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O resgate das enfiteuses anteriores ao Código Civil

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O resgate das enfiteuses anteriores ao Código Civil

REVISTA FORENSE 159

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26/10/2023

SUMÁRIO: 1. As várias tentativas de extinção da enfiteuse. 2. O artigo 693 do Cód. Civil e o direito de resgate. 3. Aplicação do art. 693 às enfiteuses constituídas anteriormente ao Cód. Civil. 4. O resgate da enfiteuse no direito italiano. 5. Aplicação imediata das normas relativas a direitos reais e o direito de resgate. 6. Inexistência de ofensa a direito adquirido. 7. A opinião de OROZIMBO NONATO e outros. 8. Um pronunciamento do Supremo Tribunal Federal. 9. Conclusão.

1. As várias tentativas de extinção da enfiteuse

Não pode deixar de surpreender a quem estude o problema da enfiteuse, aforamento ou emprazamento, continue subsistindo em nosso direito um instituto inteiramente obsoleto, que já não tivera acolhida no Código de NAPOLEÃO e que, de há muito, devera ter sido recolhido ao museu das coisas inúteis e inconvenientes aos interêsses sociais, que à lei cumpre resguardar e defender.

Há mais de 20 anos, JOÃO MANGABEIRA, com a autoridade de jurista consagrado, dava-lhe combate, sintetizando o pensamento à respeito do assunto, no tópico seguinte: “Peça do mundo antigo e base do regime feudal, nada justifica êsse cativeiro perpétuo do trabalhador ao dono da terra, que não a desbrava, não a cultiva, não a explora. Essa vassalagem, característica da servidão feudal, só por um preconceito injustificável pode ser atualmente conservada”.1

Várias tentativas, desde então, foram feitas no sentido da extinção da enfiteuse, dentre elas podendo ser citada a que teve origem com a escolha da douta Comissão, integrada pelos ilustres e consagrados juristas OROZIMBO NONATO, FILADELFO AZEVEDO, HAHNEMANN GUIMARÃES, JOSÉ SABÓIA VIRIATO DE MEDEIROS e AGRIPINO VEADO, encarregada de elaborar, ainda ao tempo da ditadura, anteprojeto de lei relativo ao assunto.

Desincumbiu-se, ràpidamente, a Comissão da tarefa que lhe fôra atribuída e, em 18 de janeiro de 1944, apresentou o resultado final de seus trabalhos, terminando por propor a “…imediata abolição da vetusta, categoria jurídica, que, revivendo o nome de antigo instituto grego, começou a se desenvolver no direito romano do IV século e forneceu a base do aproveitamento da terra no período medieval, passando para o direito português”.2

A facilidade e, porque não dizê-lo, a afoiteza com que se legislava àquela época, induz-nos a concluir que interêsses de monta se opuseram a que o trabalho executado por tão ilustre e autorizada Comissão se transformasse em realidade.

Em 1948, o deputado HERMES LIMA submeteu à apreciação de seus pares projeto de lei de extinção do instituto da enfiteuse, baseando-o, segundo suas próprias palavras, no anteprojeto elaborado pela douta Comissão acima referida. “O que faço, neste momento”, dizia êle, “é oferecer ao debate e à decisão da Câmara, tornando meu, o projeto elaborado por aquela douta Comissão, o qual, embora merecedor de certos reparos, constitui um ponto de partida magnífico para a solução do assunto”.3

O projeto HERMES LIMA, depois de longa e injustificável protelação, foi afinal aprovado pela Câmara dos Deputados, encontrando-se, de há longo tempo, no Senado Federal, à espera de seu pronunciamento, para transformar-se em realidade.

Embora não constitua nosso propósito tratar da extinção da enfiteuse, que mereceu de nossa parte um pequeno estudo, publicado na “REVISTA FORENSE”,4 consideramos oportuno oferecer ao leitor esta rápida informação, inteirando-o da marcha de um projeto de lei de real interêsse público, mas que tem sofrido injustificável retardamento em ambas as casas do Congresso Nacional.

