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2023 em Família e Sucessões – uma breve retrospectiva
Flávio Tartuce
11/01/2024
Como se tornou comum nos últimos anos, nesta última coluna Família e Sucessões do Migalhas de 2023 farei uma breve retrospectiva do intenso ano que se passou, expondo as principais mudanças legislativas, os eventos, os debates doutrinários, os principais julgados, e trazendo também uma perspectiva do que deve vir nos próximos anos.
Do ponto de vista legislativo, em outubro de 2023 surgiu nova alteração no tratamento do complicado tema da guarda dos filhos. O art. 1.584, § 2.º, do Código Civil foi modificado, passando a trazer uma exceção à suposta obrigatoriedade da guarda compartilhada em virtude da ocorrência de potenciais riscos da prática de violência doméstica para qualquer um dos membros da entidade familiar. Na sua atual redação, “quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda da criança ou do adolescente ou quando houver elementos que evidenciem a probabilidade de risco de violência doméstica ou familiar”.
Como tenho salientado, o tema da guarda de filhos vivencia hoje um verdadeiro caos doutrinário e jurisprudencial, diante das confusas e hesitantes redações dos arts. 1.583 e 1.583, após a Lei n. 13.058/2014, como de forma contundente alertou José Fernando Simão, quando da realização de audiência pública no Congresso Nacional, que à época discutia a elaboração dessa norma. Não se sabe ao certo se o sistema trata de guarda compartilhada ou alternada; se é possível exercer a guarda a distância; se ela é obrigatória ou não, entre outras questões, sendo urgente que o processo de Reforma do Código Civil, atualmente em curso, trate do tema e como já se projeta.
Seja como for, a nova norma de 2023, em certa medida, confirmou a afirmação de que a guarda compartilhada não é mesmo obrigatória, sobretudo pela locução final incluída no § 2.º do art. 1.584 da codificação privada. No que diz respeito aos procedimentos, foi acrescentado também um art. 699-A ao Código de Processo Civil, prevendo que nas ações de guarda, antes de iniciada a audiência de mediação e conciliação, o juiz indagará às partes e ao Ministério Público se há risco de violência doméstica ou familiar, fixando o prazo de cinco dias para a apresentação de prova ou de indícios pertinentes.
Em certa medida, as alterações legislativas confirmam parte do entendimento jurisprudencial. A título de exemplo, analisando a questão e confirmando a fixação de guarda unilateral, do Superior Tribunal de Justiça, destaco:
“É direito da criança e do adolescente desenvolver-se em um ambiente familiar saudável e de respeito mútuo de todos os seus integrantes. A não observância desse direito, em tese, a coloca em risco, se não físico, psicológico, apto a comprometer, sensivelmente, seu desenvolvimento. Eventual exposição da criança à situação de violência doméstica perpetrada pelo pai contra a mãe é circunstância de suma importância que deve, necessariamente, ser levada em consideração para nortear as decisões que digam respeito aos interesses desse infante. No contexto de violência doméstica contra a mulher, é o juízo da correlata Vara Especializada que detém, inarredavelmente, os melhores subsídios cognitivos para preservar e garantir os prevalentes interesses da criança, em meio à relação conflituosa de seus pais. Na espécie, a pretensão da genitora de retornar ao seu país de origem, com o filho – que pressupõe suprimento judicial da autorização paterna e a concessão de guarda unilateral à genitora, segundo o Juízo a quo – deu-se em plena vigência de medida protetiva de urgência destinada a neutralizar a situação de violência a que a demandante encontrava-se submetida” (STJ, REsp 1.550.166/DF, 3.ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 21.11.2017, DJe 18.12.2017).
De todo modo, penso que a expressão “probabilidade de risco de violência doméstica ou familiar” deve ser analisada com cautela pelo julgador. Isso porque o Direito Civil não fixou com clareza, até o presente momento e para os fins de vários institutos privados, a definição de risco. Muito maior será, portanto, o desafio em dizer o que é a “probabilidade de risco”, cláusula geral que demandará tempo e esforço para ser devidamente preenchida pelos magistrados, de acordo com as circunstâncias do caso concreto. Portanto, já vislumbro enormes desafios para a aplicação do novo comando.
