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Natureza e efeitos das propostas do poder judiciário para reforma de leis, de João de Oliveira Filho

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CONSTITUCIONAL

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Natureza e efeitos das propostas do poder judiciário para reforma de leis, de João de Oliveira Filho

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26/06/2024

A Constituição federal de 1946 dispõe no art. 124, I, que os Estados organizarão sua Justiça com observância de diversos princípios, entre os quais o de que

“Serão inalteráveis a divisão e a organização judiciária, dentro de cinco anos da data da lei que as estabelecer, salvo proposta motivada do Tribunal de Justiça”.

1. A natureza e os efeitos dessa proposta motivada do Tribunal de Justiça, têm sido muito controvertidos. Sustentam uns que sua natureza é a de iniciativa de leis, ao passo que outros salientam o caráter de proposta, ou de sugestão ou idéia para uma lei. Tiram ambas as correntes conclusões diferentes quanto aos efeitos dessa proposta. Os que sustentam o caráter de iniciativa, raciocinam que se é implícito no poder de iniciativa o poderá emendar, quem não tenha iniciativa não poderá emendar, nem rejeitar. Ao contrário, haverá infringência do princípio da independência e da harmonia dos poderes. Ao passo que a outra corrente admite que essa sugestão seja completada por outras aprovadas pelas Assembléias Legislativas, pois quem tem o direito de discutir, tem o direito de emendar, nem estando o Poder Executivo impedido de vetar a lei que tenha acolhido as sugestões dos Tribunais de Justiça, uma e outra coisa – emenda e veto – não importando na quebra do princípio da harmonia e da independência dos poderes.

2. O eminente desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Dr. HEROTIDES DA SILVA LIMA, expôs amplamente seu voto no primeiro sentido sôbre caso de veto de lei aprovada pela Assembléia Legislativa mediante proposta daquele Tribunal de Justiça (“REVISTA FORENSE”, vol. 148, página 479). No seu douto entender, a proposta do Tribunal tem o caráter de iniciativa de lei, não pode ser emendada pela Assembléia Legislativa, a Assembléia Legislativa não pode deixar de aprová-la na forma sugerida, o governador de Estado não pode vetá-la.

Na representação nº 164, relator S. Ex.ª o Sr. ministro MÁRIO GUIMARÃES, foi sustentada pelo egrégio Supremo Tribunal Federal essa tese. O poder de emendar, é corolário do poder de iniciativa. A emenda, diz CARRÉ DE MALBERG não é senão “una nueva iniciativa, que se injecta sôbre una iniciativa anterior” (“Teoria General del Estado”, trad. espanhola, pág. 354. Outros autores, com palavras diversas reconhecem êste conceito: “L’emendamento è una forma de iniciativa” MICELLI, “Diritto Costituzionale”, pág. 791. E EUGÈNE PIERRE: “Le droit d’amendement est le coroliaire du droit général d’iniciative. L’amendement se distingue de la proposition en qu’elle n’a pas comme celle-ci le pouvoir de faire naître une question nouvelle”. (v. “Droit Politique et Electoral et Parlamentaire” nº 699). E conclui o venerando acórdão do egrégio Supremo Tribunal Federal que “se a emenda é uma forma de iniciativa, um corolário da iniciativa, o próprio direito de iniciativa, já se vê que onde falta a competência para a iniciativa, falta competência para emendar”.

Em outra decisão, o egrégio Supremo Tribunal Federal seguiu o mesmo sentido. Tratava-se da representação nº 196, de Santa Catarina governador, atendendo à, proposta feita pelo Tribunal de Justiça, propusera a criação de certa comarca. A Assembléia Legislativa acolheu a proposta. Em emenda, porém, criou outra comarca. O governador vetou essa criação. A Assembléia rejeitou o veto. O governador representou contra a inconstitucionalidade dessa criação. Acolhida a representação pelo Exmo. Sr. Dr. procurador-geral da República, o egrégio Supremo Tribunal Federal deu-lhe provimento. Foi declarada inconstitucional criação dessa outra comarca, conforme se vê de venerando acórdão publicado no “Arq. Judiciário”, vol. 112, pág. 597. “Houve ofensa”, disse S. Ex.ª o Sr. ministro LAFAYETTE DE ANDRADA, relator, “ao princípio constitucional que garante a independência e harmonia dos poderes. A Assembléia invadiu as atribuições do Executivo e do Judiciário, alterando a divisão judiciária do Estado, sem atender aos direitos dêsses dois poderes, à sua competência. A nova comarca só poderia ser criada se o Executivo houvesse proposto essa criação, precedida de mensagem à Assembléia de pedido do Tribunal de Justiça. Faltava competência à Assembléia para ter a iniciativa e assim, acentuou bem o governador, onde falta competência para a iniciativa, falta competência para emendar”.