2. O art. 693 do Cód. Civil e o direito de resgate

Inspirado no antigo Cód. Civil italiano, que continha dispositivo positivo idêntico, o codificador brasileiro instituiu, no art. 693 do Cód. Civil, o direito de resgate das enfiteuses, prescrevendo:

“Art. 693. Todos os aforamentos, salvo acôrdo entre as partes, são resgatáveis 30 anos depois de constituídos, mediante pagamento de 20 pensões anuais pelo foreiro, que não poderá no seu contrato renunciar o direito de resgate, nem contrariar as disposições imperativas dêste capítulo”:

Ao entrar em vigor o Cód. Civil, foi suscitado o problema da aplicação do referido dispositivo de lei, particularmente no que concerne às enfiteuses ou aforamentos constituídos anteriormente ao seu advento, pretendendo, os que se opunham a tal aplicação, que isto seria impossível, pois viria ferir o direito adquirido dos antigos senhorios.

Tal corrente contou, de início, com o apoio e o prestígio do insigne CLÓVIS BEVILÁQUA, que, ao negar aplicação retroativa ao dispositivo em referência, teve ocasião de afirmar: “…o direito de resgate não aproveita aos aforamentos já constituídos, quando o Cód. Civil entrou em vigor, por se não ofender o direito dos senhorios, que, contando com a perpetuidade, estipularam cânones extremamente módicos. Sòmente a respeito dos prazos concedidos de 1° de janeiro de 1917 por diante, pois que já se constituem na vigência do novo direito, é que o resgate é possível”.5

Sustentando idêntico ponto de vista, invoca SÁ FREIRE a lição do insigne GABBA, no sentido de que “aquelas transformações das instituições jurídicas perpétuas, que não têm por efeito cessar essa perpetuidade, porém que se resolvem em qualquer mudança da disposição interna delas, não podem ser aplicadas retroativamente, a menos que o legislador o ordene expressamente”.6

Para SÁ FREIRE o disposto no artigo 693 do Cód. Civil não teve, portanto, o efeito de retirar ao instituto a característica de perpetuidade; no máximo, ter-se-ia verificado a transformação da enfiteuse em suas disposições internas, motivo pelo qual não poderia o referido dispositivo ser aplicado retroativamente.

São suas as palavras que se seguem: “A faculdade de resgate, repetimos, não modificou o instituto jurídico da enfiteuse, donde a conclusão de que os contratos celebrados antes de vigorar o Código devem ser regidos, quanto às suas condições de validade e seus efeitos, pela lei vigente ao tempo em que foram firmados, solução esta que se concilia com a opinião daqueles que se esforçam por sustentar que as leis que extinguem os institutos jurídicos de duração perpétua levam de vencida os direitos adquiridos”.7

3. Aplicação do art. 693 às enfiteuses constituídas anteriormente ao Cód. Civil

A alegação não nos parece procedente, pois o simples fato da lei instituir o direito de resgate como norma geral e imperativa, considerando tal direito como irrenunciáviel, òbviamente importou a modificação substancial da enfiteuse, que deixou de revestir-se da característica de perpetuidade do regime anterior para se transformar em instituto de caráter transitório e temporário, subordinado tão-sòmente ao arbítrio de uma das partes contratantes, o enfiteuta, no que se refere à oportunidade de exercitá-lo, desde que transcorrido o prazo mínimo fixado pela lei.

A questão, a nosso ver, é bastante clara e tranqüila e pode ser resumida da seguinte forma: A lei antiga estabelecia que as enfiteuses se revestiam do caráter de perpetuidade. A lei nova, o Cód. Civil, no seu art. 693, se opôs àquela perpetuidade, e, ao contrário da lei antiga, prescreveu que tôdas as enfiteuses seriam resgatáveis depois de transcorridos 30 anos de sua instituição. O Cód. Civil, por essa forma, punha têrmo à perpetuidade do instituto, reconhecida no direito anterior, não se limitando, porém, a isto, pois ainda fêz mais, proibindo, expressamente, a renúncia ao direito de resgate, pelo que tornou ainda mais claro e explícito seu propósito de não permitir, de nenhum modo, que tal princípio fôsse burlado pela vontade das partes contratantes, que ficaram impedidas de restaurar-lhe a perpetuidade.

