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Controle das Assembleias Gerais das Sociedades Anônimas

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Controle das Assembleias Gerais das Sociedades Anônimas

ASSEMBLEIAS

ASSEMBLEIAS GERAIS DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS

MINORIAS

REVISTA FORENSE

REVISTA FORENSE 153

SOCIEDADES ANÔNIMAS

Revista Forense

Revista Forense

08/09/2022

REVISTA FORENSE – VOLUME 153
MAIO-JUNHO DE 1954
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto,

Abreviaturas e siglas usadas
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CRÔNICA

PARECERES

NOTAS E COMENTÁRIOS

  • Lei Reguladora do Estatuto Pessoal – Haroldo Valadão
  • O Sistema Penitenciário no Direito Brasileiro – Lourival Vilela Viana
  • Controle das Assembleias Gerais das Sociedades Anônimas – Filomeno J. da Costa
  • Da Apuração do Dano Conforme a Natureza da Culpa – Abelardo Barreto do Rosário
  • A Inconstitucionalidade do Impôsto Adicional de 1%, Da Fundação da Casa Popular – Alípio Silveira
  • A Crise da Propriedade Industrial – João da Gama Cerqueira
  • Revelia do Autor – Absolvição de Instância – A. Lopes da Costa
  • Unificação de Justiça – João Solon Macedônia Soares
  • Salário Mínimo – Extensão aos Servidores Civis, Militares e Autárquicos, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, Bilac Pinto
  • Abono de Desemprêgo, Bilac Pinto

BIBLIOGRAFIA

JURISPRUDÊNCIA 

LEGISLAÇÃO

SUMÁRIO: Poderes da administração. Proteção das minorias. Intervenção pelo Registro do Comércio, ou judicial. Conclusão.

Sobre o autor

Filomeno J. da Costa, advogado em São Paulo.

NOTAS E COMENTÁRIOS

Controle das Assembleias Gerais das Sociedades Anônimas

Poderes da administração

No estudo da evolução do direito das sociedades por ações nos países de direito escrito, empregada esta expressão antagônicamente a common law, podemos verificar que, pela natureza das coisas, há duas questões constantes que sempre reclamam a atenção dos especialistas: a) a manutenção do princípio de que os poderes da administração são outorgados no interêsse dos acionistas e não no interêsse dos administradores;1 e b) o problema da tutela das minorias.2 Em tôrno dêste binômio é que se mantém a florescência dêste tipo de sociedade de importância capital no regime econômico do mundo ocidental.

As anônimas são dotadas de personalidade jurídica, que, segundo a teoria orgânica, seria real, existente por si mesma como organização e as pessoas que agem no interêsse social são os órgãos que a compõem e que, segundo a teoria da ficção, seria um meio técnico para o alcance de certos objetivos, unificando um patrimônio separadamente dos seus diversos titulares em comum e não passando os administradores de mandatários dêstes últimos. Em qualquer das duas teorias subjaz a necessidade da manutenção dos contrapesos ao princípio decisivo da preponderância da maioria numérica de capital; vale dizer, repetindo-se, que o exercício dos poderes da administração se deve operar em nome dos sócios e não dos próprios administradores e que se deve salvaguardar a proteção das minorias. O exercício de poder é o próprio germe do seu abuso.

Na primeira questão, a legislação se orienta no sentido de fortalecer a consagração do direito quantitativo de capital como expressão do poder social. Na segunda questão se procura limitar êsse poder, pois que a convivência social necessita presumir que os acionistas em minoria não podem ficar despidos de umas tantas faculdades, regalias ou direitos. A proteção às minorias sociais se faz por dois modos ou sistemas, conforme as simpatias legislativas de cada povo. A Europa Continental não aprecia, falando-se em linhas genéricas, a intervenção governamental,3 e nem mesmo a judicial;4 mas há países, alguns de alta expressão evolutiva, que a admitem e afiançam as virtudes do seu sistema.5

Proteção das minorias

Resulta, então, que, para êsses países que já admitem a intervenção governamental, a consagração dos princípios protetores das minorias sociais, na medida em que cada qual os julgue mais acertados, os pronunciamentos das assembléias gerais já se encontram mais ou menos fiscalizados; com relação aos outros países em que “a ausência de intervenção foi considerada, certa ou erradamente, como um processo na evolução do direito das sociedades”,6 o abuso das maiorias deve encontrar a justa medida de um freio ou limite. Damos a estas duas palavras um significado mais brando do que aquêle que sugerem gramaticamente. Tôda a proibição ou limitação provoca males maiores do que o bem. Assim, nas assembléias de acionistas despidas de qualquer fiscalização estranha, seja administrativa, seja judicial, os acontecimentos são fixados mais ou menos ao sabor de uma maioria que enfeixa nas mãos as duas inconciliáveis posições de parte e juiz ao mesmo tempo. Os abusos se verificam na razão direta dos interêsses dos componentes dessa maioria. Deve haver, então, uma fórmula que, pelo menos, registre os abusos; se não fôr possível a sua proibição. Tôda a proibição, como dissemos, representa quase sempre um mal maior do que um bem. Pode também a minoria pretender abusar de seus direitos, coisa igualmente possível e até mesmo comum se armada de poderes maiores que os necessários.7