Em outro venerando acórdão publicado no “Arq. Judiciário”, vol. 116, pág. 98, egrégio Supremo Tribunal Federal, relator S. Ex.ª o Sr. ministro MÁRIO GUIMARÃES, admitiu a iniciativa do Poder Legislativo com a condição de prévia aprovação do Poder Judiciário e do Poder Executivo. “A iniciativa da lei que compete, por via de regra Poder Legislativo, sofre exceções, no nosso Direito Constitucional: a) em favor do Tribunal de Justiça, quando verse matéria de Organização Judiciária, dados os pressupostos do art. 124, I; b) em favor do Executivo, se houver criação de novos cargos ou aumento de despesas. Segue-se daí que, se o projeto incidir nas duas exceções, deverá, antes de ser levado à consideração da Assembléia, reunir apoio do Judiciário e do Executivo. O Tribunal sugerirá as modificações que entenda necessário. Será o juiz da conveniência do projeto, em tese. O Executivo, se o considerar oportuno, dada a situação financeira do Estado, remetê-lo-á ao Legislativo. Não será preciso a anuência prévia do Executivo, sòmente quando se trata de criação de cargo na Secretaria do Tribunal, assistindo, neste caso, ao Executivo, apenas o direito de veto. Tenhamos em vista que o legislador empregou, num caso, a palavra iniciativa. Em outro, proposta. A proposta é remota. A iniciativa é próxima. Propor é apenas lembrar, sugerir, dar idéia. “Iniciativa, define MORAIS, é o ato ou efeito de ser o primeiro a pôr em prática uma idéia ou procurar realizá-la”. É sinônimo de comêço, de princípio. Em relação a uma lei, será o primeiro ato de sua elaboração. Na hipótese dos autos, a Assembléia, tendo em vista a proposta do Tribunal, criou cargo de juiz e aumentou despesas públicas, com desconhecimento da autoridade do governador. E mais ainda, criou tais cargos sem dotação orçamentária. Violou, por conseguinte, a Constituição”.

Admitiu, pois, o egrégio Supremo Tribunal Federal que, nada obstante, a proposta do Tribunal, pode o Poder Executivo vetar a lei.

3. Em elaboração, como estamos vendo, uma jurisprudência sôbre a Iniciativa de leis por parte de órgãos do Poder Judiciário.

4. Recentemente – fevereiro de 1956 – pelo fundamento de não ter o Poder Legislativo direito de emendar proposta do Poder Judiciário, S. Ex.ª o Sr. desembargador-presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná indeferiu pedido em apostila em título do MM. juiz de direito da 4ª Vara da comarca de Londrina de elevação de sua comarca de terceira para quarta entrância. O art. 12 da lei nº 2.578, de 27 de janeiro de 1956, dispôs que ficavam elevadas à categoria de 4ª entrância as comarcas que contassem três ou mais varas.

“Ficam elevadas à categoria de quarta entrância, as comarcas que contaram três ou mais varas”.

A comarca de Londrina tem quatro varas. O pedido do magistrado se baseara no texto transcrito. Mas, S. Ex.ª o Sr. desembargador-presidente do Tribunal de Justiça do aludido Estado negou aplicação a êsse artigo por considerá-lo inconstitucional. Fôra emenda na lei da reforma parcial da divisão judiciária do Estado, sem ter havido proposta do Tribunal. “O disposto no art. 12 da lei nº 2.578, de 27 de janeiro de 1956, é inconstitucional, ex vi do que prescreve o art. 124, I, da Constituição federal. Resultou de emenda legislativa à proposta do egrégio Tribunal de Justiça, visando a alteração parcial da lei nº 1.542, de 14 de dezembro de 1953, cujo qüinqüênio de vigência ainda não decorreu. Indefiro, por isso, a pretensão do ilustre requerente”.

5. Estamos persuadidos, porém, com a devida vênia, nada obstante a alta autoridade do egrégio Supremo Tribunal Federal, de que nenhum fundamento constitucional ampara a opinião de que a proposta do Judiciário deva ser aprovada na forma nela sugerida, sem ampliação nem restrição, e de que quem não tenha iniciativa, não tem direito de emenda.

