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REVISTA FORENSE 151

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10/06/2022

REVISTA FORENSE – VOLUME 151
JANEIRO-FEVEREIRO DE 1954
Semestral
ISSN 0102-8413

FUNDADA EM 1904
PUBLICAÇÃO NACIONAL DE DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E LEGISLAÇÃO

FUNDADORES
Francisco Mendes Pimentel
Estevão L. de Magalhães Pinto,

Abreviaturas e siglas usadas
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CRÔNICAcapa revista forense 151

DOUTRINA

PARECERES

  • Comissão parlamentar de inquérito sôbre as atividades da comissão central de preços – Castilho Cabral
  • Instituto de resseguros do Brasil – Autarquias e sociedades de economia mista – Carlos Medeiros Silva
  • Governador – Impedimento – Ausência – Substituição temporária – Competência do Poder Legislativo para regulamentar os preceitos constitucionais – Francisco Campos
  • Governador – Licença para ausentar-se do Estado – Poderes da Assembléia Legislativa para definir impedimentos – Substituição – Renato Barbosa
  • Falência – Compensação de dívidas – Luís Machado Guimarães

NOTAS E COMENTÁRIOS

  • Privilégios e imunidades dos organismos internacionais – Hildebrando Accioly
  • Responsabilidade civil no Código brasileiro do ar – Prescrição da ação – Alcides de Mendonça Lima
  • Capacidade para testemunharem o testamento cerrado os membros da administração da instituição ou fábrica legatária – Raul Floriano
  • O conceito de parte no processo – Homero Freire
  • A revisão judicial e a “Lei Maior” – Edward S. Corwin
  • As certidões e as comissões de inquérito – Oto Prazeres
  • Homenagem ao juiz José de Aguiar Dias
  • Prêmio Teixeira de Freitas
  • Discurso de agradecimento do Ministro Carlos Maximiliano
  • Banco do Brasil S.A. – Sua transformação em êmpresa pública – Bilac Pinto

BIBLIOGRAFIA

JURISPRUDÊNCIA

LEGISLAÇÃO

SUMÁRIO: 1. Bipolaridade do homem, sociedade e ordem jurídica. 2. Constituição e Estado. 3. Imutabilidade, permanência e mutação das normas constitucionais. 4. Reforma constitucional e Democracia de nova estrutura. 5. Separação dos poderes a entrelaçamento das funções. 6. Origem das Comissões Parlamentares de inquérito e sua contemplação nas Constituições de vários países. 7. Fundamento e finalidade das Comissões Parlamentares de Inquérito. Moralização do Direito. 8. Necessidade de novas técnicas para aperfeiçoamento do sistema democrático. 9. Autonomia das Comissões Parlamentares de Inquérito e a natureza de sua representação do Congresso. 10. Ação das Comissões Parlamentares de Inquérito. Competência e atribuições. Forma de processo, inquirições e diligências. Limitações. Lei nº 1.579. 11. Crimes perante e contra as Comissões Parlamentares de Inquérito. Crimes contra o livre exercício das atribuições de seus membros. 12. Direito Parlamentar e a temporariedade das Comissões de Inquérito. 13. Comissões de Inquérito perante as Constituições dos Estados-membros. 14. O Município e as Comissões de Inquérito. 15. Comissões Especiais. Crimes de responsabilidade, seu processo e julgamento.

Sobre o autor

Ivair Nogueira Itagiba, Advogado no Distrito Federal

DOUTRINA

Aperfeiçoamento do Estado Democrático

1. Bipolaridade do homem, sociedade e ordem jurídica

Há uma bipolaridade no homem. Ele não se basta. É, a um tempo, ser individual e ser social. Desdobra-se-lhe a vida nesses dois aspectos, exigindo a dupla face de govêrno de si mesmo e de govêrno coletivo.

Não lhe são suficientes deveres para consigo próprio. Indivíduo biológico, ou seja, animal sub-humano, que dependa e viva da natureza, só por exceção poderá existir.

Efetiva-se a natureza humana, quando o indivíduo se socializa. É o momento em que se torna em pessoa, o instante em que cria valores, a ocasião em que passa a participar da vida do grupo, cuja cultura ajuda elaborar, ou conservar.

A vida em grupo corresponde a uma necessidade natural do homem. Só a sociedade lhe possibilita a existência material e racional. Como socius, como zoon politikon da expressão aristotélica, como animal que se agrupa e vive em sociedade, não pode deixar de ter consciência de seus deveres para com o próximo (IVAIR NOGUEIRA ITAGIBA, “Do Homicídio”, ed. “REVISTA FORENSE”, Rio, 1945, págs. 11 a 13 da Introdução).

Para ser possível a coexistência dos homens, é imprescindível o estabelecimento da ordem jurídica. Sem o complexo de normas, destinadas a fixarem uma medida e uma proporção de reciprocidade nos poderes e nos deveres atribuídos aos homens, com regulamentação das condições existenciais e evolucionais dos indivíduos e grupos sociais, sem o reconhecimento de um sistema de fatos, sem a adoção de normas de organização, sem a sanção, em síntese, das regras do Direito, separadas dos princípios éticos, mas nêles fundados e por eles inspirados, a sociedade não passaria de um sonho, irrealizável na prática.

Vem ao propósito notar que o essencial ao Direito não é a coação. Não é a possibilidade de se obrigar o cumprimento, da norma legal pelo emprêgo da fôrça, da violência física, o de que necessita o Direito. O que é imprescindível é a segurança de sua efetividade. O que importa é que a norma traga em si a garantia de sua observância, de seu cumprimento regular. O que, em suma, é indispensável no Direito é a segurança jurídica.

A ordem jurídica é complexa. Integra-se de duas espécies de normas: normas de procedimento, tipicamente exigíveis, fixadoras da maneira dos homens se conduzirem em suas mútuas relações, isto é, do que devem, fazer e omitir, e normas de organização, determinadoras, para os casos e situações concretas, das normas específicas de procedimento, bem assim das condições em que, segundo BURKHART (“Die Organisation der Rechtsgemeinschaft”, Zurique, 1944, pág. 134), devem ser declaradas, aplicadas e executadas.

Está bem visto que a norma de procedimento se distingue da norma de organização. Todavia, elas coexistem. Uma não prescinde da outra. Sòmente tomam sentido, quando se entrosam. Elas se buscam, e se unem, e se inteiram, unificadas na ordem jurídica, que, na sua expressão estrutural, só há de ser considerada como totalidade. Como totalidade, sim, pois nenhuma de suas partes tem sentido ou expressão sem referência às demais.

2. Constituição e Estado

A Constituição integra necessariamente a totalidade da ordem jurídica. Porque nela se contém normas organizadoras, que outra coisa não é senão a ordem de competências, em observância das quais se criam normas de procedimento, isto é, o restante do Direito, e se assegura seu pleno vigor. Inexistindo normas de organização, expressas e consubstanciadas na Constituição, não há cogitar-se de normas de procedimento, que pressupõem as primeiras.

Por isso mesmo, dentro do ângulo de visualização em que se colocam vários constitucionalistas, dando-lhe uns maior elasticidade de conteúdo, diferençando-lhe outros elementos que a formam numa unidade dialética, é a Constituição havida por fundamento de tôda a ordem jurídica. Chama-lhe KELSEN (“General Theory of Law and State”, trad., Cambridge, 1945) norma fundamental da qual se origina o resto da ordem legal. BURKHARDT (ob. cit.) tem-na por lei suprema, por ponto de Arquimedes da legalidade estatal. ESMEIN (“Eléments de Droit Constitutionnel, Français et Comparé”, Paris, 1927, tomo I) ressalta-lhe a expressão de pedra angular da ordem jurídica, indicando o Direito Constitucional como pressuposto de todos os outros ramos do Direito. STIER-SOMLO (“Verfassung, Verfassungsrecht”, em “Handwoerterbuck”, Berlim, 1929) nela não vislumbra senão o ordenamento jurídico fundamental do Estado, escudado na.estrutura política e social da comunidade.

Pelo aspecto polêmico, pela pluralidade de elementos a considerar, pela conexidade com os diversos campos da vida humana, relacionada com a realidade política, econômica, jurídica, sociológica, não é fácil a formulação, numa síntese que satisfaça, do conceito de Constituição. O problema traz perplexidade pelo caráter polifacético, que assume.

No conceito racional normativo, a Constituição é um sistema de normas. Não nasce de decisões parciais, tomadas à medida dos acontecimentos e de situações novas. Surge de um esquema de organização, fixado de uma só vez, no qual se concentra a vida do Estado, e se reúnem todos os casos particulares possíveis. Tem-se a Constituição, destarte, por um complexo normativo, instituído por fôrça de um ato único e total, em o qual se traçam e se demarcam, sistemática e exaustivamente, as funções estatais, regulando os diversos órgãos, a esfera de sua competência, de suas relações de interdependência.

Se se atentar na conceituação historicista, ver-se-á que a Constituição de um povo não é ditada pela razão, mas resultado de lenta transformação histórica pela intervenção de motivos irracionais e fortuitos, de impossível redutibilidade a um esquema. Constitui-se de atos parciais que espelham situações concretas, assim como de usos e costume, de origem imprecisa e formação demorada. E que, na frase de HUMBOLDT, “a razão é capaz de plasmar a matéria existente; porém jamais de criá-la” (“Ideas sobre el Régimen Constitucional”, trad., México, 1943, pág. 78).

O conceito sociológico da Constituição se contrapõe às conceituações da normatividade e do racionalismo. A Constituição pela tese do sociologismo é a representação da imanência das situações e estruturas sociais do presente. Explica-se, dêsse modo, o conceito de SISMONDI dado à Constituição: “Maneira de existir de uma sociedade, de um povo ou de uma nação” (“Estudios sobre la Constitución de los Pueblos Livres”, trad., Madri, 1943, pág. 12). Por essa teoria, a estrutura política de um povo, retratada na Constituição, é fotografia de infraestrutura social, a sistematização da realidade social, subjacente.

Os três tipos de concepção jurídica têm enquadramento nestes conceitos de CARL SCHMITT: “Normativista, decisionista e de ordem concreta” (“Teoria de la Constitución”, trad., Madri, 1934). A teoria schmittiana do decisionismo radical, posta à margem mais tarde pelo próprio jurisperito germânico, assentou a Constituição em decisões fundamentais, porque, a seu aviso, o Direito é vontade e não razão; é decisão e não norma. Pontificou ser a Constituição ato do Poder Constituinte, de uma vontade política preexistente, de um momento de decisão, que resolve sôbre a forma e o modo de unidade política. Esta unidade se identifica com a realidade existencial, que a Constituição se cinge a fixar numa estrutura política concreta. Traduz-se o pensamento de SCHMITT no fato da unidade de um Estado não se escudar nos artigos da Constituição e na sua validade, mas sôbre a existência política do povo, a que o Estado serve.

O institucionalismo de MAURICE HAURIOU (“Précis de Droit Constitutionnel”, Paris, 1929) indica a Constituição como parte integrante de uma ordem superior, que é a ordem constitucional. Há, ao demais, princípios superiores à Constituição escrita, que constituem a legitimidade constitucional. Diferençando o Direito da Constituição das instituições constitucionais, distingue o Estado da Sociedade. A Constituição política do Estado, no seu entender, abrange a organização e funcionamento do govêrno, além da organização da liberdade política, que é a participação dos cidadãos na governança; a Constituição social compreende as liberdades individuais, em que se funda a estrutura da Sociedade civil e as instituições sociais espontâneas, destinadas a servirem e protegerem as liberdades civis e suas atividades.

Em sua teoria do ordenamento jurídico, SANTI ROMANO (“Scritti Minori”, Milão, 1950, vol. I) adverte que uma instituição é entidade ou corpo social, com unidade firme e permanente, com existência objetiva, concreta, exterior, com organização que absorve parte dos elementos formadores de sua estrutura. Por si só, tôda instituição é ordenamento, como todo ordenamento jurídico é instituição. O Direito é norma. Antes de ser norma, é organização ou coro social. E o corpo social que transmite à norma, como seu produto, o caráter jurídico. O Estado é ordenamento jurídico; a Constituição, pedra fundamental dêsse ordenamento. Não há distinguir Constituição jurídica de Constituição extrajurídica. É o não-senso falar-se em Estado desprovido de forma jurídica, pois o Direito é imanente a tôda organização política. A negação única possível de Constituição será a anarquia.

Sem embargo dessa pluralidade de doutrinas e conceitos, não há dúvida, nem entre-dúvida, que as normas de organização se inserem na Constituição, a determinarem a validade das normas restantes. Eis por que não sòmente a totalidade da ordem jurídica, bem assim da atividade estatal, se esteia nos preceitos da Constituição.

O Estado é uma unidade de poder, que transforma os conteúdos de natureza jurídica, sociológica, econômica, ideal, numa síntese dialética, numa unidade múltipla. A organização do Estado, dos poderes públicos, faz-se segundo regras e princípios expressos em preceitos constitucionais. Onde há Estado, há de haver Constituição. A vida do Estado é o próprio conteúdo da Constituição. A primeira é, iniludìvelmente, viva expressão da unidade e inconcussa afirmação da existência do segundo. Pode suceder que a organização do Estado não se exaure na Constituição; esta, todavia, pressupõe e fundamenta aquêle.

O Estado não é barreira granítica, nem expressão algébrica. É um fato, um ser vivente, dinâmico e evolutivo (IVAIR NOGUEIRA ITAGIBA, “Religião da Justiça Humana”, Rio, 1945). Sua unidade não é unidade estática. Nas suas constantes há momentos de permanente renovação.

O Estado, conseguintemente, vive de suas funções. Exercer funções é exercer o poder. E o exercício do poder se faz com obediência aos preceitos jurídicos constitucionais. A Constituição é, pois, a estrutura jurídico-política do Estado.

3. Imutabilidade, permanência e mutação das normas constitucionais

Pensou-se que uma Constituição pudesse constituir obra sempiterna. As leis fundamentais ou leges imperii, surgidas na era absolutista da França, continham normas invioláveis e imutáveis, de índole constitucional. Referindo-se ao exercício e à transmissão da prerrogativa real, revestiam-se de cunho formal, não sendo lícito ao soberano aboli-las, ou ab-rogá-las.

O jusnaturalismo racionalista do século XVIII, fundado no pressuposto filosófico-político da imutabilidade e universalidade da razão, vinculado à doutrina do pacto social originário, firmou, sob a exigência do consensum omnium; a regra incondicionalista e ultra-radical de serem absolutamente imutáveis as normas constitucionais. A imutabilidade levaria consigo a injustiça, impedindo que a Constituição, identificada como instrumento do processo material e espiritual, traduzisse as supremas aspirações dos grupos e da pessoa humana.

Equacionando a vida social, é contingente e variável a natureza do Direito. Porque no tempo e no espaço são incessantemente variáveis as ações, reações, relações e conflitos que constituem seu objeto. Não pode, em conseqüência, ser imune à evolução e às exigências sociais. Não é motivo para estranheza o drama da luta do Direito contra o Direito, a que se refere HANS FEHR (“Die Tragik in Recht”, 1945), quando, pelo embate das necessidades, pela colisão de princípios, pela precisão do próprio grupo humano, o Direito costumeiro é desbancado pelo Direito legal, o municipal pelo federal, as normas antigas pelas modernas.

Imutabilidade, não; permanência, sim. A estabilidade é atributo da Constituição. Em sendo fundamento da ordem jurídica e da organização estatal, é de mister tenha ela firmeza e permanência, para atingir os fins e cumprir a missão, a que é destinada.

Nem a variabilidade excessiva, que ocasiona a transformação constante, nem tampouco a imutabilidade, que perpetua erros e defeitos prejudiciais. O critério justo é o da permanência, o da superiegalidade constitucional, em que a Constituição tem dois momentos – um, o momento estático na vida do Estado; outro, o momento dinâmico na administração.

BRYCE (“Les Democracies Modernes”, Paris, 1924) apresenta dois tipos de Constituições: flexível e rígida. A primeira, elástica, fluída, dinâmica, móvel, está sujeita a permanentes modificações, pois, originando-se da mesma fonte das leis ordinárias, pode ser anulada, reformada, substituída pelo mesmo processo da feitura das leis comuns; a rígida, fixa, cristalizada, estacionária, derivando de fonte diversa das leis ordinárias, só pode ser revista, modificada ou ab-rogada por órgão e métodos diferentes.

