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Corrupção endêmica
Waldo Fazzio Junior
14/04/2017
A corrupção é, antes de tudo, um fenômeno viral. Humano e viral. Não está restrita ao arcaico conceito religioso do pecado porque vai muito mais longe. Independe de reabilitação ou qualquer outra manifestação de arrependimento. Corrupto não se arrepende, não apreende e não teme qualquer sanção.
Nem adianta pesquisar sobre o histórico desse vírus que não perdoa raça, cor, credo ou situação geográfica, conquanto tenha sólidas razões em regimes políticos que a utilizam sob os mais diversos pretextos e escusas.
A corrupção é endêmica e, a exemplo de outras doenças virais, afeta tudo e todos, espalhando-se graças à impunidade e uma equivocada leitura da tolerância, desde o famigerado “jeitinho” até as cerebrinas “maracutaias” que superam auditorias, investigações ministeriais e eventuais (poucas) medidas oficiais.
Esse quadro que vai, desde os crimes contra a administração pública, passa pela improbidade administrativa, invade o segmento empresarial e integra o cotidiano familiar, escolar, esportivo e pseudo religioso, produz o sinistro efeito de convencer as pessoas de que a corrupção é normal, um costume, uma praxe, um modo de vida. Como toda febre, oculta sua etiologia e fica satisfeita com antipiréticos.
No Brasil, por enésimas razões (que nem vale a pena examinar), a corrupção alcançou um estágio extremamente perigoso. Participa do modo de vida, dos negócios e invade os projetos mais rudimentares de uma vida boa para si.
Visceralmente egoística, a praga da corrupção não perdoa nem mesmo o mundo jurídico, onde se manifesta em teses esdrúxulas que a contornam e, às vezes, na exegese de importantes textos legislativos, afrontando quaisquer princípios éticos e, sem qualquer pudor, tecendo interpretações constitucionais que ameaçam os mais comezinhos fundamentos de uma sociedade que se pretende democrática e pautada pelo Direito.
PEC vai, PEC vem, CPI vai, CPI vem, Acórdão vai, Acórdão vem, tudo se transforma numa fantasia mal decorada pelo pior surrealismo possível. Precisamente aquele que desafia a racionalidade e zomba de qualquer pretensão à fraternidade. Não é uma questão que habita só a justiça. É uma deformação da criatura que começa a ganhar traços que a diferenciam cada vez mais de qualquer ente superior.
Educação (boa educação) pode amenizar os sintomas do vírus, mas, depois de um certo estágio, torna-se mero paliativo. Estamos muito distantes de um sistema educacional regular (bom, seria querer demais).
Lembro-me sempre que Karl Marx perseguiu a pretensão de transformar o mundo e constato que, no Brasil, acabou sendo transformado pelos pretensos seguidores. Prefiro Agnes Heller: é preciso transformar o homem. E acrescento Millor: o homo brasiliensis.
Veja também:
- A necessidade de dissolver o indissolúvel
- Improbidade administrativa nas parcerias com entidades privadas
- O risco da corrupção como praxe nacional
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