De todo modo, podem servir de apoio nesse preenchimento dois enunciados doutrinários do IBDFAM, aprovados no seu XIV Congresso Brasileiro, em outubro de 2023, poucos dias antes da entrada em vigor da nova lei. Esse, aliás, foi um dos grandes eventos do ano que se encerra. O primeiro deles é o Enunciado n. 47, segundo o qual, “constatada a ocorrência de violência doméstica, a decisão que fixar o regime de convivência entre os pais e seus filhos deve considerar o impacto sobre a segurança, bem-estar e desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes envolvidos, sopesando o risco de exposição destes a novas formas de violência”. A ementa doutrinária traz parâmetros interessantes, que devem ser levados em conta pelo julgador para o eventual afastamento da guarda compartilhada. Além dele, destaco o Enunciado n. 50 do IBDFAM, segundo o qual “a restrição ou limitação à convivência paterna ou materna em razão da violência doméstica contra a criança ou adolescente não deve ser indiscriminadamente extensiva aos demais familiares vinculados ao agressor, respeitado sempre o superior interesse e vontade da criança ou adolescente”.
Jurisprudência
Do ponto em vista da jurisprudência, muitos foram os entendimentos pronunciados no âmbito dos Tribunais Superiores. Entre eles destaco o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, da inconstitucionalidade do instituto da separação de direito, judicial e extrajudicial, desde a Emenda Constitucional n. 66/2010, conhecida como Emenda do Divórcio, que alterou o art. 226, § 3.º, da Constituição Federal, passando a ter a seguinte redação: “o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”. O debate foi intensificado pelo fato de o Código de Processo Civil de 2015 ter mencionado a separação judicial e a extrajudicial em vários de seus comandos.
No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, existiam decisões que entendiam pelo fim da separação de direito desde a Emenda n. 66, como a prolatada pelo Ministro Luis Felipe Salomão, em 2011: “assim, para a existência jurídica da união estável, extrai-se o requisito da exclusividade de relacionamento sólido da exegese do § 1.º do art. 1.723 do Código Civil de 2002, fine, dispositivo esse que deve ser relido em conformidade com a recente EC n.º 66 de 2010, a qual, em boa hora, aboliu a figura da separação judicial” (STJ, REsp 912.926/RS, 4.ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 22.02.2011, DJe 07.06.2011).
Porém, infelizmente, em contestado aresto de março de 2017, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça acabou por concluir que o instituto da separação judicial remanesceria no ordenamento jurídico nacional:
“A separação é modalidade de extinção da sociedade conjugal, pondo fim aos deveres de coabitação e fidelidade, bem como ao regime de bens, podendo, todavia, ser revertida a qualquer momento pelos cônjuges (Código Civil, arts. 1.571, III, e 1.577). O divórcio, por outro lado, é forma de dissolução do vínculo conjugal e extingue o casamento, permitindo que os ex-cônjuges celebrem novo matrimônio (Código Civil, arts. 1571, IV, e 1.580). São institutos diversos, com consequências e regramentos jurídicos distintos. A Emenda Constitucional n.º 66/2010 não revogou os artigos do Código Civil que tratam da separação judicial” (STJ, REsp 1.247.098/MS, 4.ª Turma, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 14.03.2017, DJe 16.05.2017).
Como não poderia ser diferente, sempre me filiei ao voto vencido do Ministro Salomão, em especial pelas citações à minha posição doutrinária e de muitos outros juristas como Luiz Edson Fachin, Paulo Lôbo, Rolf Madaleno, Zeno Veloso, Álvaro Villaça Azevedo, Maria Berenice Dias, Cristiano Chaves, Nelson Rosenvald, Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho e Daniel Amorim Assumpção Neves, este último com o forte argumento de que o CPC/2015 não poderia ter repristinado a separação de direito.
Cerca de cinco meses depois, mais uma vez lamentavelmente, fez o mesmo a Terceira Turma da Corte, ao julgar da seguinte forma: “a dissolução da sociedade conjugal pela separação não se confunde com a dissolução definitiva do casamento pelo divórcio, pois versam acerca de institutos autônomos e distintos. A Emenda à Constituição n.º 66/2010 apenas excluiu os requisitos temporais para facilitar o divórcio. O constituinte derivado reformador não revogou, expressa ou tacitamente, a legislação ordinária que cuida da separação judicial, que remanesce incólume no ordenamento pátrio, conforme previsto pelo Código de Processo Civil de 2015 (arts. 693, 731, 732 e 733 da Lei n.º 13.105/2015). A opção pela separação faculta às partes uma futura reconciliação e permite discussões subjacentes e laterais ao rompimento da relação. A possibilidade de eventual arrependimento durante o período de separação preserva, indubitavelmente, a autonomia da vontade das partes, princípio basilar do direito privado. O atual sistema brasileiro se amolda ao sistema dualista opcional que não condiciona o divórcio à prévia separação judicial ou de fato” (STJ, REsp 1.431.370/SP, 3.ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 15.08.2017, DJe 22.08.2017). Essa última votação foi unânime na Terceira Turma, não havendo qualquer posição em sentido contrário.