Iniciativa de lei e emenda de lei

6. Iniciativa de lei e emenda de lei são dois direitos afins, o primeiro incluindo o segundo, quando se trata de iniciativa de membros do Congresso, porém, não o incluindo, quando se trata de órgãos que não sejam do Legislativo, ficando o de emenda para êste, salvo disposição constitucional em contrário.

Admitido que o Estado exista para realizar certos serviços para os cidadãos, dizem BATES and FIELD: “State Government”, fourthedition, 1954, pág. 15), o primeiro passo em cumprir esta função é decidir quais os serviços que devem ser empreendidos pelo govêrno e como devem ser feitos. Esta função de determinar a política e seguir é cumprida primeiramente pelo legislativo do govêrno.

Quando os governos autocráticos prevaleciam na Europa, escrevem êsses autores, a política do Estado era a vontade do autocrata, e o poder que determinava a orientação política era idêntica ao que a punha em efeito. As antigas assembléias do povo, continuam êsses autores, ou dos seus representantes na Inglaterra, não determinavam a política a seguir, mas sòmente expressavam opiniões sôbre as medidas tomadas pelo rei e sôbre as petições para reconhecimento de direitos populares. A resultante legislação, se alguma porventura era feita, tomava a forma de ato real, conhecido variadamente por Édito, Constituição, Carta, ou Estatuto, muitas vêzes concedidos depois que a Assembléia tinha sido dissolvida. Tais Estatutos usualmente vinham em forma de confirmação de direitos presumidos já em existência. Tempos vieram em que expressões de crítica e de positivas propostas de medidas apareceram mais numerosas, e a voz do Parlamento assumiu tom mais autoritativo. Só foi mais tarde que o Parlamento passou a legislar com o sentido que êsse têrmo tem atualmente.

É o que se lê em “Derecho Político general y constitucional comparado”, trad. espanhola de OSKAR GEORG FISCHBACH, ed. “Labor”, seg. ed., 1934, pág. 166. “La iniciativa legislativa es decir, el derecho de proponer leyes varia según el Régimen: a) En las Monarquías, en princípio correspondía casi siempre al Rey, pues se consideraba que el reservalo al Parlamento era incompatible com el Poder real. Hasta el Derecho moderno (desde 1548) no se reconoció fundamentalmente a las Câmaras la potestad de iniciativa. En estos assuntos, el Parlamento não tenía más camino que acudir al Gobierno, mediante una petición o una resolución, moviendole a presentar el proyecto de Ley”.

“En los Estados de soberania popular, escreve FISCHBACH, “es devir, en los países republicanos (democráticos), el derecho de iniciativa reside, como se comprende, en el Parlamento, mas también o comparte el pueblo. En este (en la Nación), verdadeiro titular de la soberanía del Estado, tiene su asiento el Poder Legislativo”.

É a mesma história que nos conta VICENZO MICELLI (“Principii di Diritto Costituzionale”, 1913, pág. 789): “Il diritto d’iniziativa parlamentare ha hubito paracchie vicende nella storia degli moderni. Esso è sorti storicamente a traverso le petizioni e le doglianze, che i rappresentanti dei ceti medievali inviano al Monarca; ma si ricollega direttamente ad un processo secolare, che si è compiuto lentamente in Inghilterra, dove specialmente la Camara dei Comuni, per mezzo delle petizioni, cominció ad assumersi un vero diritto di partecipazione alla funzione legislativa, che diventò intero allorchè le petizione vennero transformante integralmente inleggi. Allora, invece di presentare petizioni, le Camara presentarono veri designi di legge, rivolti a far fronte a quelle esigenze che prima, venivano espresse con le petizione. Insieme, col regime rappresentativo l’iniziativa parlamentare venne imitata nei paesi del Continente, ma quivi inciampo nelle tradizioni dei governi dispotici, che da principio se mostrarano diffidenti verso questa attribuzione delle Assemblee, specialmente dopo abusi che si erano verificati in Francia, al tempo della revoluzione. In processo di tempo l’iniziativa parlamentare venne riconosciutta alla pari quella del Governo”.

7. Em virtude do quase monopólio exercido pelo Poder Executivo, observa PIERRE WIGNY (“Droit Constitutionnel”, 1952, tomo II, pág. 539), adivinha-se a importância do poder de emenda. “Il ne fut pas que les Chambres soient obligées d’accepter une disposition qui leur déplaise, soit de rejeter un projet qui leur convient dans son ensemble et qui a été prévu dans la déclaration governamentale. Ce serait la carte forcée. C’est pourquoi le droit d’amendement droit être aux assemblées ainsi qu’au gouvernement”.

