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A possibilidade de alteração do regime de bens no casamento

CASAMENTO

REGIME DE BENS

Gediel Claudino de Araujo Junior

Gediel Claudino de Araujo Junior

31/05/2023

A possibilidade de alteração do regime de bens no casamento

Importante inovação do código civil vigente é a possibilidade dos cônjuges requererem, de comum acordo e justificadamente, a alteração do regime de bens. Neste sentido o § 2º do art. 1.639: “É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.

Diante do comando legal, podemos deduzir que os requisitos do pedido de alteração do regime de bens são três: primeiro, o pedido deve ser feito por meio de uma ação judicial, no caso, disciplinada pelo art. 734 do Código de Processo civil; segundo, o pedido de ser feito de forma conjunta pelo casal, ou seja, não é possível pedido de alteração do regime de bens feito apenas por um dos cônjuges; terceiro, os interessados devem justificar o seu pedido.

A doutrina tem criticado a exigência no sentido de que o pedido seja feito por meio de uma ação judicial, usando basicamente dois argumentos: primeiro, que a escolha inicial do regime de bens para além do regime legal deve necessariamente ser feita por meio de um pacto antenupcial (escritura pública feita em cartório, portanto um ato notarial), ou seja, se a escolha inicial é feita por um ato extrajudicial porque eventual alteração precisa ser feito por um ato judicial; segundo, o casal pode requerer o próprio fim do casamento por meio do divórcio por escritura pública, então qual o sentido de se impor que a simples mudança do regime de bens seja feita de forma judicial, mormente ao se considerar que os efeitos da mudança são “ex nunc” e a lei põe a salvo os interesses de terceiros. Outro argumento contra a exigência da ação judicial é a constatação de que as pessoas que vivem em união estável podem alterar a qualquer tempo as regras que disciplinam as questões patrimoniais da sua relação, ou seja, quem vive em união estável pode mudar o seu regime de bens por meio de um novo contrato de convivência, também com efeito “ex nunc”; tal fato claramente lhes confere vantagem em relação às pessoas casadas, gerando ilegal desequilíbrio entre os referidos institutos.

Também tem levantado dúvidas e debates a necessidade de “motivação” do pedido, visto que essa exigência claramente se apresenta como uma indevida intromissão na privacidade do casal, recomendando a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça cautela com tal assunto (“não se deve exigir dos cônjuges justificativas exageradas ou provas concretas do prejuízo na manutenção do originário, sob pena de se esquadrinhar indevidamente a própria intimidade e a vida privada dos consortes” – REsp 1119462/MG, QUARTA TURMA, DJe 12/03/2013).

Outro aspecto que merece menção sobre o tema é a possibilidade ou não de alteração do regime de bens quando este foi imposto pela lei. De fato, o art. 1.641 do Código Civil informa que é obrigatória a adoção do regime da separação de bens no casamento: (I) das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; (II) da pessoa maior de 70 (setenta) anos; (III) de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

Quando o regime da separação é imposto em razão de o casamento ter-se realizado com infringência de uma das causas suspensivas (art. 1.641, I, CC), não há efetivamente nada que justifique sejam os cônjuges impedidos de requerer a alteração do regime de bens, desde que a causa da sanção tenha sido sanada. Por exemplo: a viúva casa sem ter feito o inventário e dado partilha dos bens aos herdeiros do de cujus, sendo-lhe imposto o regime da separação de bens; porém, após o novo casamento, vem a realizar o inventário dos bens deixados pelo falecido, dando regular partilha aos herdeiros, cessando, desta forma, a causa suspensiva, e podendo ela requerer juntamente com seu novo cônjuge a alteração do regime de bens que lhe foi imposto.

No caso da imposição do regime de separação de bens porque um dos nubentes tem mais de 70 (setenta) anos (art. 1.641, II, CC), a alteração é obviamente impossível, embora, registre-se, sejamos contra essa disposição legal que presume a incapacidade relativa das pessoas com idade superior ao limite legal. Na verdade, a capacidade de discernimento de qualquer pessoa, tenha 20, 30, 40, 50, 60 ou 70 anos, tem menos relação com sua idade e muito mais com outros fatores ligados a sua cultura e saúde física e mental. Quem hoje não conhece pessoas idosas cheias de vida, com saúde, ativas na vida pessoal e na vida profissional. Mesmo sendo altruísta a motivação do legislador, penso que deveria ter se omitido nessa questão, deixando que eventual incapacidade da pessoa maior de 70 (setenta) anos fosse levantada por quem de direito, no tempo oportuno e se necessário. Nesse particular, há que se registrar que o legislador já avançou um pouco diante das muitas censuras que recebeu, vez que, como é cediço, este limite era até há pouco tempo de 60 (sessenta) anos, tendo sido alterado pela Lei nº 12.344, de 9 de dezembro de 2010.

A imposição do regime da separação de bens aos que dependem de autorização judicial para casar (art. 1.641, III, CC) é fruto da intenção do legislador de proteger as pessoas de pouca idade. Data venia, não agiu bem o legislador. De fato, a boa intenção do legislador já tinha forçado, sob a égide do Código Civil de 1916, o Supremo Tribunal Federal a sumular que no regime de separação de bens imposto pela lei comunicavam-se os aquestos, isto é, os bens adquiridos na constância do casamento (súmula 377 do STF: “No regime de separação legal de bens comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”).

Como já afirmamos, o legislador do atual Código Civil perdeu rara oportunidade para reparar as coisas. De qualquer forma, somos da opinião de que, afastadas as circunstâncias que justificaram a imposição do regime, que, como se sabe, são todas ligadas à idade dos nubentes, é possível a alteração. Afinal, se num novo casamento qualquer deles poderia optar por outro regime de bens, qual a razão para obrigá-los a manter um regime de bens que não desejam?

Lembro que a ação de alteração do regime de bens deve ser proposta por ambos os cônjuges, sendo competente o foro do domicílio do casal, devendo ser distribuída para a Vara da Família quando, claro, houver ao menos uma organizada na comarca; na sua falta, os interessados devem endereça-la ao juízo civil. A jurisprudência tem entendido que não é necessário que o casal descreva todos os seus bens, embora essa não seja uma questão tratada de forma unanime por todos os juízos. O valor da causa pode ser de alçada (não precisa expressar o total do valor dos bens do casal). O procedimento é aquele previsto para a jurisdição voluntária (arts. 719 a 725, CPC).

Outra questão importante ligada ao tema é quanto aos efeitos da referida alteração, ou seja, se ela vale a partir do transito em julgado da sentença que acata o pedido do casal (“ex nunc”), ou se ela vale desde a celebração do casamento (“ex tunc”). Maria Berenice Dias argumenta na sua obra Manual de direito das famílias, 15º edição, da Editora Juspodivm, página 737, que “como se encontra-se pacificado no âmbito do STJ a irretroatividade do regime de bens na união estável, imperioso adotar o mesmo critério em se tratando de alteração do regime de bens do casamento”, contudo é o próprio Superior Tribunal de Justiça que em recente decisão deu provimento a recurso especial, REsp n° 1671.422, com escopo de estabelecer a retroatividade da alteração requerida por um casal; no caso, os interessados requereram a alteração do regime da separação total para o da comunhão universal. O relator, Ministro Raul Araújo, observou que a retroatividade era benéfica para a coletividade, não prejudicava terceiros e nem produzia desequilíbrio; ou seja, essa decisão deixa a questão em aberto, dependendo das circunstâncias do caso em particular.

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