Na atualidade, Constituição rígida, escrita ou não-escrita, não participa do característico de imutabilidade. Obra da objetividade, é representação jurídico-política da existência estatal. condicionada á solução dos problemas sociais, culturológicos, econômicos, ideológicos da convivência. Nessa conjuntura, ou se procede à sua reforma formal, ou se busca a adequação de seus preceitos às exigências e necessidades novas. Sôbre a Constituição a vida passa permanentemente, imprimindo à superlegalidade constitucional traços e marcas indeléveis da realidade político-social.

As Constituições do passado eram de normatividade quase total. Haja vista a Constituição do Brasil, de 1891. As Leis Maiores da modernidade se acentuam pelo aspecto programático de um sem número de preceitos. Há normas de pronta incidência. São regras bastantes em si, cogentes, exaustivas, self-executing, self-acting, self-enforcing. Outras há de conteúdo programático, ou dependentes de regulamentação. Dispondo-se sôbre regras programáticas, ou legislando-se sôbre regulamentação, o legislador não atua arbitràriamente. Atende a preceitos constitucionais. Sem malferir ou derrogar princípio fundamental, é lícito a êle criar normas jurídicas, de complementação constitucional.

É esta uma via de penetração do processo ordinário na estrutura constitucional. Existem outras. Opera-se a mutação pela interpretação dos conteúdos e têrmos das regras constitucionais. É de mister não se deslembrar que, dentre os processos interpretativos, pode o hermeneuta empregar, com alto senso de equilíbrio, o teleológico, o evolutivo-sociológico, que busca o sentido, o alcance, a finalidade da norma, posta em consonância com a realidade da vida. Tal processo não exprime demagogia, tecnicismo lógico, nem preterição da norma legal (IVAIR NOGUEIRA ITAGIBA, “A Família”, Rio, 1941).

Vem a talho a transcrição dêstes trechos: “As relações humanas e as sociedades não existem em função da lei. A lei é condição de sua existência simultânea. É técnica de organização da vida no quadro da coexistência social. É processo de adaptação aos fatos humanos, de ajustamento às necessidades sociais, de acomodação ao caso em espécie. O homem, a sociedade e o caso concreto não devem adequar-se à lei. A lei tem razão de ser quando a êles se adapta. Se a sociedade toma nova direção, o direito deve ser a rosa dos ventos, que lhe marca o rumo, a fim de evolver e orientar-se no sentido da realidade mutável e exigente. Quando a lei não segue êsse norte, não se deve proscrever a realidade. Há mister, então, de sangrar-se o texto, para dêle se extrair o direito compatível com a objetividade e a evolução. Urge fazer rebrotar do velho e rugoso tronco da lei novas vergônteas, e talhar, com perfeição de técnica, na palpabilidade do caso concreto, as linhas artísticas do pensamento justo. Dar vida e dinamismo ao Direito, curar-lhe as lesões, desencerrar a norma de seu autocracismo, fazer obra de higiene jurídica, estabelecer o postulado da justiça humana, pôr o justo real em posição superior ao justo legal, transmudar o pessimismo de um BELTRAND DE LA SALLE na confiança da arte, do bom e do eqüitativo, atender-se às exigências do bem-comum, obedecer-se aos fins sociais da regra legal, visar-se aos costumes, satisfazer-se ao direito científico ou filosófico com visão sociológica, dentro da cultura ética, social e política, tudo isso deve orientar o intérprete e o aplicador da norma” IVAIR NOGUEIRA ITAGIBA, “O Pensamento Político Universal e a Constituição Brasileira”, Rio, 1948, II).

Vale notar que o juiz nos Estados Unidos tem duplo poder de indagação dos princípios constitucionais, exercitando-o pelo método exegético da construction e da interpretation. A interpretation, de caráter eminencialmente jurídico, está ligada à regra escrita, e tem por fito a pesquisa no sentido gramatical da palavra, a elucidação da frase, o esclarecimento da proposição. Pela construction, o juiz, na frase de FREUND, se torna the judge-made-law, na função que lhe benfadou a graça divina de complementar o texto e de dar vida à lei.

A Constituição americana, ora é Interpretada, mediante a procura do texto em si e nas suas relações com outros textos, ora é construída, segundo o método de ROSCOE POUNI) (“An Introduction to the Philosophy of Law”), conforme o critério da escola sociológica, consoante o método fundamentalmente político (WOODBURON, “The American Republic and its Government”, 1916), mediante o qual o intérprete, deixa o domínio do puro Direito formal, e busca nas realidades sociais e nos imperativos do interêsse público o sentido de mais perfeita eficiência do regime. É fora de dúvida que a Constituição americana é obra pretoriana da Côrte Suprema.

Insta dizer que a palavra nem sempre expressa com fidelidade o pensamento. Dá-se-lhe sentido restrito; usam-na muitos na acepção lata; em certos casos sua significação é técnica; costumam empresá-la com o significado comum; preferem uns aceitá-la no sentido vulgar, próprio, etimológico: têm outros predileção à sinonímia figurada. Só a língua morta, como o sânscrito, o latim, o grego, o eslavo antigo, poderia ser usada para expressar normas com conteúdo fixo e imutável. Nas línguas vivas criam-se palavras novas e as usuais são integradas de novos pensamentos (IVAIR NOGUEIRA ITAGIBA, “Indelinqüência e Responsabilidade”, Rio, 1942). No Direito Constitucional, para confirmação da regra, não é preciso mais do que notar a variedade de sentido, o conteúdo diverso que hão tido as palavras igualdade e liberdade.

Finalmente, a Constituição pode sofrer outras mutações, seja por uma prática política não regulada nos textos, e que não contravém com nenhum de seus dispositivos, seja pelo desuso de atribuições fixadas em normas constitucionais, que, embora escritas, deixam de ser praticadas.

A Constituição, com o caráter de permanência na vida do povo, para o qual foi promulgada, regula o conjunto, normativiza a totalidade, estabelece, enfim, os princípios, sôbre os quais assenta a estrutura do Estado e do Direito.

4. Reforma constitucional e democracia de nova estrutura

Não há Estado que possa escapar às modificações impostas pela lei da continuidade. Em cento e trinta e um anos de Independência, teve o Brasil cinco Constituições. A República substituiu a Monarquia; o regime unitário mudou no sistema federal; o parlamentarismo à inglêsa transformou-se no presidencialismo à americana.

A Lei Maior do Império e o Código Político republicano de 1891 não corresponderam ao espírito e ao caráter nacional. A primeira teria adequação à índole do povo inglês ou francês; o segundo, modelado na Lei das Leis estadunidense, serviria de alicerce ao ordenamento jurídico norte-americano. Nem uma, nem outra se ajustaram aos reclamos brasileiros.

A falta de conhecimento ou de consideração de nossos complexos culturais, das nossas tradições populares, dos nossos costumes, dos nossos modos de vivência ou folkways determinou o se haver impingido ao nosso povo um sistema de leis ou instituições, que se lhe opunham à índole. Os marginal men, da classificação de PARK, ditaram, e costumam ditar normas inadaptáveis ao nosso demos, na sua realidade objetiva. Esses marginais vivem entre a cultura de seu povo, que lhe forma o subconsciente coletivo, e a cultura européia, asiática ou americana, que lhe infunde idéias e diretrizes estranhas ao nosso meio. Cabe indubitàvelmente ao marginalismo grande soma de responsabilidade nos erros políticos do país.

A Constituição de 1934 morreu do mal de origem. No seu singular ecletismo, sem técnica legislativa e sem unidade de doutrina, crivada de postulados bebidos em teorias políticas de após-guerra, inovou a matéria de competência de poderes, dando ao Senado, tornado em poder político privilegiado, parecias de atribuições cabíveis nas órbitas do Judiciário e do Executivo.

A Outorga de 1937 buscou o unitarismo, restringindo a esfera federalista. A supercentralização do poder importou a adoção do presidencialismo forte, ao revés da Constituição de 1934. Esse sistema presidencialista investiu o presidente da República nos poderes Moderador e Executivo. O regime era representativo. Mas o detentor do Poder, antes de legitimar à Outorga para, mediante plebiscito, a tornar em Carta Constitucional desatendeu aos seus cânones, pô-la à margem, e criou um regime ditatorial, passando, como Poder Político único, a cumular funções governativas, administrativas, legislativas, com intervenção no Judiciário, para lhe invalidar julgamentos. A Outorga de 1937 não criou o arbítrio. Mas, ao seu lado, adensou-se a ditadura. A Outorga era o próprio detentor do governo, que se presumia representante supremo e único do país.

A centralização monárquica assegurou a unidade nacional. Ou por motivo de coerência com os ideais republicanos, ou pelo desejo de manutenção dos feudos oligárquicos ou políticos provinciais, os constituintes de 91 propenderam para o federalismo, para a autonomia do Estado-membro, para a descentralização administrativa. A orientação unitária de 34 extremou-se no unionismo da Outorga de 37.

A Constituinte de 1946 formou uma consciência contrária ao fortalecimento do federalismo institucional. A mentalidade política da maioria inclinou-se em pró do unitarismo e municipalismo. A União e o Município sobrepujaram as idéias anticentralizadoras. Restringiram-se poderes e prerrogativas dos Estados-membros; ampliou-se a competência da União; o Município ressurgiu fortalecido e prestigiado. O unitarismo e o municipalismo só tinham um caminho a seguir – o parlamentarismo. Entretanto, paradoxalmente venceu a fórmula presidencialista.

A Constituição de 46 tornou a União e o Município, como únicas realidades criadoras de riquezas e de energia, que o são, em verdadeiras estruturas da vida orgânica brasileira. É a razão por que fêz do Município uma entidade intraestatal tão rígida quanto o Estado-membro.

Nas linhas gerais adotadas, a Constituição de 48 exprime a média das aspirações populares. É o louvor que se lhe não há de regatear. Jamais se dirá que a perfeição nela se concretizou. Sua revisão se impõe. Há reparos a opor-lhe à técnica, que se não amplia aos processos mais modernos. Pertence ela, sem exageros, a uma época passada, a um mundo agonizante. Está antedatada ao espírito de seu tempo. É que insistiu em demasia na índole conservadora da burguesia esclarecida. Acrescente-se-lhe, ao demais, o desgabo de haver introduzido no próprio texto grande cópia de disposições de leis ordinárias e de regras casuísticas e regulamentares, que lhe quebram as linhas recomendáveis a obras dêsse tipo.

Reformá-la é necessidade do momento, para que não tolha os movimentos de concórdia, as fórmulas de paz, a união entre os cidadãos, as exigências sociais, as precisões históricas nacionais, e para que se transforme em instrumento do poder popular na efetivação do progresso material, moral e intelectual.

Há hierarquias de diferentes níveis de normas. O ponto mais alto na graduação do ordenamento jurídico é a Constituição. Se a sua reforma é providência urgente, aquelas normas, códigos, leis e regulamentos estão igualmente exigindo profundas e radicais transformações.

É de mister que aproveitemos os ensinamentos da psico-sociologia, da etnografia, da sociologia do conhecimento, da culturologia, da economia, da sociologia educacional, das outras ciências sociais, extraídas do cadinho de nossa realidade, para, num confronto com os paradigmas de outros povos, obtermos a conciliação, a síntese desejada. Urge não adotarmos, sem mais sem menos, o que é exclusivamente alienígena, nem acolhermos utopias e abstrações. Quem legisla, não deve copiar figurinos estrangeiros, nem tampouco andar às aranhas em assuntos de tamanha relevância. O marginalismo é de todo o ponto prejudicial.

O que deve estar presente aos nossos olhos é a terra brasileira; é a coletividade brasileira; são os problemas geo-físicos, geo-econômicos, geo-políticos; é o homem, não como ser metafísico, subjetivo, mas como ser vivo, tangível; são as nossas possibilidades, as coisas em derredor, as nossas observações e as nossas experiências. Compete-nos acarear tudo isso com os princípios universais; comparar a nossa estrutura com a armadura democrática de outros povos civilizados; confrontar nossos erros com a boa técnica de outras administrações sérias; atentar nas novas concepções do Direito Público, do Direito Constitucional e do Direito Administrativo, sem se abstrair da nossa realidade emergente.

Com êsses elementos poder-se-á criar um Brasil brasileiro, num sistema democrático e administrativo aprimorado, que faça do país um dos mais poderosos pela prosperidade e pela fraternidade com todos os povos dos cinco continentes.

A realidade estatal de nossos dias reclama novo rumo, criação de novos valores, política de novo estilo, nova organização solidarista, a efetivação de uma estrutura compatível com as aspirações de uma vida mais elevada e mais digna para a humanidade. O que as comunidades humanas anseiam é a paz, a relativa tranqüilidade das massas, a instituição em que se proceda à eqüitativa distribuição da riqueza, em que se estabeleça a liberdade civil, individual, política, econômica, com base na dignidade humana, e em que se assegure a igualdade, não sòmente nos moldes da simples igualdade perante a lei, consoante quer o liberalismo, mas da igualdade de oportunidades, da igualdade de participação nos bens essenciais da vida.

Se para HEGEL o processo dialético histórico termina na monarquia pressuana; se para MACAULAY a plenitude dos tempos se concentra na monarquia constitucional britânica; se para MARX o processo histórico se conclui na sociedade sem classes, a verdadeira democracia, a Democracia política, social e econômica, que se quer e se deseja implantar definitivamente, em que pese aos maus dirigentes, é o processo de remoção de entraves e norteamento das atividades, para ser útil à vida e ao progresso das massas; é o método sadio que, em se afinando com o espírito, a vontade, a cultura e a consciência do país, propugna, no combate ao pauperismo, pelos meios de existência confortável; é o instrumento, sensível como as cordas da alma, que sente e resolve a tragédia anônima dos humildes; é a soma de energias, que se coordenam dentro das contingências da época, no sentido do bem geral; é o sistema ordenado, que busca a cada qual dar independência econômica relativa e lar; é o equilíbrio da balança para todos indistintamente; é a chave da solução dos problemas que se multiplicam neste binômio – terra e homem: é a segurança da liberdade, sem a qual inexiste a personalidade; é a rasoura que se destina a igualar as oportunidades; é o poder interventivo na esfera da economia para entroncar as atividades econômicas em prol do interêsse comum, e para proteger a iniciativa privada correta, que reverta em favor do bem coletivo; é a assistência, o direito previdencial, o trabalho, a educação para todos; é a constante investigação de tôdas as coisas sempre em benefício da tranqüilidade pública; é a fôrça dinâmica que tem o trabalho como honra e o bem-estar de todos como desígnio fundamental; é, em resumo, o processo de constante aperfeiçoamento (IVAIR NOGUEIRA ITAGIBA, “Pedaços do Cérebro e Pedaços do Coração”, Rio, 1954).

Não cremos nos Estados absolutistas da era do barrôco. Não cremos nos Estados totalitários dêste século, a que já se denominou século do subconsciente, pelo irracionalismo e pela indisfarçável influencia da psicanálise de FREUD. Não há Estados absolutistas, nem Estados totalitários. Há, sim, governantes despóticos e homens totalitários, que se supõem providenciais.

A oniciência e a onipresença dos super-Estados são enganos cegos das almas desprevenidas, arrastadas pelas miragens, que, muito de indústria, lhe apontam os inimigos do povo, desejosos de hibernar-se nas trevas das ditaduras. Regimes cesaristas nada edificam. A vaidade e a ambição do mando nada constroem. Nenhum mortal possui dom capaz de reproduzir o milagre da mitologia mosaica, qual o de arrancar do nada a massa ordenada do mundo.

O que é de mister é obter, é conseguir a conciliação pela qual sinceramente luta, não a falsa Democracia, a Democracia de fachada, a Democracia impinge-araras, mas a verdadeira Democracia, a Democracia que se radica na vida e se embebe na realidade, a Democracia política, social e econômica, “a form of government in whick the people rule, da definição de MUNRO (“The Government of the United States”).

Entre dois pólos – o comunismo, que é a ditadura econômica transformada em ditadura política, e o fascismo, que é a ditadura política gerada em ditadura econômica – a Democracia é a forma estatal em busca do bem e da relativa felicidade coletiva.