Razão, portanto, assistia a JOÃO LUÍS ALVES, defensor da tese da aplicabilidade do art. 693 do Cód. Civil às enfiteuses constituídas anteriormente à sua vigência:

“O resgate, no próprio conceito de GABBA”, dizia êle, “não constitui uma simples mudança na disposição interna da enfiteuse perpétua, mas uma transformação que tem por efeito fazer cessar essa perpetuidade. Se o foreiro,

passados 30 anos, pode resgatar o aforamento (sem poder renunciar prèviamente êsse direito), é claro que o Cód. Civil o transformou, estabelecendo uma fórmula de fazer cessar-lhe a perpetuidade”.8

Na realidade, o próprio GABBA, invocado por SÁ FREIRE, para justificar a tese da não-aplicabilidade do art. 693 às enfiteuses constituídas anteriormente ao Cód. Civil, esclarece e define seu pensamento a respeito, quando afirma: “Noi non dubitiamo che una volta introdotto il principio della affrancabilità delle rendite enfiteutiche perpetue, questo principio dovrebbe essere applicato alle enfiteusi già constituite quand’anche il legislatore espressamente non l’abbia detto; tale retroattività è imposta dallo stesso carattere di perpetuità di quela istituzione, come noi abbiamo gia avuto più volte ocasione di osservare”.9

4. O resgate da enfiteuse no direito italiano

EDUARDO ESPÍNOLA e EDUARDO ESPÍNOLA FILHO, defensores da aplicação do direito de resgate às enfiteuses constituídas anteriormente ao Código Civil, relembram ter sido o assunto objeto de discussões no direito italiano, cujo antigo Cód. Civil serviu de modêlo ao nosso art. 693.

Segundo esclarecem os referidos autores, os comentadores do Cód. Civil italiano sempre sustentaram que se a lei nova sancionou o princípio da liberação ou resgate das enfiteuses, sem limitar sua aplicação a respeito das enfiteuses perpétuas antes constituídas, não resta dúvida que também compreendem as enfiteuses perpétuas procedentes.10

Esta é, na realidade, a lição da doutrina e da legislação italianas, segundo esclarece NICOLA STOLFI: “Quindi la facoltà di riscatto è stata concessa sensa limitazione di tempo e di circostanze, e deve prevalere anche al diritto di prelazione spettante al direttario per patto stipulato sotto l’impero delle antiche leggi. Cf. App. Palermo, 10 decembre 1875 (Circ. giur. 1876, I, 253); App. Catalina, 18 gennaio 1876 (Foro ital. 1876, I, 1876); App. Roma 23 febbraio 1876 (ibid. 1876, I, 1063)”.11

5. Aplicação imediata das normas relativas a direitos reais e direito de resgate

Segundo afirmam os doutrinadores, as normas que dispõem sôbre os efeitos dos direitos reais são de aplicação imediata, regulando-se pela lei vigente ao tempo que foram postas em execução.12

Referindo-se particularmente à enfiteuse, EDUARDO ESPÍNOLA e EDUARDO ESPÍNOLA FILHO afirmam ser princípio reconhecido na doutrina que as enfiteuses perpétuas, como tôdas as instituições e direitos reais de duração perpétua, se submetem à lei atual.13

Na hipótese do direito de resgate, motivos de ordem social levaram o legislador a determinar ou prescrever a cessação da perpetuidade do instituto da enfiteuse vigorante no direito anterior, determinando que estas seriam resgatáveis transcorridos 30 anos de sua instituição.