Intervenção pelo Registro do Comércio, ou judicial

Damos dois exemplos de situações bem diversas. Certa maioria de capital recusa a consignar os protestos de uma minoria, limitando-se a aconselhá-la que se retire do recinto e dando tudo como realizado num clima da maior harmonia que se imagine. Uma minoria de capital, composta de maior quantidade física de acionistas, expulsa à fôrça os componentes da maioria (ou a ameaça disto) e lavra a ata da sua destituição, que é arquivada no Registro do Comércio.8

Pela simples enunciação das circunstâncias, ilustrada quiçá com os dois exemplos que formulamos, pensamos que, nos países que repudiam a intervenção governamental, se impõe a adoção, pelo menos, de um meio de registro honesto das assembléias gerais. Será facultativo, dependente de solicitação de algum legítimo interessado.

Devemos entender por legítimo interessado não apenas o acionista. Em têrmos de generalidade, admite-se que haja hipótese em que também um administrador, membro do conselho fiscal, membro do conselho de administração, obrigacionista e até credor social tenham legítimo interêsse para que se registre fielmente alguma ocorrência nas deliberações assembleárias. As anônimas – não nos devemos esquecer – assentam-se no tripé da liberdade, publicidade e responsabilidade9 e assim não se deve compreender razoàvelmente que prevaleça o retraimento ou esconderijo dos interêsses da maioria sôbre os princípios da divulgação honesta das práticas societárias. O segrêdo, se desejado, pode ser alcançado com um tipo diverso de sociedade.

Enquanto as anônimas representarem um agrupamento mais ou menos disperso de maiores ou menores porções de capitais (as sociedades fechadas ou unipessoais não intervêm para contrariar o princípio), haverá forçosamente a assembléia geral10 como meio de dar a todos e a cada um o ensejo de expressar a própria vontade, regulando a constituição da vontade da maioria como vontade social. Os vícios e as nulidades constituirão tarefa judicial posterior; êles, porém, devem alicerçar-se inicialmente em elementos que reflitam a realidade dos fatos. Para o efeito apenas do seu registro pode-se ou deve-se admitir a fiscalização administrativa ou preferentemente judicial.

As leis em geral consagram a revogação das deliberações assembleárias tomadas viciada ou nulamente. Silenciam quanto aos meios preventivos do seu registro; as maiorias (de capital ou… físicas) têm pràticamente um vasto campo de ação preliminar que anula a proteção das minorias. “A sociedade por ações representa, com efeito, um instrumento musical de que não se poderá fazer saírem sons harmoniosos, se não fôr êle feito de um modo técnico”.11

Conclusão

Em conclusão: Sempre que algum legítimo interessado (acionista, administrador ou conselheiro fiscal social, obrigacionista ou credor social) solicitar, deverá recomendar-se que os países que não adotam a intervenção governamental nas sociedades anônimas durante o curso de sua vida, facultem a fiscalização das assembléias gerais pelos Registros de Comércio ou pelos magistrados (ou prepostos honestos de sua imediata confiança). A adoção desta medida consagrará uma proteção da minoria (e mesmo da maioria) com a fidelidade que se propugnado registro dos fatos ocorridos em tais reuniões sociais.12

Filomeno J. da Costa, advogado em São Paulo.

______________

Notas:

1 Considerando-se certas peculiaridades francesas, F. DAVID não se mostra muito favorável a isto; lá, a assembléia geral não representaria mais a vontade da sociedades e sim a vontade de uma minoria de acionistas ou capitalistas ativos; a preponderância pertenceria aos órgãos de direção; estaria nas mãos dos conselhos de administração ou do presidente dêste (“La Réf. de la Législ. des Socs. par Actions d’après les Enseign. du Dr. Comparé”, na “Rev. Gén. de Dr. Comm.”, 1940, págs. 498-499).

Há, a nosso ver, um equívoco neste raciocínio. Generalizado que seja êsse princípio isto é, estabelecendo-se como dogma que, a “soberania” nas sociedade anônimas seja privativa de uns poucos da direção social, a economia privada acabar-se-ia desinteressando de investimentos em tais sociedades. Não importa o fenômeno – de resto, universal – do absenteísmo dos pequenos acionistas das particularidades administrativas sociais; existem à distância duas coisas, pelo menos, que alimentam a confiança do pequeno investidor: o regime de publicidade e a faculdade de eventualmente se agrupar com colegas para incriminar o que não estiver certo. Onde esta última faculdade não tem efeito prático, o interêsse de investimento diminui bastante.