Apesar do surgimento desses acórdãos superiores, mantive a minha posição em meus livros, aulas e palestras, mesmo com essas derrotas, até porque o tema pendia de análise pelo Supremo Tribunal Federal, que, nos autos do Recurso Extraordinário n. 1.167.478/RJ, reconheceu a repercussão geral de questão constitucional, o que se deu em junho de 2019 – Rel. Min. Luiz Fux (Tema 1.053).
Em suma, apesar dos recentes arestos superiores, prolatados no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, compartilhava do entendimento de extinção da separação de direito no Direito de Família brasileiro, conforme constava do voto vencido do Ministro Luis Felipe Salomão.
Pois bem, felizmente e depois de treze anos de intenso debate e muitas discussões doutrinárias e jurisprudenciais, o Pleno do Supremo Tribunal Federal finalmente examinou a questão do fim da separação judicial, em novembro de 2023. Por maioria de votos, sete votos contra três, concluiu que ela não persiste mais no sistema jurídico brasileiro, desde a Emenda Constitucional n. 66/2010. Seguiram o voto do relator Luiz Fux os Ministros Cristiano Zanin, Dias Toffoli, Edson Fachin – que sempre defendeu essa posição, como doutrinador –, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia. Foram vencidos os Ministros Nunes Marques, André Mendonça e Alexandre de Moraes, que, apesar de julgarem pela necessidade de uma separação judicial prévia para o divórcio – o que foi unânime –, ainda concluíam pela possibilidade da ação autônoma de separação judicial. A tese final foi ementada da seguinte maneira:
“Após a promulgação da EC 66/10, a separação judicial não é mais requisito para o divórcio, nem subsiste como figura autônoma no ordenamento jurídico. Sem prejuízo, preserva-se o estado civil das pessoas que já estão separadas por decisão judicial ou escritura pública, por se tratar de ato jurídico perfeito” (STF, RE 1.167.478/RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, Tema 1.053, j. 08.11.2023).
Apesar de a tese mencionar apenas a separação judicial, entendo que ela vale também para a separação extrajudicial. Assim, o instituto da separação de direito, a englobar as duas figuras, foi banido do ordenamento jurídico, sendo inconstitucionais os dispositivos do Código Civil, do Código de Processo Civil e da legislação específica que mencionam a categoria, como sempre defendi em meus livros.
Como o julgamento foi prolatado em sede de repercussão geral, tem força vinculativa para novas decisões da primeira e da segunda instância, nos termos dos arts. 489, 926, 927 e 985 do Estatuto Processual. O Superior Tribunal de Justiça também precisará rever a sua posição, passando a prevalecer a posição anterior do Ministro Luis Felipe Salomão, alinhada à maioria dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Espera-se, ainda, que a doutrina vencida se recolha quanto a essas discussões, uma vez que a decisão deve ser cumprida. Como tenho afirmado em minhas aulas e palestras, épreciso saber perder, em prol do respeito institucional, da certeza, da estabilidade e da segurança jurídica. Além disso, é preciso cumprir a lei, sobretudo a força vinculativa das decisões judiciais que são precedentes qualificados, como é o caso dessa decisão do STF, e nos termos do que foi consagrado pelo Código de Processo Civil de 2015.
Ainda no plano normativo e jurisprudencial, do Conselho Nacional de Justiça, devem ser destacadas duas iniciativas da Corregedoria-Geral de Justiça, exercida pelo Ministro Luis Felipe Salomão. A primeira delas diz respeito aos Provimentos n. 141 e 146 do CNJ, que alteraram o Provimento n. 37/2014, para atualizá-lo à luz da Lei n. 14.382/2022, que instituiu o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (SERP), tratando do termo declaratório de reconhecimento e dissolução de união estável perante o registro civil das pessoas naturais e dispondo sobre a alteração de regime de bens na união estável e sobre a sua conversão extrajudicial em casamento.
