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Violência econômica o que é a violência familiar patrimonial

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Violência econômica: o que é a violência familiar patrimonial

ANA CAROLINA CARPES MADALENO

DIREITO DE FAMÍLIA

RAFAEL MADALENO

ROLF MADALENO

VIOLÊNCIA PATRIMONIAL

Rolf Madaleno

Rolf Madaleno

12/06/2025

Paradoxalmente, o lar conjugal, que deveria ser o lugar considerado mais seguro, por vezes é precisamente o mais instável e perigoso de todos diante da violência familiar que pode ser física, psicológica, sexual, moral ou patrimonial. Existe no Brasil a Lei 11.340, de 7 de agosto de 2006, apelidada de Lei Maria da Penha, que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher e intenta prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher. Prescreve o artigo 7.º, IV, da Lei Maria da Penha que a violência patrimonial ocorre diante de qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades, ou, em resumo, pratica violência doméstica patrimonial o cônjuge que se apropria indevidamente ou destrói os bens da esposa ou companheira, como aquele que se furta deliberadamente do pagamento da pensão alimentícia destinada à subsistência da mulher credora de alimentos.

Conforme Adriana Noemí Krasnow, essa classe de violência se caracteriza por seu implemento silencioso, o que permite muitas vezes que a violência econômica se estenda no tempo, sendo a violência doméstica patrimonial definida na Argentina pelo artigo 4.º da Lei 26.485/2009, que trata sobre proteção integral para prevenir, sancionar e erradicar a violência contra as mulheres nos âmbitos em que desenvolvam suas relações interpessoais, definindo a violência como: “toda conduta, ação ou omissão, que de maneira direta ou indireta, tanto no âmbito público como no privado, baseada em uma relação desigual de poder, afete sua vida, liberdade, dignidade, integridade física, psicológica, sexual, econômica ou patrimonial, assim como também a sua segurança pessoal. Restam também compreendidas aquelas perpetradas pelo Estado ou por seus agentes. Considera-se violência indireta, para efeitos da presente lei, toda conduta, ação, omissão, disposição, critério ou prática discriminatória que ponha a mu­lher em desvantagem com respeito ao varão”.

Em geral, diz a citada autora, a classe de violência doméstica patrimonial coloca a mulher em uma situação de debilidade econômica, produto da concentração do poder material nas mãos do homem. Na sequência, apresenta como exemplos de violência patrimonial contra a mulher a falta de participação dela na tomada de decisões vinculadas com o patrimônio familiar; limitações no manejo de recursos econômicos; desapoderamento de bens; dependência econômica; controle de gastos. Representam todas essas hipóteses exemplos de uma clara menos-valia do atuar livre e autônomo da mulher, forçando com o decurso do tempo a que muitas das mulheres se adaptem a essa situação e percam o ânimo de produzir alguma mudança pela quebra de um projeto de vida compartilhado e optem pelo caminho do término da convivência, com o divórcio ou a dissolução da sua união estável, persistindo essa violência durante todo o processo de ruptura do relacionamento e até mesmo depois de dissolvida a relação prossegue a agressão, por exemplo, como a da privação dos alimentos.1

Lamentavelmente, a violência econômica, quando perpetrada contra a mulher no âmbito doméstico, deixa-a em uma situação de debilidade e demove em nível internacional de que sejam tomadas as medidas apropriadas para modificar esses padrões socioculturais de conduta dos homens que atuam com a ideia de uma inferioridade ou superioridade que dis­crimina em função do poder econômico, o qual obriga muitas mulheres a permanecerem em situação de violência diante da privação econômica que pode ocorrer nos dois sentidos, muito embora a Lei Maria da Penha trate apenas dos mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, prevendo o artigo 24 da Lei 11.340/2006 que, para a proteção pa­trimonial dos bens da sociedade conjugal ou dos bens de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras: (I) restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida; (II) proibição temporária para a ce­lebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo ex­pressa autorização judicial; (III) suspensão das procurações conferidas pela ofendida contra o agressor (uma forma muito comum de fraude); (IV) prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida; sendo oficiado o cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo (Lei Maria da Penha, art. 24, parágrafo único).