Face às lições dos doutrinadores, no que diz respeito às normas relativas a direitos reais, não é possível negar-se aplicação imediata ao dispositivo que instituiu o direito de resgate, que, por essa forma, deverá regular não só as enfiteuses posteriores ao Cód. Civil, como, também, as anteriormente constituídas, que perderam as características de perpetuidade de que antes se revestiam.

Neste sentido é a lição de PAUL ROUBIER: “La loi qui supprime un type de droit réel doit s’appliquer aussitôt à tous les droits de ce genre qui existent: car la loi ainsi portée a pour but de remédier aux inconvénients résultant de ce droit réel; elle est une loi de statique juridique, qui, dès son entrée en viguer, met fin à toutes les situations existantes (supra, I, page 405). Tel fut le cas des lois qui supprimaient les droits féodaux. Tal fut encore le cas des lois qui ont organisé la faculté de rachat des rentes foncière (D. 1829 déc. 1790, art.1er.; C. civ., 530; V. aussi, en ce qui concerne les emphytéoses, les Disp. transit. du C. civ. ital. de 1865, art. 30, et GABBA, op. cit., III, p. 186 suiv.)”14

Não é diversa a lição de RUGGIERO, que, embora ressalvando os direitos adquiridos na vigência da lei anterior, termina por concluir: “…o interêsse social pode levar ao desconhecimento das aquisições já feitas, desde que esta forma de propriedade ou de outro direito real seja considerada contrária aos princípios em que se inspira a legislação posterior (por exemplo: abolição dos feudos, fideicomissos, libertação da enfiteuse etc.)”.15

Quem examine, embora perfunctòriamente, o art. 693 do Cód. Civil, não poderá fugir à conclusão de que o referido dispositivo de lei consubstancia uma norma de ordem pública, já que não é lícito às partes contratantes sôbre êle dispor livremente, derrogando-lhe, modificando-lhe ou alterando-lhe as disposições. Sòmente um interêsse de ordem pública ou social teria determinado a instituição do direito de resgate, pelo legislador, que visou a consolidar a propriedade na pessoa do enfiteuta.

6. Inexistência de ofensa a direito adquirido

Pretendem os que advogam a tese da não-aplicabilidade do direito de resgate às enfiteuses constituídas anteriormente ao Cód. Civil, que isto seria impossível por ferir o direito adquirido do senhorio direto.

Entendemos que, ainda aí, não lhes assiste razão, nem tampouco amparam o ponto de vista defendido os ensinamentos da doutrina e os princípios gerais de direito aplicáveis à espécie.

Ao instituir o direito de resgate, o codificador brasileiro estabeleceu, no artigo 693 do Cód. Civil, em caráter imperativo e peremptório, que todos os aforamentos são resgatáveis 30 anos depois de constituídos, mediante o pagamento de 20 pensões anuais pelo foreiro, que não poderá renunciar ao direito de resgate.

Previu a lei, conseqüentemente, uma indenização a ser paga ao senhorio pela perda do domínio direto da propriedade dada em aforamento, motivo pelo qual não se poderá falar em ofensa a direito adquirido.

No máximo, poder-se-ia sustentar que o critério estabelecido pela lei para a indenização teria sido desarrazoável e injusto; todavia, cumpre-nos ponderar que se tal critério é justo e deve predominar com relação às enfiteuses constituídas posteriormente ao Cód. Civil, também deverá ser relativamente às enfiteuses constituídas anteriormente a êle.

Se é certo que os institutos jurídicos de caráter perpétuo podem ser abolidos, sem ofensa a direito adquirido, pois do contrário seria impossibilitar a própria evolução da ciência jurídica, não vemos como a instituição do resgate da enfiteuse pelo art. 693 do Cód. Civil possa ofender o direito do senhorio direto, máxime quando a lei impõe lhe seja paga uma correspondente indenização pela perdas do domínio direto.