Entre duas doutrinas antitéticas – o nacional-socialismo, entranhadamente absorvente, superlativamente totalitário, e o liberalismo, repleto de fórmulas exauridas e seca, vergado sob princípios individualistas só conciliáveis com idéias de uma era vitoriana, que ficou muito atrás – a Democracia é sistema de base fundamentalmente econômica, que trata de se realizar por um processo harmonioso de continuidade, evitando os excessivismos ditatoriais e liberais, dentro de esferas administrativas de conciliação da ordem e da liberdade, da igualdade e da fraternidade.

Entre duas contradições – o teorismo, a abstração, o subjetivismo vago, o alheamento à realidade social do platonismo, e a observação direta dos fatos, a objetividade da vida social do pensamento aristotélico – a Democracia, no quadro de nosso tempo, é o equilíbrio na sua face dinâmica, é o ajustamento às condições nacionais de cada povo, a adaptação à época histórica.

Entre dois conceitos de polaridade diversa – a nossa cultura social e econômica, de formação extremada no individualismo familial ou de clã, e a cultura de outros povos, escudada em frágeis laços de solidariedade, em frouxos hábitos de cooperação – a Democracia, como fôrça “irresistível, poderosa e fatal”, da expressão de BARTHÉLEMY (“La Crise de la Democratie Contemporaine”, Paris, 1931), é o espírito do bem-comum, o sentimento de solidarismo, a preocupação do interêsse coletivo acima de qualquer outro.

Entre dois planos – o da unilateralidade de princípios e o do semiparcialismo de idéias – a Democracia, que não se embioca no conformismo, é a visão panorâmica dos fenômenos e das realidades sociais.

Entre dois aspectos – o das fórmula algébricas, lixas como a estrêla Polar, e o da verdade, a evolver como mera manifestação do pensamento – a Democracia é o dínamo, é a superação, é a procura da utilidade coletiva, é a verdade como ultrapassamento.

Entre duas idéias – sócio-econômicas e sócio-políticas, aceitas por êsse ou aquêle povo – a Democracia que, segundo JELLINEK (“Allgemeine Staalchre”, Berlim, 1922), repousa sôbre a posição da comunidade do povo como supremo órgão público, cuida de harmonizá-las na perfeita socialização da vida inter-humana.

Entre dois princípios – o da esquerda, que tem o fato econômico como infra-estrutura social, e do centrismo, que colocou na liberdade individual o fato-base – a Democracia considera o fato econômico como o ponto alto das nossas superestruturas, porque a subestrutura se encontra no homem, como ser social e moral, no fato da coexistência, na utilidade social, nas tendências vitais do grupo e do ser humano.

A Democracia, como realidade filosófica, sociológica e jurídica, visa à total garantia, da vida social, à segurança da dignidade do homem, à concessão da liberdade econômica. Para que o indivíduo não continue oprimido, vítima da exploração que o transforma em animal de trabalho braçal e cerebral, a Democracia peleja pela abolição dos privilégios de crença, raça, cor, nascimento e riqueza. Batalha a boa batalha para libertá-lo de todas as servidões, quer da servidão da ignorância, quer da servidão econômica.

O pensamento democrático é o do govêrno da maioria, com assento na igualdade e na garantia de tôdas as liberdades, assegurado às minorias o direito de representação, de fiscalização e de crítica. Antípoda do totalitarismo, é sistema em que todos os indivíduos participam indistintamente da direção do país; é método fundamentalmente pluripartidário, de liberdade de pensamento, de consciência e de crítica; é o govêrno da nação, o govêrno que vem do povo, se orienta pelo povo e se dirige para o povo.

O objetivo democrático, de oposição ao reacionarismo de estilização elevada à intransigência conservadorista, é o objetivo inovador, construtivo, de aperfeiçoamento, de atenção às exigências coletivas e de equilíbrio social.

A Democracia política, social e econômica é, em suma, o norte das aspirações da história no curso sempre crescente da prosperidade, da elevação moral, cultural, econômica e espiritual.

5. Separação dos poderes e entrelaçamento das funções

Se a CLAUDE SEYSEL, que, na “Grande Monarchie de France”, discorreu, em 1519, sôbre as limitações impostas ao rei pelos freios da religião, justiça e polícia; se a THOMAS SMITH, que, no “De Republica Anglorum, escreveu, em 1583, acêrca da organização política britânica; se a PUFENDORF, que, no “De Statu Imperii Germanic”, tratou, em 1667, da imprecisão e da falta de racionalidade dos pactos, capitulações e privilégios que transmudaram o Império em monstro político; se às suas obras se deve a origem do Direito Constitucional, a MONTESQUIEU, em “De l’Esprit des Lois”, cabe a glória de ter escrito, não um tratado pròpriamente dito de Direito Constitucional, mas o de haver, dentro do caráter polêmico de sua exposição, ordenado um sistema, criado esquemas fundamentais e indicado o funcionamento dos poderes.

A fórmula “le pouvoir arréte le pouvoir”, de MONTESQUIEU, tem atuação pragmática no pensamento político moderno e foi adotada na doutrina constitucional. É o poder limitando o poder, para que, aquêle que o detiver, dêle não abuse.

A clássica trilogia, apesar de sua artificialidade, como diria LASKI (“El Estado Moderno”, Barcelona, 1932), atravessa incólume as épocas. A divisão, ou separação da técnica política hodierna, ou distinção de poderes, como quer CARL SCHMITT no seu “Politische Theologie”, em Legislativo, Executivo e Judiciário, resistiu ao acréscimo do “pouvoir neutre”, da construção de BENJAMIM CONSTANT (“Cours de Politique Constitutionelle”, Paris, 1861), com a função específica de suavizar os embates entre aquêles três poderes.

Não há separação absoluta das funções estatais. Há inter-relações recíprocas. Na separação dos poderes existem linhas de conexão. O que se observa é a distinção dentro do equilíbrio. Os “checkes and balances”, da expressão americana, os limites constitucionais, fixam-lhe a congruência, a concordância, a regularidade, a justa relação. No movimento funcional de uns, penetra, sem exorbitações, mas na esfera das respectivas atribuições, a ação de outras, numa mútua ajuda, que busca a unidade de bem servir à comunhão.

DUGUIT (“Traité de Droit Constitutionnel”, Paris, 1911, tomo I) e CARRÉ MALBERG (“Contribution à la Theorie Générale de l’Etat”, Paris, 1920, tomo I) indicam as funções específicas dos três poderes: a legislativa fixa, normas jurídicas gerais e individuais; a judicial aplica o direito ao caso concreto, mantendo e atualizando as regras jurídicas, e a executiva, repartida em governamental, com atribuições de resolver problemas atinentes à unidade política do Estado e relativas aos interêsses nacionais, e em administrativa, com o encargo de gerir os assuntos públicos ordinários.

Não há sòmente especificidade nas funções dos três poderes. Tratando-se de categorias artificiais necessárias, que visam à distinção e ao equilíbrio mútuo, as Constituições parlamentares ou presidencialistas adotam freios e contrapesos, outorgando, nos limites fixados, ao Executivo funções legislativas e judiciais, ao Judiciário funções legislativas e administrativas e ao Legislativo funções executivas e judiciais. Há, ao que se vê, um entrelaçamento de funções.

Para comprová-lo, basta compulsar a Constituição do Brasil, na qual se firma o princípio da indelegabilidade das funções. Competem ao Executivo, exercido pelo presidente da República, atribuições administrativas normais. Cabem-lhe, ao demais, funções legislativas referentes à iniciativa de legislação, à interferência do veto e à expedição de decretos e regulamentos para execução das leis, bem assim funções judiciais tocantes à concessão do indulto e à comutação de penas.

O Judiciário tem funções adequadas. Atribuem-se-lhe, também, competências legislativas e executivas, quais as de elaboração de seus regimentos internos, de organização de seus serviços auxiliares, de provimento dos cargos e de proposta ao Legislativo de criação e extinção de cargos e de fixação dos vencimentos.

O Legislativo da União, ou Congresso Nacional, é órgão funcionalmente legiferante. Além da legislação ordinária, pertencem-lhe funções não legislativas. São-lhe pertinentes atribuições de conteúdo administrativo. Assim é que ao Senado Federal compete privativamente autorizar os empréstimos externos dos Estados-membros, do Distrito Federal e dos Municípios, assim como aprovar, mediante voto secreto, a escolha de ministros do Supremo Tribunal Federal, do procurador geral da República, dos juízes do Tribunal Federal de Recursos, dos ministros do Tribunal de Contas, do prefeito do Distrito Federal, dos membros do Conselho Nacional de Economia e dos chefes de missão diplomática de caráter permanente.

Desempenha o Congresso Nacional, pela sua Câmara alta, funções judiciais relevantes, funções que podem ser denominadas político-judiciais. É a Côrte judiciária competente para julgar o presidente da República nos crimes de responsabilidade e os ministros de Estado nos delitos da mesma natureza, conexos com os daquele. Depende o impeachment do presidente da República de declaração,

por maioria absoluta de seus membros, da procedência da acusação pela Câmara dos Deputados. A Câmara é o juiz que processa e o Senado o juiz que julga.

O impeachment aplicado aos ministros do Supremo Tribunal Federal é diferente, pois ao Senado Federal cumpre processá-los e julgá-los.

Tem o Congresso outras funções relevantes. Pode denegar fundos, embaraçando a direção política e administrativa; atribui-se-lhe o zelar pela guarda da Constituição e das leis, na defesa dos vitais interêsses do povo; pertence-lhe a função fiscalizadora do govêrno, dos órgãos da administração, mediante requisição de informações ou convocação de ministro de Estado. No exercício da função de fiscalizar, inerente ao Parlamento, que, para poder deliberar com exatidão, deve esclarecer-se e conhecer a verdade, é reconhecido, no regime parlamentar ou presidencial, o direito à nomeação de Comissões de inquérito ou de investigação.

6. Origem das Comissões Parlamentares de Inquérito e sua contemplação nas Constituições de vários países

Direito de interpelação. Técnicas parlamentares no regime presidencialista. Embora seja o homem, no dizer de VICTOR HENRY (“L’Enseignement de la Grammaire”, Paris. 1906), um animal etimologista pela sua inata curiosidade das origens, não é fácil descobrir-se a fonte de onde provieram Instituições, práticas, hábitos ou costumes. A pesquisa exige tempo, estudo profundo, esforços redobrados, paciência beneditina, aquela invencível curiosidade espongiária, de que falava GOETHE.

O pesquisador trabalha, multiplica as investigações, distancia-se no tempo, penetra o passado longínquo, atravessa espaços, reúne materiais, colhe informes, aprimora-se na técnica, sintetiza dados e chega à sua conclusão. Pode realmente atingir a origem procurada, mas, por falta de elementos ou por não haver aprofundado o necessário, muita vez indica por princípio aquilo que é originado de outra fonte.

Para nos cobrir da responsabilidade da indicação de uma fonte, que talvez remonte a épocas mais distantes, firmamo-nos na autoridade de ANSON, que declarou (“Law and Custom”, tomo I, pág. 435) que a prática do inquérito parlamentar teve sua origem na Inglaterra, por volta do ano de 1689. Segundo TODD (“Gouvernement Parlementaire dans l’Angleterre”, trad., vol. II), a Comissão podia convocar testemunhas, sem, contudo, lhe ser permitido deferir-lhes juramento. Na atualidade, porém, as testemunhas que não dizem a verdade estão sujeitas a severas penalidades.

A França, no governo parlamentar, adotou o sistema de l’enquéte parlementaire. Foi na época anormal das primeiras assembléias da Revolução. Quer na Assembléia Constituinte (1789 a 1791), que votou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, extinguiu privilégios e títulos hereditários, aboliu as torturas, as ordens secretas e outras medidas opressivas; quer na Assembléia Legislativa (1791 a 1792), quando o país estêve a pique de soçobrar na luta interna e externa; quer na Convenção (1792), que mandou, já sob o domínio de Marat, Danton e Robespierre, guilhotinar Luís XVI como criminoso de traição, como conspirador contra a pátria, em que pese à defesa de Tronchet, Malesherbes e Desèze, e proclamou a República; nessas três assembléias se procedeu, por grandes Comissões, a um sem número de inquéritos nos vários departamentos da administração.

No período do Diretório e do Primeiro Império as Constituições, avessas à separação completa do Legislativo e do Executivo, obstaram à prática dos inquéritos, que ficaram restritos aos limites de certos atos relativos á competência da Câmara. No fim do Segundo Império, sob a direção de Napoleão III, o reconhecimento do direito de iniciativa parlamentar e da responsabilidade ministerial abriu margem à criação das Comissões de Investigação. A lei de 23 de março de 1914 fixou penas pecuniárias para os que desatendessem à convocação, ou que faltassem à verdade. A lei francesa de 1950 contém disposições mais severas.

Na Bélgica, já no último século, por volta do ano de 1880, era lícito à Câmara ordenar que uma Comissão, por ela escolhida dentre seus pares, efetuasse inquérito sôbre assunto determinado (MICHON, “Les Enquètes Parlementaires”, Paris, 1890). Havia pena de prisão para o perito e para a testemunha que não acudissem à intimação da Comissão ou faltassem à verdade. Levado o fato ao conhecimento do procurador geral, a êste competia agir conforme ao Direito.

A Constituição de Weimar, de 11 de agôsto de 1919, outorgou à Câmara (Reichstag), no art. 34, o direito de criar Comissões Parlamentares de Inquérito, com poderes de produção das provas em sessão pública. Obrigou às autoridades judiciárias e administrativas a procederem às investigações e verificações reclamadas pelas Comissões. Determinou que tôda a documentação oficial lhes fôsse fornecida, respeitado, todavia, o segredo da correspondência, dos comunicados telegráficos e telefônicos. Ordenou ainda que as normas do procedimento penal se aplicassem, tanto quanto possível, às investigações feitas pelas Comissões.

A Carta Magna da Cidade Livre de Dantzig, estabelecida com a garantia da Sociedade das Nações, que lhe deu aprovação em 11 de maio de 1922, dispôs no art. 19 que, no caso de se suscitarem dúvidas acêrca da legalidade ou moralidade de medidas governamentais ou administrativas, assistia à Assembléia Popular o direito e o dever de instituir Comissões investigadoras. Estas Comissões, uma vez formadas, podiam requisitar documentos, recolher provas em público e raso, ou produzi-las em sessão secreta, exigir das autoridades administrativas e judiciárias tôda matéria de interêsse de inquérito parlamentar e aplicar, por analogia, às suas investigações os preceitos do Cód. de Procedimento Penal.

A Lei Maior da Grécia, de 1927, que substituiu a Constituição helênica, de 1925, também era explícita. Autorizou, no artigo 55, que a Câmara dos Deputados nomeasse Comissões Informativas com a representação proporcional dos partidos políticos, segundo sua fôrça numérica. Igualmente o Cód. Político da Polônia, votado em 1921, consentia (art. 34) que a Dieta (Câmara dos Representantes), para se informar acêrca de questões determinadas, fizesse nomeação de Comissões extraordinárias, às quais se garantia o direito de ouvir as partes interessadas e de convocar testemunhas e peritos.

As Constituições posteriores à Segunda Grande Guerra inserem preceitos relativos às Comissões de Inquérito. A da República Popular da Hungria, adotada por aclamação aos 18 de agôsto de 1949 pela Assembléia Nacional húngara, prescreve, no art. 17, que essa Assembléia tem jus de formar Comissões havidas por necessárias, às quais os poderes públicos, as administrações e todos os cidadãos do país são obrigados a fornecer esclarecimentos e a prestar declarações que reclamarem.

A Lei Fundamental da República Democrática Alemã, de 7 de outubro de 1949, preceitua, no art. 85, que a Câmara Popular poderá criar Comissões de Inquérito, às quais as administrações e tribunais devem fornecer documentos e Informações requisitados. As Comissões aplicam o Cód. de Proc. Penal no que tange à produção das provas.