O legislador brasileiro tem investido fortemente na formulação e aprovação de leis vol­tadas para a proteção das pessoas consideradas vulneráveis, criando, inclusive, leis especiais dispondo sobre medidas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher e de enfrentamento à violência contra crianças, adolescentes, pessoas idosas e pessoas com deficiência durante a emergência de saúde pública de importância internacional decorren­te do coronavírus, responsável pelo surto de 2019, daí sendo sancionada e decretada a Lei 14.022/2020 para garantir total prioridade e tramitação dos processos e procedimentos volta­dos para a proteção dessas pessoas consideradas vulneráveis e, portanto, sujeitas a toda forma de violência humana, tal qual foi editada a Lei 14.010/2020, que dispunha sobre o Regime Ju­rídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do coronavírus (Covid-19).

O artigo 181 do Código Penal isenta de pena quem comete qualquer dos crimes de es­telionato e outras fraudes e receptação em prejuízo de cônjuge, na constância da sociedade conjugal (inc. I); de ascendente ou descendente, seja o parentesco civil ou natural (inc. II), com especial proteção do idoso contra aqueles que se apropriam ou desviam seus bens, pro­ventos, pensão ou qualquer outro rendimento (Lei 10.741/2003, art. 102), entre outros crimes de cunho econômico previstos no Estatuto da Pessoa Idosa.

Conforme esclarece Cleber Masson, ao comentar o artigo 181 do Código Penal, que versa sobre as imunidades absolutas e isenta da pena quem comete qualquer dos crimes contra o patri­mônio, em prejuízo do cônjuge, de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ile­gítimo, seja civil ou natural, trata-se de imunidades materiais absolutas, por questões de ordem pública, e importam na total isenção de pena ao responsável pelo delito patrimonial, em que o crime permanece íntegro e subsiste a culpabilidade do agente. Contudo, não há possibilidade de imposição de pena, pois a isenção de pena é obrigatória. O autor complementa: “esta imunidade penal absoluta refere-se à isenção de pena em razão do matrimônio, sendo imprescindível que o crime patrimonial tenha sido cometido em prejuízo do cônjuge na constância da sociedade conjugal, ou seja, antes do divórcio ou da separação oficial e diz que a separação de fato não afasta a incidência da imunidade absoluta, mas já a separação de corpos impede a utilização do benefício, havendo, por seu turno, duas correntes que discutem a possibilidade da imunidade penal absoluta na união estável, onde a primeira nega, pois cônjuge é somente aquele que casa e o texto constitucional seria claro ao reconhecer diferença entre a instituição do matrimônio e o instituto da união estável, tanto que pode ser convertida em casamento, mas cuja defesa desta tese de se tratar de institutos jurídicos distintos fica difícil depois do pronunciamento do Supre­mo Tribunal Federal nos Recursos Extraordinários 646.721/RS e 878.694/MG, de 10 de maio de 2017, proibindo qualquer sobreposição de uma entidade familiar sobre a outra, e a segunda posição doutrinária que entende ser possível a escusa absolutória por conta do artigo 226, § 3.º, da Constituição Federal que protege a união estável”.2

Os crimes patrimoniais cometidos entre cônjuges e familiares seriam lesivos à sociedade conjugal e à base familiar e, sendo assim, o Estado não deve interferir, salvo em casos excep­cionais, pois a punição do criminoso, diz Cleber Masson, tornaria a vítima também culpada, em face do seu comportamento capaz de colaborar na condenação do seu cônjuge ou parente, destruindo a relação afetiva matrimonial ou parental biológica e socioafetiva.3616

Entretanto, há previsão de pena no Código Penal quanto ao crime de abandono material, ao deixar o alimentante de prover, sem justa causa, a subsistência do cônjuge, ou de filho me­nor de 18 anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento da pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada (CP, art. 244). Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada (CP, art. 244, parágrafo único).

Autores

ROLF MADALENO 

ANA CAROLINA CARPES MADALENO 

RAFAEL MADALENO


NOTAS

1 KRASNOW, Adriana Noemí. Régimen patrimonial del matrimonio. Buenos Aires: Erreius, 2019. p. 226-229.

2 MASSON, Cleber. Direito penal. Parte especial. 13. ed. Rio de Janeiro: GEN/São Paulo: Método, 2020. v. 2, p. 628-631.

3 MASSON, Cleber. Direito penal. Parte especial. 13. ed. Rio de Janeiro: GEN/São Paulo: Método, 2020. v. 2, p. 627-628.

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