O direito de emenda, pois, vem a ser um resíduo do direito de iniciativa. Êste, passando a competir ao Poder Legislativo, por inteiro, na forma do princípio de separação dos poderes, começou a voltar para o Poder Executivo e para órgão do Poder Judiciário.

Atribuindo ao Poder Legislativo tôda a ação legislativa da Nação, numa rígida adaptação do princípio da separação dos poderes, nos modernos governos parlamentares, porém, acentuam BATES and FIELD (ob. cit., pág. 166), tôdas as importantes medidas de política são propostas pelo ramo executivo do govêrno ao parlamento, atenuando-se a rigidez do princípio da separação dos poderes.

Na Constituição dos Estados Unidos dá América, porém, foi mantida a estrutura ortodoxa do princípio da separação dos poderes. Não se admitiu a iniciativa do presidente da República para a feitura das leis. Envia êle mensagens ao Congresso sugerindo medidas a serem convertidas em lei. Se a doutrina da separação dos poderes, dizem BATES and FIELD (ob. cit., pág: 166), tinha que seguir até sua lógica conclusão, a função legislativa só poderia ser cumprida exclusivamente pela legislatura, e, por isso mesmo, nenhuma outra função êsse corpo poderá exercer. Por isso, nesse pais, onde a intenção foi aderir, mais estritamente que em outro, à doutrina da separação dos poderes, a maior parte do trabalho de política legislativa, ou legislação, foi deixada à legislatura, com excesso do que na verdade lhe devia ser atribuída.

8. No Brasil êsse excesso foi mitigado. Deixou-se ao presidente da República o direito de expedir decretos e regulamentos para a boa aplicação da lei. Mas tarde admitiu-se o direito de Iniciativa de leis também ao presidente da República. Só as Câmaras do Congresso tinham o direito de elaborar seus regimentos internos. Veio a ser admitido, depois, que os Tribunais de Justiça elaborassem os seus autônomamente.

Na última Constituição federal (1946), a invasão dos Poderes Executivo e Judiciário nas funções do Poder Legislativo foi considerável, tendo-se até permitido que certo órgão – o Conselho Nacional de Economia – sugerisse ao Congresso Nacional as medidas que considerasse necessárias à vida econômica do país. A título de fortalecer o Poder Executivo, deu-se-lhe o direito exclusivo da iniciativa de lei sôbre determinados assuntos, deu-se-lhe, outrossim, o direito geral de iniciativa sôbre os assuntos de competência da União, Igual ao atribuído ao Congresso Nacional, reservado para êste alguns assuntos de sua exclusiva iniciativa. Atribuiu-se também ao Poder Judiciário a iniciativa exclusiva de leis, como no que concerne aos serviços administrativos dos tribunais – criação ou a extinção de cargos e a fixação dos respectivos vencimentos -, aumento do número de Juizes dos tribunais, criação de outros tribunais, – eleitorais ou tribunais federais de Recursos, tendo-se mesmo chegado ao ponto de determinar que certa proposta – aumento dos juízes dos tribunais eleitorais – só poderia ser aprovada na forma nela sugerida. Ficou também atribuída aos tribunais de Justiça dos Estados a proposta para alteração da lei de divisão e organização judiciárias, dentro de cinco anos da data da lei que as tenham estabelecido.

Nessa volta, porém, ao Poder Executivo e nessa outorga a órgãos do Poder Judiciário, de parte do integral direito de iniciativa de leis que, pelo princípio da separação dos poderes, ficara atribuído ao Legislativo restou, sempre, a êste o resíduo do direito de emendar, que não foi tirado, salvo nos casos expressos.

Proibição do direito de emendar

9. Um dêsses casos de proibição do direito de emendar se encontra em nossa Constituição no art. 113, onde se dispõe que

“O número dos juízes dos tribunais eleitorais não será reduzido, mas poderá ser elevado até nove, mediante proposta do Tribunal Superior Eleitoral e na forma por êle sugerida”.

Vale dizer que o Congresso Nacional ou aprova como está sugerido, ou não aprova. Se aprovar por forma diferente do sugerido, comete inconstitucionalidade.