A Lei das Leis da Síria, votada pelo Parlamento, em 5 de outubro de 1950, consigna, no art. 52, que, a todo o momento, é lícito à Câmara dos Deputados constituir Comissões de Inquérito, ou delegar a um ou vários de seus membros o encargo de investigar determinado assunto, dispondo que os ministros e todos os funcionários do Estado não podem recusar seu testemunho, nem deixar de apresentar documentos e esclarecimentos que lhes forem solicitados.

Na República da Islândia, a grande ilha do Oceano Glacial Ártico, desligada da Dinamarca graças à ab-rogação do Ato da União pelo Althing, ou Assembléia constituída da Câmara Alta e da Câmara Baixa, e ratificada em plebiscito com 98% dos sufrágios, a Constituição, votada em 23 de maio de 1944, assentou, no art 39, que a cada uma das Câmaras do Althing é permitido nomear Comissões entre seus membros. Estas Comissões podem requisitar das autoridades públicas e das particulares explicações orais ou por escrito acêrca de assuntos de interêsse geral.

Denomina-se Dieta o Poder Legislativo do Japão. Forma-se de duas Casas: a dos Representantes e a dos Conselheiros. Assegura-se a qualquer delas o poder de investigação dos negócios governamentais, o direito de convocar testemunhas, de tomar-lhes o depoimento, de organizar as provas julgadas necessárias. Com efeito, o art. 82 da Constituição japonêsa, promulgada a 3 de novembro de 1946, está redigido nestes têrmos:

“Each house may conduct investigations in relation to government, and may compel the presence and testimony of witnesses, and the production of records”.

Pela primeira vez na Itália o Regimento da Câmara dos Deputados de 1888 contemplou as Comissões Parlamentares de Inquérito (FERRUCCIO PERGOLESI, “Diritto Costituzionale”, Bolonha, 1949), sem eficácia com respeito à pública administração. Visavam mais de perto à apuração da lisura das eleições e à verificação de acusações atinentes à honra de parlamentar acusado.

Hoje, a Constituição italiana, promulgada a 22 de dezembro de 1947, não só atribui à Câmara e ao Senado o direito de interpelar e interrogar, como também o de criar “commissioni d’inchiesta o de indagine”. A Comissão Parlamentar de Inquérito ou de Investigação é instituto que, quanto à matéria de interêsse público em geral, não sofre qualquer restrição no seu objeto. Diz o art. 82:

“Ciascuna Camara puô disporre inchieste su materie di pubblico interesse”.

À Comissão se asseguram amplos poderes de investigações e exame, e o resultado do inquérito servirá ao Parlamento para deliberações de natureza política, administrativa, legislativa ou denunciativa.

Importa assinalar, nesse passo, que ESMEIN (ob. cit., tomo II, pág. 484) indica ser a vigilância exercida pelo Congresso sôbre os ministros, na sua qualidade de agentes diretos do Executivo, um dos traços nítidos do parlamentarismo. Afigura-se-lhe que essa fiscalização se exercita pelas interpelações e pelas investigações parlamentares.

É de ver que o direito de interpelação, o comparecimento dos ministros ao Parlamento e o princípio da compatibilidade entre os cargos de ministro e deputado ou senador, incorporados na atual Constituição do Brasil. são, por sem dúvida, processos de índole do sistema de gabinete. Todavia, essas técnicas, somadas às instituições das Comissões de Inquérito, comuns aos governos parlamentares e presidencialistas, não desfiguram o caráter do nosso presidencialismo. Dão-lhe colorido parlamentarista, feição eclética nesse ponto, afastam-no do classicismo norte-americano, sem, contudo. quebrar-lhe a estrutura.

É um processo de flexibilidade das linhas do nosso presidencialismo. Dir-se-à que é um arejamento do sôpro parlamentarista na rigidez da separação dos poderes, que se torna mais fluídica, mais consentânea com a realidade política.

O direito de interpelação ou requerimento dirigido por deputado ou senador a um ministro para discussão pública acêrca de algum assunto definido e o direito de exigir o comparecimento do ministro ao Parlamento para discussão e debate dê questão determinada são infiltrações parlamentaristas no nosso presidencialismo. Trata-se de influência espiritual dos usos e costumes britânicos, das idéias vindas do sistema adotado pelos franceses e dos princípios da Constituição de Weimar, que facultavam à Câmara reclamar a presença de qualquer ministro de Estado, consoante assim dispunha, no comêço, o art. 33,

“Der Reichstag und seine Ausschuesse Koennen die Amwesenheit des Reichskanzlers und jedes Reichs-ministres verlangen”.

Convém advertir que o direito de pedir informações ao Executivo é prática parlamentar nos Estados Unidos (BEARD, “American Government”, Nova Iorque, 1943) e consentida no Brasil na vigência da Constituição de 1891, por fôrça do artigo 35, que atribuía ao Congresso velar pela guarda da Carta Constitucional e das leis, assim como providenciar sôbre as necessidades de caráter nacional.

No respeitante às Comissões de Inquérito pròpriamente ditas, a Constituição de 1891 era omissa. A de 1934 continha disposição expressa no art. 36, que rezava:

“A Câmara dos Deputados criará Comissões de Inquérito sôbre fatos determinados, sempre que o requerer a têrça parte, pelo menos, dos seus membros”.

No parágrafo único dêste artigo preceituava:

“Aplicam-se a tais inquéritos as normas do processo penal, indicadas no Regimento Interno”.

Tratava-se de uma novidade no nosso Direito Constitucional. O anteprojeto de Constituição adotara um critério mais favorável às minorias. Porque, para criação das Comissões de Inquérito, bastava que fôsse requerida por um quarto dos membros da Câmara, e não havia a restrição inserta no parágrafo único – “Indicadas no Regimento Interno”. Prevaleceu, entretanto, o requerimento da têrça parte e a limitação apontada.

Causou estranheza o não haver a Carta Constitucional de 1934 estendido a missão fiscalizadora da Câmara dos Deputados ao Senado Federal, que tinha funções de alta relevância no mecanismo governamental. A Constituição vigente cobriu a lacuna, ampliando ao Senado idêntica atribuição, conferida à Câmara dos Deputados.

A Outorga de 1937, que, ao revés da Lei Maior de 1934, instituíra um Executivo forte, com excessivas atribuições, nenhuma norma estabeleceu acêrca da criação das Comissões Parlamentares de Investigação.

A Constituição de 1948, contemplando o assunto no art. 53, assim dispõe:

“A Câmara dos Deputados e o Senado Federal criarão Comissões de Inquérito sôbre fato determinado, sempre que o requerer um têrço de seus membros”.

Prescreve no parágrafo único que

“Na organização dessas Comissões se deverá assegurar, tanto quanto possível, a representação proporcional dos partidos nacionais que participem da respectiva Câmara”.

7. Fundamento e finalidade das Comissões Parlamentares de Inquérito

Moralização do Direito. O Instituto da Comissão Parlamentar de Inquérito tem seu fundamento, seu alicerce, sua razão, sua justificativa. Não foi criado sem mais nem mais. Não surgiu de improviso, ao acaso, ao lusco-fusco, de cambulhada como certas criações fúteis da vaidade humana. Não teve por base o interêsse de campanário, nem o propósito ou o intento malicioso do dissídio, de incompatibilidade, de eliminação do adversário.

Surgiu como imperativo do momento. Decorreu da precisão de se regular fato social palpável. Resultou da conveniência da fiscalização dos atos administrativos. Nasceu da necessidade do povo se informar acêrca de fatos determinados, através de seus representantes no Legislativo. Proveio do critério fornecido pela Moral na apreciação dos interêsses públicos. Emanou, sobretudo na época da Revolução francesa e maiormente nos dias atuais, de normas éticas, mantenedoras do prestígio do Estado, da correção da autoridade administrativa, normas essas que, não raro, apareciam e aparecem desrespeitadas pelo arbítrio, vulneradas pelo favoritismo, malferidas pelos desmandos, vilipendiadas pela dissipação ou locupletação de bens públicos, relaxadas pela desídia na direção das negócios de interêsse direto da comunhão social, maculadas pela prática de atos reprovados da sociedade, tisnadas pela excessiva abusividade capaz de abalar os alicerces do regime, solapadas pela falta de limites dentro dos quais se realiza o que é justo, útil e proveitoso à coletividade.

O instituto da Comissão Parlamentar de Inquérito, nascido, conforme já se ressaltou, do jus non scriptum, é produto dos mores, surgidos da regra de procedimento, espontâneamente criada pela consciência comum do povo inglês. O costume se concretou, ali, pela prática constante, pelo uso uniforme e pela opinio juris et necessitatis, ou seja, pela convicção de se observar a regra consuetudinária, dada sua correspondência a uma necessidade jurídica.

O art. 34 da Constituição alemã, fonte mais próxima do jus scriptum constante dos arts. 36 e 53, respectivamente, da Carta Constitucional do Brasil, de 1934 e de 1946, fundou-se não sòmente na necessidade de informar e esclarecer a consciência, mas em princípios de ordem moral.

Inúmeras regras éticas, disciplinadoras dos atos humanos que procuram os fins próprios ao homem, à vista da realidade, diante de múltiplos fatôres, se exteriorizam, objetivando-se e materializando-se em normas jurídicas. O Direito encontra sua origem na natureza do indivíduo, havido como ser social. Distingue-se da Moral, mas com ela se harmoniza. A Moral fixa normas de procedimento, de caráter ético e de natureza interior; o Direito estabelece igualmente normas de procedimento, de feição ética, de natureza exterior, destinadas a criar e a manter a coexistência e o aperfeiçoamento do indivíduo e da coletividade.

O Direito, mesmo como norma objetiva, como norma técnica, mesmo nesta era de utilitarismo, não deve renegar a Moral. Disse-o alguém que o Direito é um rio e a Moral o leito dêste rio. A influência dos princípios morais, cintilantemente exposta por GEORGES RIPERT (“La Règle Morale dans les Obligations Civiles”, págs. 5 e segs.), nas relações jurídicas obrigacionais, verifica-se em todo o vasto campo jurídico.

A moralização do Direito Abrange, destarte, os vários ramos em que se divide. O Direito Constitucional não foge à regra. A nossa Constituição, para exemplificar, o comprova no capítulo das inelegibilidades, adotadas à cautela para impedir a perpetuação de régulos, de senhores feudais da República, que muito à satisfação de seu gôsto sempre se esforçaram por cambiar a temporalidade das funções pela usurpação dos cargos públicos.

O Estado asiático da Birmânia, outrora componente do Império das Índias britânicas, promulgou sua Constituição aos 24 de setembro de 1947, na qual se assegura a ordem social alicerçada nos princípios eternos de justiça, de liberdade e de igualdade. Precisamente neste Pacto Fundamental democrático, onde se garantem a todos os cidadãos a justiça social, econômica e política, a liberdade de pensamento, de expressão, de opinião, de crença, de culto, de profissão, de associação e de ação e a igualdade diante da lei, ficou estabelecido que nenhum indivíduo pode fazer parte da Câmara dos Deputados ou da Câmara das Nacionalidades, de que se forma o Parlamento, nem ser eleito presidente da União birmânica, se, consoante prescreve o art. 74, dentre outras várias incompatibilidades, fôr falido ou insolvente, se estiver condenado ou julgado culpado de corrupção ou de manobra eleitoral ilegal, se houver sido apenado com a deportação ou com a prisão de dois anos, se ocupar cargo remunerado a serviço da União ou de um de seus territórios, salvo se o cargo fôr daqueles para os quais o Parlamento, por ato expresso, declarar inexistir a incompatibilidade.

Observa-se, desta sorte, que regras de direito comum, por influência de normas éticas, por fôrça de altos princípios morais, passam a se tornar em vedações constitucionais. E dia virá em que, para salvaguarda da honra, da cultura e da civilização, haja proibição constitucional à eletividade do pé-rapado, do negocista, do corruptor, do corrompido, do criminoso, do indivíduo, em síntese, que não possa apresentar um curriculum vitae isento de máculas, que o incompatibilizem para o exercido de funções que requerem dignidade, compostura e competência.

As Comissões Parlamentares de Inquérito visam à informação, ao esclarecimento, à elucidação, à sindicância, à fiscalização, ao exame de atos, à averiguação de fatos, à recolha de elementos, à investigação minuciosa de dados, à pesquisa pormenorizada de circunstâncias, à inquirição de testemunha e de acusados, à realização de diligências, ao estudo de documentos, à instrução do caso em debate sob todos os aspectos, à observação de fatos para conhecimento da verdade e à apuração final das responsabilidades, Seu fim é, pois, indagar, inquirir, sindicar as atividades das autoridades públicas, o emprêgo dos dinheiros públicos, para o exato cumprimento da lei.

8. Necessidade de novas técnicas para aperfeiçoamento do sistema democrático

Partidos políticos. SPINOSA, admirável panteísta, havido por GOETHE como segunda pessoa depois de Jesus, tido pelo incansável RENAN como o maior judeu dos tempos modernos, pugnando pelo regime democrático, apontou-lhe o defeito de levar homens despreparados e pouco escrupulosos a ocuparem cargos e funções públicas, com evidente prejuízo para o país. A censura é em parte verdadeira.

Pregoeiros do Estado forte e paternal, na postura intorsa de autoconvictos da insubstituição de suas idéias totalitárias, com a visão daltonizada da realidade, indicam para solução do problema a medicina heróica da autoridade de cima e a obediência de baixo, suprimindo-se assim o chamado govêrno democrático. É de mister combater-se desenganadamente a contra-verdade dessa tese, que se funda na teoria hobbesiana do Leviatã, retirada por CARL SCHMITT das cinzas em que a sepultaram três séculos e reconstruída com o barro da poderosa dialética do jurisperito germânico.

Não é no estabelecimento do Estado unipartidário, senhor da totalização das atividades dirigentes, não é no monocausalismo da concepção extremista, que se há de encontrar o remédio para a cura de males, equívocos e erros existentes na Democracia.

Não há regime mais danoso à vida de uma nação, mais nocivo a um povo do que o ditatorial. É inatinável que se queira consertar uma organização, suprimindo-lhe o direito de crítica, de manifestação do pensamento. O regime de arbítrio não se forra às contingências do latrocínio das posições, do predomínio da oligarquia, da folgança do despotismo, da supremacia dos nepotistas. Gera a tirania, e a tirania gera a irresponsabilidade. A constante do autocracismo é a afilhadagem, o compadresco, o implemento dos cargos por quem, dada sua incompetência, não lhe tem jus, a prepotência, o excesso, a perseguição dos desafetos, o sacrifício geral.

Não é necessário organizar-se opressão, consentir-se na abdicação da personalidade individual, ou se conformar com o holocausto do homem ao Estado, para a correção dos erros no sistema democrático. Basta criarem-se técnicas de aperfeiçoamento, como está sucedendo no campo da moralização administrativa com as Comissões Parlamentares de Inquérito, que em pouco tempo já prestaram serviços de monta ao país. Atuando-se no sistema democrático de acôrdo com o espírito da moderna ciência, com base na teoria racional da experiência e do êrro, todos os seus graves problemas podem ser resolvidos.

Os partidos políticos, nascidos da diversidade de interesses econômicos da variabilidade de opiniões políticas e da multiplicidade de concepções filosóficas, formados destarte pela inteiração, pelo antagonismo e pela oposição. têm o destino de programar suas idéias, estabelecer seus estatutos, congregar seus líderes, organizar os indivíduos, reunir as conveniências públicas e disciplinar as opiniões. Indispensáveis ao mecanismo do sistema constitucional, segundo POSADA (“Derecho Constitucional Comparado”, Madri, 1894), como grupos sociológicos, ou melhor, como institutos de direito público, são essenciais à vida de um povo democrático. Integrando o processo governativo, não órgãos de representação, de influência na estrutura estatal, de condição de uma vida política forte.

Necessitam perder os partidos o caráter individualista, ter armadura de enquadramento nas massas, de larga dimensão, possuir estrutura indireta com base popular, fazer, tanto quanto possível, ligações verticais para mais perfeita união e subordinação de seus organismos, promover o debate acêrca dos assuntos ideológicos e dos problemas econômicos, políticos, culturais, de interesse geral, de certas áreas ou de determinados grupos, a fim de que formem a consciência partidária. Porque assim não são organizados os nossos partidos políticos, seus dirigentes não sentem a mobilidade social, não percebem a ressonância dos anseios do povo-massa, passam a ignorar as aspirações da maioria, e se tornam incapazes de interpretar fenômenos de sociologia eleitoral e de geografia eleitoral, como aqueles verificados no correr de 1953, em que um candidato a prefeito de São Paulo, que se serviu de um partido de pouca expressão, ùnicamente para lhe registrar a candidatura, derrotou espetacularmente grandes agremiações partidárias coligadas.