Irrespondível nos parece a lição de CARLOS MAXIMILIANO: “não há direito adquirido no tocante a instituições ou institutos jurídicos. Aplica-se logo, não só a lei abolitiva, mas, também, a que, sem os eliminar, lhes modifica essencialmente a natureza. Não se acoima de retroativa a aplicação integral e imediata de uma lei abolitiva da escravidão, da enfiteuse, do fideicomisso perpétuo”.16

A aplicação imediata do art. 693 do Cód. Civil às enfiteuses constituídas anteriormente à sua vigência decorre não só dos têrmos peremptórios com que foi redigido o dispositivo em referência, como, também, das normas e princípios que regulam a aplicação das leis relativas aos direitos reais, especialmente as que dizem respeito aos institutos de caráter perpétuo.

7. A opinião de OROZIMBO NONATO e outros

Cabe-nos salientar que a questão da aplicabilidade do art. 693 do Cód. Civil às enfiteuses anteriormente constituídas foi examinada pela referida Comissão, composta dos consagrados juristas OROZIMBO NONATO, FILADELFO AZEVEDO, HAHNEMANN GUIMARÃES, JOSÉ SABÓIA VIRIATO DE MEDEIROS e AGRIPINO VEADO, que, na exposição de motivos que acompanhou o projeto por ela elaborado, afirmara: “íntegro se apresentava, à Comissão, o problema da aplicabilidade do art. 693 do Cód. Civil a emprazamentos anteriores. A grande maioria dos comentadores, a partir do egrégio autor do Cód. Civil, como a dos julgados, se inclinava para os excluir do resgate, em respeito aos direitos adquiridos, naquela época protegidos por princípios constitucionais. Vozes autorizadas, todavia, invocavam lições ponderosas, desde a do clássico GABBA, no sentido de que as instituições perpétuas podem ser abolidas, sem ofensa a qualquer vedação de irretroatividade, sob pena, de se trancar a própria evolução jurídica”.

Não obstante, terminou a douta Comissão por afastar a fórmula do resgate, “contra o voto do ministro OROZIMBO NONATO, que considerava já estar o problema resolvido, em face do art. 693 do Cód. Civil”.17

8. Um pronunciamento do Supremo Tribunal Federal

Cumpre-nos esclarecer que, em um de seus raros pronunciamentos sôbre o assunto, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o recurso extraordinário nº 7.560, originário de Pernambuco, houve por bem reformar decisão do Tribunal de Justiça daquele Estado para declarar que “a disposição do art. 693 do Código Civil só é aplicável aos aforamentos constituídos depois da vigência do Código Civil”, sendo de salientar-se os votos vencidos dos ministros RIBEIRO DA COSTA, MACEDO LUDOLF, OROZIMBO NONATO e ANÍBAL FREIRE.18

Trata-se de importante decisão da nossa mais alta Côrte de Justiça, não só pelo amplo interêsse que o assunto despertou, como também, pelo brilho com que foi êle debatido, especialmente pelos Srs. ministros HAHNEMANN GUIMARÃES e OROZIMBO NONATO, cujo pensamento a respeito já era conhecido através do pronunciamento anteriormente referido.

São de OROZIMBO NONATO as seguintes palavras: “É o resgate um dos modos de extinção das enfiteuse, instituto perpétuo. E as leis que extinguem tais institutos têm inevitável projeção retrooperante, cabendo ao legislador, como providência de política jurística, e em prol respeitáveis interêsses ligados, muitas vêzes, às conveniências mesmas da paz social e do consórcio civil, estabelecer providências atenuadoras de prejuízos e perturbações. Mas, o princípio, de qualquer modo, é verdadeiro.

O que se controverte é a ocorrência ou não do dever de indenizar; mas fôrça é conhecer que as leis abolitivas de institutos de duração perpétua necessitam, para a realização de seu fins, do mais amplo efeito retroativo”.19

9. Conclusão

Ao redigir êste trabalho, não nos move outro objetivo senão e tão-sòmente o de chamar para o assunto a atenção dos mais doutos, provocando, por essa forma, um reexame do problema, de real e incontestável interêsse público, tanto mais que viria, por si só, resolver entre nós a questão da enfiteuse, independentemente de qualquer outra medida ou providência de ordem legislativa.