Nenhum outro caso igual de proibição de emenda do Poder Legislativo se encontra na Constituição, nos casos de atribuição de iniciativa privada outorgada a órgãos de outro Poder.

Estão aqui os textos. O art. 67:

“A iniciativa das leis, ressalvados os casos de competência exclusiva, cabe ao presidente da República e a qualquer membro ou comissão da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

§ 1º Cabe à Câmara dos Deputados e ao presidente da República a iniciativa da lei de fixação das Fôrças Armadas e a de tôdas as leis sôbre matéria financeira.

§ 2º Ressalvada a competência da Câmara dos Deputados, do Senado e dos tribunais federais, no que concerne aos respectivos serviços administrativos, compete exclusivamente ao presidente da República a Iniciativa das leis que criem empregos em serviços existentes, aumentem vencimentos ou modifiquem, no decurso de cada legislatura, a lei de fixação das Fôrças Armadas.

§ 3° A discussão dos projetos de lei de iniciativa do presidente da República começará na Câmara dos Deputados”.

Art. 98:

– “O Supremo Tribunal Federal, com sede na Capital da República e jurisdição em todo o território nacional, compor-se-á de 11 ministros. Êsse número, mediante proposta do próprio Tribunal, poderá ser elevado por lei”.

Art. 97: Compete aos tribunais: …

“II, elaborar seus regimentos internos… e bem assim propor ao Poder Legislativo competente a criação ou a extinção de cargos e a fixação dos respectivos vencimentos”.

Art. 105:

“A lei poderá criar, em diferentes regiões do país, outros tribunais federais de recursos, mediante proposta do próprio Tribunal e aprovação do Supremo Tribunal Federal, fixando-lhe sede e jurisdição territorial e observados os preceitos dos artigos 103 e 104”.

Art. 111, parág. único:

“Mediante proposta do Tribunal Superior Eleitoral. poderá criar-se por lei um Tribunal Regional Eleitoral na capital de qualquer Território”.

Art. 113:

“O número de juízes dos tribunais eleitorais não será reduzido, mas poderá ser elevado até nove, mediante proposta do Tribunal Superior Eleitoral e na forma por êle sugerida”.

Art. 124, I:

“Os Estados organizarão a sua Justiça com observância dos arts. 95 a 97 e também dos seguintes:

I, serão inalteráveis a divisão e a organização judiciária, dentro de cinco anos da data da lei que as estabelecer, salvo proposta motivada do Tribunal de Justiça”.

Art. 205:

“É instituído o Conselho Nacional de Economia„ cuja organização será regulada em lei.

§ 1º Os seus membros serão nomeados pelo presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, dentre cidadãos de notória competência em assuntos econômicos.

§ 2º Incumbe ao Conselho estudar a vida econômica do país e sugerir ao poder competente as medidas que considerar necessárias”.

10. São notáveis os avanços que o presidente da República e os tribunais conseguiram no setor do Poder Legislativo. Pretende-se ainda mais desfalcando-se o Poder Legislativo, devido sua lentidão. Quarto ao presidente da República, os defensores de maior fortalecimento dêsse Poder pleiteiam a delegação de poderes de Legislativo, pela revogação do princípio contido do § 2º art. 38:

“É vedado a qualquer dos poderes delegar atribuições”.

Quanto aos Tribunais, é típica a Interpretação, de início aludida, que Inculca não possa o Legislativo emendar a proposta de lei feita pelos órgãos do Poder Judiciário, nem modificá-la, nem acrescentar alguma outra providência além da contida na proposta, impedido, outrossim, o Poder Executivo de vetá-la. Entende essa corrente de opinião que o Poder Legislativo não poderia deixar de aprová-la, nada obstante inexistir na Constituição alguma disposição sôbre essa intangibilidade da proposta judiciária, observando, como foi que quando a Constituição quis que a proposta fôsse Intangível, porém não compulsòriamente aprovável, declarou-o, por expresso, como no art. 113, com a observação “e na forma por êle (Tribunal) sugerida”.

Salvo para êste caso, quanto às demais propostas dos tribunais, são elas da mesma natureza que a iniciativa dos membros do próprio Congresso Nacional e do presidente da República: suscetíveis de alteração, adição, emenda, acrescentamento, rejeição, veto, pois nenhuma disposição constitucional dá para as propostas do Judiciário o caráter de intangibilidade.