Uma das maiores missões dos grupos partidários é dar educação política ao povo. Esta missão deve ir além da politicização dos grupos. Os partidos precisam lutar para infundir cultura à massa, que deixará então de ser massa, e não será jamais a matéria plástica, maleável, pelos demagogos, à maneira do barro, pelos oleiros. É de mister blindar a nossa gente contra os males do analfabetismo e a ignomínia da demagogia. O voto necessita ser arma da consciência e da inteligência.

Duas diáteses devastou a energia de nossas populações, aniquilando-lhe interesses fundamentais e desagregando-lhe a estrutura moral: o cangaceirismo, que lavrou em várias regiões brasileiras, e o caudilhismo, que se dilatou aos quatro cantos da nacionalidade, ambos já muito quebrados na sua sanha malfazeja.

Uma terceira diátese lança raízes estranguladoras da ordem moral e da ordem jurídica, infecta a alma e o caráter nacionais, debela o ideal e o patriotismo, ilude o corpo eleitoral e crapuleia consciências: o aventureirismo. Sua expressão mais legítima, que aqui pretende enraizar-se, é o aventureiro, corrompido e corruptor, trapaceiro e demagogo, passador de moeda falsa da inteligência e peteador por índole, aldravão em economia e pinta-monos em assuntos populares, escamoteador arguto e fazedor de falsas promessas. Serve-se do cargo para ratonear, ou para lograr vantagens ilícitas, com que dissemina a corrupção. Sua lei é a fraude; sua bíblia, a mentira; seu evangelho, o enganar os incautos.

A sociologia dessas nefandas atividades traz à tona êsse cortejo de fatos, que envergonham e clamam por sério corretivo. O povo precisa ser advertido contra essa perigosa casta de violadores da lei penal.

Deve prevenir-se contra o homem providencial, o profeta, o engenheiro social, o discípulo amado, o revolucionário científico, o líder caricato, o chefe de fancaria, o que se arroga dons carismáticos, ou se considera, por uma transubstanciação milagrosa, encarnação de espírito iluminado. É exagêro supor-se que o ideal do super-homem da indicação nietzschiana se concentrava em Hitler, Mussolini, Lênine ou Stalin. No super-homem há uma constante da contínua superação que nenhum dêles revelou. Quem, neste século, apresentou característicos que o alçavam acima da craveira comum dos indivíduos humanos, foi Gandhi.

O Mahatma possuía qualidades de condutor, tinha vontade de potência, era capaz de gestos e sacrifícios ingentes, mostrava desinterêsse dos prazeres comuns, amava dificuldades, trazia ímpeto filosófico, revelava coragem e queria o ultrapassamento. Por tudo isso, foi uma figura excepcional dentre os condutores de massas.

Importa não confundir o líder com o oportunista ou o demagogo. O oportunista ou tem status social, ou o alcança pelo processo da capilaridade social, através dos canais de ascensão na estrutura da sociedade estratificada. O demagogo é o imediatista diante dos problemas, dada sua despreocupação consciente das conseqüências das soluções oferecidas. Observa-se que nas posturas demagógicas o que se excita é a paixão popular; o que se aproveita é a inquietação do grupo; o que se explora é a miséria das massas: o que se indica é a solução parcial, quase sempre fundada na análise imperfeita, privada do conteúdo prático, desprovida da visão dos efeitos no meio social.

O líder, na pesquisa da psicologia profunda das multidões feita por BROWN (“Psychology and the Social Order”, Nova Iorque, 1936), é aquele que, pela estilização de caracteres revelados, toma corpo na imaginação popular, atraindo adeptos e imanizando fanáticos.

MENZEL (“Introductión a la Sociologia”, 1945), pondo o problema nos quadros da ciência, examina-o do ângulo sociológico, para concluir pela recíproca influência entre líder e massa, com a correspondente realidade.

KIMBALL YOUNG (“Social Psychology”, 1945) situa a questão no campo de uma combinação de habilidade e oportunidade. Sociólogos há que atribuem a origem do líder ao elemento pessoal e á inteligência criadora, que geram situações favoráveis aos seus fins. Parece haver acordo nas considerações sociológicas: líder é aquêle que, por um conjunto de predicados excepcionais, se define como centro do grupo, e se faz propulsor decisivo dos acontecimentos históricos.

Muitos poderão fazer os partidos políticos na batalha de educação advertência e moralização. Igualmente os representantes do povo, que não o envergonham, mas o elevam e dignificam. A eles cabe a criação de técnicas de aperfeiçoamento democrático, no campo administrativo e no terreno eleitoral.

As Comissões Parlamentares de Inquérito deverão levar a cabo a obra de destruição da desfaçatez e da dilapidação dos haveres públicos e da desonra do povo. Os inquéritos sôbre o jogo, de que se tira proveito para a corrupção, sobre o Banco do Brasil, que se transformara em prêsa de aventureiros inescrupulosos, sobre a Cexim, que enriqueceu centenas, sobre estas e outras negociatas tão prejudiciais ao povo, hão de contribuir, por sem dúvida, para a moralidade administrativa.

Urge prosseguir sem temor nesse trabalho de salvação da honra nacional, para que não se estabilize e, sim, se desintegre, se assim se pode dizer o complexo de “Wall Street”, que enfeixa não só o elemento subjetivo da idéia da riqueza, do sentimento da ambição, da emoção do jogo, como o externo dos dinheiros acumulados nos cofres e colocados nos bolsos para a dissipação e a corrupção.

Dos partidos, digna e patriòticamente dirigidos, do Congresso, pelos seus inteligentes e honrados representantes, das Comissões Parlamentares, nobremente orientadas, dos governos devotados à solução de nossos múltiplos problemas, depende a fôrça do regime democrático.

9. Autonomia das Comissões Parlamentares de Inquérito e a natureza de sua representação do Congresso

Não merece acolhida a assertiva de ser a Comissão Parlamentar de Inquérito simples mandatária da Câmara ou do Senado, que a criou para examinar determinados fatos. Não ó é tal, da mesma maneira que o representante não é mandatário e o povo mandante.

O mandato imperativo, no que diz respeito ao representante, nasceu do “antigo regime” da França, no período dos stats généraus. O deputado dos Estados gerais era, de fato, mandatário dos que o elegeram. É que, na convocação dos stats généraux, o rei formulava as questões em itens reduzidos. O eleitorado indicava aos eleitos o modo de votarem e o de responderem ao questionário. Caso o rei, no decorrer da sessão, formulasse pergunta nova, para cuja resposta o deputado não houvesse recebido instruções dos mandantes, cabia-lhe recusar respondê-la, para não ultrapassar os limites do mandato.

Nesse sistema, indubitàvelmente a representação se identificava com o mandato-procuração. Recebendo o deputado poderes expressos e especiais, incumbia-lhe cingir-se às atribuições a êle outorgadas. Se, como mandatário, excedia o mandato, praticando atos estranhos aos poderes recebidos, sujeitava-se a uma sanção. Nesta hipótese, lícito era ao comitente ou mandante, constituído do corpo eleitoral que o nomeou, revogar o mandato.

Está bem visto que, hoje, não se admite mais a tese de que são mandatários os membros do corpo legislativo e mandantes os cidadãos que os elegeram, segundo a teoria do mandato-procuração regido pelo Direito Privado. Os deputados não agem absolutamente pelo mesmo título; não são as mesmas suas obrigações, nem os mesmos seus deveres. Convenha-se em que êles representam o povo, enquanto os mandatários, em Direito Privado, são procuradores do comitente, nos têrmos do instrumento de mandato conferido.

HAURIOU, em sua citada obra, propôs a teoria da investidura, para explicar a função que o agente investido exerce em nome do investidor. A doutrina jurídica do órgão, exposta por JELLINECK, em livro já invocado, assenta no princípio de que, em sendo o Estado pessoa jurídica de Direito Público, deve atuar por meio de seus órgãos. DUGUIT, pretendendo uma conciliação, sustentou a teoria da solidariedade ou interdependência entre representantes e representados na comunidade humana. A doutrina do mandato livre, em oposição á do mandato imperativo, declara liberdade plena e independência dos representantes,

Nenhuma das teorias explica satisfatòriamente a natureza do sistema representativo. O assunto deve ser olhado do ângulo sociológico e do prisma jurídico. A instituição representativa, sociològicamente falando, esteia-se no equilíbrio político objetivo, isto é, no equilíbrio entre o poder da nação e o poder do govêrno, entre governados e governantes, entre o corpo eleitoral e os representantes.

A conformação da opinião dos representantes com as aspirações e tendências do eleitorado demonstra a relativa dependência daqueles com êste. A relação não se circunscreve entre deputados e eleitores da circunscrição. Verifica-se entre deputados e a nação inteira, de que receberam o mandato. Para se obter a conformidade constante da vontade dos representantes com a vontade do corpo eleitoral, existe, no sistema democrático representativo, a periodicidade da renovação do Parlamento; no parlamentarismo, a dissolução das Câmaras de representantes; na democracia mista, a iniciativa popular e o referendum.

Juridicamente, ter-se-á de apurar no sistema representativo a situação dos representantes e representados. A uns e outros cabem deveres. De um lado, está o dever do eleitor nomear deputados; de outro, o dever do deputado cumprir a função, cabível ao órgão de representação, do qual é membro. Há, destarte, um poder correlativo de realização de funções. Realiza-se o interêsse nacional, mercê de direitos e deveres recíprocos de governantes e governadas.

A Constituição do Brasil, no art. 56, evitou a coação dos partidos, dando ao representante liberdade de votar. Os deputados representam o povo. Representar é cumprir a função que lhe incumbe, como membro do órgão de representação. Não há falar em representação jusprivativista na representação política. Representando o deputado a nação, a representação é da unidade total.

Tal e qual se dá nas Comissões Parlamentares de Inquérito. Não são elas mandatárias da Assembléia que as constituiu. São a própria Assembléia no exercício das funções que lhes competem. Constituídas no Senado ou na Câmara, dentro de suas atribuições, elas representam esta ou aquêle na sua totalidade.

A Comissão Parlamentar de Inquérito, desta sorte, não pode ser havida por órgão distinto do Congresso. Criada pelo Senado, é o próprio Senado. Instituída pela Câmara, não é senão a Câmara. Embora funcione com um número reduzido de membros, é sempre representativa da unidade total. A totalidade que representa é tanto mais expressiva quanto, por fôrça de preceito constitucional, ela se forma de elementos de todos os partidos, na proporção de sua representação.

Não seria admissível que a Câmara e o Senado, com todos seus componentes, no plenário de seus trabalhos, se entregassem, com evidente prejuízo das várias e complexas atribuições que lhes cabem, à tarefa de fiscalização e sindicância das funções e atividades das autoridades públicas. Importaria espaçar, procrastinar, alongar indefinidamente os inquéritos numa época de fome de tempo, se o trabalho de pesquisa fôsse, na frase do eminente ministro OROZIMBO NONATO, efetuado pela Câmara au grand complet.

Para atalho dessas dificuldades, que acabariam por se tornar insuperáveis, visto como, sendo os Congressos corpos numerosos, os quais, na frase do eminente ministro MÁRIO GUIMARÃES, com o aumento da população mundial, vão assumindo proporções das assembléias gregas ou romanas, criaram-se Comissões de Inquérito, que se identificam com os Congressos, e os representam, e exercitam funções a êles inerentes. Atente-se, pois, em que a Câmara, bem assim o Senado, se encarna, no mais estrito rigor da palavra, nas Comissões de Inquérito, e nelas vive, infundindo-lhes todo o poder de sua soberania.

Conseqüentemente, a Comissão de Inquérito de uma Câmara não é uma dependência dessa Câmara. É, consoante se manifestou o eminente ministro LUÍS GALLOTTI, a representante da Câmara na tarefa que lhe é cometida. Dentro de seus encargos, ela fotografa, retrata, reproduz a imagem da Câmara; possui o mesmo prestigio, usa dos mesmos poderes, goza da mesma autonomia da Assembléia a que pertence. Poder-se-á dizer com DURANDO (“Interpretazione e Commento della Costituzione Italiana”, Turim, 1948) que a Comissão de Inquérito é mesmo uma “piccola camera”.

A Câmara (ou o Senado) concentra-se, consubstancia-se, converte-se, resume-se, reduz-se na Comissão de Inquérito, à qual são conferidos amplos poderes, de origem constitucional, para a realização dos trabalhos que lhe foram designados.

Depois de constituída, a Comissão de Inquérito passa à função investigadora, com a faculdade de produzir as provas que tiver por convenientes, indispensáveis à apuração de determinado fato e à verificação do cumprimento da lei, à vista dos altos interesses públicos. A autonomia, de que goza nessa fase de sindicância e indagação. é idêntica à do Congresso em qualquer de suas atribuições específicas. Termina sua função quando apresenta ao plenário o relatório com suas conclusões, acompanhando-o de projeto de resolução, se julgar necessária uma lei para suprir faltas e corrigir abusos.

10. Ação das Comissões Parlamentares de Inquérito. Competência e atribuições. Forma de processo, inquirições e diligências. Limitações.

Lei nº 1.579. DUGUIT, na obra algumas vêzes invocada, adverte que o poder de inquérito é oriundo do poder de fiscalização. No exercício deste poder, as Comissões de Inquérito sindicam e fiscalizam o emprêgo dos dinheiros públicos, a atividade das autoridades públicas, o funcionamento dos serviços públicos. É-lhes defesa a prática de atos da competência normal dos funcionários administrativos ou judiciários.

Há, pois, segundo escreve OTTMAR BUHLER (“Comentário à Constituição Alemã”, trad., 1939), na órbita de sua atuação, os mesmos limites traçados à Câmara a que pertencem. As limitações são de ordem das que as impedem de julgar e punir. Instauram inquéritos e promovem processos. A elas, no entanto, não cabem funções judicantes, nem punitivas, que são da competência do Judiciário.

As Comissões de Inquérito concluem. Suas conclusões não têm o caráter de sentenças, na significação dada pelo Direito Processual Penal. Não se revestem, também, do cunho das deliberações conhecidas no Direito Administrativo. Suas conclusões podem ser havidas como decisões tão-sòmente do ponto de vista da lógica. São decisões ou conclusões destinadas a servirem de fundamento às resoluções da Câmara, que as constituem.

Conseqüentemente, as Comissões de Inquérito, de que trata o art. 53 da Constituição, criadas por deliberação do plenário da Câmara ou do Senado em forma de projeto de resolução, ou determinadas pelo terço da totalidade dos membros de cada uma dessas Casas do Congresso (artigo 30 do Regimento Interno da Câmara e art. 1º da lei nº 1.579), têm atribuições que convizinham, mas que não ocupam nem penetram a área das atribuições judiciárias ou disciplinares. A lei nº 1.579, de 18 de março de 1952, dispondo sôbre as Comissões, criadas na forma daquele preceito constitucional, declara logo no art. 1º, a amplitude de sua ação às pesquisas destinadas à apuração dos fatos determinados que deram causa à sua formação.

Esta amplitude não é indemarcada. É completa e sem limitações na esfera de sua ação, nos limites de suas atribuições. No que entende com a medida de jurisdição, ou seja, com a competência geral de fiscalização, esta pertence ao Poder Legislativo. E esta competência de contrôle é sobremodo ampla. Competindo ao Congresso votar leis complementares da Constituição, leis relativas ao Direito material e ao Direito formal que entendem com a vida do país, com as relações entre a União e os Estados-membros, afora outras atribuições, está visto que os fatos, de que as Comissões de Inquérito ou as duas Casas do Congresso precisam averiguar, são incontáveis. Isso demonstra quão vasta é a competência fiscalizadora.

Cabe dentro das atribuições das Comissões Parlamentares de Inquérito o poder de requererem, por intermédio da Mesa, a convocação de ministros de Estado, tomarem o depoimento de autoridades federais, estaduais ou municipais, inquirirem testemunhas sob compromisso, ouvirem os indiciados, requisitarem informações e documentos de repartições públicas ou autárquicas, transportarem-se aos locais onde sua presença fôr considerada necessária, determinarem, enfim, as diligências reputadas imprescindíveis.