Para a extinção do instituto da enfiteuse no Brasil, bastaria que se desse execução e cumprimento à vontade do legislador, expressa no art. 693 do Código Civil, pois acreditamos inexistentes os aforamentos constituídos posteriormente à sua vigência.

Não é possível admitir-se, nos tempos atuais, a subdivisão da propriedade privada, permitindo-se que sôbre o mesmo bem subsistam, concomitantemente, os direitos de dois proprietários; um, o enfiteuta, a quem é reconhecido o direito de possuí-lo diretamente, satisfazendo determinadas prestações; o outro, o senhorio, que lhe conserva o domínio direto e o explora como um privilégio inexaurível, dado seu atual caráter de perpetuidade.

Segundo esclarece ORLANDO GOMES, há no direito moderno, especialmente no direito francês, uma tendência para interpretar a evolução do direito de propriedade como um movimento para a sua democratização. “A fortuna acumulada”, diz êle, “desprestigia-se. A propriedade estática cede diante da propriedade dinâmica, baseada no trabalho ou na utilização das coisas. Os que trabalham e os que utilizam as coisas, operários, lavradores, professionistas, comerciantes, inquilinos, rendeiros, tôda essa incalculável massa de não-proprietários forçam o círculo da propriedade”.20

Quando a evolução da propriedade se orienta no sentido de sua maior democratização, visando proteger precisamente os que a trabalham e a utilizam diretamente, de todo descabida se nos apresenta a posição dos que tentam opor-se ao movimento da extinção da enfiteuse, cuja existência só se compreende e só se torna possível admitir-se como expressão do conceito de propriedade vigorante elo direito medieval.

A aplicação do direito de resgate às enfiteuses constituídas anteriormente ao Cód. Civil virá, portanto, de encontro às exigências do bem comum, estando em consonância com o moderno conceito da propriedade, ao permitir a consolidação do domínio na pessoa daquele que diretamente a utiliza, valorizando-a em função de seu trabalho e da inversão de recursos, muitas vêzes penosamente adquiridos.

Sobre o autor

ALFREDO DE ALMEIDA PAIVA – Advogado no Distrito Federal

______________

Notas:

1 “Em tôrno da Constituição”, ed. 1934, página 227.

2 “REVISTA FORENSE”, vol. 98, pág. 238.

3 “Diário do Congresso Nacional”, de 15 de maio de 1948, pág. 3.273.

4 “REVISTA FORENSE”, vol. 118, páginas 33-41.

5 Cód. Civil, vol. 3, pág. 261; cf., ainda, PAULO LACERDA, “Manual do Código Civil Brasileiro”, vol. I pág. 111, nota 35; CARVALHO SANTOS, “Código Civil Interpretado”, vol. II, págs. 104-105.

6 “Rev. de Direito”, vol. 44, pág. 199.

7 “Rev. de Direito”, vol. e pág. cits.

8 “REVISTA FORENSE”, vol. 29, págs. 15 e segs.

9 “Teoria della retroattività delle leggi”, volume 3º, pág. 187.

10 “A Lei de Introdução ao Código Civil”, vol. I, pág. 465.

11 “Diritto Civile”, vol. I, parte I, pág. 645.

12 FERRARA, “Trattato di Diritto Civile”, vol. I, pág. 274; CARLOS MAXIMILIANO, “Direito Intertemporal”, págs. 150 e segs.; VICENTE RAO, “O Direito e a vida do Direito”, vol. II, pág. 462.

13 “A Lei de Introdução ao Código Civil”, vol. I, pág. 464.

14 “Les conflits de lois”, vol. II, pág. 189.

15 “Instituições de Direito Civil”, vol. I, página 181.

16 “Direito Intertemporal”, pág. 262.

17 “REVISTA FORENSE”, vol. 98, pág. 238.

18 “Arq. Judiciário”, vol. 95, pág. 207.

19 “Arq. Judiciário”, vol. 95, pág. 211.

20 “REVISTA FORENSE”, vol. 149, pág. 15.

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