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O Monitoramento na Recuperação Judicial
Thomas Felsberg
05/03/2020
Dentre as várias “jabuticabas” que afligem o nosso país, uma das mais gritantes é o monitoramento judicial de uma empresa cujo plano de recuperação tenha sido aprovado. O art. 61 da Lei de Insolvência determina que a empresa recuperada seja considerada ainda insolvente pelo prazo de dois anos para que possa ser fiscalizada pelo Judiciário. Ninguém, nem o Bill Gates, merece um tratamento semelhante.
As empresas insolventes, ao terem o seu plano de recuperação aprovado, estão trôpegas, convalescendo de um processo duríssimo em que negociaram com os seus credores a fórmula de continuarem as suas atividades para, entre outras coisas, pagarem as suas dívidas. Nesse momento, o que mais precisam é de credibilidade para manter as suas operações. Credibilidade junto a seus fornecedores, às instituições financeiras, aos seus clientes e empregados. Mas como conquistar essa credibilidade, se continuam em recuperação judicial?
Sendo curto e grosso, o monitoramento judicial equivale ao assassinato da empresa. Mas diriam alguns, como assegurar que essa empresa está realmente recuperada e poderá cumprir o seu plano? A resposta é simples: Quando necessário, podem os credores optar por um monitoramento privado, o que ocorre em inúmeros casos de reperfilação de dívidas, negociadas fora do ambiente judicial. O próprio administrador judicial pode ser contratado para realizar esse monitoramento, ou auditorias e consultorias especializadas que, na prática, já atuam muitas vezes como administradores judiciais.
E se o monitoramento revelar que a empresa não está cumprindo plano aprovado? Nesse caso, podem os credores acionar a empresa, executando as dívidas, ou até requerendo a sua falência. Mas argumentariam outros, na sistemática atual, caso a recuperanda não cumpra o plano, o plano é automaticamente anulado, a recuperação é convolada em falência e as partes voltam à situação anterior (art. 61, § 1º e 2º, Lei 11.101/05). Aqui a resposta é simples: basta o próprio plano disciplinar a consequência do seu não cumprimento, que poderá inclusive ser a de devolver às partes à sua situação anterior.
A anulação automática do plano tem sido motivo de grande insegurança jurídica, porquanto muitas vezes é impossível volver à situação anterior. Exemplo disso é quando bens já tiverem sido alienados a terceiros e esses terceiros precisam de segurança jurídica para adquirir esses bens. Outro exemplo é o da Rede: quando o último agravo requerendo a anulação do plano estava sendo julgado, 90% da dívida concursal havia sido paga e novos investidores haviam investido mais de quatro bilhões de reais na empresa. Como voltar atrás?
Hoje em dia, muitos planos já preveem o fim do monitoramento por ocasião de sua homologação, mas o Judiciário ainda hesita em aprovar essa solução. Felizmente, o projeto de lei 10.220/18, atualmente em trâmite na Câmara de Deputados, dispõe, embora ainda timidamente, que o juiz da recuperação poderá determinar o fim do monitoramento. Espera-se que isso ocorra sempre os credores assim o desejarem. De qualquer forma, é hora de dispensar mais essa “jabuticaba”, que nada mais é que uma insidiosa barreira dificultando a verdadeira recuperação de empresas.
Mesmo antes da alteração proposta pelo Projeto entre em vigor, o novo Código de Processo Civil, no art. 190, oferece às partes envolvidas o poder de ajustar o procedimento segundo as necessidades da causa. A consequência da aplicação desse artigo é também a possibilidade das partes pactuarem no próprio plano de recuperação, o fim do monitoramento.[1]
Em suma, para que a empresa possa eximir-se mais rapidamente do estigma da insolvência e recuperar sua credibilidade no mercado, é necessário conferir celeridade ao processo de recuperação. Não é eficaz que exista uma ferramenta judicial de pouca utilidade prática que engesse a atuação da empresa recuperanda. Dado o poder conferido pelo art.190 do NCPC às partes envolvidas, nada mais justo que possam exercer esse direito disponível ajustando o monitoramento às suas necessidades.
[1] Em sentido contrário, em decisão conservadora, o TJ-SP determinou que não pode ser afastado o disposto no art. 61 da LRF. No entendimento do Tribunal, o prazo de dois anos deve ser cumprido pois é neste período que o devedor mostra se pode atuar regularmente “sem que comprometa o mercado que atua com a sua crise econômico-financeira”. (TJ-SP – AI: 21929602220188260000 SP 2192960-22.2018.8.26.0000, Relator: Grava Brazil, Data de Julgamento: 12/11/2018, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 14/11/2018). Disponível em: https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/648417048/agravo-de-instrumento-ai-21929602220188260000-sp-2192960-2220188260000/inteiro-teor-648417068 (Acessado em 22 de janeiro de 2020).
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