos em Valores Americanos mencionado na nota, precedente contém na sua cláusula X, letras b e c, dispositivos que permitem o investimento até 8% dos seus haveres em ações, de uma mesma companhia (“Banca, etc.”, cit., pág. 184); a aquisição de títulos deverá outrossim obedecer ao principio da repartição proporcional aos riscos de cada ramo de atividade.
As emprêsas inglêsas não aplicam mais de 10% do capital na mesma emissão e não colocam mais de 20% de suas disponibilidades num mesmo país, segundo nos informa PAJISTE, cit., no “Dig. Eon.”, nº 110 (janeiro de 1954), pág. 144, e mais tarde em “Invests.”, pás. 173.
22 PAJISTE, no “Dig. Econ.”, nº 104 (agôsto de 1983), pág. 11, mais tarde em “Invests.”, cit., págs. 74-78.
23 “Il est oisenx d’examiner si la holding company dans le sens étroit du mot, est nu bien ou un mal; elle est l’habitat juridique approprié a des phenomènes économiques donnés” (BERNARD DELVAUX, “Les Sociétés Holdings au Luxembourg”, Luxemburgo & Paris, 1948, página 22).
24 Art. 130 do dec.-lei nº 2.627, citado.
25 As sugestões feitas neste escrito não aspiram ao caráter de universalidade. Receamos bastante o excesso de legiferação. Imaginam muitos que as leis constituam panacéias, esquecidos, via de regra, de duas verdades anteriores, rebeldes ou teimosas: uma é que a ressonância das leis funciona na razão direta da acústica do meio, isto é, “leis bonitas” não refletem harmonia quando nelas não percute um nível de euforia educacional da coletividade; é um engano imaginar-se que uma constante conspiração de vontades para ludibriar o espírito legal redunde na manutenção do esqueleto da norma; tomar a lei tomo ponto de referência para um seu propósito desvirtuador é aniquilá-la. CRUET no seu conhecido ensaio “La Vie du Droit et l’Impuissance des Lois” (Paris, 1920, pág. 34), preocupou-se mais com a função jurídica da legalidade que chamamos, para efeito de distinção, de “evolutiva”; seria alavanca do progresso do direito objetivo, isto é, das normas escritas; a ilegalidade que denominamos de “frontal” talvez se atenue (não é possível negar um pouco razoável de legalidade… na lei com a – legislação experimental -, cuja definição o próprio CRUET reproduz (pág. 299) de MACAULAY: “Ne point s’inquiater de la symétrie et s’inquiéter beaucoup de l’utilité, n’ôter jamais une anomalle, parce qu’elle est une anomalie, ne jamais innover sauf lorsque quelque malaise se fait sentir et alors innover juste assez pour se débarrasser du malaise; n’établir jamais une proposition plus large que le cas particulier auquel ou remédie”. A outra verdade analgésica ao valor convencional das ordens legislativas, emanadas de grupos amorfos e quiçá desprovidos de autoridade moral, é que, quando uma lei (escrita) tem um índice acatável de respeitabilidade sempre que estabelecer restrições ou limites,. Êstes podem ser prejudiciais; é com tais leis proibitivas que se apura que as vêzes as boas intenções dos legisladores podem ser prejudiciais; elas poderiam ser comparadas às facas de duas pontas, protegendo e prejudicando, simultâneamente.
Feitas estas ressalvas, lembramos então que haveria òbviamente outras particularidades que uma “legislação experimental” poderia, ou melhor, deveria tentar. Em França, por exemplo, os honorários da diretoria, segundo a Ordenança especial, também de 2 de novembro de 1945 do seu então govêrno provisório, não podem ultrapassar de 1% do capital mais reservas. Na Espanha, o art. 3º, nº VIII, da sua citada lei de 15 de julho de 1952, impõe que a mais-valia concretizada, resultante da alienação de títulos, se destine na base mínima de 50% para um fundo de flutuações e na base mínima de 25% para a formação de reservas sociais, enquanto estas não significaram metade do capital e os restantes 25% poderão ser distribuídos como dividendos se se entender isto conveniente.
26 MIRANDA VALVERDE, ob. cit., nº 174, vol. I, págs. 213-214.
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