Pretendesse a Constituição dar para essas propostas o caráter de decisões (modificáveis, sòmente homologáveis pelo Poder Legislativo e pelo Poder Executivo, sancionando-a e promulgando-a, aplicaria outra técnica, qual a de dar ao Poder Judiciário a prerrogativa de decisão sôbre o assunto. Deu-a, por exemplo, no caso de elaboração dos regimentos dos próprios tribunais. Deu-a, em outro exemplo, ao presidente da República, no ego da expedição de decretos e regulamentos para a boa aplicação da lei.

11. Iniciativa em nosso direito constitucional é a atribuição de poder apresentar proposições destinadas a seguir os trâmites constitucionais estabelecidos para as leis. O projeto de lei adotado numa das câmaras será pela ostra, que, aprovando-o, o enviará à sanção ou promulgação. Nos têrmos da votação final, será o projeto enviado ao presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. Dentro de 10 dias úteis, contos daquele em que o receber, o presidente poderá vetá-lo no todo ou em parte. Decorrido o decêndio, o silêncio do presidente da República importará sanção.

Êsses os trâmites para uma iniciativa de lei ou um projeto de lei se transformar em lei. Iniciativa de lei são as propostas do Poder Judiciário ao Legislativo. Nenhum privilégio a Constituição criou para essas propostas serem compulsòriamente aprovadas e nos têrmos nela sugeridos, salvo em um caso, como vimos. Os privilégios de direito estrio. As propostas são como as preliminares vencidas nos recursos judiciários. Nos recursos ordinários e extraordinários, vencida a preliminar de sua admissibilidade, os tribunais entram a julgar os feitos em tôdo seu mérito. É privativo dos órgãos do Poder Judiciário a iniciativa das leis mencionadas na Constituição. É privativa do presidente da República a iniciativa de certas leis. Iniciada, porém, a lei com a proposta, nenhuma restrição há para os poderes incumbidos da aprovação e da promulgação da lei para aprová-la, tal como vem, para modificá-la, restringi-la, ampliá-la, emendá-la, ou para desaprová-la, ou se aprovada pelo Legislativo ser vetada pelo Poder Executivo.

12. As iniciativas de leis concedidas a órgãos de outros poderes, diferentes do Poder Legislativo, são da mesma natureza que as iniciativas dos próprios membros do Poder Legislativo e nos trâmites para se tornarem leis, não têm nenhum privilégio para deixarem de sofrer as mesmas modificações, alterações, emendas subemendas a que as iniciativas do Poder Legislativo e do Poder Executivo estão submetidas, inclusive veto.

13. Dar o direito de iniciativa de leis a órgãos diversos do Poder Legislativo não significa que a Constituição simplesmente deseje ver que o projeto, vindo do Executivo ou do Judiciário, seja discutido no Legislativo, na expressão de LABAND (“Le Droit Publique de l’Empire Allemand”, vol. II, not. I, pág. 294).

“D’ailleurs, pour que le Bundesrath envite le Reichstag à donner son assentiment au projet présenté, suppose que le Bundesrath est d’accord avec lui pour le fond et non seulement qu’il desire voir le projet discuté au Reichstag”. A Constituição não retirou do Congresso Nacional o direito de entrar no mérito do caso, modificá-lo, aprová-lo, desaprová-lo, acrescentá-lo, sempre no uso do seu direito de legislar.

Direito de emenda e direito de iniciativa

14, O direito de emenda não é consectário do direito de iniciativa. São direitos distintos. A retirada da do direito de iniciativa não significa que fique retirado o direito de expenda. Pode ser concedido a outro poder que não o Legislativo o direito de iniciativa, sem lhe conceder o direito de emenda. E tal ocorre com os projetos enviados pelo Poder Executivo e pelo Poder Judiciário. Pode ser concedido o direito da iniciativa a outro, órgão do govêrno com a retirada do poder de emenda do Congresso. E tal ocorre com o supracitado caso do art. 113 da nossa Constituição de 1946. Se a Constituição não retirou o direito de emenda, esta continua na posse do Poder Legislativo.

O direito de iniciativa, escreve DUGUIT (“Manuel de Droit Constitutionnel”, pág. 428), pertencente aos deputados e senadores compreende naturalmente o direito de emenda, quer dizer o direito de propor modificações parciais aos projetos do govêrno ou às proposições parlamentares.

15. Direito de iniciativa e direito de emenda são dois direitos existentes, se bem que afins. A iniciativa é para trazer o projeto, a emenda é para alterá-lo. “Al diritto d’intziativa è per molto affine il diritto di emendamento, anzi il primo include in secondo”, diz-nos MICELLI (ob. cit. pág. 791), o que significa que não é a existência do primeiro que dê lugar ao segundo, pois o segundo pode existir sem o primeiro.