No respeitante a indiciados e testemunhas, suas intimações, para prestarem declarações e darem seus depoimentos, devem obedecer às normas das legislações penais que regem a matéria. As Comissões Parlamentares de inquérito não dispõem, pois, senão das regras comuns do Direito Processual Penal para intimarem e notificarem os indiciados, testemunhas e demais pessoas que devam tomar conhecimento de qualquer ato seu.

Pode suceder que a testemunha deixe de comparecer sem motivo justificado, ou se recuse a atender to chamamento da Comissão de Inquérito. Esta, em tal hipótese, solicitará do juiz criminal da localidade em que resida ou se encontre a testemunha, sua intimação.

A obrigação da testemunha é acudir à convocação e prestas depoimento. A prestação do depoimento é, dêsse modo, integrante do dever de comparecimento. No caso de ocorrer a impossibilidade da testemunha comparecer, por se encontrar impedida de se locomover, por velhice ou enfermidade, ainda assim não se desobriga do dever de depor. Seu depoimento será então tomado em sua residência, para onde se transportarão os membros da Comissão.

É de mister que a impossibilidade do comparecimento seja cumpridamente provada, mediante atestação médica. Se houver motivo de suspeita de simulação, a Comissão Parlamentar solicitará do juiz competente um exame, para averiguar a veracidade ou não da alegada impossibilidade de locomoção.

Havendo recusa de comparecimento ou simulação comprovada, cabe ao juiz, a quem foi pedida a intimação, fazer com que a testemunha compareça, ainda que seja conduzida por oficial de justiça, debaixo de vara e com a pena de desobediência.

Vem à baila inquirir se é licito às autoridades negarem às Comissões Parlamentares de inquérito certa informação, sob pretexto de que sua divulgação acarretará prejuízos ao interêsse da União, do Estado-membro ou do Município. A recusa envolve responsabilidade. A autoridade é obrigada à prestação das informações requisitadas. Ao Poder Legislativo, na sua função fiscalizadora, dentro da norma material de sua competência de dotar o pais de leis de interêsse da coletividade, não se permite suprimir o conhecimento de fatos de que necessita inteirar-se. Deixá-lo na ignorância de informes requisitados, sob quaisquer escusas, vale por abolir uma fonte de pesquisa de que não pode prescindir, para o completo exercício de funções, que lhe são inerentes.

No correr do inquérito, é da alçada das Comissões Parlamentares a determinação das diligências tidas por necessárias. Calha nêste passo indagar quais as diligências que podem ser ordenadas. A lei, que dispôs sôbre as Comissões Parlamentares, não as especifica. O Regimento Interno da Câmara dos Deputados faz referências às diligências nos §§ 2º e 4° do art. 47.

Diz; ali, que

“A Comissão poderá determinar, dentro e fora da Câmara, as diligências que reputar necessárias”.

Dispõe, aqui, que

“O presidente da Comissão de Inquérito, por deliberação desta, poderá incumbir qualquer de seus membros, ou funcionários da Secretaria da Câmara, da realização de sindicância, ou diligência, necessária aos seus trabalhos”.

Tudo indica que as diligências não são outras que as de intimação, de exames de documentos, de tomada de depoimentos, no caso de impossibilidade do comparecimento da testemunha, de acompanhamento de providências judiciais, de medidas preventivas ou cautelares, de Instrução do Inquérito, de colheita de elementos para melhor esclarecimento, apuração ou segurança da verdade real.

Em que pêse à autorizada opinião de STIER-SOMLO, não se incluem nas diligências das Comissões Parlamentares de Inquérito as buscas e apreensões, os seqüestros, as detenções, as conduções debaixo de vara, as penas de desobediência e outras, contempladas na lei processual penal. Tôdas essas medidas cautelares e punições corretivas pertencem ao Judiciário, ao qual as Comissões devem dirigir-se.

11. Crimes perante e contra as Comissões Parlamentares de Inquérito. Crimes contra o livre exercício das atribuições de seus membros.

Para fortalecer a ação da Comissão Parlamentar de Inquérito, cercando-a de respeito, poupando-lhe embaraços, proporcionando-lhe o ensejo de desempenhar a todo o poder sua alta missão de desvendar fatos relativos ao emprêgo de dinheiros públicos e à atividade de autoridades públicas, a lei nº 1.579 criou novas modalidades delituais dos denominados crimes de impedimento e falso testemunho, falsa perícia ou falsa tradução, contemplados no Cód. Penal, mas sem a extensão e a definição que ora assumem de novas entidades criminais.

Dentre os princípios cósmicos do Direito repressivo, figura o da anterioridade da lei penal. Prescrevia a Constituição francesa de 1791 que “nul ne peut être puni qu’en vertu d’une loi établie et promulguée anterieurement aut delit et légalement appliquée”. Proveio essa norma da velha máxima nullum crimem, nulla poena sine praevia lege, assegurada no § 27 do art. 141 da nossa Constituição. Trata-se de princípio jurídico-político fundado na necessidade da segurança da liberdade individual e do próprio Direito. Não se permite, pois, punição sem lei expressa anterior, nem tampouco se admite, em face de nosso Direito Penal, criação analógica. Aplicação analógica só in bonm parte ou pro reo. Não há crime, nem contravenção, sem tipicidade. Só existe tipicidade, quando há exata correspondência entre o fato e a definição legal do crime ou contravenção.

Por essas razões, objetivando o legislador não deixar sem punição modalidades novas de impedimento e falso testemunho, que poderão surgir na seara do crime, tratou em praevia lex, de defini-las, cominando, para os casos de Infração, penas adequadas.

Assim fixou o crime de impedimento, nos seus pressupostos gerais:

“Impedir, ou tentar impedir, mediante violência, ameaça ou assuadas, o regular funcionamento da Comissão Parlamentar de Inquérito, ou o livre exercício das atribuições de qualquer de seus membros.

Pena – detenção, de dois meses a dois anos”.

MAGGIORE (“Diritto Penale”, volume II) realça que a lei penal, ao punir os crimes praticados por particular contra a administração geral, deixa de considerar o interesse privado para procurar evitar a atividade arbitrária do particular na esfera reservada aos órgãos públicos. Coincide essa opinião com a de MANZINI (“Trattato di Diritto Penale”, vol. 5). Em verdade, o que a lei busca defender não é a pessoa em si, mas a Comissão Parlamentar de Inquérito, não é o membro da Comissão que ela protege, mas o exercício das atribuições na pessoa do membro da Comissão.

O crime tem um conteúdo subjetivo ou moral. psíquico, intelectual. Interno, e outro objetivo ou material, físico e externo. A relação de causalidade entre a ação ou emissão e o resultado é objetiva. A relação de causalidade que medeia entre a culpabilidade (dolo ou culpa no sentido estrito) e o resultado é subjetiva.

O crime de que se fala pode assumir diversas feições: a) impedir o regular funcionamento da Comissão Parlamentar de Inquérito: b) tentar impedir o regular funcionamento dessa Comissão; impedir o livre exercício das atribuições de qualquer dos membros da Comissão; c) tentar impedir o livre exercício das atribuições de seus membros.

Impedir é não permitir, é embaraçar, é estorvar, é não consentir que a Comissão exerça, execute com regularidade suas funções, ou que qualquer de seus membros atue livremente, desempenhe suas atribuições com liberdade de ação. Tentar impedir é procurar obstar, é experimentar, mostrar intento, em que ela não exerça regularmente suas sessões, seus trabalhos, suas funções, ou em que qualquer de seus membros fique privado do livre exercício de suas atribuições,

O modo com que.se impede ou tenta impedir o regular funcionamento da Comissão Parlamentar de Inquérito, ou o livre exercício das atribuições de qualquer de seus membros, é indiferente: tanto pode o agente empregar a violência, a ameaça, ou assuadas. Assuadas é bando de gente, armada ou não, para provocar desordem, fazer distúrbios, cometer hostilidades; é ajuntamento de indivíduos, voz em grita, a insultar com vaias, apupadas, corrimaças, assobios; é motim, briga, conflito, tumulto, arruaça. A ameaça é a ação de atemorizar, a intimidação por gestos ou palavras, a fim de que não funcione regularmente a Comissão, ou seus membros fiquem tolhidos do livre exercício de suas atribuições. Violência é a coação, a opressão, ou abuso da fôrça, a pressão, a fúria, a brutalidade, o ímpeto da turbulência.

O sujeito passivo dêste crime é a Comissão Parlamentar de Inquérito, ou qualquer de seus membros. Sujeito ativo é qualquer pessoa ou várias pessoas. No fato delituoso, mediante assuadas, a pluralidade de agentes é o que se observa.

Verificado que o agente quis diretamente o resultado, o effectus sceleris, dirigindo a vontade ao evento, ou assumiu o risco de produzi-lo, isto é, se arriscou conscientemente a produzir o evento, o crime é doloso. Dolo direto e dolo eventual estão equiparados.

É êste o princípio da legalidade na conceituação formal do crime de falso testemunho e na cominação da pena:

“Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade, como testemunha, perito tradutor ou intérprete, perante a Comissão Parlamentar de Inquérito.

Pena – reclusão, de um a três anos, e multa de Cr$ 1.000,00 a Cr$ 3.000,00”.

As obras de CARNELUTTI (“Teoria del Falso”, 1935) e de ALTAVILLA (“Psicologia Giudiziaria”, 1937) ressaltam as dificuldades de que se acha eriçada a questão de se saber se a afirmação de uma testemunha, tachada de falsa, tem ou não esse caráter. E de mister não se deslembrar a multiplicidade de variáveis condições sociológicas, psicológicas e patológicas que influi no testemunho, consoante pôs de manifesto o desembargador JOSÉ DUARTE, em acórdão dado à estampa na “REVISTA FORENSE” (vol. 100, pág. 554).

Vale notar que nem tôda contradição, nem tôda mentira se arrola no âmbito do falso testemunho. Para que se caracterize êsse crime, não se dispensa o elemento moral, a voluntariedade da ação, a intenção de enganar. É necessário que exista o dolo, que vem a ser a consciência da ilicitude, da afirmação falsa. É preciso que o agente conscientemente afirme o falso, negue ou cale a verdade.

Se a testemunha, perito ou tradutor, ou o intérprete, perante a Comissão Parlamentar de Inquérito, não por êrro comprovado, mas por dolo, por má-fé, faz falsa afirmação, nega a realidade, cala a verdade, indubitàvelmente comete crime e se sujeita a processo e punição pela autoridade judiciária competente.

Para êsse fim, tanto neste como no crime de impedimento, à comissão de inquérito cabe encaminhar ao procurador da República, ou solicitar diretamente ao juiz criminal, com jurisdição e competência na matéria, as providências processuais e punitivas.

12. Direito Parlamentar e a temporariedade das Comissões de Inquérito.

Ramo do Direito Constitucional, e de suma importância na vida dos regimes de representação, liberdade e opinião, o Direito Parlamentar é o conjunto de normas relativas ao ordenamento interno e ao funcionamento da Câmara.

As normas do regulamento parlamentar, isto é, as normas dos regimentos internos da Câmara e do Senado, têm eficácia jurídica como normas executivas ou integrativas dos princípios constitucionais tocantes ao Legislativo. Elas se situam num plano de subordinação hierárquica às regras da Constituição em matéria que entende com a organização e funcionamento das Casas do Congresso. Devem, por conseqüência, ajustar-se a essas regras não podem, sob pena de não valerem, contrapor-se a elas ou delas exorbitar (MOHRHOFF, “Trattato di Diritto e Procedura Parlamentare”, Roma, 1948; BALADORE PALLIERI, “Diritto Costituzionale”, Milão, 1949).

A eficácia interna das normas regimentais em cada Câmara tem indiscutível reflexo externo, pois, segundo adverte FERRUCCIO PERGOLESI (ob. cit.), nenhum contrôle, nem mesmo judiciário, se admite ao procedimento formativo do ato que produz efeitos externos, como seja o da aprovação da lei.

Salvantes as peculiaridades de cada uma das Câmaras, que têm a regula-Ias disposições especiais, as normas regimentais das duas Casas do Congresso, no sistema bicameral, possuem identidade e semelhança, por obedecerem aos mesmos princípios constitucionais reguladores das atividades parlamentares.

Se se acarear o Regimento Interno da Câmara dos Deputados com o Regimento Interno do Senado, ver-se-á a comprovação da assertiva. Confronte-se a organização da Mesa de uma e de outro; coteje-se o modo dos debates e deliberações daquela e desta Casa do Congresso; compare-se a formação das Comissões Parlamentares da primeira e da segunda, e fàcilmente se observará que o Regimento do Senado consolida normas de inquestionável similitude, quando não de perfeita identidade redacional. com as consubstanciadas no Regimento da Câmara.

O Direito Parlamentar se objetiva nos textos das regras do Regimento da Câmara, do Senado e do Congresso Nacional, cuja exegese obedece aos processos conhecidos de hermenêutica, sujeitando-se, portanto, às interpretações filológicas, históricas, teleológicas, evolutivo-sociológicas, analógicas. Não exprime contra-senso a própria exegese por fôrça de extensão. Atente-se em que, na formação da norma regimental e na sua aplicação prática, entra não raro o elemento político. Este elemento se radica no conteúdo da disposição regimental, do qual radia constantes efeitos.

Nos regimentos de uma e de outra Câmara figuram as regras que concernem ao local das reuniões e da mudança eventual de sede, às sessões preparatórias e à eleição da Mesa, à indicação, pelos partidos, de seus lideres e às atribuições do presidente, vice-presidentes, secretários e suplentes de secretários, às sessões ordinárias, extraordinárias, solenes, públicas, secretas e à fala dos representantes, à ordem do dia e à explicação pessoal, às proposições e aos projetos de lei de iniciativa do presidente da República, dos representantes e das Comissões, às reclamações e às questões de ordem, às indicações e aos requerimentos, às emendas e aos pareceres, à pauta e à discussão, aos prazos e às votações, aos métodos de votação e do destaque, à redação finai e à preferência, à urgência e aos orçamentos, à tomada de contas e à transferência de votações, aos subsídios e à ajuda de custo, aos projetos de crédito e às emendas à Constituição, às licenças do representante e à perda do mandato, à polícia da Câmara e à convocação extraordinária, ao comparecimento do ministro e aos serviços administrativos, às Comissões Permanentes e às Comissões Temporárias, entre as quais se acham as de inquérito, bem assim à constituição delas, às suas reuniões, aos seus trabalhos, às suas conclusões. Essas normas se assemelham num e noutro Regimento. O Senado, porém, funcionando como órgão judiciário, quer julgando o presidente da República e os ministros de Estado nos processos oriundos da Câmara dos Deputados, quer funcionando como tribunal de pronúncia e julgamento nos crimes de responsabilidade dos ministros do Supremo Tribunal Federal e do procurador geral da República, insere em seu Regimento disposições que, por lhe serem inerentes, não encontram semelhança nas normas regimentais da Câmara, à qual não competem atribuições que tais.

Na órbita do Direito Parlamentar, as Comissões Permanentes têm sua conceituação dentro de sua precípua finalidade, sue é a de estudar os assuntos levados, por fôrça de norma regimental, ao seu exame, para sôbre êles manifestar sua opinião. Dentre as principais Comissões Permanentes estão a de Constituição e Justiça, a de Finanças, a de Economia, a de Legislação Social, a de Saúde Pública, a de Educação e Cultura, a de Tomada de Contas, a de Transporte, Comunicações e Obras Públicas.

É temporária a Comissão Especial para estudo de assuntos relevantes, como sejam, a do Polígono da Sêca, a da Valorização Econômica da Amazônia, a da Bacia do São Francisco. É-o a Comissão Mista, constituída de deputados e senadores, com o encargo da elaboração ou da modificação do Regimento Comum do Congresso Nacional. É-o a Comissão Externa, para representar a Câmara nos atos para que tenha sido convidada.