Código Nacional de Normas (CNN-CNJ)
Sucessivamente, como segunda iniciativa a ser mencionada, foi criado, em agosto de 2023, o Código Nacional de Normas (CNN-CNJ), que já incorporou essas previsões, sem prejuízo de muitas outras editadas pelo órgão, com aplicação direta para o Direito de Família e das Sucessões, e sobretudo para a atividade extrajudicial. Como bem destacado pelo Ministro Luis Felipe Salomão na sua exposição de motivos, “a ideia é que os cidadãos, os delegatários, os magistrados e os demais profissionais do Direito encontrem, neste Código Nacional de Normas, tudo de que o Conselho Nacional de Justiça dispõe em matéria de atos normativos relativamente aos serviços notariais e registrais, ainda que por meio de remissões”. E mais, “o objetivo do presente Código Nacional de Normas é colaborar para a adequada sistematização das normas envolvendo os serviços notariais e registrais, tudo em proveito dos cidadãos e dos profissionais do Direito que precisam realizar consultas mais objetivas e seguras”. Tive a honra de fazer parte do grupo de trabalho de sua elaboração, ao lado das Juízas Carolina Ranzolin Nerbass, Caroline Somesom Tauk e Daniela Pereira Madeira, bem como do Professor Carlos Eduardo Elias de Oliveira. Sem dúvida o novo CNN é um marco para a atividade extrajudicial dos Cartórios em nosso País, que deve ser muito incrementada e incentivada nos próximos anos.
Reforma do Código Civil
Como outro ponto a ser destacado, o que deve ser debatido intensamente nos próximos anos, 2023 marcou o início dos trabalhos de Reforma do Código Civil. Em 24 de agosto de 2023, o Presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, nomeou e formou uma comissão de juristas para empreender os trabalhos de atualização do Código Civil de 2002. Como se sabe, o projeto que gerou a atual codificação privada é da década de 1970, estando ela desatualizada em vários aspectos, sobretudo em questões relativas ao Direito de Família e das Sucessões e especialmente diante das novas tecnologias. Voltou-se a afirmar, com muita força, que o atual Código Civil “já nasceu velho”.
A comissão tem a presidência do Ministro Luis Felipe Salomão e a vice-presidência do Ministro Marco Aurélio Bellizze, ambos do Superior Tribunal de Justiça. Tenho a honra de atuar como relator da comissão, ao lado da Professora Rosa Maria Andrade Nery. O prazo para o desenvolvimento dos trabalhos é de cento e oitenta dias, com a possibilidade de eventual prorrogação.
Foram formados nove grupos de trabalho, de acordo com os livros respectivos do Código Civil e com a necessidade de inclusão de um capítulo específico e novo sobre o Direito Digital, o que é urgente. As composições das subcomissões, com os respectivos sub-relatores, são as seguintes:
- Na Parte Geral, Professor Rodrigo Mudrovitsch (relator), Ministro João Otávio de Noronha, Professora Estela Aranha e Juiz Rogério Marrone Castro Sampaio.
- Em Direito das Obrigações, Professor José Fernando Simão (relator) e Professor Edvaldo Brito.
- Em Responsabilidade Civil, Professor Nelson Rosenvald (relator), Ministra Maria Isabel Gallotti e Juíza Patrícia Carrijo.
- Quanto ao Direito dos Contratos, Professor Carlos Eduardo Elias de Oliveira (relator), Professora Angelica Carlini, Professora Claudia Lima Marques e Professor Carlos Eduardo Pianovski.
- Em Direito das Coisas, Desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo (relator), Professor Carlos Vieira Fernandes, Professora Maria Cristina Santiago e Desembargador Marcelo Milagres.
- Em Direito de Família, Juiz Pablo Stolze Gagliano (relator), Ministro Marco Buzzi, Desembargadora Maria Berenice Dias e Professor Rolf Madaleno.
- No Direito das Sucessões, Professor Mario Luiz Delgado (relator), Ministro Cesar Asfor Rocha, Professora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka e Professor Gustavo Tepedino.
- Para o livro especial do Direito Digital, Professora Laura Prado (relatora), Professora Laura Mendes e Professor Ricardo Campos.
- Por fim, para o Direito de Empresa, Professora Paula Andrea Forgioni (relatora), Professor Marcus Vinicius Furtado Coêlho, Professor Flavio Galdino, Desembargador Moacyr Lobato e Juiz Daniel Carnio.
Muito longe de ser um trabalho feito às pressas, no ano de 2023 foram realizadas três audiências públicas, em São Paulo (OABSP, em 23 de outubro), Porto Alegre (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em 20 de novembro) e Salvador (Tribunal de Justiça da Bahia, em 7 de dezembro). Além da exposição de especialistas e debates ocorridos nesses eventos, muitos outros seminários jurídicos foram realizados em reuniões de cada subcomissão, com a participação de seus componentes por todo o Brasil. Foram também abertos canais para envio de sugestões pelo Senado Federal e oficiados mais de quinhentos institutos e instituições jurídicas, que enviaram suas colaborações.