2 Acentua-o T. ASCARELLI em “Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Comparado”, pág. 362.

3 SOLA CAÑIZARES, “Interv. de l’Etat dans les Socs. Anons. au Chili”, na “Rev. Trim. Dr. Comm.”, 1953, pág. 372.

4 PIERRE COPPENS, “L’Abus de Majorité dans les Socs. Anonymes”, nº 207, pág. 249, que condena êsse receio com um exagêro antecipado do sistema.

5 CAÑIZARES, trab. e lug. cits., nota I, menciona na Europa a Holanda e a Turquia. Na América Latina há a Argentina, Chile, Colômbia, Paraguai e Uruguai.

Êste, pelo decreto de 18 de dezembro de 1947 (“Inform. Jurídica”, Madri, nº 78, 1949, 1.673), mantém um mecanismo administrativo de contrôle governamental das companhias, algo burocratizado demais, através da Inspetoria Geral de Fazenda, Bancos e Sociedades Anônimas.

Na Inglaterra, o Ministério do Comércio, como expressão imprópria do “Board of Trade”, tem poderes para Inspecionar amplamente os negócios sociais a pedido de acionistas (art. 164 do “Companies Act” de 1948) ou (art. 165), na ocorrência de suspeita de fraude e mediante resolução da Justiça. Cf. A. P. TOPHAM “Palmer’s Comp. Law”, 19ª ed., 1949, págs. 544-545.

Nos Estados Unidos, a S. E. C. (“Securities and Exchange Commission”) concentra uma soma de poderes que, em essência, consagra o contrôle federal das companhias pelo govêrno (v. ANDRÉ TUNC “Le Contr. Féd. des Soes. par Actions aux Etats Unis” na “Rev. Trim. Dr. Comm.”, 1952, págs. 255 e 509).

6 CAÑIZARES, trat. e lug. Cits.

7 Essa possibilidade de excesso – que não constitui, de resto, nenhuma novidade – foi vislumbrada por GIUSEPPE FERRI como um perigo para o funcionamento normal das companhias (“Banca Borsa Tit. Crédito” 1952, II, 161). E ÂNGELO DE MARTINO lamentou a excessiva tolerância da lei italiana como motivo da sua aula inaugural em Trieste em 24 de fevereiro de 1953 (“La Tutela delle Minoranze nel Controllo Giudiziario sugli Atti delle Società”, na “Riv. Dir. Comm.” 1953, I, págs. 26-49).

8 Temos um caso sub judice desta espécie sob nossa atenção profissional. A ação possessória – comprovada a violência de um modo inequívoco – foi em primeira instância julgada improcedente porque… a legislação sôbre sociedades anônimas não arrola semelhante ação na sua terapêutica. Demais a mais, a ata da assembléia… foi arquivada no Registro de Comércio, de modo que, só mediante uma prévia ação anulatória da assembléia, se poderia considerar a violência ocorrida… como se o autor da violência tivesse qualidade para dar foros de validade àquilo que é o fruto da própria fraude.

Bem disse HENRI DECUGIS: “Comme la langue d’Esope, les sociétés par actions sont à la fois ce qu’il y a de meilleur et ce qu’il y a de pire, suivant l’usage son ou mauvais qu’en font les hommes” (“Les Tendances Modernes du Dr. dos Socs. par Actions”, 1937, pág. 64).

9 “Fora daí e além daí não há senão restrições injustificáveis ao direito individual” (AFONSO CELSO, no Senado, em 24 de abril de 1882, apud CARVALHO DE MENDONÇA, “Trat. de Dir. Com.”, vol. I, 2ª ed., nº 42, pág. 110).

10 ENRICO SOPRANO, “L’Assembl. Gener. degli Azionisti”, 1914, nº I, pág. 2.

11 EDMOND KUNOZ, “Les Enseign. des Recentes Lois Allemande et Suisse sur les Socs. par Actions”, na “Rev. Gén. de Dr. Comm.”, 1939, pág. 466.

12 Trabalho oferecido à VIII Conferência Interamericana de Advogados, realizada em São Paulo, entre 15 e 22 de março de 1954. No seio da sua 7ª Comissão (Direito Comercial). Seção A, por 8 votos contra 4 resolveram aceitar as seguintes conclusões: 1ª) que é conveniente adotarem-se princípios uniformes em matéria de funcionamento das assembléias gerais das sociedades anônimas contrárias ao controle administrativo das mesmas; 2ª) que é recomendável adotarem-se princípios a tornar efetivos os direitos das minorias nas assembléias das sociedades anônimas.

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