O direito de emendar tornou-se de relevância quando o direito de iniciativa passou do Poder Legislativo para o Executivo, como já notou WIGNY e acima o citamos. É uma imprescindível conseqüência do direito de discussão. “Esso è peraltro sempre considerato com una imprescindibile conseguenza del diritto di discussione delle legge e, sotto questo aspetto, ha maggiore importanza del diritto d’iniziativa”, acentua MICELLI (ob. cit, pág. 792).

Sem o pleno exercício do direito de emendar não poderia ter lugar e não teria significação uma discussão da lei nas suas várias partes, escreve FEDERICO MOHRHOFF (“Trattato di Diritto e Procedura Parlamentare”, pág. 192).

A iniciativa se diferencia da emenda no ponto em que a emenda se aplica a um projeto de lei já existente, diz MOHRHOFF, (ob. cit., pág. 319).

16. Não se pode dizer, pois, que só quem tenha a iniciativa é quem possa oferecer emendas, eis que o presidente da República tem o direito de iniciativa, mas não tem o direito de oferecer emendas ao seu projeto. Fêz êsse assunto objeto de importante parecer do eminente deputado OSVALDO TRIGUEIRO, aprovado pela Comissão de Justiça da Câmara dos Deputados, conforme está publicado no “Diário do Congresso Nacional” de 13 de julho de 1953, pág. 5.391. Aí se declarou que o projeto enviado por mensagem do Executivo não pode mais ser modificado por outra mensagem, mas por emenda apresentada por qualquer deputado.

O mesmo ocorre com os projetos enviados, dentro de sua competência, pelos órgãos do Poder Judiciário.

17. Paralelamente, por não ter a Constituição retirado do Poder Executivo o direito de veto para as propostas de lei do Poder Judiciário, não há violação da harmonia dos poderes quando o presidente ou o governador veta uma lei que aprove proposta do Poder Judiciário.

Decidiu o egrégio Supremo Tribunal Federal que não fere o princípio da Independência e harmonia dos poderes o fato do governador vetar uma lei da Assembléia Legislativa que aprovara proposta feita pelo Tribunal de Justiça. O relator foi S. Ex.ª o Sr. ministro RIBEIRO DA COSTA. Foi adotado o voto do eminente desembargador TEODOMIRO DIAS, do Tribunal de Justiça de São Paulo. O caso fêz objeto do recurso extraordinário nº 25.601 e está publicado no “Arq. Judiciário”, vol. 115, pág. 41.

Dizer que a quem falta o poder de iniciativa, falta o poder de emendar é, datavenia, confundir impulso inicial para formação de lei – iniciativa – com a decisão final de aprovação dessa lei discussão. “Indudablemente“, diz-nos CARRÉ DE MALBERG (ob. cit., pág. 354), la iniciativa es una operación, esencial del procedimiento legislativo, ya que éste sólo puede iniciarse por cuanto que las Cámaras han sido llamadas a examinar un texto, y es evidente también que, para ser adotada, la ley ha de ser antes propuesta. Incluso es posible que las proposiciones hechas a las Cámaras se impongan a éstas, en el sentido de que han de tomarlas en consideración y deliberar sôbre ellas. Tal es el caso actualmente, en virtud de la misma Constitución, de los proyectos presentados por el gobierno. Sin embargo, es incontestable que la iniciativa no es un acto de decisión legislativa, sino que solamente de impulso a la labor de la legislación; por indispensable que sea solo constituye una condición preliminar de la formación de la ley y no parte integrante de su adoción”.

18. Ante o exposto, as conclusões parecem evidentes. Não se confunde o direito de iniciativa de leis com o direito de emendar projetos de leis. Iniciativa é o direito da apresentar proposições escritas para se tornarem leis. Emendar é o direito de modificar essas proposições. No direito de iniciativa, concedido aos membros do Poder Legislativo, está incluído o direito de emendar. O direito de iniciativa concedida a órgãos estranhos no Poder Legislativo não inclui o direito de emendar. O direito de emendar é inerente ao direito de discutir, salvo disposição constitucional em contrário. Emendar projetos de leis iniciados pelo Poder Executivo ou pelo Poder Judiciário não é fato que contrarie o princípio da harmonia e independência dos Poderes, assim como não infringe êsse princípio o direito de veto exercido pelo Poder Executivo com relação a alguma lei que adote proposta do Poder Judiciário. O direito de emenda de projeto do Poder Judiciário foi retirado do Poder Legislativo em um único caso na Constituição, o do art. 115. O poder de veto foi retirado pela Constituição sòmente para aquêles casos que não contravenham os interêsses nacionais ou estaduais e não sejam inconstitucionais.