Após um intenso trabalho no âmbito de cada grupo, em dezembro de 2023 foram consolidados os textos dos dispositivos sugeridos, com cerca de 1.800 páginas, e enviados para a revisão dos relatores gerais. Em 2024 ocorrerão, sem atropelos e conforme as normas regimentais do Congresso Nacional, os debates entre todos os membros da comissão, a votação dos textos e sua elaboração final, em meados de abril, para posterior envio ao Presidente do Senado. Depois, ainda, ocorrerão as discussões nas Casas do Povo, no Parlamento brasileiro, com a possibilidade de novas emendas e tramitação oficial.
Deixarei aqui de expor as principais mudanças, pois o texto ainda está sendo discutido. De todo modo, como afirmei em minhas aulas e palestras de 2023, a ideia central é desburocratizar e destravar o Direito Privado brasileiro, no que for possível em prol da operabilidade, um dos princípios fundamentais do Código Civil de 2002.
Perdas
Apesar de grandes ganhos, o Direito de Família e Sucessões também sofreu enormes perdas. Entre elas destaco o falecimento do Ministro e Professor Paulo de Tarso Sanseverino, em abril, e do Professor Cristiano Chaves de Farias, em novembro. Ambos deixaram um legado de relevo para todo o Direito Civil, que sempre será lembrado e nunca esquecido.
Desde 2019, este último ano foi o primeiro que começamos sem o fantasma pandêmico da Covid, o que fez com que os encontros e eventos jurídicos voltassem com muita força. Entre tantos, destaco a III Jornada de Direito Processual Civil, do Conselho da Justiça Federal e com apoio do Superior Tribunal de Justiça, realizada em Brasília, em setembro, coordenada pelos Ministros Og Fernandes e Mauro Campbell Marques. Com vários enunciados importantes para o Direito de Família e das Sucessões, destaco três: “o foro de domicílio da vítima de violência doméstica tem prioridade para a ação de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável” (Enunciado n. 163); “em casos excepcionais, o juiz poderá dispensar a prova pericial nos processos de interdição ou curatela, na forma do art. 472 do CPC e ouvido o Ministério Público, quando as partes juntarem pareceres técnicos ou documentos elucidativos e houver entrevista do interditando” (Enunciado n. 178); e “nos termos do art. 627, § 3.º, do CPC, é possível o reconhecimento” (Enunciado n. 179). A última ementa doutrinária, aliás, é de grande interesse para a prática do Direito das Sucessões, com tese que há tempos tenho defendido.
IBDFAM
O IBDFAM, seja pela Diretoria Nacional, seja pelas Estaduais, voltou a fazer grandes eventos presenciais. Destaco novamente o seu XIV Congresso Brasileiro, em outubro, que marcou as despedidas dos Professores Paulo Lôbo e Giselda Hironaka da Diretoria Nacional e reuniu mais de 1.500 participantes em Belo Horizonte, com a aprovação de dez enunciados doutrinários, dois deles aqui antes destacados.
O IBDFAM/SP realizou também muitos eventos, o maior deles do Núcleo ABCDMR, feito em minha homenagem, em novembro. Após dezoito anos na Diretoria do IBDFAM/SP, tendo sido vice-presidente e presidente por dois mandatos, despeço-me da entidade, que passa a ser presidida por Ana Paula Copriva, a primeira mulher a exercer o mandato, ao lado de Marcelo Truzzi Otero, como vice-presidente. Sigo no IBDFAM Nacional como presidente da comissão de Direito das Sucessões, recentemente premiada, e como vice-presidente da comissão de Enunciados.
Encerrando este texto, gostaria de agradecer ao Migalhas pela oportunidade. Ano que vem esta coluna completa dez anos e a minha coleção de livros de Direito Civil completa vinte anos. Quero agradecer ao Miguel e a toda a sua excelente equipe, deste que é, na minha opinião, o maior e mais importante informativo jurídico do Brasil. Em 2023, os textos aqui publicados – sobretudo aqueles sobre “holdings familiares” – tiveram enorme repercussão, como nunca visto. Quero agradecer aos Professores Maurício Bunazar e Carlos Elias, que foram meus coautores na coluna. Ano que vem pretendo ampliar as coautorias, com muitos outros juristas, tendo como foco principal a Reforma do Código Civil.
Desejo a todos os leitores um Feliz Natal! E que 2024 seja tão intenso como foi 2023!
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