As Comissões de Inquérito são igualmente temporárias. Criadas para apurarem fatos determinados, que deram origem à sua formação, não podem ter caráter permanente. Concluído seu trabalho de pesquisa e averiguação dos fatos, tomadas as providências necessárias e apresentado o relatório final de sua investigação ao plenário. exaurem-se suas atribuições, não havendo mais razão para que continuem a existir.

Criação constitucional, a Comissão Parlamentar de Inquérito é regulada pelo Regimento Interno de cada Câmara. Pode ser disciplinada também por normas fixadas em lei especial.

Entre nós, as Comissões Parlamentares de Inquérito receberam regulamentação no Regimento Interno do Senado (artigos 50 e 51), no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (arts. 30 e 47) e na lei nº 1.579. Vale a pena indagar o motivo dessa dupla regulamentação. Se o Regimento Interno de cada Câmara disciplinara o assunto, por que foi votada e sancionada aquela lei, ordenando tôda a matéria já regimentalmente regulada?

E de todo o ponto explicável que o Congresso Nacional houvesse elaborado a lei nº 1.579, ora em vigor, a despeito do assunto se achar regido por normas regimentais. É que essa lei não se limita à disciplina regimental das Comissões de Inquérito. Dispõe sôbre direito objetivo processual e sôbre direito objetivo material. Êste e aquêle direito não podiam ser regulados pelo Regimento Interno. Transcendem de sua órbita. Justifica-se, destarte, a feitura da lei nº 1.579, sem a qual não seria possível, por exemplo, a criação das novas modalidades delituais que nela foram contempladas.

13. Comissões de Inquérito perante as Constituições dos Estados-membros

Nem tôdas as Constituições dos Estados-membros, promulgadas após 18 de setembro de 1946 pelas Assembléias Constituintes, para complementação do quadro constitucional da República Federativa do Brasil, inseriram em seus textos, de modo expresso, no capítulo respectivo, disposições acêrca das Comissões Parlamentares de Inquérito. Na sua maioria, porém, as Constituições dos Estados-membros acolheram, reproduzindo-a, a norma de nossa Lei Maior que autoriza a criação dessas Comissões.

A Constituição de Alagoas, nos artigos 35 e 38, prescreve claramente o direito da Assembléia Legislativa convocar os secretários de Estado e de criar Comissões de Inquérito sôbre fato determinado. A do Amazonas, nos arts. 11 e 13, adotou preceitos idênticos.

No inciso XVI do art. 28 da Constituição da Bahia está a atribuição conferida à Assembléia Legislativa de criar Comissões de Inquérito, sempre que o requerer um têrço, pelo menos, dos deputados. A do Ceará explicita, no inciso VII do artigo 17, a mesma competência de sua Assembléia Legislativa.

É incisiva a Constituição do Espírito Santo. Reza seu art. 17:

“Sempre que o requeira um têrço, pelo menos, de seus deputados, a Assembléia pode constituir Comissões especiais, para levantamento das contas que não forem apresentadas pelo governador, ou para procederem a inquérito sôbre fatos determinados, cuja apuração seja de interesse público. O Regimento Interno traçará as normas que devem ser observadas nos trabalhos dessas Comissões”.

O art. 8° da Constituição de Mato Grosso, o 10 da Constituição de Minas Gerais, o 18 da Constituição do Pará, o 15 da Constituição da Paraíba, o 18 da Constituição do Rio de Janeiro, o 21 da Constituição do Paraná, o 23 da Constituição de Pernambuco, o 8º da Constituição do Rio Grande do Norte, o 18 da Constituição de Santa Catarina, o 30 da Constituição de Sergipe e o inciso 17 do art. 38 da Constituição do Piauí tratam do assunto, dando às respectivas Assembléias Legislativas o poder de instituir Comissões de Inquérito.

A Constituição de São Paulo, no capítulo do Poder Legislativo, fala da organização de comissões em geral com a garantia da representação proporcional dos partidos e da eleição de Comissão Especial para levantar as contas do governador, não apresentadas, e promover a punição dos culpados. Essa é a orientação seguida pela Constituição do Rio Grande do Sul, de Goiás e do Maranhão.

Vem á tona Indagar se à Assembléia Legislativa de um Estado-membro, cuja Constituição nada dispuser a respeito, será lícito criar Comissões Parlamentares de Inquérito? A resposta afirmativa se impõe. Fôrça é convir que, dentre as normas de organização do Legislativo no Brasil, se deparam as que autorizam a criação dessas Comissões.

Se a Constituição do Estado-membro é omissa, o Regimento Interno da Assembléia, na parte que trata da formação das Comissões Permanentes e Temporárias, poderá cogitar da Comissão de Inquérito. Assistirá ainda à Assembléia o direito de, em emenda constitucional, acrescentar ao texto disposições sôbre a matéria. Caber-lhe-á, ao demais, se não quiser emendar a Constituição, regular o assunto em lei ordinária, circunscrita à órbita de sua competência.

A requisição de informações, a convocação de secretários de Estado e a criação de Comissões de Inquérito, iniludivelmente são atribuições que inerem ao poder de fiscalização das Assembléias Legislativas. Essas importantes atribuições correspondem a reclamos da consciência jurídica de nosso tempo. As sindicâncias, de parte do Legislativo, têm a alta e nobre finalidade de fazer com que a lei seja observada e cumprida de conformidade com os mais alevantados interêsses públicos.

Não há discutir, portanto, o direito inconcusso que cabe às Assembléias Legislativas da apuração das atividades das autoridades públicas estaduais e da verificação de todos os fatos que interessem de perto o exercício das funções públicas na esfera governamental e administrativa do Estado-membro.

Se à Assembléia Legislativa compete apurar as acusações formuladas contra o governador, é de tôda a evidência que jamais se poderia pretender discutir a legitimidade de seu direito de criar Comissões de Inquérito para apuração de determinado fato. Para terem ação, com a amplitude das Comissões de Inquérito da Câmara e do Senado, é de mister que a lei estadual regule expressamente a matéria de sua atribuição.

14. O Município e as Comissões de Inquérito

Outro problema que merece examinado é o que entendo com as Comissões de Inquérito nas Câmaras de Vereadores. Poderá, porventura, a Câmara Municipal criar Comissões de Sindicância para averiguar o emprêgo de dinheiros públicos e fatos que atentam contra a retidão indispensável das atividades prefeitorais? Sim e re-sim.

Há, no quadro da federação brasileira, três órbitas com autonomia política e administrativa: União. Estado-membro e Município. A cada um dêsses níveis a Constituição traça os limites de sua atuação.

Tal qualmente o Direito Parlamentar, o Direito Municipal não tem sido estudado convenientemente. Não existe ainda doutrina racional e orgânica acêrca das funções autonômicas de nossas comunas.

Por largo tempo juristas e magistrados andaram às aranhas, quando eram convocados a definir com exatidão os vários aspectos da autonomia municipal. Sòmente agora, depois da promulgação do Cód. Político de 1946, graças ao movimento municipalista, irrompido no seio da Assembléia Nacional Constituinte, que refletia as justas aspirações do povo interiorano, ansioso por melhorar as condições de vida do Município, e mercê da necessidade da fixação do conteúdo das normas do art. 28 e dos §§ 2º e 4º do art. 15 da Constituição, que recolheram e consolidaram grande parte daqueles anseios, é que se começou a estudar com aprimoramento a esfera de ação dos poderes municipais.

Já a Constituição de 91 (art. 68) assegurava a autonomia do Município no que concerne ao seu peculiar interêsse. Na sua vigência se testilhou, e muito, sobre se a eletividade dos prefeitos era postulado decorrente da autonomia municipal. Duas correntes se formaram. Numa e noutra pontificaram juristas de alto tomo. QUINTINO BOCAÍUVA e EPITÁCIO PESSOA defenderam a constitucionalidade das leis que autorizavam a nomeação de prefeitos. RUI BARBOSA e PEDRO LESSA se opuseram a essa autorização, havendo-a por vulneradora do princípio da autonomia.

O Supremo Tribunal Federal não firmou jurisprudência sobre o assunto. Suas decisões surgiram na vacilação do pró e do contra. Ora em nome do princípio autonômico firmava regra de ser vedada a nomeação do prefeito; ora no interpretar o conceito de peculiar interesse declarava o caráter de constitucionalidade da lei ordinária, que dispunha sôbre essa nomeação.

Reconhecendo a Assembléia Nacional Constituinte de 1996 que o Município é a base física e espiritual da Nação, ficou desde logo assentado o princípio da autonomia política da eleição do prefeito e dos vereadores, da administração própria no que diz respeito ao seu interêsse peculiar, e, também, da autonomia financeira com os novos recursos que lhe foram constitucionalmente assegurados.

A Constituição atual, à moda da de 91 e da de 34, usou da expressão “peculiar interêsse”, sem, todavia, defini-la. Promana dessa omissão a controvérsia que, ainda hoje, se observa entre os que buscam a fixação de seu exato conceito.

A queda da Monarquia ensejou o triunfo da idéia federalista de descentralização político-administrativa, que se estendeu à esfera local. O Município passou desde então a ser o Imperativo da forma federativa, uma decorrência do princípio de descentralização. Exprime êle a soma dos interêsses locais, e se organiza por si mesmo, atendidas sempre as normas da Constituição da União e das Constituições do Estado-membro, que não contrariarem o espírito dos textos da Lei Mater.

Desta sorte, não está no livre alvedrio do Estado-membro, através de sua Constituição, ofender, no que toca à autonomia municipal, os cânones que a garantem. A cláusula do art. 28 da Carta Magna do Brasil envolve uma concessão ao Município, a qual não pode a Constituição do Estado-membro reduzir arbitràriamente. Os limites se contém no peculiar intêresse. Tôdas as atribuições neste encerradas, isto é, tôdas as atribuições compreendidas nesta esfera própria, são funções do poder municipal que não comportam qualquer cerceamento, inda que imposto em Assembléias Constituintes ou Ordinárias dos Estados-membros.

Não é fácil estabelecer o que seja interêsse puramente municipal, de self-government local. Bastante é recordar que inúmeras atividades locais não somente interessam ao Município, mas a um conjunto de comunas e ao próprio Estado-membro. Os planos de urbanismo, as obras de saneamento, os transportes coletivos, os serviços de água, iluminação, esgotos e outros muitos, embora sejam tipicamente municipais, têm conexação com o interesse geral do Estado-membro e da União.

Para se fixar o conteúdo da expressão “peculiar interesse”, é necessário que se tenha em vista não o que é do exclusivo interesse do Município, mas o que é da sua atribuição principal e imediata, o que pertence ao interêsse local, o que é da função própria da Municipalidade. Na esfera da competência municipal estão todos os poderes fixados pela Constituição do Estado-membro e por lei, na conformidade do Pacto Fundamental da União.

Diz o art. 18 de nossa Carta Magna:

“Cada Estado se regerá pela Constituição e pelas leis que adotar, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição”.

São reservados aos Estados-membros os poderes que implícita ou explicitamente lhes não sejam vedados pela Lei Magna do Brasil (art. 18, § 1º). Ao Estado-membro é defeso restringira órbita municipal gizada pelo Pacto Fundamental da União. Quanto aos poderes remanescentes, êstes pertencem aos Estados-membros, que só os atribuirão aos Municípios se fôr verificada a conveniência de fazê-lo.

Se os Estados-membros se arrogarem atribuições de interêsse principal, imediato, peculiar ao Município. que não sejam de sua competência privativa ou pertinentes à esfera remanescente, é claro que importará isso infringência da Constituição federal e poderá ser invalidado por mera representarão do Supremo Tribunal Federal O estadualismo extremado é incompatível com a autonomia municipal. O Município é hoje uma realidade não somente administrativa, mas também uma estrutura política com autonomia financeira. O princípio da autonomia municipal há de ser guardado, na conformidade do art. 18 da Constituição federal.

Dentro de sua autonomia e das atribuições que lhe cabem, os Municípios têm organização semelhante à do Estado-membro. Competem ao prefeito, nos limites constitucionais e legais, funções administrativas e governativas do Município. E assim órgão executivo municipal A Câmara de Vereadores é órgão legislativo. Cabe-lhe legislar, com a sanção do prefeito, sôbre as matérias de competência do Município.

A maneira da Câmara dos Deputados, das Assembléias Legislativas, as Câmaras Municipais organizam Comissões permanentes e especiais. As últimas se destinam à apuração de contas dos prefeitos, que não as prestem na época aprazada. Compete-lhes mais promover a responsabilidade dos prefeitos.

Se lhes cabe a atribuição de fiscalizar, nesta está a de apurar determinado fato da órbita de sua competência. mediante a criação de Comissão de Inquérito. Dispondo, no Regimento Interno, sôbre a constituição de suas Comissões, é óbvio que lhe assiste a criação de Comissão de Inquérito, caso a Lei Orgânica da Municipalidade nada prescreva a respeito.

A lei nº 1.579, de 18 de março de 1952, cogitou sòmente das Comissões Parlamentares de Inquérito na Câmara dos Deputados e no Senado. Para que as Comissões de Inquérito na Assembléia Legislativa e nas Câmaras de Vereadores tenham ampla ação nas pesquisas destinadas a apurar os fatos determinados que deram origem à sua formação, é necessário que uma lei regule a matéria de modo expresso.

Sem uma lei que assim disponha, as Comissões de Inquérito nos Estados-membros e nas Municípios se limitarão a sindicâncias, desprovidas, contudo, da fôrça e dos poderes que possuem as Comissões Parlamentares de Inquérito da Câmara dos Deputados e do Senado.

15. Comissões Especiais, crimes de responsabilidade, seu processo e julgamento

A lei n° 1.079, de 10 de abril de 1950, definiu os crimes de responsabilidade do presidente da República, dos ministros de Estado, dos ministros do Supremo Tribunal Federal, do procurador geral da República, dos governadores e dos secretários de Estados-membros. Dispôs também sôbre o processo e julgamento dêsses crimes. O julgamento dos prefeitos, salvo o da Capital da República, objeto do antigo 29 e dos seus parágrafos da Lei Orgânica do Distrito Federal (lei n° 217, de 15 de janeiro de 1948), ficou na competência regulamentar do Estado-membro.

Serão passíveis de pena os crimes de responsabilidade consumados e tentados. Consuma-se o crime, quando nêle se reúnem todos os elementos de sua definição legal (art. 12, I, do Cód. Penal). A tentativa se verifica, quando, começada a execução, não se completa, por circunstâncias alheias à vontade do sujeito ativa (artigo 12, II, do Cód. Penal). A tentativa é punida com a pena correspondente ao crime consumado, reduzida de um a dois terços, a menos que haja disposição em contrário (parág. único do art. 12 do Cód. Penal).

Comprovada a responsabilidade do presidente da República, dos ministros de Estado, dos ministros do Supremo Tribunal Federal ou do procurador geral da República, o Senado Federal impor-lhes-á a pena de perda do cargo, com o aditivo’da Inabilitação para o exercício de qualquer função pública, até cinco anos. No crime tentado ou consumado, a perda do cargo é condição sine qua. A redução só se dará quanto ao têrmo da inabilitação para exercício de função pública.

A condenação no impeachment não exclui o processo e o julgamento do acusado por crime comum perante a Justiça ordinária, na conformidade das leis do processo penal. Se o acusado fôr absolvido no processo de impeachment, não pode ser processado pelo mesmo fato noutra jurisdição.

Vários são os crimes do presidente da República e conexas dos ministros de Estado (art. 89 da Constituição federal). O sujeito ativo do crime será sempre o presidente da República, bem assim o ministro de Estado, se de qualquer modo concorreu para a tentativa ou consumação do delito, dado o princípio da co-autoria previsto no Cód. Penal (art. 25).