19. São constitucionais, portanto, as emendas com as quais as Assembléias Legislativas dos Estados aprovem as propostas dos Tribunais de Justiça respectivos para alteração das leis de divisão e organização judiciárias. Nada na Constituição torna privilegiadas as iniciativas do Poder Judiciário, tornando-as insuscetíveis de modificações ou adicionamentos. São as iniciativas dos órgãos judiciários da mesma natureza que as iniciativas de leis dos congressistas e do presidente da República. Sofrem elas, como estas, as contingências do amplo e irrestrito estudo dos poderes incumbidos da legislação, o Poder Legislativo e o Poder Executivo.

Superfetação do Poder Executivo o que se pede com a adoção da delegação de poderes, superfetação do Poder Judiciário o que se pretende com a interpretação coativa da proposta que faça para as leis de que tenha a iniciativa, é por essa e por outras que os adversários do Poder Legislativo proclamam sua inutilidade.

20. É constitucional a lei do Estado do Paraná que, ao discutir certa proposta enviada pelo Tribunal de Justiça, para alteração da Lei doe Organização Judiciária do Estado, acrescentou, por meio de emenda que as comarcas de três ou mais de três varas passavam a ser de quarta entrância.

João de Oliveira Filho

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  5. O(s) nome(s) do(s) autor(es) e sua qualificação devem estar no arquivo do texto, abaixo do título;
  6. As notas de rodapé devem ser colocadas no corpo do texto.

II) Normas Editoriais

Todas as colaborações devem ser enviadas, exclusivamente por meio eletrônico, para o endereço: revista.forense@grupogen.com.br

Os artigos devem ser inéditos (os artigos submetidos não podem ter sido publicados em nenhum outro lugar). Não devem ser submetidos, simultaneamente, a mais do que uma publicação.

Devem ser originais (qualquer trabalho ou palavras provenientes de outros autores ou fontes devem ter sido devidamente acreditados e referenciados).

Serão aceitos artigos em português, inglês, francês, italiano e espanhol.

Os textos serão avaliados previamente pela Comissão Editorial da Revista Forense, que verificará a compatibilidade do conteúdo com a proposta da publicação, bem como a adequação quanto às normas técnicas para a formatação do trabalho. Os artigos que não estiverem de acordo com o regulamento serão devolvidos, com possibilidade de reapresentação nas próximas edições.

Os artigos aprovados na primeira etapa serão apreciados pelos membros da Equipe Editorial da Revista Forense, com sistema de avaliação Double Blind Peer Review, preservando a identidade de autores e avaliadores e garantindo a impessoalidade e o rigor científico necessários para a avaliação de um artigo.

Os membros da Equipe Editorial opinarão pela aceitação, com ou sem ressalvas, ou rejeição do artigo e observarão os seguintes critérios:

  1. adequação à linha editorial;
  2. contribuição do trabalho para o conhecimento científico;
  3. qualidade da abordagem;
  4. qualidade do texto;
  5. qualidade da pesquisa;
  6. consistência dos resultados e conclusões apresentadas no artigo;
  7. caráter inovador do artigo científico apresentado.

Observações gerais:

  1. A Revista Forense se reserva o direito de efetuar, nos originais, alterações de ordem normativa, ortográfica e gramatical, com vistas a manter o padrão culto da língua, respeitando, porém, o estilo dos autores.
  2. Os autores assumem a responsabilidade das informações e dos dados apresentados nos manuscritos.
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  4. Uma vez aprovados os artigos, a Revista Forense fica autorizada a proceder à publicação. Para tanto, os autores cedem, a título gratuito e em caráter definitivo, os direitos autorais patrimoniais decorrentes da publicação.
  5. Em caso de negativa de publicação, a Revista Forense enviará uma carta aos autores, explicando os motivos da rejeição.
  6. A Comissão Editorial da Revista Forense não se compromete a devolver as colaborações recebidas.

III) Política de Privacidade

Os nomes e endereços informados nesta revista serão usados exclusivamente para os serviços prestados por esta publicação, não sendo disponibilizados para outras finalidades ou a terceiros.


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