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PROCESSO CIVIL
Qual o prazo de prescrição para suscitar a nulidade de uma partilha?

Arnaldo Rizzardo
29/09/2025
O art. 2.027 do Código Civil, alterado pela Lei 13.105/2015 (atual Código de Processo Civil) trata da partilha anulável, cujo prazo para a anulação é de um ano. Veja-se o dispositivo:
“A partilha é anulável pelos vícios e defeitos que invalidam, em geral, os negócios jurídicos.
Parágrafo único: Extingue-se em 1 (um) ano o direito de anular a partilha”.
O prazo de um ano é para a anulabilidade e não para a nulidade, cuja alegação não é limitada pelo decurso do tempo, por força do art. 169 do Código atual, estabelecendo que “o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo”.
Washington de Barros Monteiro salienta, primeiramente, o conteúdo do art. 1.805 do Código Civil anterior, equivalente ao atual art. 2.027, de tornar anulável a partilha pelos vícios e defeitos que invalidam, em geral, os atos jurídicos, sendo esses vícios e defeitos “o erro ou ignorância, o dolo, a coação e a simulação, definidos no Capítulo II, Título I, do Livro III, do Código Civil…”1 (atualmente Capítulo IV, Título I, do Livro III, da Parte Geral do Código). De ressalvar que, presentemente, a simulação é ato nulo (art. 167 do Código Civil).
AS NULIDADES ABSOLUTAS E O TRATAMENTO DIANTE DAS NULIDADES RELATIVAS
Diferente é a situação se a partilha impregnar-se de nulidade absoluta, nos termos do art. 166 do Código Civil, sendo os seguintes:
I – celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II – for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III – o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV – não revestir a forma prescrita em lei;
V – for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
VI – tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
Em casos tais, finaliza o mencionado autor, embora não abrangendo o universo de hipóteses introduzido pelo vigente Código, não se pode admitir um prazo tão curto para o que denomina prescrição, sendo atualmente o prazo para a decadência.2
Pontes de Miranda endossa a posição de estabelecer o prazo vintenário (pelo Código atual o prazo é de dez anos) a favor de quem não foi parte no ato de partilha.3
Jefferson Daibert refere que a então prescrição estendia-se por vinte anos porque existiria um ato nulo na partilha, e “ato nulo não chega a nascer, não pode produzir efeitos, e se é, como afirmamos, natimorto, é imprescritível. Contudo, poder-se-ia aplicar-lhe a prescrição dos direitos pessoais, que é de dez anos”.4
Orlando Gomes, distinguindo os atos nulos e anuláveis, observa o caso de faltar um dos elementos essenciais à partilha, como na participação de herdeiro menor quando amigável o arrolamento: “Não se trata, no caso, de vício ou defeito da vontade, mas de falta de um elemento sem o qual o ato não pode ter validade. Será, pois, nulo de pleno direito, não se lhe aplicando a disposição do art. 1.805 do Código Civil, mas a regra geral de que não prescrevem os atos nulos, ou, quando muito, prescrevem em vinte anos”.5
Insta observar que, pelo presente Código – art. 169 –, não se fixa algum tempo para suscitar a nulidade. Se passar um lapso de quinze ou mais anos na posse de um bem, com os requisitos previstos para o usucapião, pode-se dar, aí, o reconhecimento desta forma de aquisição do domínio, tornando sem efeito a nulidade.
Sílvio Rodrigues traz uma exegese bem aceitável para encontrar a explicação de que os arts. 1.805 e 178, § 6º, inc. V, do mesmo Código Civil de 1916, e, assim, o art. 2.027 e seu parágrafo único do atual Código, cujos conteúdos equivalem, se restringem aos casos de anulabilidade:
“Primeiro, porque o art. 178, § 6º, inc. V, do Código Civil refere-se especificamente ao art. 1.805, que cuida apenas, e tão só, da partilha anulável, e não da nula, de modo que só se aplica aos casos de anulação por defeito de erro, dolo, coação, simulação ou fraude. Segundo, porque os atos nulos, conforme vimos, são imprescritíveis”.6
Jurisprudência sobre partilha anulável
Parece que aí está o cerne da questão. Conclui-se, conforme a jurisprudência:
“Todos os vícios processuais, inclusive os da sentença, uma vez transitada em julgado, passam a ser relativos, e desde que cobertos pela res judicata, somente são apreciáveis em ação rescisória, específica à desconstituição do julgado. Um deles, porém, restou indene à transformação da querela nullitatis, em ação rescisória: a falta de citação inicial, que permaneceu como citação ipso iure, com todo o vigor de sua conceituação absoluta de tornar insubsistente a própria sentença transitada em julgado”.7
É fora de dúvida que a lei tem em conta, no art. 2.027, exclusivamente os vícios e defeitos que tornam anulável a partilha.
E não poderia ser diferente a exegese. Inconcebível que objetivasse dar a lei o mesmo tratamento para situações de intensidade diferente. Os fatores que ensejam a nulidade são de conteúdo bem mais grave. Realmente, quem não participou do inventário, ou teve um bem particular incluído na partilha, ou, mesmo participando, era menor ou totalmente incapaz, e não foi regularmente representado, não se encontra no mesmo pé de igualdade da pessoa que, participando, foi enganada na distribuição do patrimônio.
Válida esta conclusão de João Alberto Leivas Job, escrevendo sobre o art. 1.805 do Código de 1916, que equivale ao art. 2.027 ora em vigor: “O art. 1.805… do Código Civil brasileiro apenas determina as condições em que a partilha é ato jurídico anulável, permanecendo o mesmo capítulo omisso a uma referência especial aos casos de partilha enquanto ato nulo”.8
Na mesma posição, o Supremo Tribunal Federal, há bastante tempo, restringindo os arts. 178, § 6º, inc. V, e 1.805, do Código de 1916, e, assim, o art. 2.027 e seu parágrafo único, do presente Código, aos atos anuláveis, e referindo-se à prescrição:
“I – Prescrição ânua do art. 178, § 6º, V, do Código Civil para a partilha simplesmente anulável e não a nula. II – Os prazos do art. 178 não se aplicam aos atos nulos, mas apenas aos anuláveis… Nesses casos, há a prescrição ordinária e não a breve e excepcional de um ano, nem a decadência inerente à rescisória”.9
Texto de:Arnaldo Rizzardo, Arnaldo Rizzardo Filho e Carine Ardissone Rizzardo

NOTAS
1Curso de direito civil: direito das sucessões. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1962. p. 311-312.
2Curso de direito civil: direito das sucessões, cit., p. 312.
3Tratado de direito privado. São Paulo: RT, 1974. v. VI, p. 349.
4Direito das sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 1976. p. 372.
5Sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 1973. p. 333.
6Direito civil: direito das sucessões. São Paulo: Saraiva, 1972. v. VII, p. 283.
7 Agravo de Instrumento nº 589034555, da 6ª Câmara Cível do TJRS, de 27.06.1989, Revista de Jurisprudência do TJRS 142/152.
8Da nulidade da partilha. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1986. p. 5-6.
9 Recurso Extraordinário nº 94.302-1/SC, de 17.09.1982, Lex – Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal 48/108.