Definindo os crimes de responsabilidade contra a existência política da União, o art. 5º da lei nº 1.079 indica os atos havidos por atentatórios dessa existência. Se o presidente da República, por si, por ministro de Estado ou por quem quer que seja, mantiver comunicação com govêrno de outro país, incitando-o, afrontando-o, provocando-o a cometer hostilidade ou a fazer guerra contra a República; se prometer ao govêrno estrangeiro assistência ou favor, ou se lhe der auxílio, qualquer que seja, nos preparativos ou planos de guerra contra a República; se, à vista de fatos, ou diretamente, diligenciar por submeter a União ou algum dos Estados-membros ou Territórios a domínio estrangeiro, ou da União procurar separar qualquer Estado-membro, ou porção do território nacional; se praticar hostilidade contra nação estrangeira, sujeitando a República aos riscos da guerra; se por indiscrição ou outro motivo der a conhecer assuntos políticos ou militares que devam ficar em sigilo no interêsse da defesa da segurança externa ou dos interêsses da Nação; se prestar ajuda, seja qual fôr o modo, é nação inimiga a fazer guerra ou praticar hostilidade contra a República; se celebrar tratados, ajustes ou convenções comprometedoras da dignidade da Nação; se violar a imunidade que assiste a embaixadores ou ministras estrangeiros acreditados no país, bem assim tratados legitimamente feitos com nações estrangeiras; se declarar a guerra, salvo os casos de invasão ou agressão estrangeira, ou fizer a paz, não autorizadas pelo Congresso Nacional, ou, ainda, não empregar contra o inimigo os meios de defesa de que poderia dispor: se, finalmente, permitir que, durante as sessões legislativas e sem autorização do Congresso Nacional, fôrças estrangeiras transitem pelo território do país, ou por motivos de guerra nêle permaneçam temporàriamente, o presidente da República comete crime contra a existência política da União.

Na categoria dos crimes contra o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados-membros (art. 89, II, da Constituição), incluem-se a tentativa do presidente da República de dissolver o Congresso Nacional, quer impedindo a reunião, quer procurando impedir por qualquer maneira, o funcionamento das Câmaras; o uso da violência ou da ameaça contra algum representante da Nação, seja para o afastar da Câmara ou do Senado, seja para o coagir no momento de exercer seu mandato, seja para, mediante subôrno ou outra forma de corrupção, conseguir ou tentar obter idêntico objetivo; a violação das imunidades conferidas aos membros do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas dos Estados-membros, da Câmara de Vereadores do Distrito Federal e das Câmaras Municipais; a permissão de trânsito de fôrça estrangeira pelo território do país, ou permanência nêle quando houver oposição do Congresso Nacional; o obstáculo criado ao livre exercício do Poder Judiciário, ou o emprêgo de violência para impedir o efeito de sentenças, mandados ou atos judiciais; o constrangimento, por ameaça ou violência, do juiz, ou jurado, a proferir ou deixar de proferir voto, despacho ou sentença, ou a fazer ou deixar de fazer atos de seu ofício; a prática de atos com um dos aspectos acima definidos contra os poderes estaduais ou municipais, e, finalmente, a intervenção em negócios peculiares aos Estados-membros ou aos Municípios, com infração das normas constitucionais.

Constituem crimes contra o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais (art. 89, III, da Constituição) o impedir o livre exercício do voto por meio da violência, da ameaça ou da corrupção; o obstar ao livre exercício das funções dos mesários eleitorais; o violar o escrutínio de seção eleitoral, ou inquinar de nulidade seu resultado, subtraindo, desviando ou Inutilizando o material respectivo; o servir-se de autoridades que lhes sejam imediatamente subordinadas para a prática de abuso de poder ou o aquiescer em que essas autoridades o cometam, sem a repressão devida; o subverter ou o tentar subverter a ordem política e social por meios violentos; o açular militares à desobediência à lei ou à quebra de disciplina; o provocar animosidade entre as classes armadas ou contra elas, ou delas contra as instituições civis; o violar de modo expresso quaisquer das garantias individuais ou dos direitos sociais, constantes dos arts. 141 e 147 da Constituição; o tomar ou o autorizar, na vigência do estado de sitio, medidas de repressão que ultrapassem os limites estabelecidos na Constituição.

Contra a segurança interna do país (art. 89, IV, da Constituição), comete crime de responsabilidade o presidente da República que tentar mudar por violência a forma de govêrno adotada, ou a Constituição federal, ou a Constituição de Estado-membro, ou a lei da União, Estado-membro ou Município; que decretar estado de sítio, achando-se reunido o Congresso Nacional, ou, no recesso dêste não havendo comoção interna grave, ou fatos que mostrem estar a mesma a pique de irromper, ou não existindo guerra externa; que concorrer para que se cometa qualquer dos crimes contra a segurança interna definidos na legislação penal, ou não providenciar com as medidas de sua competência para impedir ou frustrar a execução de tais crimes; que se ausentar do país sem autorização do Congresso Nacional; que consentir tácita ou expressamente na infração da lei federal de ordem pública: que, enfim, deixar, nos prazos fixados, de dar providências ordenadas por lei ou tratado federal necessárias à sua execução e cumprimento.

Consideram-se crimes do presidente da República contra a probidade na administração (art. 89, V, da Constituição) a omissão ou retardamento malicioso de publicação das leis ou resoluções do Poder Legislativo ou dos atos do Executivo; a não prestação ao Congresso Nacional da conta do exercício anterior, dentro de 80 dias seguintes à abertura da sessão legislativa; a não efetivação da responsabilidade de seus subordinados, quando apurada em delitos funcionais ou na prática de atos contrários à Constituição; a expedição de ordens ou requisições que não se ajustem às disposições constitucionais expressas; a infringência das normas legais no prover os cargos públicos; o emprêgo de ameaça ou violência, de subôrno ou outra forma de corrupção para coagir o funcionário público a proceder ilegalmente; o procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decôro do cargo.

Se o presidente da República deixar de apresentar ao Congresso Nacional a proposta do orçamento da República dentro dos dois primeiros meses de cada sessão legislativa; se realizar estôrno de verba, exceder ou transportar sem autorização legal verbas orçamentárias, ou infringir expressamente, por qualquer modo, disposição da lei de meios, comete crime contra a lei de orçamento (art. 89, VI, da Constituição).

Está sujeito às penas do crime de responsabilidade contra a guarda e o legal emprêgo do dinheiro público (art. 89, VII, da Constituição) o presidente que, sem autorização legal ou observância da lei, ordenar despesas, abrir créditos, contrair empréstimos, emitir moeda corrente, apólices ou efetuar operação de crédito, alienar imóveis nacionais ou empenhar rendas públicas, bem assim que negligenciar a arrecadação das rendas, impostos e taxas, ou a conservação do patrimônio nacional.

Arrolam-se nos crimes de responsabilidade contra as decisões judiciárias êstes atos do presidente da República: obstar, por qualquer meio, o efeito dos mandados ou decisões do Poder Judiciário, recusar o cumprimento das decisões judiciais no que depender do exercício das funções do Poder Executivo, deixar de atender à requisição de intervenção federal. do Supremo Tribunal Federal ou do Tribunal Superior Eleitoral, impedir ou frustrar pagamento determinado por sentença judiciária (art. 89, VIII, da Constituição e art. 12 da lei nº 1.079).

Os ministros de Estado estão sujeitos a impeachment se cometerem espontâneamente ou por ordem do presidente da República qualquer dos atos aqui definidos como crime, se deixarem de comparecer, sem motivo justificado, perante a Câmara dos Deputados, o Senado Federal ou qualquer de suas Comissões, quando convocados para prestarem informações acêrca de determinado assunto, se não prestarem, dentro de 30 dias, e sem motivo justo, a qualquer das Câmaras do Congresso Nacional, os informes que lhes forem solicitados por escrito, ou se os prestarem com falsidade.

Qualquer cidadão pode denunciar o presidente da República ou o ministro de Estado por crime de responsabilidade. A denúncia deverá ser assinada pelo denunciante, ter a firma reconhecida e vir acompanhada de documentos ou da indicação do local onde se encontram. Havendo prova testemunhal a ser feita, o rol das testemunhas, nunca inferior a cinco, deverá figurar na denúncia, dirigida à Câmara dos Deputados.

Recebida a denúncia, lida no expediente da sessão seguinte, despachada a uma Comissão Especial eleita, formada de representantes de todos os partidos, na proporção de sua representação, terá a Comissão o prazo de 10 dias para opinar sôbre a denúncia, sendo-lhe, nesse têrmo, permitido promover diligências julgadas necessárias.

Publicado o parecer da Comissão Especial, será levado ao plenário da Câmara, para discussão e votação nominal. Se a denúncia não fôr considerada objeto de deliberação, será arquivada. No caso contrário, será remetida cópia autêntica ao denunciado para, no prazo de 20 dias, contestá-la e indicar os meios de provas que houver por necessárias à sua defesa.

Concluído êsse prazo, contestada ou não a denúncia, a Comissão promoverá as diligências requeridas ou tidas por convenientes, tomará depoimentos das testemunhas, fará acareação, ouvirá o denunciante e o denunciado, a quem é assegurado acompanhar pessoalmente ou por procurador todo o processo de instrução.

No prazo de 10 dias, findas as diligências, a Comissão dará parecer sôbre a procedência ou improcedência da denúncia. Publicado e distribuído o parecer, será de imediato incluído na ordem do dia. Depois de encerrada a discussão, seguir-se-à a votação nominal.

A procedência da acusação de crime de responsabilidade só poderá ser decretada pela maioria absoluta da Câmara. Sob pena de preclusão, não poderá exceder de 120 dias, contados da declaração da procedência da acusação, o prazo para o processo e julgamento dos crimes de responsabilidade. A denúncia só poderá ser formulada e apresentada à Câmara e por ela, recebida, enquanto o denunciado não houver deixado o cargo.

Decretada a procedência da denúncia, a Câmara dos Deputados elegerá uma Comissão de três membros para acompanhar o julgamento do acusado. Consoante se trate de acusação de crime comum ou de responsabilidade, o processo será enviado ao Supremo Tribunal Federal ou ao Senado Federal. O decreto de acusação do presidente da República ou de ministro de Estado terá efeito imediato da suspensão do exercício das funções do acusado e da metade do subsídio ou vencimento até sentença final.

A Câmara dos Deputados enviará ao Senado o processo e o decreto de acusação.

A Comissão acusadora oferecerá o libelo. O acusado comparecerá ao julgamento por si ou por seus advogados. No caso de revelia, ser-lhe-á nomeado defensor. A sessão de julgamento será presidida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal. Lidos o processo, o libelo e os artigos de defesa, inquiridas as testemunhas, realizar-se-á o debate oral entre a Comissão acusadora e o acusado e seus advogados. Encerrada, a discussão, o presidente do Supremo Tribunal Federal fará relatório dos debates e das provas produzidas, submetendo à votação nominal dos senadores o julgamento.

Sendo absolutório, o julgamento produzirá todos os efeitos desde logo a favor do acusado. Se o julgamento concluir pela condenação, será fixado o tempo de inabilitação do condenado para o exercício de qualquer função pública, ficando o acusado de imediato destituído do cargo.

A resolução do Senado constarei de sentença, lavrada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, e assinada pelos senadores que funcionaram como juízes. Será publicada nos órgãos oficiais e transcrita na ata de sessão.

Os crimes de responsabilidade dos ministros do Supremo Tribunal Federal, que consistem em alterar, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou voto já proferido em sessão do Tribunal; em proferir julgamento, quando a lei o considera suspeito na causa; em exercer atividade político-partidária; em ser patentemente desidioso no cumprimento dos deveres do cargo e em proceder de maneira incompatível com a honra, a dignidade e o decôro de suas funções (art. 39 da lei nº 1.079), serão processados e julgados pelo Senado Federal, que é, a um tempo, tribunal de pronúncia e julgamento. Idênticamente ocorre com o procurador geral da República nos crimes constantes de dar parecer, quando por lei seja suspeito na causa, de se recusar a praticar ato de sua incumbência, de ser evidentemente desidioso no cumprimento de suas atribuições e de proceder de modo contrário à dignidade e decôro do cargo.

O processo é semelhante ao da Câmara dos Deputados em relação ao presidente da República e aos ministros de Estado. A diferença está em que é o Senado o juiz processante e julgador. Presidirá ao julgamento o presidente do Supremo Tribunal ou seu substituto legal. A condenação importa perda do cargo e inabilitação para qualquer função pública durante certo prazo.

Os governadores de Estado-membro e seus secretários que cometerem atos atentatórios da existência da União, do livre exercício do Poder Legislativo, Poder Judiciário e de outros poderes constitucionais, do exercício dos direitos políticos individuais e sociais, da segurança interna do país, da probidade na administração, da guarda e do legal emprêgo dos dinheiros públicos, da lei orçamentária, ou do cumprimento das decisões judiciárias, acima definidos, respondem por crime de responsabilidade.

O processo é instaurado mediante denúncia à Assembléia Legislativa. Decretada sua procedência por maioria absoluta dos componentes da Assembléia, segue-se o julgamento por um tribunal constituído de cinco membros do Legislativo, escolhidos por eleição, e cinco desembargadores, mediante sorteio, sob a presidência do presidente do Tribunal de Justiça local. Só por dois terços dos membros de que se compuser o tribunal de julgamento será decretada a condenação.

Ao Legislativo Municipal cabe apurar e, se procedente, decretar a acusação do prefeito, em processo regular em que lhe seja assegurada defesa ampla. Seu julgamento no crime de responsabilidade (art. 89 da Constituição) se fará em tribunal organizado de acôrdo com a Lei Orgânica dos Municípios, observado, no que couber, o que se contém na lei número 1.079, para se evitar que governador faccioso, ou que a politicalha interesseira se sirva de um meio, que se afirma legal, para obra de vindita ou de eliminação do adversário.

As Comissões Parlamentares de Inquérito podem, no curso de suas investigações ou terminadas estas, chegar à conclusão da existência de crime de responsabilidade. Neste caso, deverá ser formulada denúncia e, designada a Comissão Especial, se procederá como manda a lei.

A Comissão Parlamentar de Inquérito é um instrumento de moralização; é um Instituto dos mais salutares e necessários na época que atravessamos.

I) Normas técnicas para apresentação do trabalho:

  1. Os originais devem ser digitados em Word (Windows). A fonte deverá ser Times New Roman, corpo 12, espaço 1,5 cm entre linhas, em formato A4, com margens de 2,0 cm;
  2. Os trabalhos podem ser submetidos em português, inglês, francês, italiano e espanhol;
  3. Devem apresentar o título, o resumo e as palavras-chave, obrigatoriamente em português (ou inglês, francês, italiano e espanhol) e inglês, com o objetivo de permitir a divulgação dos trabalhos em indexadores e base de dados estrangeiros;
  4. A folha de rosto do arquivo deve conter o título do trabalho (em português – ou inglês, francês, italiano e espanhol) e os dados do(s) autor(es): nome completo, formação acadêmica, vínculo institucional, telefone e endereço eletrônico;
  5. O(s) nome(s) do(s) autor(es) e sua qualificação devem estar no arquivo do texto, abaixo do título;
  6. As notas de rodapé devem ser colocadas no corpo do texto.

II) Normas Editoriais

Todas as colaborações devem ser enviadas, exclusivamente por meio eletrônico, para o endereço: revista.forense@grupogen.com.br

Os artigos devem ser inéditos (os artigos submetidos não podem ter sido publicados em nenhum outro lugar). Não devem ser submetidos, simultaneamente, a mais do que uma publicação.

Devem ser originais (qualquer trabalho ou palavras provenientes de outros autores ou fontes devem ter sido devidamente acreditados e referenciados).

Serão aceitos artigos em português, inglês, francês, italiano e espanhol.

Os textos serão avaliados previamente pela Comissão Editorial da Revista Forense, que verificará a compatibilidade do conteúdo com a proposta da publicação, bem como a adequação quanto às normas técnicas para a formatação do trabalho. Os artigos que não estiverem de acordo com o regulamento serão devolvidos, com possibilidade de reapresentação nas próximas edições.

Os artigos aprovados na primeira etapa serão apreciados pelos membros da Equipe Editorial da Revista Forense, com sistema de avaliação Double Blind Peer Review, preservando a identidade de autores e avaliadores e garantindo a impessoalidade e o rigor científico necessários para a avaliação de um artigo.

Os membros da Equipe Editorial opinarão pela aceitação, com ou sem ressalvas, ou rejeição do artigo e observarão os seguintes critérios:

  1. adequação à linha editorial;
  2. contribuição do trabalho para o conhecimento científico;
  3. qualidade da abordagem;
  4. qualidade do texto;
  5. qualidade da pesquisa;
  6. consistência dos resultados e conclusões apresentadas no artigo;
  7. caráter inovador do artigo científico apresentado.

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